PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 3ª REGIÃO
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- Manuella Philippi Rijo
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1 RECORRENTE RECORRIDO ROSELY APARECIDA DOS SANTOS UNION INDÚSTRIA DE PRODUTOS ESPORTIVOS LTDA. EMENTA: LITIGAÇÃO DE MÁ-FÉ. RECLAMANTE QUE OMITIU FATO DE FUNDAMENTAL IMPORTÂNCIA PARA A SOLUÇÃO DO LITÍGIO. Evidenciado nos autos que as lesões alegadas pela trabalhadora como sendo decorrentes de acidente de trabalho foram, em verdade, resultantes de acidente de trânsito da qual foi vítima e dolosamente omitidas por ela quando da propositura da demanda, com o evidente intuito de obter da empregadora indenização como se tratasse das conseqüências de um acidente de trabalho, afigura-se aplicável ao caso o disposto nos arts. 17, II, e 18, caput, do CPC. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, interposto contra decisão proferida pelo Juízo da Vara do Trabalho de Sabará, em que figura, como recorrente, ROSELY APARECIDA DOS SANTOS e, como recorrida, UNION INDÚSTRIA DE PRODUTOS ESPORTIVOS LTDA., como a seguir se expõe: RELATÓRIO O Juízo da Vara do Trabalho de Sabará, pela r. sentença de fl. 366 a 369-v, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados para condenar a reclamada ao pagamento das parcelas constantes do dispositivo de fl. 369 a 369-v. Inconformada, a reclamante interpõe recurso ordinário à fl. 370 a 374, pleiteando a reforma do julgado quanto ao acidente do trabalho e a condenação a litigação de má-fé. Contrarrazões à fl. 376 a 376-v. Dispensável a intervenção do MPT. É o relatório. VOTO 1. Admissibilidade Conheço do recurso ordinário, eis que aviado a tempo e modo e
2 regular a representação. 2. Mérito Acidente do trabalho. Litigação de má-fé A reclamante sustenta que não pode prevalecer a sentença de improcedência do pedido de emissão de CAT e demais consectários do acidente, ao entendimento de que não fora produzida prova da real ocorrência do acidente, considerando o Juízo, ainda, que a autora teria agido de má-fé ao omitir a existência de acidente de trânsito causador do problema de saúde por ela apresentado. Argumenta que, embora não tenha comprovado a ocorrência de acidente do trabalho, a conclusão de que o sinistro de trânsito é que foi o real causador dos males de que sofre é mera ilação, sem qualquer fundamento na prova técnica dos autos. Aduz que o fato de não ter mencionado o acidente de trânsito repousa na ausência de relação deste com os seus problemas de saúde, destacando que jamais pretendeu ocultá-lo. Ademais, argui que os problemas psiquiátricos de que sofre, conforme apuração em perícia médica, serviriam como atenuante para a aplicação da pena por litigação de má-fé. Argumenta, outrossim, que a perícia constatou lombalgia e que tal enfermidade não guarda relação com o acidente de trânsito. Assim, assevera que não há nos autos elementos necessários à caracterização da má-fé, ressaltando que jamais teve a intenção de subverter a verdade dos fatos e de causar dano processual. Recorre, ainda, do percentual de 5% arbitrado, por excessivo, devendo ser reduzido para o mínimo legal. O Juízo de primeiro grau fundamentou a condenação por litigação de má-fé na omissão da autora de que havia sofrido acidente de trânsito em 2011, em que teve lesões na bacia e na região pélvica, já tendo ajuizado duas ações na Justiça Comum acerca da matéria. Assevera que a obreira preferiu atribuir suas lesões a um inverídico acidente do trabalho, violando o dever de lealdade no processo. Ao exame. Em sua inicial, de fato, a autora alega que estava em plena higidez física, tendo sido inclusive aprovada em exame médico admissional. Descreve que sofreu ruptura da área abdominal e do peritônio em 02 de maio de 2012, razão pela qual pugna pela emissão de CAT e encaminhamento para o INSS, a fim de receber benefício previdenciário e fazer jus à estabilidade provisória. A reclamante, inclusive, alega, em sede de impugnação à defesa, que as assertivas da ré não condizem com a realidade fática e visam a simplesmente opor resistência a fatos incontroversos e de clara procedência. Nesse sentido, verifica-se que a reclamante insistiu em sua impugnação na tese de que os danos por ela sofridos foram decorrentes de acidente do trabalho e não do acidente de trânsito referido pela empresa em sua contestação. No que se refere ao acidente de trânsito em questão, verifica-se que, no boletim de ocorrência de fl. 201 a 206, foi atestado que a autora foi atropelada em e que teve escoriações no corpo, ficando em observação na Santa Casa (fl. 205). Em ficha de atendimento ambulatorial (fl. 209), consta que a paciente relata dor no membro inferior direito e no baixo ventre inguinal direito.
3 Já o documento de fl. 213 atesta que a paciente sofreu atropelamento e teve fratura do anel pélvico, prescrevendo-lhe tratamento ortopédico. Nesse sentido, em documento de fl. 225, consta que o diagnóstico da autora em razão do atropelamento por ela sofrido foi fratura da coluna lombar e da pelve, além de fratura de outra parte da coluna lombossacra, pelve e NE (S32.08). O laudo médico de fl. 326 informa que a autora sofre de lombalgia crônica refratária a tratamento, com histórico de atropelamento há 1 ano e meio, destacando ter sido prensada entre dois veículos. Deste documento consta, ainda, que o diagnóstico inicial era de lombalgia pós-traumática. A autora, por sua vez, manifestou-se acerca dos documentos juntados aos autos pela reclamada, alegando que o mal que a acomete não decorre diretamente do acidente do trânsito anteriormente sofrido por ela, mas sim de típico acidente do trabalho nas dependências da reclamada. Confirmou que, de fato, sofreu acidente em , mas sustenta que as lesões sofridas não são idênticas àquelas que causam a invalidez alegada na inicial. Aduz que essas lesões decorrem de peso excessivo por ela suportado na execução de suas tarefas diárias (fl. 343 a 344). Desse modo, assevera que a lesão hoje existente é uma inflamação na região pélvica, originada de levantamento de peso incompatível com sua compleição física, pois era obrigada a carregar pesadas formas. No laudo da perícia médica, acostado à fl. 353 a 358-v, consta do histórico clínico-ocupacional que a reclamante sofre fratura da bacia em 2010 decorrente de atropelamento, sem que houvesse a necessidade de cirurgia (fl. 354-v). Em seus comentários, informa o expert que inicialmente, na linha da peça inicial, informa o perito que não há absolutamente nenhum relato da paciente ou registro documental acerca de ruptura de área abdominal/peritônio. A ocorrência de uma ruptura deste tipo ocorreria, a princípio, após algum trauma grave na região abdominal, demandando tratamento cirúrgicio imediato, com risco de morte. Definitivamente, não é o caso. A reclamante sofreu um atropelamento, meses antes da admissão na ré, com fratura de bacia, evoluindo com pubalgia e lombalgia crônica. Nota-se, claramente, que a questão osteomuscular da reclamante é pré-existente ao ingresso na reclamada (fl. 357). O perito consignou que não há nenhum documento indicando intoxicação da reclamante, durante o contrato com a ré, por algum produto químico, destacando, ainda, que, na prática, a reclamante quase não trabalhou no setor de tinta. A alegada necessidade de uso atual de bombinha para controle de asma só reforça a ausência de nexo doença-trabalho. Se algum fator ocupacional fosse o desencadeador da asma, obviamente que, hoje, a autora não usaria mais tal bombinha (fl. 357). Nesse diapasão, conclui o perito pela ausência de elementos técnicos indicando a existência de doença relacionada ao trabalho ou agravada pelo trabalho, e tampouco de lesão associada a acidente de trabalho (fl. 357-v), sendo que foi a obreira considerada apta em exame demissional realizado em , além de não terem sido observadas alterações incapacitantes. Conclui, ainda, pela aptidão da autora para o trabalho e
4 para as atividades da vida diária. Finalmente, cabe salientar que o perito ressaltou em seu laudo técnico que a reclamante laborava na fabricação de bolas de novembro/2011 a junho/2012. De junho/2012 a outubro/2012, as atividades eram: efetuar pintura das bolas com tinta vinílica à base de solvente, o que ocorria três vezes por semana; auxiliar na retirada de formas do chão para colocar na mesa e auxiliar virando a bombona de massa para fabricação das câmaras em tambores de 2001 e lavar as mãos com querosene para retirar da massa (fl. 169) (fl. 356-v). Pois bem. Embora o perito tenha relacionado entre as atividades exercidas pela obreira na empresa a retirada de formas do chão para colocar na mesa, o fato de não ter a reclamante nem sequer mencionado em sua petição inicial o acidente de trânsito por ela sofrido em 2011 atrai a constatação de que agiu de má-fé. Com efeito, como constatou o perito, a ruptura da área abdominal, peritônio, somente ocorre após trauma grave nessa região, o que demandaria tratamento cirúrgico imediato, com risco de morte. Desse modo, não haveria como a reclamante ter sido vítima desse tipo de lesão e, ainda assim, continuasse a trabalhar, apenas relatando dores no local afetado. Assim, não subsiste tecnicamente a argumentação autora de que sofreu acidente do trabalho e que, em função apenas desse sinistro, passou a ser acometida por dores na região pélvica. Ora, não é possível admitir que as dores de que se queixa a reclamante são exatamente no mesmo local em que foi a obreira prensada entre dois carros em um acidente de trânsito ocorrido em A questão fundamental para aferir se houve litigação de má-fé por parte da autora está justamente no fato de que toda a sua argumentação inicial leva a crer que estava saudável e sem qualquer problema de saúde até o momento do alegado acidente de trabalho, quando passou a sentir fortes dores pélvicas. Transparece, assim, o evidente intuito da parte de transferir para a empregadora a responsabilidade que, na verdade, deveria recair sobre a pessoa responsável pelo acidente de trânsito. Evidencia tal intuito, ademais, o fato de não ter a autora contestado as conclusões a que chegou o perito oficial em seu laudo, por meio do qual destacou que não há nexo de causalidade entre as dores relatadas e a atividade laboral cumprida pela obreira no período em que laborou para a reclamada. Além disso, nota-se que a autora não trouxe à colação qualquer elemento de prova, documental ou testemunhal, que corroborasse a versão de que houve acidente do trabalho e que justificasse a alegação de que não foi apresentada CAT, acusação
5 que se revela de extrema gravidade, pois implica obstar o recebimento do correspondente benefício pela obreira. Nessa mesma linha, a autora afirma que ficou inválida para o trabalho e que sua dispensa foi ilegal, pois não mais tinha higidez física. Em verdade, a reclamante somente admitiu ter sido vítima de acidente de trânsito quando a reclamada trouxe à colação os documentos referentes às ações por ela ajuizadas. Tanto que nada trouxe a respeito em sua manifestação de fl. 163 a 164. Sem que tivessem sido juntadas essas peças, afigura-se certo que a autora jamais teria mencionado o sinistro de 2011, o que torna patente a litigação de má-fé, consubstanciada no intuito de transferir para a empresa a responsabilidade por lesões decorrentes, como confirmado pelo perito oficial, em razão de acidente de trânsito. Não se olvida que a parte tem o direito de submeter ao Poder Judiciário, na forma do art. 5º, XXXV, da CRFB, as questões de seu interesse, a fim de obter provimento que solucione a lide existente. No entanto, o exercício desse direito não autoriza a reclamante a omitir circunstâncias que, flagrantemente, influenciam na resolução da matéria objeto de análise. Não se está a exigir que a parte produza prova contra seus próprios interesses, mas sim que seja revelada toda a verdade acerca dos fatos pertinentes. Com relação à alegação da autora de que é imprescindível a prova de que agiu com dolo ou culpa, tem-se que não há dúvida de que o objetivo da autora em omitir o acidente de trânsito repousou na possibilidade por ela vislumbrada de transferir para a empresa a responsabilidade por suas lesões. Evidente, portanto, o dolo. Finalmente, acerca da fixação pelo Juízo de multa de 5% por litigação de má-fé, verifica-se que o art. 18, 2º, do CPC autoriza a fixação pelo Juízo do valor de indenização à parte contrária, não superior a 20% do valor da causa. No entanto, afere-se que, no caso dos autos, que não houve comprovação pela reclamada de qualquer prejuízo decorrente da litigação de má-fé por parte da autora, o que impede a condenação com fundamento no art. 18, 2º, do CPC, ante a expressa menção no caput do art. 18 do CPC aos prejuízos sofridos pela parte a ser indenizada. Comprovada a má-fé no caso dos autos, entretanto, cabe a reforma do julgado para, com base no disposto nos arts. 17, II, e 18, caput, do CPC, condenar a autora ao pagamento de multa de 1% sobre o valor da causa, excluindo do julgado a condenação com fundamento no art. 18, 2º, do CPC, pois não comprovados os prejuízos havidos pela ré. Com tais considerações, dou parcial provimento ao recurso da autora, para reduzir a multa por litigação de má-fé para 1% sobre o valor da causa, na forma dos arts. 17, II e 18, caput, do CPC. 3. Conclusão Conheço do recurso ordinário e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, para reduzir a multa por litigação de má-fé para 1% sobre o valor da causa, na forma dos arts. 17, II e 18, caput, do CPC.
6 Fundamentos pelos quais, O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária da sua Oitava Turma, hoje realizada, julgou o presente processo e, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso ordinário; no mérito, sem divergência, deu-lhe parcial provimento, para reduzir a multa por litigação de má-fé para 1% sobre o valor da causa, na forma dos arts. 17, II e 18, "caput", do CPC. Belo Horizonte, 28 de maio de JOSÉ MARLON DE FREITAS Juiz Convocado Relator
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