RECURSO ESPECIAL Nº ES (2008/ )

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1 RECURSO ESPECIAL Nº ES (2008/ ) RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA RECORRENTE : (...) ADVOGADO : THIAGO PILONI E SILVA - DEFENSOR PÚBLICO RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PROCURADOR : INDIRA DIWALI EMENTA PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 617 DO CPP. OCORRÊNCIA. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL. PENA DE MULTA MAJORADA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. REFORMATIO IN PEJUS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO. DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto por (...), com fundamento na alínea "a" do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, manejado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, ementado verbis: APELAÇÃO CRIMINAL - ENTORPECENTE - ARTIGO 33 DA LEI Nº /06 - CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO 4º DO MESMO DIPLOMA LEGAL IRRESIGNAÇÃO QUANTO À FRAÇÃO APLICADA - CORREÇÃO ERRO MATERIAL POSSIBILIDADE - RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1 - A aplicação da causa de diminuição prevista no parágrafo quarto do art. 33 da Lei nº /06, prevê um conjunto de fatores que demonstra a distância do agente com a prática de crime e que deixa ver sua maneira de ser e de comportar-se em sociedade; 2 - No tocante as causas de aumento ou diminuição, quando as mesmas são previstas em limites ou quantidades variáveis, elas devem ser calculadas pelas circunstâncias da própria causa de aumento ou diminuição, e não pelas circunstâncias do crime, pois estas já foram consideradas no cálculo da penalização; 3 A fixação da fração prevista pela lei para a diminuição da pena vai depender da análise dos requisitos mencionados pelo magistrado, visto que esse goza de liberdade na formação de sua convicção, estando vinculado, tão somente, aos limites a que lhe foram impostos pela lei, no caso, de um sexto a dois terços, sabe-se, portanto, que o poder discricionário conferido ao julgador de piso para o exercício da fundamental atividade de determinação da reprimenda penal deve ser respeitado pelo Tribunal de Justiça, o qual somente deveria interferir nos casos em que ocorrer nulidade ou flagrante arbitrariedade, o que não é o caso dos autos; 4 - Ressalte-se que, de acordo com decisão pacífica do STJ, o Tribunal de 2º grau pode corrigir, de ofício, em recurso exclusivo da defesa, eventual erro material contido na sentença de 1 grau, ainda que tal providência venha a agravar a situação do réu, por não

2 se consubstanciar, esse caso, em Reformatio in Pejus. Posto isso, por estar expressamente prevista na lei, aplico o art. 33 da lei /06 para corrigir a quantidade de dias multa fixada de 50 (cinquenta) para 500 (quinhentos) dias multa, os quais, com a aplicação do 4º, serão fixados em 417 (quatrocentos e dezessete) dias multa; 5- Recurso conhecido e improvido. (fl. 143). Foram opostos, ainda, embargos de declaração, os quais restaram rejeitados, nos seguintes termos: PENAL E PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO NO ACÓRDÃO. INOCORRÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Evidenciado que as razões dos embargos, não se ocupam em demonstrar quaisquer das irregularidades apontadas, e, sim, limitam-se a atacar os fundamentos do julgado com o intuito de lograr a reforma do decisum, impõe-se o não provimento do recurso. 2. Recurso de que se conhece e a que se nega provimento. (fl. 170). Sustenta a recorrente, às fls. 181/189, ter sido contrariado o artigo 617 do Código de Processo Penal, ao argumento de ter o Tribunal de origem procedido a verdadeira reformatio in pejus, haja vista, em recurso exclusivo da defesa, ter corrigido suposto erro material na aplicação da pena de multa, majorando esta de 50 para 500, reduzindo-a, ao final, para 417 dias-multa, em razão da aplicação da minorante prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei /06. As contrarrazões foram apresentadas às fls. 195/197. O Tribunal de origem admitiu o recurso às fls. 200/201. O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 208/211, pelo conhecimento e provimento do recurso especial. É o relatório. A insurgência merece prosperar. Com efeito, nos termos do que assentando pela recorrente, "o princípio do ne reformatio in pejus parte de uma lógica bastante simples: a ação do recorrente (ato de recorrer) não pode ser mais prejudicial que sua inércia". Dessarte, tem-se que não poderia o Tribunal de origem, ao argumento de estar corrigindo mero erro material, não impugnado pela acusação, majorar em quase 10 vezes a pena de multa aplicada na sentença condenatória, em sede de recurso exclusivo da defesa. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado da Sexta Turma, de minha relatoria, noticiado no informativo nº 431 deste Superior Tribunal de Justiça: RECURSO EXCLUSIVO. DEFESA. MAJORAÇÃO. PENA. Trata-se de habeas corpus que se cingiu à verificação do acerto do acórdão recorrido que promoveu, em recurso exclusivo da defesa, correção de erro material, de cálculo, incrementando significativamente as penas dos pacientes. A Turma reconheceu procedente o reclamo da impetração, visto que o tribunal a quo corrigiu o erro de cálculo em que teria incorrido o magistrado de primeiro grau e, assim, em recurso exclusivo da defesa, majorou de modo significativo a sanção criminal imposta aos pacientes. Manifesta, pois, a reformatio in

3 pejus, visto que, por mais que erro houvesse, não seria por meio de recurso defensivo que o tribunal de origem poderia modificar a sentença, acarretando gravame tão intenso em desfavor dos pacientes. Com esse entendimento, concedeu-se a ordem. Precedentes citados: HC RS, DJe 16/3/2009; HC RJ, DJe 9/3/2009; HC SP, DJe 1/9/2008, e HC DF, DJ 9/4/2007. HC SE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 20/4/2010. Confiram-se, ainda, dentre muitos, os seguintes precedentes da Quinta e da Sexta Turmas deste Superior Tribunal de Justiça sobre o tema: HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO DE DOCUMENTO FALSO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO INTERPOSTA PELA DEFESA. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL EM PREJUÍZO DO RÉU. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS. PRECEDENTES. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. OCORRÊNCIA. 1. A recente jurisprudência dos Tribunais Superiores firmou entendimento no sentido de que a correção, de ofício, de erro material na sentença condenatória, em prejuízo do condenado, quando feito em recurso exclusivo da Defesa, constitui inadmissível reformatio in pejus, conforme ocorre na espécie. 2. (...). (HC /RS, de minha relatoria, SEXTA TURMA, julgado em 22/08/2011, DJe 08/09/2011). AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL PENAL. LATROCÍNIO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO INTERPOSTA PELA DEFESA. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REDUÇÃO NÃO IMPLEMENTADA. REVISÃO CRIMINAL. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS. 1. Em sede de revisão criminal, não é possível obter a alteração do julgado em prejuízo do Réu, a despeito de se tratar de evidente erro material. 2. A recente jurisprudência dos Tribunais Superiores firmou o entendimento no sentido de que a correção, de ofício, de erro material na sentença condenatória, em prejuízo do condenado, quando feito em recurso exclusivo da Defesa, constitui inadmissível reformatio in pejus, o que ocorreria na presente hipótese. 3. Recurso desprovido. (AgRg no REsp /PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 07/02/2011). HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ARTIGO 14 DA LEI DA LEI /2003). PACIENTE CONDENADO À PENA DE 02 (DOIS) ANOS DE RECLUSÃO, CONFORME O DISPOSITIVO DA SENTENÇA. MENÇÃO À PENA DE 2 (DOIS) ANOS E 6 (SEIS) MESES NA FUNDAMENTAÇÃO DO ÉDITO REPRESSIVO. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. ACÓRDÃO QUE CONSIDERA A PENA

4 MAIS GRAVOSA, CONSTANTE NA MOTIVAÇÃO DA DOSIMETRIA. ALEGAÇÃO DE REFORMATIO IN PEJUS. EXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. O Tribunal não pode, em recurso exclusivo da defesa, corrigir erro material na parte dispositiva da sentença quanto à fixação da pena, sob pena de ofensa ao princípio que proíbe a reformatio in pejus. 2. No caso dos autos, diante da evidente contradição entre a fundamentação e a parte dispositiva da sentença condenatória, a Corte impetrada considerou a quantidade de pena exposta na fundamentação do édito repressivo (dois anos e sei meses de reclusão), ignorando o quantum constante da sua parte dispositiva (dois anos de reclusão). 3. Não obstante a sentença condenatória contivesse evidente erro material, dele não se aperceberam nem o órgão ministerial, nem o próprio magistrado sentenciante, tanto que decisum transitou em julgado para a acusação, motivo pelo qual não se admite que a instância superior o corrija, de modo a prejudicar o réu quando do julgamento de recurso exclusivamente por ele interposto. (...). (HC /SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 20/09/2010). PENAL. HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. CORRUPÇÃO ATIVA. APELAÇÃO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA PELO TRIBUNAL EM RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. OCORRÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS. INQUÉRITOS E AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO. MAUS ANTECEDENTES. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL VALORADA NEGATIVAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL RECONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O Tribunal estadual não pode, em recurso exclusivo da defesa, corrigir erro material na parte dispositiva da sentença quanto à fixação da pena majorando-a. Ofensa ao princípio de ne reformatio in pejus. 2. A jurisprudência deste Tribunal orienta-se no sentido de que a existência de inquéritos e ações penais em andamento não pode se constituir no fundamento da valoração negativa dos antecedentes, da conduta social ou da personalidade do agente, em respeito ao princípio constitucional da presunção de não-culpabilidade. 3. Ordem concedida para, afastando-se a valoração negativa dos maus antecedentes e reconhecendo a reformatio in pejus, fixar a pena-base dos 2 delitos no mínimo legal (2 anos cada), tornando-se definitiva em 4 anos de reclusão, no regime aberto. Em consequência, determino ao juízo singular que proceda à análise dos demais requisitos legais exigidos pelo art. 44 do CP para a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. (HC /RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 05/02/2009, DJe 09/03/2009). No mesmo sentido, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

5 PROCESSO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. CONTRADIÇÃO ENTRE DISPOSITIVO QUE FIXA A PENA E A RESPECTIVA FUNDAMENTAÇÃO. RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO EXCLUSIVAMENTE PELO RÉU. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Se a sentença condenatória transitou em julgado para o órgão de acusação, que dela não interpôs recurso, não pode o Tribunal competente, ao conhecer da apelação interposta pelo réu, aumentar a pena declarada no dispositivo da sentença sob pretexto de corrigir erro material. O art. 617 do Código de Processo Penal repudia situações em que a reforma da sentença condenatória se opera em detrimento do réu-apelante, quando apenas este se insurgiu contra o julgado. Ordem de habeas corpus deferida. (HC /SP, 2.ª Turma, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJ de 02/02/2007.) Habeas Corpus. 2. Crime Hediondo. 3. Possibilidade de Progressão de Regime (cf. HC no SP, Pleno, maioria, Rel. Min. Marco Aurélio, julg. em ) 4. Existência de erro material na fixação do quantum da pena que implica reformatio in pejus. 5. Ordem deferida. (HC 87693/SE, 2.ª Turma, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJ de 01/09/2006.) Assim, mostra-se evidente a ofensa ao princípio de ne reformatio in pejus, na medida em que a Corte estadual, ao corrigir erro material, majorou a pena de multa aplicada à recorrente, agravando, dessa forma, sua situação, sem que houvesse recurso do Ministério Público, o que é expressamente vedado pelo artigo 617 do Código de Processo Penal, o qual restou, portanto, violado. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para restabelecer a pena de multa aplicada na sentença de 1º grau. Publique-se. Intime-se. Brasília, 15 de fevereiro de MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA Relatora