Ministério Público Federal Procuradoria da República em Pernambuco

Transcrição

1 Procedimento Administrativo n. º / DESPACHO Cuida-se de procedimento administrativo instaurado nesta Procuradoria da República com o intuito de apurar notícia de indícios de irregularidades, no âmbito da Petrobras, consistentes na efetivação de contratos com possível sobrepreço, decorrente de preços excessivos frente ao mercado, referentes à obra de construção da Refinaria Abreu e Lima, em Recife (PE). De início, expediu-se ofício ao Tribunal de Contas da União TCU, a quem foram solicitadas informações específicas acerca da origem dos recursos com os quais possivelmente teriam sido praticadas as irregularidades detectadas e descritas no Acórdão nº 3362/2010-TCU-Plenário. 1 Em resposta, o TCU afirmou que os recursos são oriundos do grupo Petrobras, e que, para a execução dessas obras, não houve celebração de convênios ou contratos de repasses com a União. Conclui-se, desse modo, que o exame dos fatos e a eventual adoção das medidas pertinentes adentra a seara de atribuições do Ministério Público do Estado de Pernambuco MPPE, já que a Petrobras constitui-se em sociedade de economia mista, entidade que não integra o rol de sujeitos contido no art. 109, I, da Constituição Federal de 1988: 1 Fls. 50 e 56.

2 Art Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; A competência da Justiça Federal prevista no art. 109, inc. I da CF/88 está delimitada de acordo com um critério subjetivo, que leva em consideração a identidade dos presentes na relação processual, e não a natureza da lide. Figurando, naquela, um dos citados no referido inciso a saber, a União, empresa pública federal ou entidade autárquica -, a competência será impreterivelmente da Justiça Federal. Contudo, conforme se verifica, na situação material levada a conhecimento deste órgão ministerial, é uma sociedade de economia mista que ocupa posição de parte interessada, a Petrobras. E a esta não se estende a competência da Justiça Federal, como se depreende da leitura do art. 109, I da CF/88. nos autos da ACO nº 1038/RJ: Absolutamente pertinente ao caso, a seguinte decisão proferida Vistos. Trata-se de expediente que tem por objeto apurar eventuais danos à Petróleo Brasileiro S/A PETROBRÁS, supostamente cometidos por administradores daquela empresa, no que se refere ao pagamento da pesquisa de opinião denominada Brasil/IBOPE levada a efeito em De início, o feito teve trâmite perante o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, que declinou de suas atribuições ao argumento do caso envolver sociedade de economia mista, o que, em seu entender, à luz do previsto no art. 109 da Constituição, não permite o aforamento de demandas perante a Justiça Federal. Assim sendo, os autos foram remetidos ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro que, pelos motivos descritos às fls , suscitou conflito de atribuições, com a remessa do feito ao Supremo Tribunal Federal. Ouvida a Procuradoria Geral da

3 República, esta pugna pelo reconhecimento da competência do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (fls ). Primeiramente, anoto que desde o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, da Pet /BA, Rel. Min. Marco Aurélio, firmou-se a competência deste Tribunal para conhecer e julgar os conflitos de atribuições entre órgãos do Ministério Público, ante a ausência de dispositivo constitucional expresso, mas com a efetiva possibilidade de conflito federativo (art. 102, I, f, da Constituição). Tenho que não assiste razão ao suscitante. Conforme é sabido, a PETROBRÁS se constitui numa sociedade de economia mista, sendo a União Federal detentora do respectivo controle acionário. Assim, em princípio, salvo casos excepcionais (v.g. litisconsórcio, assistência ou oposição) as demandas judiciais que envolvam fatos relacionados a esta empresa devem ser aforadas perante a Justiça Estadual, em vista da aplicação do art. 109 da Constituição de Nesta linha, caminha ampla e pacífica jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, com destaque para a Súmula 517. Portanto, as investigações relativas a este caso, que eventualmente podem ou não resultar no aforamento de ações indenizatórias, de improbidade, ou outras que tais, devem ser lavadas a cabo pelo Ministério Público Estadual, órgão legítimo e apropriado para os litígios perante a Justiça Comum. Entendo que ao caso não se aplicam os preceitos legais levantados pelo órgão suscitante, pelos motivos que passo a explicar. Ainda que o art. 6º, XVII, b, da Lei Complementar 75/93 estatua ser da competência do Ministério Público da União propor as ações cabíveis para a declaração de nulidade de atos ou contratos geradores do endividamento externo da União, de suas autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público Federal, ou com repercussão direta ou indireta em suas finanças, não entendo que a PETROBRÁS se enquadre em quaisquer destas hipóteses. Com efeito, tratando-se de pessoa jurídica de direito privado (CF, art. 173, 1º, II), sequer me parece viável enquadrar a hipótese dentro das demais entidades controladas pelo Poder Público Federal, na medida em que a empresa, no caso a PETROBRÁS, não se equipara à

4 entidade, expressão inserida pelo legislador para albergar situações fático-jurídicas regidas pelo Direito Público, mas diversas das autarquias e fundações, como, por exemplo, os consórcios públicos, objeto da Lei /2005. De forma assemelhada, tenho que o art. 37, II, também da Lei Complementar 75/93, aqui não se aplica. É que, embora o referido preceito outorgue ao Ministério Público Federal o exercício de funções nas causas de competência de quaisquer juízes e tribunais, para defesa de direitos e interesses dos índios e das populações indígenas, do meio ambiente, de bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, integrantes do patrimônio nacional, nenhuma destas hipóteses se encaixa com o objeto primordial das investigações noticiadas. Pelo mesmo motivo, a previsão do art. 39, II da LC 75/93 não socorre o suscitante, na medida em que a sociedade de economia mista não compõe a administração indireta, face à sua natureza predominantemente privada. O fato do Tribunal de Contas da União participar do controle externo das sociedades instituídas pelo Poder Público Federal em nada modifica o raciocínio que aqui se desenvolve, uma vez que a este órgão não detém poderes jurisdicionais, exclusivos que são do Poder Judiciário, ressaltando-se, mais uma vez, que cabe à Justiça Comum as ações que envolvam sociedades de economia mista federais. Portanto, a circunstância de a União Federal ser detentora da maioria do capital da PETROBRÁS não implica sejam as diligências investigatórias a respeito de seus atos e contratos ultimadas pelo parquet federal. Evidentemente, caso a União venha a compor um dos pólos de uma eventual e futura demanda judicial, a remessa dos autos à Justiça Federal implicará na assunção do feito pelo Ministério Público Federal, mas isto ainda é incerto. Portanto, considerando a fundamentação acima, conheço do presente conflito e declaro que a atribuição para o prosseguimento das investigações, inclusive com eventual propositura de ações judiciais, cabe ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, para onde estes autos devem ser remetidos. Publique-se e intime-se. Brasília, 23 de junho de Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Relator.

5 Diante do exposto, e com base no art. 15, 1º, da Lei Complementar n. 75, de 1993, determino sejam os autos remetidos, no estado em que se encontram, ao Ministério Público do Estado de Pernambuco, para que adote as providências que entender apropriadas. Antes, porém, comunique-se a presente decisão à 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, nos termos da Resolução CSMPF nº 87/2006. Recife (PE), 15 de agosto de ANASTÁCIO NÓBREGA TAHIM JÚNIOR Procurador da República