PONTO 1: Questões e Processos Incidentais PONTO 2: Incidente de insanidade mental. 1. Questões e Processos Incidentais:

Transcrição

1 1 DIREITO PROCESSUAL PENAL PONTO 1: Questões e Processos Incidentais PONTO 2: Incidente de insanidade mental 1. Questões e Processos Incidentais: 1) Questões prejudiciais, preliminares e incidentais. Questões preliminares dizem respeito a natureza estritamente processual, refletem tão somente na regularidade formal do processo. Em síntese, o acolhimento ou não de uma preliminar não afeta a natureza absolutória ou condenatória da sentença, mas reserva, importa, na regularidade dos atos praticados. Exemplo: parte da jurisprudência entende que o Juiz não pode fazer perguntas diretas as testemunhas, principalmente as de acusação, já que vigora o sistema do cross examination. Assim, se o Juiz iniciar as perguntas, tal qual se fazia no sistema presidencialista poderá haver nulidade absoluta. Trata-se, inequivocadamente, de uma questão preliminar e que, caso acolhida, conduziria ao reconhecimento de vício processual, impedindo a análise do mérito, pois em claro afronta ao art , CPP. Questões prejudiciais são aquelas que reconhecidas pelo juiz afetarão diretamente o mérito da causa. Isso significa que caso acolhidas pelo Juiz, conduzirão inegavelmente a atipicidade do fato principal, ou seja, devendo ser absolvido o réu. Exemplos: - em crime de receptação, previsto no art , CP, deverá o Juiz obrigatoriamente enfrentar a questão relativa a procedência ilícita do bem, que é uma questão prejudicial a este crime. - Acusado o réu por falso testemunho, defende-se alegando que é verdadeira a declaração feita no outro processo. Essa alegação é prejudicial penal a ser resolvida por ocasião da sentença, e 1 Art As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. 2 Receptação Art Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

2 2 conforme seja a respectiva deliberação, conduzirá o magistrado a conclusão pela atipicidade ou não da conduta praticada. - Imagine-se a prática de um crime contra a honra de calúnia ou difamação contra funcionário público no exercício das funções. Utilizado o procedimento especial dos crimes contra a honra previstos nos artigos e do CPP, cabível a exceção da verdade ou a notoriedade do fato, preferencialmente no prazo da resposta a acusação com esta prejudicial, visa o querelado a provar que aquilo que ele disse sobre o querelado é verdade. Por essa razão, deverá ser julgada antes da análise do mérito da ação principal, pois caso acolhida conduzirá a absolvição pelo fato principal. Obs: cuidar quando o excepto tiver foro privilegiado pela prerrogativa de função, pois, neste caso, somente no caso de calúnia, com base no art do CPP, caberá ao Tribunal competente o julgamento da exceção. Conclusão: o que há em comum entre as questões preliminares e prejudiciais é o momento em que devem ser julgadas: imediatamente após o relatório da sentença sempre antes do mérito. São aquelas que devem tramitar em autos apartados, mas que guardam relação com o processo principal, tendo, em princípio natureza cautelar elas subsistem por si mesmas, tanto que elas são autuadas em apartado. 2) Classificação, espécies e localização das questões prejudiciais. Existem questões prejudiciais chamadas homogêneas e heterogêneas, também conhecidas como penais e, respectivamente, extrapenais. As primeiras são dirimidas pelo 3 Art No processo por crime de calúnia ou injúria, para o qual não haja outra forma estabelecida em lei especial, observar-se-á o disposto nos Capítulos I e III, Titulo I, deste Livro, com as modificações constantes dos artigos seguintes. 4 Art Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de dois dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal. 5 Art. 85. Nos processos por crime contra a honra, em que forem querelantes as pessoas que a Constituição sujeita à jurisdição do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Apelação, àquele ou a estes caberá o julgamento, quando oposta e admitida a exceção da verdade.

3 3 próprio juízo penal, ficando vinculadas na própria esfera penal, tendo delas cuidado o CPP. Exemplos: incidente de insanidade mental, exceção da verdade, etc. As questões prejudiciais extrapenais são aquelas tratadas e julgadas fora da esfera criminal, cabendo, por exemplo, a um juízo civil, a sua apreciação. Não foram disciplinadas pelo CPP. - Questões prejudiciais extrapenais - Arts 92 e 93, CPP: - Art. 92, CPP: Art. 92. Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente. Quando a decisão sobre a existência do crime disser respeito a matéria que envolva o estado civil das pessoas, que o Juiz repute séria e fundada, mesmo que não haja ação civil ajuizada, suspenderá o seu processo até que a questão seja dirimida por sentença transitada em julgado. Percebe-se que aquilo que se discute no art. 92 do CPP é muito mais relevante do que aquilo que se discute no art. 93 do CPP. Isso ocorre porque: 1º) no artigo 92 do CPP não é necessário que haja ingresso de uma ação civil para que se suspenda o processo; 2º) trata-se de uma questão prejudicial heterogênea obrigatória, devendo o Juiz criminal suspender o seu processo, bem como a prescrição até que transite em julgado a questão extrapenal. Obs: se a discussão na esfera civil disser respeito a uma circunstância do crime não haverá suspensão do prazo prescricional. Isso porque o artigo 116, I 6, CP, é claro em prever como causa suspensiva questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime. Uma circunstância somente torna o crime mais ou menos reprovável. 6 Art Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I - enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime.

4 4 Obs2: não pode a lei civil limitar a prova, pois, do contrário, inócua a aplicação do art. 92 do CPP. Assim, não haverá suspensão para que se discuta, por exemplo, se alguém é casado, pois esta prova se faz com uma mera certidão. Ex: A está sendo processado por bigamia (art , CP), enquanto se discute na esfera civil sobre a validade do primeiro casamento. É uma questão heterogênea e obrigatória. Obs: cabe tentativa no crime de bigamia? Duas posições, a majoritária diz que cabe. Ex2: Art , 2ª parte, CP crime contra estado de filiação. É o caso em que se discute, ou se ingressa com ação de investigação de paternidade envolvendo as partes. Se o réu for declarado pai da criança, não terá havido o crime em comento. - Art. 93, CPP: Art. 93. Se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da prevista no artigo anterior, da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente. Se a controvérsia sobre a existência do crime depender de questão diversa do estado civil das pessoas, também da competência do juízo civil, e se já houver sido proposta a ação, poderá o Juiz suspender o processo fixando prazo razoável. Após esse prazo, com ou sem a solução determinará o prosseguimento do feito. Observações: O art. 93 do CPP não tem o mesmo alcance do art. 92, a saber: - a suspensão não se dá até que transite em julgado a decisão no cível; - trata-se de questão prejudicial heterogênea, facultativa; - já deverá ter sido ajuizada ação no cível, algo que não se exige no art. 92 do CPP. 7 Bigamia Art Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena - reclusão, de dois a seis anos. 8 Supressão ou alteração de direito inerente ao estado civil de recém-nascido Art Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil: Pena - reclusão, de dois a seis anos.

5 5 Ex: réu está sendo processado por crime de apropriação indébita (art , do CP), sendo que já há discussão, na esfera cível, sobre quem é o dono da coisa. Essa discussão é importante, mas não tão importante como o estado civil das pessoas. aplicado. No caso desse artigo, se não houver uma ação já iniciada na esfera cível, não poderá ser Da mesma forma como ocorre no art. 92 do CPP, a prescrição ficará suspensa, com base no art. 116, I, CP. - Recurso cabível: CPP. Da decisão que denega a suspensão cabe recurso em sentido estrito art. 93, 2º 10, do Caso o réu postule a suspensão e o Juiz desacolha o pedido, duas soluções são possíveis: - impetra um HC visando a obter a suspensão se o crime for apenado com pena privativa de liberdade Súmula do STF. ou - Aguarda até a sentença, se a sentença for condenatória, em preliminar de apelação ele alega cerceamento de defesa. Ou seja, levanta a nulidade. A favor da acusação, caso deferida a suspensão de modo indevido, caberá recurso em sentido estrito art. 581, XVI 12, CPP. 9 Apropriação indébita Art Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 10 Art. 93, 2º. Do despacho que denegar a suspensão não caberá recurso. 11 Súmula 693 do STF: Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada. 12 Art Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: XVI - que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial.

6 6 Obs: o réu deverá comprovar, de imediato a ilegalidade da decisão que não permitiu a suspensão do processo, já que o HC é ação materialmente sumária, bem como o mandado de segurança. O MP, por seu turno, terá a disposição o recurso em sentido estrito da decisão que concede a suspensão, de cognição plenária. - Legitimidade para postular e decretar a suspensão art do CPP: processo. As partes poderão requerer. E o Juiz poderá decretar de oficio a suspensão do Jamais suspender-se-á o curso do inquérito policial. 2. Incidente de insanidade mental arts. 149 a 154, CPP: O incidente de insanidade mental tem a finalidade de apurar a capacidade do réu, a sua higidez mental tanto a época da pratica do fato, bem como no momento atual. Objetiva verificar se o individuo consegue compreender o caráter ilícito de seu comportamento e de seu autodeterminar de acordo com esse entendimento. O incidente de insanidade mental objetiva dirimir dúvida sobre essa capacidade do individuo, e é sempre determinado por ordem do Juiz. Não pode o delegado, de oficio, submeter o individuo a perícia. O incidente de insanidade mental é possível tanto na fase do inquérito policial, como na fase do processo, mas sempre dependerá de ordem do Juiz, de oficio ou provocado. A submissão de alguém a um exame dessa natureza é sempre um constrangimento a pessoa, por isso somente pode ser deferido pelo Juiz. - Legitimados para requerer a medida: Juiz de oficio, ou a requerimento do MP, cônjuge, ascendente, descendente ou irmão estes poderão fazê-lo tanto na fase do IP como do processo. O Juiz poderá determinar a 13 Art. 94. A suspensão do curso da ação penal, nos casos dos artigos anteriores, será decretada pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes.

7 7 instauração mediante representação do delegado de polícia, porém, somente terá legitimidade na fase do IP. Obs: o art do CPP traz uma outra figura legitimada, qual seja, o curador do réu, figura prevista no revogado artigo 194 do CPP (réu menor de 21 anos). Doutrinariamente falando, se defende que o curador do cível também possa requerer a instauração do incidente de insanidade mental. Obs: com relação a interdição do cível, esta não possui qualquer relação com a incapacidade penal; uma independe da outra. O individuo pode estar interditado civilmente, mas ser plenamente capaz para o direito penal, e vice-versa. A prova de um jamais servirá para o outro, pois são analises absolutamente diversas. Pode ocorrer que num mesmo processo criminal, o individuo esteja sendo acusado pela prática de vários crimes. Nesse caso, por certo, haverá apenas um incidente de insanidade mental. Esse incidente, no entanto, deverá demonstrar as condições do indivíduo de como ele estava ao tempo de cada um dos fatos, mesmo que tenham sido praticados no mesmo dia ou em situação de continuidade delitiva, bem como o réu se encontra no momento atual. Se houver vários processos, cada qual apurando um crime em separado, envolvendo o mesmo réu, deverá haver um incidente de insanidade mental para cada um deles. Na verdade, o incidente de insanidade mental é autuado em apartado, o que impede haja um incidente para dois processos. A lei não prevê recurso da decisão que defere ou indefere a instauração do incidente de insanidade mental. Se o Juiz indeferir a instauração a pedido do MP ou da defesa, o que cabe para atacá-la é o HC, desde que o crime, objeto da instauração seja punido com reclusão, conforme Súmula do STF. Caso deferida a medida de modo indevido, leia-se protelatória, caberá por parte do MP correição parcial. 14 Art Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal. 15 Súmula 693 do STF: Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.

8 8 Assim que for determinada a instauração do incidente, neste mesmo ato, o Juiz deverá adotar determinadas providências. A primeira delas é fazer com que o incidente seja autuado em apartado ao processo principal o apensamento aos autos principais apenas ocorrerá após a conclusão do laudo, conforme art do CPP. A segunda providencia: é determinada, quando instaurado na fase judicial, a suspensão do processo, que vai durar, enquanto o incidente estiver tramitando. Com a conclusão do IP, já que ele não é suspenso, a suspensão terá inicio a partir da data do recebimento da denúncia ou da queixa (existe posição minoritária que entende que a suspensão dar-se-á a partir da data da citação do réu - art do CPP). A outra providência ser adotada pelo Juiz é a nomeação de curador ao réu que não passa da pessoa do seu advogado. O Juiz deverá notificar as partes para que, querendo, apresentam quesitos e assistente técnico à perícia. Obs: o assistente técnico acaba sendo importante para eventual atenuação da medida a ser imposta, flexibilizando-se a psicopatia do réu para que se busque a aplicação, por exemplo, de uma medida de tratamento ambulatorial, mesmo com crime punido com reclusão. O processo ficará paralisado, salvo necessidade de produção de provas urgentes. O Juiz também deverá se preocupar com a situação do individuo, uma vez que instaurado o incidente. Se estiver preso, esta prisão deverá ser transformada em internação, ou então, deverá ele colocado em cela separada dos demais. Obs: não existe medida de segurança provisória, tanto que a natureza jurídica da sentença que impõe esta medida é de natureza constitutiva. 16 Art O incidente da insanidade mental processar-se-á em auto apartado, que só depois da apresentação do laudo, será apenso ao processo principal. 17 Art O processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado

9 9 A sentença absolutória imprópria, para a doutrina possui essa natureza. Para Boschi, no entanto, ela é constitutiva, pois cria um estado jurídico novo, qual seja, o da inimputabilidade ninguém pode ser considerado louco antes do transito em julgado dessa sentença. Assim, esta internação de que se falou não deve ser confundida como uma internação provisória, não admitida. É, na verdade, uma forma de proteção ao réu com problemas mentais. Até porque ninguém poderá ser considerado inimputável antes do trânsito em julgado desta sentença. O réu, no entanto, poderá não estar preso. Nesse caso, mesmo assim, poderá vir a ser preso, sob os seguintes fundamentos: 1º) houver requerimento dos peritos, a fim de examiná-lo com maior precisão; 2º) se houver o preenchimento dos pressupostos da prisão preventiva; 3º) se ele intimado não comparecer nas perícias do IPF.