SERPRO Desabafo de um trabalhador do Paraná sobre a campanha salarial

Transcrição

1 SERPRO Desabafo de um trabalhador do Paraná sobre a campanha salarial Reproduzimos, na íntegra, uma nota escrita por um colega da Regional Curitiba do Serpro sobre a campanha salarial. Em seu desabafo, o trabalhador relata com clareza os fatos que levaram à greve e a postura da empresa e da Fenadados. Nota de Roberto Carlos Hecke, da Regional Curitiba Isto é um desabafo Desde o início da campanha salarial percebi a forma desrespeitosa com que a empresa passou a nos tratar, desde a flagrante intimidação contra o exercício do direito de greve, quando descontou as paralizações dos protestos de 2 horas. Depois vimos a cada mesa de negociação este desrespeito e descaso aumentarem, a ponto de serem copiadas as mesmas propostas feitas à Dataprev, sendo que esta possui um contexto bem diferente, com PLR bem maior que nossos pouco mais de R$ 4,00 que nem foram pagos, auxílio educação próximo de R$ 600,00 por filho até o ensino médio. Recebemos uma proposta inicial de pouco mais de 4% de reajuste calculados por uma média aparada esperamos dias por uma nova proposta, nos indignamos com o extremo descaso da diretoria da empresa que cabalmente nos apresentava propostas já conhecidas, feitas para a Dataprev, e desdenhosamente repetidas para nós depois de dias de espera. Vimos uma greve deflagrada perante o descaso e inflexibilidade desta diretoria da empresa, que teve seu ponto máximo naquela videoconferência do diretor presidente, no mesmo dia e até horário de assembléias que deliberariam pelo exercício de greve, novamente flagrante intimidação a este exercício de direito. Durante os 28 dias de greve dos quais participei, só vi as demonstrações de descaso e arrogância desta diretoria

2 aumentarem, quando ocorreram novas videoconferências e foram enviados comunicados por , novamente intimidando-nos através das gerências e chefias, num flagrante assédio moral, dizendo que não receberíamos isto ou aquilo. Arrogância quando a empresa entrou no TST com dissídio de greve sendo que nosso movimento sempre foi pacífico e em conformidade com as exigências legais, o que o próprio juiz do TST reconheceu ser descabido, pois solicitaram lista de contingência apenas depois de 21 dias de greve, sendo que a própria empresa nos dizia que a greve estava com baixa adesão. Posturas incompatíveis com a verdade e com a dignidade. E por falar nisto, em meio à morosidade de atuação da nossa representatividade nacional, a Fenadados, que parecia adotar o discurso da empresa deixando que a greve viesse a perder força, buscamos a única saída cabível diante do impasse e da irredutibilidade da empresa, que alegava não ter autonomia para nos conceder o que pedimos, e assim iniciamos um movimento pela instauração de dissídio econômico. Depois de expulsos do comando nacional na Fenadados, e muitas manifestações a favor, finalmente a Fenadados resolveu instaurar o dissídio econômico. Vimos claramente a intransigência da diretoria da empresa, que solicitou novas mesas de negociação para nos apresentar as mesmas propostas com os mesmos pontos que rejeitamos seguidamente, sendo o maior a imposição de acordo com vigência de 2 anos, significativamente com interesses que visam a campanha eleitoral deste ano, mas que nenhum ganho real nos ofereceram para 2009, e ínfimos 1% prometidos para 2010, a nós que nem PLR mais recebemos. Ao copiar as propostas da Dataprev para nos apresentar, esta diretoria sequer cogitou em nos oferecer também os mesmos benfícios e PLR de lá. Quando votamos pelo ajuizamento de dissídio, minha vontade era permanecer em greve até que a intransigência da diretoria cedesse. Porém conversei com vários colegas, em meio à greve, e me convenci de que o dissídio era a melhor alternativa para

3 nós que já estávamos há tantos dias em greve, quando alguns estados nem fizeram greve, outros como Minas Gerais já tinham retornado. Não tínhamos qualquer esperança de que a empresa nos tratasse com dignidade em algum momento posterior, depois de meses vendo mostras de intransigência por parte da diretoria. Ajuizado o dissídio, vimos uma certa passividade da Fenadados em denunciar perante o juiz do TST tantos desmandos e pressão que sofremos antes, durante e depois de encerrada a greve, fatos estes que nós que fizemos greve julgamos muito relevantes para mostrar ao juiz qual foi o posicionamento da empresa durante todo o tempo. Encerrada a greve, agora enfrentamos a imposição de desconto dos dias parados, claramente punindo quem exerceu seu direito à greve. Mesmo deixando a cargo do TST julgar quanto aos dias de greve, corremos ainda o risco de desconto destes dias, sendo que fizemos greve por causa da própria intransigência da diretoria da empresa, esperamos em greve por vários dias para que fosse apresentada a mesma proposta já feita também à Dataprev e conhecida há dias. E querem nos descontar estes dias ainda. Agora quero falar um pouco sobre integridade e determinação. Vejo muitos colegas que fizeram greve agora aceitarem a mesma proposta amplamente rejeitada em múltiplas assembléias. E assim também aceitarem desconto dos dias de greve, já que isto a empresa não negocia, impõe. Muitos colegas que não fizeram greve porém se beneficiam dos avanços, ainda que pequenos, obtidos graças à paralisação do trabalho, também agora impõem sua vontade de aceitar a proposta da empresa, sem considerarem a ameaça do desconto dos dias de greve dos colegas que aderiram ao movimento. Mas o que mais me chama a atenção é a questão da falta de determinação. Como diz a letra de uma música antiga em que o autor diz ser uma metamorfose ambulante, parece ser este o mote de muitos que esquecem o porquê de termos feito uma greve

4 histórica. Temos uma federação sindical que fez o mesmo jogo da empresa, talvez por serem do mesmo partido político, o do governo. A empresa já disse que não aceita o dissídio econômico, assim como a Fenadados taxou de traidores aqueles que se anteciparam em buscar o dissídio contra a sua vontade. É isso que vemos, interesses políticos e outros, dos quais parece que fomos usados como fantoches, como se nossos 28 dias de greve nada fossem, porém nós sabemos o afinco e seriedade com que conduzimos este movimento, sabemos a decisão que tomamos pelo ajuizamento do dissídio no TST. Sem valores e sem determinação não chegamos a lugar nenhum. Não podemos mudar nossos valores e a direção que tomamos somente porque as circustâncias mudaram. Não podemos aceitar esta proposta final infame feita pela diretoria da empresa só porque esta não quer mais negociar e está ainda mais irredutível, alegando determinações superiores. Nem mesmo a proposta menor em índice e abono, para o prazo de 1 ano, feita por um dos juízes na audiência de dissídio foi aceita pela empresa, tamanha a instransigência desta. Não podemos aceitar migalhas desta mão que nos golpeia, justamente a nós que somos a alma desta empresa, a mola propulsora por detrás de cada sucesso alcançado ao longo destes 45 anos. Muitos colegas que fizeram esta história agora saem na APA. Outros como eu começam agora para continuar proporcionando para a empresa o renome que alcançou. Queremos tão somente reconhecimento e tratamento digno, com ações concretas e não com hipocrisia. Não sejamos também nós hipócritas ao ponto de considerar como se fosse nada a nossa vontade e esforço de greve, apenas porque a empresa não quer mais conversar, nem fazer acordo no TST. Para a diretoria tudo, acordo de 2 anos, não arcar com os dias de uma greve que ela mesma causou, amordaçar-nos no ano eleitoral, já que nos teme porque nos deve, e para nós nada, nada de PLR, nada de ganho real, nada de querer ter vontade própria, nada de evitar o desconto em pecúnia dos dias

5 parados. Será que vamos também transformar em nada a nossa dignidade, aceitar que merecemos este tratamento por parte da diretoria da empresa aceitando esta proposta final tão rejeitada anteriormente, sucumbindo previamente com o dissídio econômico ajuizado antes mesmo de sabermos qual será a decisão? Eu particularmente não sou uma metamorfose ambulante, tenho meus valores e minha dignidade, disto não abro mão, e não mudo minha opinião só porque as circunstâncias mudaram. Continuo rejeitando esta proposta da empresa. Se é para ter desconto de dias parados, ou pela empresa ou pela decisão do TST, então até abro mão de qualquer ganho que esta proposta possa trazer. Quanto vale nossa dignidade? A minha não tem preço e não é negociável. Roberto Carlos Hecke Regional Curitiba Serpro