2º CONGRESSO BRASILEIRO DE POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO EM SAÚDE UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM PROJETO POSSÍVEL Definindo prioridades em saúde: a escolha do modelo de atenção e a definição das redes prioritárias em Minas Gerais Francisco Antônio Tavares Junior Mariana Cristina Pereira Santos Priscila Fernanda Morais Chaves Antônio Jorge de Souza Marques Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais BELO HORIZONTE 2013
DEFININDO PRIORIDADES EM SAÚDE: A ESCOLHA DO MODELO DE ATENÇÃO E A DEFINIÇÃO DAS REDES PRIORITÁRIAS EM MINAS GERAIS. SETTING PRIORITIES IN HEALTH: THE CHOICE OF THE MODEL FOR NETWORKS AND DEFINITION OF PRIORITY IN MINAS. RESUMO O Estado de Minas Gerais foi pioneiro no país na implantação das redesde atenção, modelo escolhido em função da transição demográfica e epidemiológica e das das caraterísticas geográficas. Este artigo demonstra como a utilização da análise de situação de saúde, através do Estudo de Carga de Doenças vem auxiliando o Estado a eleger as prioridades e definir as redes temática em função das condições de saúde que mais afligem a população, bem como explora as possibilidades decorrentes dos avanços nas normativas recentes do SUS (entre estas o Decreto 7508/2011) que se referem a Gestão. Palavras-chave: redes de atenção; regionalização; gestão do SUS. Introdução O modelo federativo adotado na constituição de 1988 deu início a um forte processo de municipalização no país. Como exemplos deste processo, devemos levar em consideração as seguintes informações: 1) Foram criados no país 1.328 novos municípios no período entre 1988 e 1997.
2) Em Minas Gerais temos, atualmente, 853 municípios, sendo que aproximadamente 79,1% dos municípios possuem até 20.000 habitantes (IBGE, Censo, 2010). A título de comparação, no Brasil, 70,13% dos municípios possuem até 20.000 habitantes. Já nos estados de São Paulo e Bahia, esse quantitativo é de 62,1% e 59,4%, respectivamente. A realidade de Minas Gerais, portanto, difere do país e dos demais estados citados por estar próximo aos 80% de municípios com menos de 20.000 habitantes. É importante ressaltar, também, que apenas 7,7% dos municípios mineiros possuem mais de 50.000 habitantes. O quantitativo de municípios no país e o contingente populacional distribuído de forma heterogênea refletiram-se também no estabelecimento do Sistema Único de Saúde. A NOB 01/91 primeira Norma Operacional do SUS editada após a constituição e a lei orgânica dava instruções para a implantação do SUS, visando estabelecer a operacionalização das leis até então editadas. No seu escopo, foram criadas as formas de remuneração de serviços e de transferências para estados, municípios e até mesmo prestadores de serviços. Pestana e Mendes (2004, p.21) firmaram, neste contexto que apesar de isso significar um recuo em relação ao Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), os municípios apoiaram aquela NOB por perceberem a oportunidade de receber recursos diretamente da União sem a intermediação do Estado. No sentido de aproximar a gestão do Estado de Minas Gerais aos seus 853 municípios e, principalmente às diferenças sociais, econômicas e culturais das regiões, o processo de regionalização se fazia imperativo. Cabe ressaltar que Minas Gerais sempre tem sido um Estado pioneiro, estabelecendo importantes avanços em conceitos e práticas no que tange a este processo.
A atual regionalização do Estado de Minas Gerais, definida através do Plano Diretor de Regionalização (PDR), corrobora o pioneirismo deste Estado com a descentralização. A última alteração do PDR, ocorrida em 2011 e registrada na Deliberação CIB SUS nº 978, de 16 de novembro de 2011, que conforma os 853 municípios em 77 micro e 13 macrorregiões. Com a Deliberação CIB-SUS/MG n 1.219, de 21 de agosto de 2012, houve apenas a mudança na nomenclatura utilizada na regionalização, uma vez que as micro e macrorregiões foram substituídas por, respectivamente, região e região ampliada de saúde. Os primeiros trabalhos de concepção e elaboração do PDR em Minas Gerais ocorreram em 1999, antes mesmo da publicação da NOAS. Por sua vez, o Plano Diretor de Regionalização, aprovado em 2002, pelo Conselho Estadual de Saúde, pela Comissão Intergestores Bipartite de Minas Gerais (CIB-SUS/MG) e pela Comissão Intergestores Trípartite teve como base um modelo para organização dos serviços no qual, idealmente, a cada nível de regionalização deve corresponder um nível de atenção. O PDR 1999/2002 considerava cinco níveis de regionalização: município, módulo, micro, meso e macrorregião. Posteriormente, em todas as revisões a partir de 2003, foram considerados três níveis: município, micro e macrorregião. Assim, busca-se estabelecer relação entre o nível de regionalização e o nível de atenção da seguinte forma: município e atenção primária; microrregião e atenção secundária; e macrorregião e atenção terciária. Esta lógica é válida para a versão atual que compreende as regiões e regiões ampliadas de saúde. Na teoria, dentro de um contexto contexto regionalizado e descentralizado, os gestores de cada território devem se articular solidariamente, buscando responsabilidades comuns pelos níveis relacionados ao território que representam, além das responsabilidades inerentes a atenção primária que são responsabilidade de cada município.
O PDR é um instrumento que visa estabelecer a descentralização/regionalização, a equidade e a resolubilidade, e não uma norma rígida. A resolubilidade, neste sentido, é compreendida como a capacidade de atendimento do residente na própria região no que for definido como esperado ou de responsabilidade do nível de regionalização. O Estado de Minas Gerais implantou as Superintendências e Gerências Regionais de Saúde (atualmente 28) antes do PDR, buscando organizar os territórios político-administrativos do SUS/MG. A conformação destes territórios mantém semelhança, na medida do possível, com as regiões e regiões ampliadas de saúde. Os territórios assistenciais, definidos pelo PDR 1, foram construídos à partir da observação aos fluxos assistenciais existentes e de princípios como economia de escala 2, economia de escopo 3, qualidade da atenção à saúde e acesso aos serviços. Um exemplo prático para entender as economias de escala e escopo são os hospitais. Em Minas Gerais, um estudo feito por meio da análise envoltória de dados (DEA), mostrou que os hospitais de menos de 25 leitos apresentam uma eficiência total de apenas 0,32 e os de mais de 250 leitos uma eficiência total de 0,60. Ainda que todos os segmentos analisados operem com uma eficiência total baixa, os hospitais de pequeno porte são altamente ineficientes (ANDRADE et al., 2007). O que explica a ineficiência total é, sobretudo, a baixíssima eficiência de escala dos hospitais contratados pelo SUS. 1 Para mais informações históricas e técnicas sobre a formulação do PDR de Minas Gerais, recomendamos a leitura do Livro Plano Diretor de Regionalização de Saúde de Minas Gerais, publicado pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais em 2010, disponível em: http://www.saude.mg.gov.br/politicas_de_saude/plano- diretor-de-regionalizacao-pdr-novo/livro%20plano%20diretor%20de%20regionalizacao%20- %20ultima%20versao.pdf. 2 As economias de escala referem-se a uma situação em que os custos médios de longo prazo caem com o crescimento do volume de atividades produzidas. As economias de escala devem se dar num processo produtivo em que os custos fixos são altos em relação aos custos de produção variáveis. 3 As economias de escopo ocorrem quando a variedade dos serviços ofertados por uma mesma unidade produtiva aumenta. Por exemplo, ocorre uma economia de escopo quando em um determinado hospital, em função da coexistência de diversas especialidades, evita-se a duplicação de um determinado equipamento ou de um determinado profissional.
A revisão da literatura sobre o assunto confirma que "as economias de escala são encontradas em hospitais de mais de 100 leitos, que o tamanho ótimo dos hospitais pode estar entre 100 a 450 leitos e que as deseconomias de escala vão se tornar importantes em hospitais de mais de 650 leitos" (ALETRAS et al., 1997; ANDRADE et al., 2007). Conforme dito anteriormente, atualmente o Estado de Minas Gerais possui 13 regiões ampliadas com 19 pólos e 77 regiões de saúde com 99 municípios pólos. Dessa forma, para definição das regiões de saúde, de maneira geral, tem-se adotado o critério populacional de 100.000 a 150.000 habitantes, decorrente de um estudo de economias de escala e escopo. Como critérios para a acessibilidade geográfica, utiliza-se o parâmetro geral de uma distância entre 120 a 150 quilômetros como distância máxima de um município em relação ao pólo ou duas horas em vias não pavimentadas. Esta distância é, conforme estudos, suficiente para que se estabeleça um arranjo logístico adequado e que não se coloque em risco a população usuária do sistema de saúde regional. Na definição de uma região ampliada de saúde, considera-se como parâmetro populacional ideal 1.500.000 habitantes, ainda que em função do critério acesso algumas regiões ampliadas do Estado possuam população inferior a este parâmetro. Atualmente, para cada região e região ampliada estabelecidas no Estado, existe uma Comissão Intergestores Regional (CIR) e uma Comissão Intergestores Regional Ampliada (CIRA), respectivamente, composta por representantes da gestão estadual e das gestões municipais do respectivo território. Dentro deste contexto regionalizado, de empoderamento da gestão compartilhada regional, faz-se necessária a gestão em saúde baseada em evidências. Dessa forma, as decisões sobre a gestão em saúde devem estar embasadas em pesquisas científicas, dados municipais, regionais e estaduais, que subsidiem o desenvolvimento e implementação das políticas de saúde.
Outro aspecto importante a ser considerado neste trabalho diz respeito a transição demográfica e epidemiológica pela qual estamos passando no Estado. Atualmente, a situação de saúde da população do Estado de Minas Gerais é marcada pelo predomínio da chamada tripla carga de doenças. Nesta situação, concorrem como causas da mortalidade e da morbidade da população do Estado as chamadas condições crônicas, as condições agudas e as causas externas. Há um grande predomínio das condições crônicas e um aumento das causas externas. Observa-se que existe uma incoerência entre essa situação de saúde de tripla carga de doenças, com predominância relativa das condições crônicas, e um sistema fragmentado de saúde, voltado principalmente para as condições agudas. Assim, implantar Redes de Atenção é mais que uma estratégia: é uma missão da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Neste sentido, este trabalho explora o contexto em que foram feitas estas escolhas e a definição das prioridades. Além disso, procura ressaltar como os aspectos atinentes a gestão considerados e abordados no Decreto 7508/2011 podem representar um significativo avanço no funcionamento das redes. Justificativa Este trabalho justifica-se pela importância de considerar critérios técnicos e evidências científicas na definição de prioridades em saúde, bem como de estabelecer parâmetros que possibilitem alinhar a gestão do SUS de modo a potencializar os recursos escassoz, visando proporcionar maiores benefícios a população.
Historicamente, sabe-se que existem teorias econômicas que estudam as falhas de governo e que entre estas, estão a sobreposição de tarefas entre os entes federados e a falta de escolhas claras que levem em conta padrões de priorização. O Estado de Minas Gerais vem se destacando por adotar um modelo de Gestão por Resultados e, no que tange a saúde, por ser coerente em suas escolhas. Prova disso é que os chamados Programas Estruturadores representam um volume cada vez maior do orçamento investido, tendo saído de 19,44% em 2004 (em valor bruto cerca de R$ 194 milhões) para 38,37% em 2012 (alcançando um patamar de cerca de R$ 1,45 bilhões). Como veremos neste artigo, isso significa fazer escolhas técnicas e que consideram as reais necessidades de saúde da população. Há que se pensar agora nos próximos passos, qual sejam: reforçar a gestão regional, a governança, os processos de planejamento e contratualização, passos estes que podem ser construídos a partir do Decreto 7508/2011. Objetivos O objetivo geral deste trabalho é demonstrar como o Governo de Minas Gerais tem feito escolhas racionais, tendo em vista a identificação da situação demográfica e epidemiológica e priorizando as reais necessidades de saúde da população. Como objetivos específicos, destacamos: 1) Apresentar as especificidades do Estado em relação a sua estrutura geográfica e populacional;
2) Destacar o modelo de redes de atenção, como alternativa para alcançar resultados mais expressivos para a saúde pública; 3) Apresentar a situação epidemiológica vigente no Estado de Minas Gerais, conforme o Estudo de Carga de Doenças; 4) Apontar possíveis avanços na gestão do SUS em função do proposto pelo Decreto 7508/2011. Referencial Teórico As Redes de Atenção são uma nova forma de organização do Sistema de Saúde e visam estabelecer uma organização horizontal do sistema, integrando os diversos pontos e assegurando uma atenção contínua com maior agilidade, melhor utilização dos recursos e melhores resultados de saúde para os cidadãos. Diga-se de passagem, há que se ressaltar que a saúde pública do Estado de Minas Gerais obteve grandes avanços neste sentido, tendo se tornado modelo para o país e para o mundo na concepção do modelo de atenção em Redes. Tanto é assim, que o Governo Federal instituiu a Portaria 4279/2010, que se tornou marco nacional para que todos os Estados trabalhem também no sentido de implantar as Redes de Atenção. Diversos autores, na literatura internacional, vem discutindo ao longo dos anos a importância de se constituir sistemas integrados de prestação de serviços de Saúde. Tais sistemas devem ser implantados tendo como foco as necessidades de saúde da população. Recentemente, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 4.279/2010. Trata-se de um importante marco em nível nacional para a implantação das redes de atenção. Esta Portaria
consolida e referenda discussões que já vinham sendo construídas nos Estados, sendo Minas Gerais um dos Estados pioneiros nesta discussão. Constatou-se que havia uma clara incompatibilidade entre a maneira em que o sistema de saúde no país está organizado e o cenário epidemiológico atual. A própria fragmentação gerada pelo processo de descentralização administrativa, citada anteriormente, contribui para o agravamento desta situação, uma vez que um sistema organizado em redes pressupõe integração e cooperação. De acordo com Mendes (2011, p. 78): O conceito de redes tem sido desenvolvido em vários campos como a sociologia, a psicologia social, a administração e a tecnologia de informação. Mendes, citando Castells (2000), afirma que as redes são novas formas de organização social, do Estado ou da sociedade, intensivas em tecnologia de informação e baseadas na cooperação entre unidades dotadas de autonomia e acrescenta que diferentes conceitos coincidem em elementos comuns das redes: relações relativamente estáveis, autonomia, inexistência de hierarquia, compartilhamento de objetivos comuns, cooperação, confiança, interdependência e intercâmbio constante e duradouro de recursos. Especificamente em relação às redes de atenção à saúde, estas são definidas, conforme a Portaria nº 4.279/2010, como arranjos organizativos de ações e serviços de saúde, de diferentes densidades tecnológicas, que integradas por meio de sistemas de apoio técnico, logístico e de gestão, buscam garantir a integralidade do cuidado. Seu objetivo é promover a integração sistêmica, de ações e serviços de saúde com provisão de atenção contínua, integral, de qualidade, responsável e humanizada, bem como incrementar o desempenho do Sistema, em termos de acesso, equidade, eficácia clínica e sanitária; e eficiência econômica.
Mendes (2011, p.82) define as redes como organizações poliárquicas de conjuntos de serviços de saúde, vinculados entre si por uma missão única, por objetivos comuns e por uma ação cooperativa e interdependente, que permitem ofertar uma atenção contínua e integral a determinada população, coordenada pela atenção primária à saúde prestada no tempo certo, no lugar certo, com o custo certo, com a qualidade certa, de forma humanizada e com equidade e com responsabilidades sanitária e econômica e gerando valor para a população. As Redes de Atenção à saúde têm na atenção primária o seu Centro de Comunicação e devem se estruturar enfrentar uma condição de saúde específica, por meio de um ciclo completo de atendimento. Conforme Mendes (2011): As condições de saúde podem ser definidas como as circunstâncias na saúde das pessoas que se apresentam de forma mais ou menos persistente e que exigem respostas sociais reativas ou proativas, eventuais ou contínuas e fragmentadas ou integradas dos sistemas de atenção à saúde (...) A categoria condição de saúde é fundamental na atenção à saúde porque, conforme assinalam Porter e Teisberg (2007), só se agrega valor para as pessoas nos sistemas de atenção à saúde quando se enfrenta uma condição de saúde por meio de um ciclo completo de atendimento a ela. Método Este é um relato de experiência acerca da construção do planejamento do Estado de Minas Gerais, com a opção por um modelo de atenção, a seleção de prioridades que se refletem na escolha das redes de atenção e a construção da carteira de Programas Estruturadores. Como fonte das informações, para sustentação do relato deste artigo, usou-se os dados contidos no Estudo de Carga de Doenças e nos documentos de planejamento do Estado de Minas Gerais.
Para priorizar as redes a serem implantadas em nosso Estado, tem-se considerado as principais causas de mortalidade e morbidade da população. Hoje, em nosso Estado, as principais causas de anos de vida perdidos pela população são as causas externas e as doenças cardiovasculares, seguidas pelas neoplasias e pelas condições perinatais. Entre as principais neoplasias que afetam as mulheres, destacam-se o Câncer de Mama (6ª causa) e de Cólo (12ª causa). Por sua vez, as Doenças Psiquiátricas são a principal causa de morbidade em nosso Estado. Deste modo, é possível estabelecer uma relação entre os principais problemas identificados e as redes temáticas priorizadas em nosso Estado. Em função do aumento da mortalidade por causas externas e da mortalidade por doenças cardiovasculares, tem-se a opção pela implantação da Rede de Urgência e Emergência. Em decorrência da questão das doenças cardiovasculares, existem a opção pela Rede Hiperdia. Como a questão da saúde infantil e materna prevalece como uma preocupação, significando a necessidade de avançar ainda na questão da Saúde Pública, ocorre a opção pela Rede Viva Vida. O envelhecimento da população justifica a Rede Mais Vida, que busca melhorar a qualidade de vida da população idosa. E, finalmente, os problemas de morbidade causados pelas questões atinentes a Saúde Mental justificam a escolha da Rede de Saúde Mental. É importante ressaltar que com o quarto ( Melhorar os indicadores de morbimortalidade entre a população juvenil ) e o quinto ( Estimular maior cuidado do cidadão com a própria saúde ) objetivo estratégico agregado ao Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado as ações
intersetoriais passam a assumir extrema importância na Carteira da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Deste modo, algumas ações como o Travessia Saúde, o Estratégias Nutricionais de Promoção a Saúde, o Aliança pela Vida e o Avança Minas Olímpica são fundamentais para que se alcance e execute os objetivos estratégicos planejados. Na definição da carteira de Programas Estruturadores do Estado, tem-se considerado o processo de implantação e manutenção das Redes de Atenção. Assim, o Estado tem na área de saúde três grandes prioridades, bastante coerentes com o necessário para fazer funcionar as redes de atenção: Saúde em Casa: programa de fortalecimento da atenção primária que é a porta de entrada da maior parte das redes de atenção e deve ser a coordenadora do cuidado; Redes Integradas: que é responsável pela implantação e funcionamento de cada rede temática (escolhida em função das condições de saúde), sendo as prioridades as definidas acima; Saúde Integrada: que é responsável por implantar os arranjos logísticos e de apoio tão necessários para a conexão dos pontos de atenção e para o funcionamento das redes. O alinhamento da estratégia governamental de longo prazo com as ações de curto prazo da Secretaria permitirá que os passos cotidianos nos levem no rumo esperado, assegurando a Gestão para a Cidadania e o Estado em Redes. Os Programas Estruturadores representam os programas estratégicos de cada Rede de Desenvolvimento, nos quais são alocados prioritariamente os recursos estaduais discricionariamente disponíveis e dos quais se espera os maiores impactos da ação do Estado.
Nesse sentido, compõem o eixo fundamental de atuação do governo, a fim de materializar os objetivos estratégicos fixados no Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado. Os Programas Associados representam os programas dotados de colaboração sinérgica com os programas estruturadores, tendo em vista o alcance dos objetivos estratégicos do PMDI, e, consequentemente, da visão de futuro que o informa. Por sua vez, os Programas Especiais representam os programas que são de suma importância para a administração estadual, na medida em que contemplam as prioridades setoriais que não estejam diretamente vinculadas à estratégia global do governo. Após esta conceituação, fica mais fácil compreender quais são os Programas Estruturadores, Projetos e Processos Estratégicos de responsabilidade da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. A definição dos Programas deve ter relação com os objetivos estratégicos estabelecidos e com os problemas identificados, assim como a concepção das ações leva em conta as causas destes problemas identificados. Resultados Muito se tem avançado em Minas Gerais em função da opção pelo modelo de atenção em redes e pela implantação das redes prioritárias. Alguns resultados expressivos podem ser demonstrados como a ampliação da cobertura do programa de saúde da família, a ampliação do número de nascidos vivos cujas mães fizeram 7 ou mais consultas de pré-natal e a redução da taxa de mortalidade infantil. Em relação a
cobertura de PSF, saímos de 48,93% em 2003 para 75,45% em 2012. Em relação as gestantes com 7 ou mais consultas, saímos de 51,82% em 2003 para 71,77% em 2012. Quanto a mortalidade infantil, houve uma redução bastante significativa de mais de 30% entre 2003 e 2012. Outro importante resultado é a boa colocação do Estado de Minas Geraisno Indicador de acesso e qualidade do Ministério da Saúde, o IDSUS. Minas Gerais é o 4º melhor estado do país e o 1º da região Sudeste. Outrossim, percebe-se claramente que um modelo de atenção em redes, exige um modelo de gestão em redes. Neste sentido, faz-se necessário ressaltar as possibilidades geradas em função do Decreto 7508/2011. Discussão O fortalecimento das redes de atenção à saúde é, em grande medida, dependente do robustecimento das regiões e do empoderamento dos territórios na prestação e gestão dos serviços de saúde. Recentemente, alterações normativas nas legislações do SUS vêm reforçando esse crescimento do papel regional. O principal instrumento nesse sentido é o Decreto Federal n. 7.508, de 28 de junho de 2011, advindo da necessidade de construção/aprimoramento de processos de governança do SUS. O referido instrumento trouxe para os entes federados a demanda por aprimoramento das capacidades técnicas, gestoras, e da relação entre os atores do Sistema, tornando-as sistêmica e dinâmica.
É impossível relacionar o fortalecimento das redes de atenção e do papel regional sem abordar a questão da governança. A importância da mesma ocorre em virtude da impossibilidade de se desvincular a participação da sociedade das questões políticas, tendo em vista a necessidade de se trabalhar em rede em função da necessidade de se agregar a colaboração de diversos departamentos e órgãos em prol de melhores resultados. Dessa forma, ressalta-se que a legitimidade dos serviços públicos prestados está diretamente vinculado a interação entre os diversos níveis de governo, destes com as organizações empresariais e sociedade civil. (LEMOS, 2009). Nessa mesma diretriz, a governança pode ser caracterizada como o exercício da autoridade política, econômica e administrativa para gerir os negócios do Estado. Constitui-se de complexos mecanismos, processos, relações e instituições através das quais os cidadãos e os grupos sociais articulam seus interesses, exercem seus direitos e obrigações e mediam suas diferenças (RONDINELLI, 2006 apud MENDES, 2011). A governança é aspecto inerente à organização do sistema de saúde, tendo em vista que é um dos componentes das Redes de Atenção à Saúde (RAAs). Configurando-se como arranjo que possibilita a organização e gestão de todos os componentes da rede, a governança permite a criação de missão e visão nas organizações, definição de objetivos e metas a serem cumpridas, articulando as políticas em prol do desenvolvimento de maior capacidade de gestão, permitindo maior planejamento, monitoramento e avaliação. Consoante os esforços para incremento da governança como aspecto fundamental na consolidação das redes de atenção como organizadoras do sistema de saúde, muitos são os desafios que necessitam ser superados para a consolidação dos resultados esperados: constituição do modelo de governança, aprimoramento dos instrumentos de planejamento ascendente, definição dos mecanismos para a alocação de recursos regional, adequação das
carteiras de serviços e medicamentos conforme demanda da população local e integração das políticas dos distintos entes federados. Nessa perspectiva, o Decreto 7508/11, ao instituir uma série de elementos visando o reforço da articulação regional, tem colaborado para a consolidação das redes de atenção. O referido Decreto afirma a relevância da gestão para resultados e da contratualização, sob a perspectiva de uma contratação unificada em redes, de forma a alinhar os incentivos entre todos os atores do SUS para alcançar os objetivos estratégicos. Os elementos que caracterizam a governança no âmbito das redes (territorialização, planejamento estratégico, contratualização, monitoramento e avaliação) apresentam forte correlação com os principais aspectos instituídos pelo Decreto 7508/11. O primeiro aspecto diz respeito à territorialização, que se expressa nos Planos Diretores de Regionalização. Os territórios são espaços de responsabilização sanitária por uma população, devendo haver clara definição dos serviços dos serviços ofertados. Nesse sentido, o decreto institui o conceito de regiões de saúde, pelos Estados em articulação com os municípios, as quais devem disponibilizar serviços de atenção primária, urgência e emergência, atenção psicossocial, atenção ambulatorial/hospitalar e vigilância em saúde. O segundo aspecto é do planejamento estratégico, tendo em vista a necessidade de convergência dos diversos atores em prol de objetivo comum. Deve o planejamento ser pautado a partir das necessidades de saúde da população, considerando as peculiaridades de cada região, além da necessidade de integração dos instrumentos de planejamento. Por consequência do decreto, o processo de planejamento é definido de maneira ascendente e integrada, do nível local ao federal, buscando compatibilização das necessidades de saúde com a disponibilidade financeira. O decreto é um instrumento que visa superar a fragmentação dos sistema de planejamento, contando com a introdução de inovações como o
Mapa da Saúde, a Programação Geral de Ações e Serviços de Saúde, Rename e Renases, abordados mais adiante. O Monitoramento e avaliação são o terceiro elemento da governança a ser analisado. Visando maior articulação entre os atores e as bases de suporte decisório, o processo de monitoramento e avaliação implica no julgamento de valor para racionalização da decisão, o que necessita de informação gerencial eficaz. Vinculado ao decreto, visualiza-se a instituição das Comissões Intergestores com objetivo de pactuar a organização e funcionamento das ações e serviços de saúde integrados em redes de atenção à saúde. Tais comissões são incumbidas de fornecer o suporte às decisões, pactuando aspectos operacionais, financeiros e administrativos da gestão compartilhada do SUS, as diretrizes norteadoras ao funcionamento das regiões de saúde, bem como as responsabilidades dos entes. No que se refere à contratualização, o Decreto estabeleceu o Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde (COAP), um acordo de colaboração entre os entes federativos para a organização da rede interfederativa de atenção à saúde (BRASIL, 2011a, p. 3). Terá o COAP a função de delimitar as responsabilidades individuais e solidárias dos entes federativos com relação às ações e serviços de saúde, os indicadores e as metas de saúde, os critérios de avaliação de desempenho, os recursos financeiros que serão disponibilizados, a forma de controle e fiscalização da sua execução e demais elementos necessários à implementação integrada das ações e serviços de saúde. Configura-se o COAP, desta forma, como instrumento de gestão compartilhada, que permite a uma região de saúde constituir-se de unicidade conceitual, capaz de desenvolver diretrizes, metas e indicadores, claramente explicitados por meio das pactuações, permitindo então o cumprimento dentro dos prazos estabelecidos.
Em prol da consolidação do processo de governança, a SES/MG desenvolveu duas atividades: a elaboração de material instrucional sobre o processo de planejamento integrado e os instrumentos de planejamento do SUS, e a realização de reuniões regionais para a recepção dos novos prefeitos e do 3º Encontro Estadual de Saúde, o qual representou um momento de apresentação das políticas de saúde a Prefeitos, Secretários Municipais de Saúde e técnicos municipais de saúde, todos com desfecho em fevereiro de 2013. O objetivo é munir os gestores e técnicos regionais de informações suficientes para serem parceiros no processo de construção das novas diretrizes abordadas pelo Decreto e pelos princípios da gestão por resultados. A SES/MG estabelece ainda um processo de articulação com outros atores (Conselho de Saúde, Ministério Público, Tribunal de Contas, entre outros) para a divulgação e alinhamento de conceitos referentes ao Decreto e definição de mecanismos de responsabilização em decorrência dos COAPs. Considerações finais Conforme descrito neste artigo, os passos apontados pelo Decreto 7508/2011 representam avanços conceituais importantes no que tange a gestão do SUS. Minas Gerais, ao longo da última década, consolidou uma posição de vanguarda na gestão pública, destacando-se por avanços como o Choque de Gestão e suas posteriores gerações: o Estado para Resultados e a Gestão para Cidadania. Todas estas fases impactaram fortemente a área da saúde, de maneira que algumas realizações concretas foram estabelecidas, como a existência de um bom sistema de planejamento estratégico, a consolidação de uma cultura de monitoramento e avaliação e a criação de mecanismos de incentivo com a vinculação de pagamentos ao desempenho ou performance.
Os caminhos percorridos, contudo, não escondem a necessidade de que novos trilhos sejam permanentemente estabelecidos, sendo neste caso uma oportunidade de avanços os dispositivos apontados no Decreto. Referências Bibliográficas BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. BRASIL. Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. COMISSÃO INTERGESTORES BIPARTITE. Deliberação CIB SUS nº 978, de 16 de novembro de 2011. Conforma os 853 municípios em 77 micro e 13 macrorregiões. COMISSÃO INTERGESTORES TRIPARTITE. Resolução nº 001/2010. Dispõe sobre as regiões de saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. SUS: avanços e desafios. Brasília: CONASS, 2006. LEMOS, Carolina Siqueira. Gestão pública orientada para resultados: avaliando o caso de Minas Gerais. Dissertação apresentada à Escola Brasileira de Administração Pública. 2009. MENDES, E. V. As Redes de atenção à saúde. Brasília. OPAS, 2011. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria Nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERAIS. Pacto de gestão: da Municipalização autárquica à regionalização cooperativa. Marcus Vinícius Caetano Pestana da Silva e Eugênio Vilaça Mendes. Belo Horizonte, 2004.
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