HISTÓRIA EM QUADRINHOS: UMA PROPOSTA DE ENSINO. Alex Caldas Simões (UFOP) 1. Introdução



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Transcrição:

HISTÓRIA EM QUADRINHOS: UMA PROPOSTA DE ENSINO Alex Caldas Simões (UFOP) 1 RESUMO: Pretendemos, por meio desse artigo, relatar, parte das experiências adquiridas na montagem dos planos de aula das oficinas de quadrinhos, do projeto de extensão da Universidade Federal de Ouro Preto UFOP) Mídia Participativa: Periódico, desenvolvido nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, CEMPA e Dom Silvério, localizadas na cidade de Mariana - MG; bem como as estratégias de ensino desenvolvidas para o ensino do gênero quadrinhos e demais gêneros icônicos. Ressaltamos também, baseados nas teorias de gêneros textuais de Charaudeau, Meurer e Marcuschi, a importância do gênero HQ para o ensino secundário e para a formação integral do aluno. Palavras-chave: gêneros textuais, quadrinho, ensino. Introdução O ensino de língua materna, de acordo com as atuais orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais PCN s, direciona os estudos de Língua Portuguesa para o trabalho com os chamados gêneros textuais, que podem ser entendidos como tipos específicos de texto de qualquer natureza (MEURER, 2002, p. 1), construtos sociais que circulam em nossa vida diária, definidos por aspectos sócio-comunicativos e funcionais, que, no ensino, desenvolvem competências específicas de aprendizado. Do ponto de vista funcional, aprender a língua materna significa desenvolver competências no uso de um número crescente de funções de linguagem. (HALLIDAY, 1970 apud MEURER, 2002, p. 1). Essa competência é desenvolvida por meio da exposição dos gêneros textuais, que proporcionam ao indivíduo um maior entendimento do ambiente em que este se encontra, e sobre a sua função no mesmo. Um estudo conduzido dessa forma proporciona também ao indivíduo o desprendimento das regularidades típicas de um gênero, e das regularidades da esfera social em que esse gênero é construído. Podemos definir gênero textual, como afirma Marcuschi (2002), como um texto materializado, verbal ou escrito, que encontramos nas mais diversas situações da nossa vida diária e que apresenta características sócio-comunicativas definidas por seu conteúdo, propriedades funcionais, estilo e composições características. O Projeto Mídia Participativa: Periódico (MPP), desenvolvido no programa Língua Portuguesa: Ensino Comunicação e Sociedade, vinculado a Pró-reitoria de Extensão (PROEX), da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), corresponde a um exemplo de como podemos trabalhar a produção textual na perspectiva dos Gêneros Textuais, nas escolas de Ensino Fundamental e Médio. Neste artigo, relataremos algumas experiências adquiridas na montagem dos planos de aula das oficinas de Produção de Textos - Oficina de Quadrinhos, Caricatura e Charge, com 38 1 E-mail: axbr1@yahoo.com.br

ênfase nos gêneros não-verbais, ou icônico-verbais, bem como algumas estratégias de ensino desenvolvidas para o ensino dos gêneros, quadrinhos, e demais gêneros icônicos-verbais. Por fim, indicaremos a importância de se ensinar o gênero quadrinho para os alunos do Ensino Médio. Oficina de Quadrinho, Caricatura e Charge: uma proposta de ensino A Oficina de Quadrinhos, Caricatura e Charge é constituída, a princípio, por 18 planos de aula de 50 minutos cada, que serão desenvolvidas juntamente com os professores de Língua Portuguesa das escolas participantes do projeto 2. Os gêneros não-verbais ou icônico-verbais, de acordo com Mendonça (2002), podem ser: caricatura, charge, cartum, tira e quadrinhos. Esses gêneros podem ser conceituados, de acordo com a autora, como: 1. Charge, texto que se apresenta graficamente, geralmente associado a uma informação atual, principalmente política, que tende a envelhecer com o tempo, como uma notícia; 2. Cartum, texto gráfico, que pode apresentar balões ou legendas, que, assim como a charge, apresenta informações muitas vezes cômicas, que tendem a não perder o seu sentido com o passar do tempo; 3. Tira, pode ser considerado um quadrinho pequeno, pois apresenta todas as características de uma história em quadrinhos grande, tais como: balões, desenhos, textos, marcações de cor, enredo, personagens e sentido próprio. São encontradas em revistas e jornais e possuem de 3 a 4 quadros. Podem ser tiras-piada, em que o humor é obtido por meio das estratégias discursivas utilizadas nas piadas de forma em geral (MENDONÇA, 2002, p. 198) e tira-episódio, na qual o humor é baseado especificamente no desenvolvimento da temática numa determinada situação, de modo a realçar as características das personagens. (MENDONÇA, 2002, p. 198); 4. Histórias em quadrinho, texto formado por quadros que apresentam os seguintes elementos típicos: desenhos, balões e/ou legendas nos quais é inserido o texto verbal. São geralmente narrativas longas, mais de quatro quadros, que podem surgir em revistas próprias. O nome do personagem principal da história, ou, nome do grupo de personagens principais das histórias, geralmente, leva o título da revista. Will Eisner (1999), em relação aos quadrinhos, firma que a 39 [...] função fundamental da arte em quadrinhos (tira ou revista), que é comunicar idéias e/ ou histórias por meio de palavras e figuras, envolve o movimento de certas imagens (tais como pessoas e coisas) no espaço. Para lidar com a captura ou encapsulamento desses eventos no fluxo da narrativa, eles devem ser decompostos em segmentos seqüenciados. Esses segmentos são chamados quadrinhos. (EISNER, 1999, p. 38) 2 O Mídia Participativa: Periódico, teve início em Agosto de 2007 e irá se desenvolver até meados do mês de dezembro de 2007. Esse artigo foi escrito antes do início das Oficinas de Quadrinho, Caricatura e Charge.

Temos, portanto, que a nomenclatura do gênero quadrinho leva em consideração, principalmente, a função desse tipo de texto, muito embora não exclua a configuração, balões, cores, textos verbais, imagens em movimento; temática, contação de histórias; e aspectos sociais de construção, autor, leitor. A primeira aula da oficina, intitulada 0-A 3, pretende apresentar o projeto MPP aos alunos de maneira a informá-los sobre a organização e funcionamento do mesmo. Nesse primeiro encontro, observaremos, por meio de uma pesquisa de opinião escrita, quais os interesses dos alunos, temáticas prediletas de leitura, o que costumam fazer nas horas vagas, o que assistem na televisão, etc. Escutaremos também, por meio de uma dinâmica, um resumo da vida do aluno até o presente momento, sua idade, sonhos, afinidades, entre outros. Compreendemos que antes de se iniciar qualquer atividade de produção de textos, principalmente as que envolverão desenho e criação, é necessário conhecer a turma que se envolverá na produção textual. Saber quem são e onde estão nos levará a descobrir eventuais potencialidades artísticas e criativas, o que poderá facilitar, futuramente, o trabalho do professor. Assim, o plano de aula 0-A analisa o terreno em que o professor das oficinas de quadrinho irá pisar. Será que ele é firme? Que temáticas irá abordar? Que postura deverá ter em relação aos alunos? Essas são algumas questões que serão respondidas com a aplicação da primeira aula. O Plano de aula seguinte, 0-B, assim como o 0-A, pretende descobrir que tipo de conhecimentos os alunos que participarão do projeto possuem em relação aos gêneros quadrinho, charge, caricatura, cartum e tira. Será apresentado um questionário escrito, chamado por nós de Pesquisa de opinião: gêneros, que conterá: questões de definição, tais como o que é cartum?, ou ainda, o que é quadrinho? ; e um exercício de classificação, onde o aluno, em meio a diversos tipos de textos icônicos-verbais ou não verbais, deverá reconhecer quais são, dos textos apresentados, o quadrinho, a charge e a caricatura. Após a entrega desse questionário, será apresentada aos alunos a dinâmica Quadrinho coletivo, que será desenvolvida em um tempo curto e possuirá, apesar da contrariedade do conceito, três quadros. A partir de um enredo geral, o fim do mundo, por exemplo, cada aluno receberá um personagem, médico, professor, adolescente, ou outro, e deverá desenvolver em três quadros uma história completa, com começo, meio, e fim. O aluno que desenvolver o primeiro quadro não desenvolverá o segundo, pois haverá um rodízio de criação, quem começa a história não a finaliza. A atividade seguinte, ainda nesse plano de aula, medirá a capacidade dos alunos de identificarem regularidades dos gêneros que serão trabalhados na oficina. Apresentaremos três exemplares de um gênero específico a grupos de alunos da turma. Eles redigirão um texto sobre a seguinte questão: o que esses três textos têm em comum?. Com o plano 0-B, esperamos descobrir quais as competências dos alunos em relação aos gêneros que serão trabalhados. Mediremos se os mesmos sabem conceituá-los, identificálos, produzi-los e observá-los. Cabe dizer que essa atividade representa uma iniciativa relevante para o profissional de produção de textos que pretende desenvolver qualquer gênero textual em aula, uma vez que é imprescindível saber que aspecto dos gêneros textuais que serão trabalhados o aluno já conhece. Ter esse conhecimento possibilita preparar o professor para 40 3 A nomenclatura 0-A, criada por nós, se deve ao fato de ainda não iniciarmos os planos de aula específicos da Oficina de quadrinhos, caricatura e charge. Esse plano de aula é uma orientação para todas as oficinas de produção de textos do MPP.

iniciativas futuras. Caso percebamos que os alunos não conhecem determinado aspecto do gênero trabalhado, iremos nas próximas aulas trabalhar esse aspecto; ou, caso percebamos que os alunos já conhecem determinado aspecto iremos desenvolver outros mais relevantes. Essa aula, portanto, assim como a 0-A, corresponde a um medidor de conhecimentos, é a partir do que os alunos sabem ou não que os outros planos de aula serão montados. O terceiro encontro com os alunos secundaristas se dará na aula 1. Nela, de acordo com as orientações de Anna Christina Bentes em seu livro Gêneros textuais: reflexões e ensino (20--?), abordaremos, de fato, as características dos gêneros icônicos-verbais e não-verbais. Tentaremos diferenciá-los e classificá-los. Nossa metodologia de trabalho 4 consiste em uma adaptação das idéias de Bentes. Iremos apresentar aos alunos quatro textos, são eles: 1- texto introdutório, deve conter as características gerais e principais do gênero que será trabalhado. No caso específico do quadrinho mostraremos uma história em quadrinhos curta, uma página, e teceremos breves comentários a respeito de sua configuração e elementos principais; 2- texto de apoio, deve abordar uma outra forma de apresentação do gênero. No caso da oficina de quadrinhos apresentaremos uma outra maneira de se associar imagem e texto, um poema com desenhos, por exemplo; e, 3- texto principal, será o texto analisado em suas especificidades, observaremos, agora, mais profundamente, através da comparação entre dois textos, quais são as características principais do gênero (no nosso caso gênero quadrinhos). Cabe destacar que os textos escolhidos para a aula1 seguirão as temáticas indicadas pelos alunos na pesquisa de opinião da aula 0-A. Sendo assim, levaremos para a turma, por exemplo, ao constatarmos que este seja o interesse da maioria dos alunos, um texto introdutório da Turma da Mônica, um texto de apoio de um poema de Oswald de Andrade, e um texto principal dos X-men e do Super-homem. Essa aula pretende apenas inserir o aluno no campo de gêneros que serão trabalhados. Será uma aula mais expositiva por parte do professor. Entretanto será a partir desta que as outras aulas se basearão. A aula 1 corresponde a um resumo das aulas que serão apresentadas no decorrer do projeto. Aspectos específicos desta aula 1 serão trabalhados em outras aulas. Na aula 2 temos como objetivo fazer o aluno escrever/ produzir o gênero cartum ou charge. Antes da produção textual, deve-se apresentar um texto de retomada 5. Escolheremos uma charge. Ao apresentá-la, mostraremos somente o primeiro quadro e esconderemos a seqüência. Questionaremos verbalmente os alunos sobre a seqüência da charge, o que vem após essa seqüência? Com isso a turma perceberá, ao ler o quadro escondido, que o humor é produzido, dentre outros elementos, por situações contraditórias. Para produção textual seguiremos os seguintes passos: apresentaremos uma charge/cartum de um personagem de desenho animado, ou histórias em quadrinho, conhecido dos alunos (Pokémon satirizado, por exemplo). Mostraremos, em seguida, algumas estratégias de construção do humor, baseados em teorias semânticas (Semântica Formal Ana Lúcia Müller e Evani Viotti (2003), Lexical Antonio Pietroforte e Ivã Lopes (2003) e Enunciativa Eduardo Guimarães (1995) ou, ainda, em teorias pragmáticas (a pragmática cognitiva: Pragmática do Código e Teoria da Relevância, 41 4 Esta metodologia, desenvolvida a partir dos dizeres de Bentes (20--?), se aplica também a todos as outras oficinas de produção de textos do projeto. 5 Cabe dizer que no início de qualquer aula (a partir da primeira), embora não especificado aqui, espera-se que o professor apresente um texto de retomada. Este corresponde a um texto de uma temática que foi abordada na aula anterior. Ë abordado de maneira sucinta, apenas para recordar os alunos do que foi aprendido na aula anterior.

desenvolvidas por Jane Silveira e Heloísa Feltes (2002) em estudo sobre Sperber e Wilson, por exemplo). A partir das charges/cartuns que foram apresentadas na aula, será pedido para que o aluno produza algo similar. Utilizaremos, para os alunos que não sabem desenhar, uma folha com vários personagens conhecidos (estes personagens serão escolhidos a partir dos resultados da pesquisa de opinião da aula 0-A), que sobreposta a uma outra branca servirá de esboço para cópia do desenho. Em seguida basta ao aluno apenas acrescentar um comentário cômico. Nessa aula veremos pela primeira vez a escrita dos alunos. Ficar atenta a ela nos mostrará que caminhos deveremos seguir: eles compreenderam a tarefa? Como está a escrita dos alunos? Muitas inadequações gramaticais? De acordo com as respostas reformularemos ou não os planos de aula seguintes. Sugerimos, também, ainda na aula 2, que o professor de produção de texto, assim como os alunos, realize a tarefa de criação de uma charge/cartum. Ao realizar essa tarefa, que será feita a priori para que no momento da aula o mesmo possa auxiliar os alunos na produção textual, o professor sentirá, apesar dos conhecimentos que possui, qual é a real dificuldade da tarefa que propôs. É relevante dizer que em aulas de produção de texto, sejam elas quais forem, o professor deve mostrar alguns dos seus textos aos alunos. Essa cumplicidade formará, certamente, um elo entre professor e aluno, pois o secundarista verá o professor não como alguém que corrige, mas como alguém que, assim como ele, está interessado em produzir textos, criá-los e se divertir. Passaremos, então, para o próximo plano de aula, aula 3, que pretende criar um personagem. Para essa tarefa serão utilizadas duas aulas, 3 e 4. Em se tratando de histórias em quadrinho este aspecto, personagem, é um elemento primordial. Nessa aula, para situarmos os alunos no campo das HQ s iremos apresentar diversas revistas de notícias que possuem quadrinhos para que os alunos observem como os mesmos são tratados e que temáticas abordam. Em seguida, mostraremos algumas revistas de histórias em quadrinho e procuraremos analisar seus diversos tipos de traço. Nessa etapa, por exemplo, podemos apresentar partes de: uma revista Comics (X-men, Super-homem, Batman, etc.) uma revista Mangá com traço americano (X-men, Homem-aranha, etc.), uma revista Mangá (Dragon Ball, Sakura Cards Caption, Cavaleiros do zoodíaco, etc.), uma revista infantil (Mônica, Zé Carioca, Magali, etc.), e uma revista adulta (Alien x Predador, 300 de Esparta, Watchmen, etc.). Após essa análise do mercado editorial das HQ s e de seus diferentes tipos de traços/públicos, indicaremos ao aluno um enredo geral (enredo sugerido: um personagem da nossa história, século XVIII, por exemplo, está prestes a morrer. Crie um personagem para salvá-lo, um mocinho ou super-herói. O que ocorrerá após esse salvamento? Será que a história do mundo irá se modificar?) para que o mesmo crie seu próprio personagem. O aluno deverá desenhar seu personagem em três posições diferentes (de frente, de costas e de lado) e acrescentará ao mesmo um pequeno resumo da vida do personagem, passado, presente e futuro (essas informações serão construídas a partir de um roteiro de perguntas, tais como: quem são os pais de seu personagem [passado], como o seu personagem conseguiu super-poderes [hoje], e o que ele fará daqui em diante [futuro] ). O professor, assim como na aula anterior, também deverá apresentar um personagem seu à turma. Personagens famosos, como, por exemplo, Wolverine, ou Cascão, poderão ser apresentados a título de exemplificação da tarefa. Os planos de aula 5,6 e 7 podem ser resumidos da seguinte maneira: a aula 5 desenvolverá a noção gramatical de substantivos e adjetivos através do gênero quadrinho; a aula 42

6, desenvolverá uma dinâmica com personagens ao estilo RPG; e, por fim, a aula 7 abordará mais especificamente o gênero tira de jornal de maneira a produzi-lo em sala. Concluídas essas etapas observaremos agora, mais de perto, os plano de aula 8,9,10,11,12 e13 de maneira conjunta. Essas aulas desenvolverão, cada uma com sua temática específica, partes fundamentais de uma história em quadrinhos. São elas 6 : 1- personagem (aula 3 e 4); 2- história ou enredo (indicados pelo professor na aula 8) e roteiro (produzido pelos alunos na aula 8); 3- técnicas de desenho, tais como perspectiva, movimento, cenário, paginação, enquadramento, cor, entre outros, (na aula 9); 4- esboço da história, baseado nas orientações da aula 9 (na aula 10 e 11); 5- apontamentos textuais e reescritura (na aula 12); e 6- arte-final e cor (na aula 13). Através desse processo será possível criar uma história em quadrinhos com no mínimo uma página, com seis quadros cada página, e no máximo 2 páginas. Os alunos poderão observar, após essa seqüência de aulas, como é construído um quadrinho e que processos sociais e de produção encontramos nessa arte seqüencial. As demais aulas da Oficina de Quadrinhos, Caricatura e Charge, 14 a 16, terão como objetivo produzir uma propaganda de HQ s, assunto que não será desenvolvido nesse artigo, visto que o nosso o foco, aqui, é outro. Com o fim do projeto, esperamos que os alunos secundaristas entendam, como afirma Najara Ferrari Pinheiro (2002), o estudo de gêneros textuais nas aulas de produção de textos como um orientador textual a produtores (autores), no nosso caso escritores, roteiristas ou desenhistas de histórias em quadrinhos, e a receptores (leitores), estudantes interessados por quadrinhos. Através dessa orientação os alunos poderão, por meio da escrita ou leitura, desenvolverem/produzirem ou interpretarem/compreenderem melhor as histórias em quadrinho disponíveis no mercado editorial. Os alunos aprenderão também, ainda de acordo com Pinheiro, que um gênero tende a configurar-se como uma instituição que incorpora e reflete a sociedade em que ocorre, regulando as ações de produtores e receptores (PINHEIRO, 2002, p. 273). Os escritores/produtores de quadrinhos, a partir das aulas do projeto, conseguirão criar quadrinhos, em função dos gêneros que conheceram ou redescobriram nas oficinas de produção de texto. Acabarão, portanto, percebendo o quadrinho como um gênero que pertence a uma instituição social específica dentro da sociedade. Perceberão a formação discursiva do gênero e assim verão, segundo Pinheiro (2005), o que pode e o que não pode ser dito em um determinado gênero situado em um momento histórico específico. Situarão gêneros como [...] formas de textos que conectam produtores [desenhistas, roteiristas], consumidores [crianças, jovens e adultos], tópicos [terror, aventura, saúde, educação], meio [revista impressa, internet, jornal], maneira [tom educativo, apelativo], e ocasião [festas, inaugurações, lançamentos] isto é, relacionam produção, recepção, texto e contexto. (PINHEIRO, 2002, p. 274) 43 A partir de todo esse processo o aluno otimizará a sua leitura de imagens e textos, pois 6 As etapas de produção de um quadrinho foram, aqui, adaptadas por nós de acordo com, os dizeres de Will Eisner (1999), e da Oficina de quadrinhos, ministrada por Luíz Gê, oferecida de 23 a 27 de Julho de 2007, no Festival de Inverno Mariana Ouro Preto Chico Rei e a Cultura Afro- brasileira.

de acordo com Pinheiro: [...] quem conhece as especificidades e regularidades constitutivas de um gênero [no nosso caso o gênero quadrinho] pode, com muito mais propriedade, lançar mão de estratégias e táticas para criar, movimentar e transformar o espaço aberto, permeável de todo texto ou gênero (PINHEIRO, 2002, p. 284) Segundo Charaudeau (2004), podemos afirmar que ao ensinar quadrinhos, principalmente para os alunos do Ensino Médio, estamos, além de desarticulando a idéia de que quadrinhos só é pertinente para alfabetização de alunos da pré-escola e ensino Fundamental, afirmando a existência dos gêneros icônico-verbais ou não-verbais, diferenciando-os, especificando-os, e, com isso, entendendo que a produção linguageira (quadrinho) está submetida a restrinções. Não se pode escrever qualquer coisa em um quadrinho, há uma função a cumprir, uma configuração estabelecida por convenções sociais e uma série de estruturas sociais em volta que impedem certas construções nesse gênero. Ter noção desses conteúdos possibilita ao aluno muito mais do que iniciá-lo na leitura como podem afirmar alguns, entender e adequar sua linguagem as mais diversas situações. Dessa forma, então, entendemos que o ensino do gênero quadrinho se constitui como ferramenta preciosa para os professores de produção de textos, pois, como já visto, o mesmo abre a visão do aluno para o mundo da escrita e da percepção textual. REFERÊNCIAS: BENTES, Anna Christina. Gênero e ensino: algumas reflexões sobre a produção de materiais didáticos para a educação de jovens e adultos. In: KARWOSKI, Acir Mário; GAYDECZKA, Beatriz; BRITO, Karim Siebeneicher (Orgs.). Gêneros textuais: reflexões e ensino. União da Vitória, PR: Kaygangue, 2005. p. 95-122. CHARAUDEAU, Patrick. Visadas discursivas, gêneros situacionais e construção textual; In: MACHADO, Ida Lúcia; MELLO, Renato de. (Orgs.). Gêneros: reflexões em análise do discurso. Trad. Renato Teixeira. Belo Horizonte: NAD/FALE/UFMG, 2004. p. 13-41. EISNER, Will. Quadrinhos e arte seqüencial. Trad. Luís Carlos Borges. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. KARWOSKI, Acir Mário; GAYDECZKA, Beatriz; BRITO, Karim Siebeneicher (Orgs.). Gêneros textuais: reflexões e ensino. 2. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006. p. 25-6. MARCUSCHI, Luis Antônio. Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002. p. 19-36. MENDONÇA, Márcia Rodrigues de Souza. Um gênero quadro a quadro: a história em quadrinhos. In: DIONISIO, Ângela Paiva; MACHADO, Anna Raquel; BEZERRA, Maria Auxiliadora (Orgs.). Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002. p. 194-207. MEURER, José Luiz. O conhecimento de gêneros textuais e a formação do profissional da linguagem. In: FORTKAMP, Mailce Borges Mota; TOMICH, Lêda Maria Braga (Orgs.). Aspectos da lingüística aplicada: estudos em homenagem ao professor Hilário Inácio Bohn. Florianópolis: Insular, 2000. p. 144-66. PINHEIRO, Najara Ferrari. A noção de gênero para análise de textos midiáticos. In: MEURER, José Luiz; MOTTA-ROTH, Desirée (Orgs.). Gêneros textuais e práticas discursivas: subsídios para o ensino da linguagem. Bauru, SP: EDUSC, 2002. p. 259-290. 44