Publicidade e semiótica aplicada: as contribuições de Ugo Volli



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Transcrição:

Publicidade e semiótica aplicada: as contribuições de Ugo Volli Lara Victoria de Camargo Dal Posso 1 Rodolfo Rorato Londero 2 Resumo: O objetivo deste trabalho é discutir a semiótica da publicidade a partir dos conceitos apresentados por Ugo Volli em Semiótica da publicidade (2003). Acompanhando o desenvolvimento dessa disciplina, desde seu interesse inicial pela construção de uma retórica visual até sua abordagem greimasiana da publicidade, a obra de Volli procura esclarecer esses conceitos visando a formação de uma semiótica aplicada. Este trabalho integra o projeto de pesquisa Teorias da publicidade e cultura visual, realizado na Universidade Estadual de Londrina, cuja finalidade é representar um panorama históricodidático das teorias em questão. Palavras-chave: publicidade; semiótica aplicada; semiótica greimasiana. 1. Introdução Em Contribuições para uma história da análise da imagem no anúncio publicitário (2008), Souza e Santarelli constatam quatro fases da semiótica da publicidade. Na primeira fase temos o texto fundador de Roland Barthes, Retórica da imagem (1964), e a contribuição de Umberto Eco em A estrutura ausente (1968), ambos interessados na construção de uma retórica visual embasada na semiótica. Na segunda fase temos a continuação dessa proposta inicial, realizada por Jacques Durand em Retórica e imagem publicitária (1970) e Georges Péninou em Intelligence de la publicité (1972). O abandono da retórica visual marca a terceira fase quando Jean-Marie Floch (Sémiotique, marketing et communication, 1990) busca pensar a publicidade a partir da semiótica greimasiana, principalmente inspirado pelas aplicações do quadrado semiótico. Na quarta fase, Martine Joly (Introdução à análise das imagens, 1994) introduz a semiótica peirciana nos estudos da publicidade (algo já realizado por Eco, mas superficialmente) e André Semprini (Analizzare la comunicazione, 1996) propõe uma leitura diacrônica a partir da intertextualidade formada pelas várias peças que compõem uma campanha publicitária. 1 Graduanda do Curso de Comunicação Social Habilitação em Jornalismo, da Universidade Estadual de Londrina. 2 Orientador. Professor do Departamento de Comunicação, da Universidade Estadual de Londrina.

Também poderíamos incluir a proposta de uma semiologia do efeito nessa quarta fase: através do conceito de pertinência, Eliseo Verón procura entender as relações entre efeito e significado na publicidade (LONDERO, 2013). Souza e Santarelli encerram seu percurso da semiótica da publicidade nos anos 1990, deixando em aberto as contribuições do século XXI. Se podemos falar em uma quinta fase da semiótica da publicidade, então ela é certamente orientada para a semiótica aplicada, ou seja, pelo uso da semiótica enquanto ferramenta de criação publicitária. Um bom exemplo dessa quinta fase é Estratégias semióticas da publicidade (2010), de Lucia Santaella e Winfried Nöth. Como o próprio título indica, além dos vários cases expostos, o objetivo de Santaella e Nöth é oferecer conceitos semióticos úteis para os publicitários. Na verdade, os autores indicam como se tornou possível a passagem de uma semiótica crítica, exercida originalmente pelos autores da primeira fase (Barthes e Eco), para uma semiótica aliada ao marketing e à pesquisa de consumo: A semiótica da publicidade teve início nos anos 1960. Após ser primeiramente influenciada por aspectos crítico-ideológicos, continuou desenvolvendo-se, desde então, em muitas outras direções. Teoria geral dos signos, semiótica textual, semântica e pragmática, retórica, mitos, arquétipos, símbolos, poesia e metáforas tornaram-se alguns dos instrumentos e temas da análise semiótica da publicidade, o que diminuiu mais e mais o abismo ideológico que separava, de um lado, uma semiótica crítica da publicidade, de outro, a investigação empírica de marketing e consumo (SANTAELLA; NÖTH, 2010, p. 75). Isto não é novidade, pois desde o princípio Péninou (1976) imaginou sua semiótica da publicidade como o exercício prático da tarefa publicitária não por acaso, ao contrário de Barthes, Eco e Durand, Péninou é publicitário, sendo o primeiro a pensar a semiótica dentro da publicidade. Também não podemos esquecer que alguns semioticistas conhecidos tornaram-se consultores de agências de publicidade (Floch, Verón, etc.). Entretanto, apesar de suas intenções, nenhum dos autores citados propôs uma semiótica aplicada à publicidade como o fez Ugo Volli em Semiótica da publicidade (2003). Como indica o subtítulo da obra A criação do texto publicitário, Volli busca oferecer ao estudante, ao profissional e ao cidadão interessado um instrumento metodológico que se esforce por ser orgânico e não casual (VOLLI, 2003, p. 13), ou seja, um instrumento ligado ao que se faz em publicidade. Volli procura repensar o fazer publicitário não formulando uma teórica

semiótica da publicidade, mas oferecendo uma caixa de ferramentas semióticas que possam revelar-se úteis para a análise (VOLLI, 2003, p. 13; grifo do autor). Não muito diferente do que fazem os autores de Estratégias semióticas da publicidade. Essas obras buscam, portanto, resgatar vários conceitos da semiótica da publicidade, mas desta vez aplicando-os à prática profissional. O objetivo deste artigo é refletir sobre a semiótica da publicidade seguindo os conceitos apresentados por Volli na obra referida. Portanto, o artigo discute conceitos como conotação, funções da linguagem, valorização, esquema narrativo, entre outros, buscando, no mesmo espírito do autor, a formação de uma semiótica aplicada. Este trabalho integra o projeto de pesquisa Teorias da publicidade e cultura visual, realizado na Universidade Estadual de Londrina, cuja finalidade é representar um panorama histórico-didático das teorias em questão. 2. O signo publicitário Do ponto de vista da semiótica, o primeiro objetivo de qualquer campanha publicitária é conduzir um significante a um significado. Portanto, o signo publicitário deve ser capaz de relacionar algo (uma frase, um objeto, uma logo) ao produto publicitado. Pensemos, por exemplo, na maçã da Apple. No âmbito da linguística e da semiótica é corrente falar em arbitrariedade do signo, ou seja, o signo não é determinado pelo seu significado isolado, mas pela história da língua e da relação de oposição e derivação nela desenvolvida (VOLLI, 2003, p. 86). Não é o conteúdo positivo e concreto de um signo que se revela determinante na comunicação, mas sim seu valor opositivo, negativo, concorrencial. Essa noção opositiva do sentido ganha especial relevo quando aplicada ao mundo dos produtos e da publicidade. A prática publicitária não se justifica apenas pelo regime de concorrência entre marcas, objetos e serviços que competem para satisfazer as mesmas necessidades ou desejos dos consumidores. Além de preencher de sentido os produtos e marcas de que se fala, o objetivo fundamental da publicidade é opor produtos e marcas semelhantes, instituir diferenças onde materialmente talvez nem existam (VOLLI, 2003, p. 50-51). Voltemos ao exemplo da maçã, logo da marca Apple. Se pensarmos somente em uma maçã, tomada como signo isolado do mundo da tecnologia, o primeiro significado que

teremos é o de uma fruta. Já se relacionarmos a maçã com a marca Apple, então ela terá outro significado, deixará de representar apenas uma fruta, mas passará a ser um sinal de excelência, uma garantia de que determinado eletrônico é de qualidade. É bastante comum na publicidade a utilização de signos para atribuir uma valorização positiva ao produto. Uma flor, por exemplo, utilizada na identidade visual de uma marca, tende a passar uma ideia de naturalidade ao produto (VOLLI, 2003, p. 84-85). Esse processo de figuratização de qualidades abstratas está intimamente relacionado com a denotação e a conotação. Em A mensagem publicitária (1963), Barthes expõe como o texto publicitário se utiliza dos processos de conotação para criar seus efeitos de sentido. Para ele, a mensagem publicitária, assim como qualquer mensagem, é composta por duas mensagens: a denotada e a conotada. A respeito da primeira, Barthes afirma que a primeira mensagem (esta ordem de análise é arbitrária) é constituída pela frase entendia (se fosse possível) na sua literalidade, abstraindo-nos, precisamente, da sua intenção publicitária (BARTHES, 1987, p. 165). A conotação ocorre quando um signo denotativo se torna o significante para um novo signo conotativo. Por exemplo, uma mulher de idade avançada, de cabelos brancos e roupas antiquadas, é identificada como uma avó. A partir de então, a figura de avó se torna o significante de um novo significado: de sabedoria e experiência, valores que a qualifica como uma pessoa que recomenda bons produtos (relação conotativa) (VOLLI, 2003, p. 87-88). Portanto, a mensagem denotada é o ponto de partida para a conotada. Os significantes de conotação, chamados por Barthes de conotadores, são construídos por signos oriundos do sistema denotado. Deste modo, para Barthes, a mensagem conotada é a extensão da primeira mensagem, permitindo um segundo significado além do vinculo imediato e superficial com a realidade obtido com a denotação. A finalidade da publicidade é atingida no momento em que se percebe esse segundo significado (BARTHES, 1987, p. 166). Cabe então observar, como veremos nos exemplos adiante, que a conotação na comunicação publicitária se dá predominantemente por meio de figuras de linguagem, constituindo-se em uma retórica da imagem. Além das mensagens denotada e conotada, há uma terceira mensagem, a linguística, que exerce duas funções em relação às imagens: o texto verbal pode tanto fixar um sentido único para a imagem por meio de uma descrição denotada, combatendo assim qualquer tipo

de interpretação equivoca da imagem, quanto complementar seu sentido (BARTHES, 1990, p. 32-34). No anúncio dos desodorantes Rexona (figura 1), veiculado em 2014, pode-se observar claramente uma complementaridade entre a imagem e o texto. Neste caso, a mensagem linguística não apenas pretende destacar a marca Rexona das demais (aquela que não mancha roupas), como também complementa o sentido da imagem, relacionando a marca branca realizada pelos árbitros dos jogos de futebol às manchas causadas por outros desodorantes. Trata-se de uma relação pouco evidente caso se considere apenas a imagem. Figura 1: Anúncio dos desodorantes Rexona Fonte: <http://plugcitarios.com/2014/07/genialidade-da-rexona-men/>. Acesso em 13 de agosto de 2015. No mesmo anúncio também se nota a conotação, ao relacionar a linha branca realizada pelo árbitro, geralmente usada como limite aos jogadores, à característica de outros desodorantes (manchar as roupas). Ou seja, os outros desodorantes impõe limites ao consumidor (mancham as roupas), enquanto Rexona não.

Figura 2: Anúncio do ketchup Heinz Fonte: <https://advsoc2013.wordpress.com/2013/03/04/semiotic-analysis-heinz-ketchupadvertisement/>. Acesso em 13 de agosto de 2015. No anúncio acima (Figura 2), a marca de ketchups Heinz, ao colocar uma embalagem cortada como fatias de tomate, constrói uma metáfora que é facilmente identificada: o ketchup é tão natural quanto um tomate. A mensagem linguística, neste caso, é utilizada para reforçar o sentido proposto de enxergar o ketchup como o próprio tomate que cresce: Ninguém cresce ketchup como Heinz, que também é uma paródia do slogan da marca Ninguém faz como Heinz. Figura 3: Anúncio dos chocolates Bis Fonte: <http://professoranabe.blogspot.com.br/2013/02/atividades-anuncio-publicitario.html>. Acesso em 13 de agosto de 2015. Acima (Figura 3) podemos notar duas figuras de linguagem no anúncio publicitário dos chocolates Bis: a sinestesia e a antítese. A repetição dos termos aberta e fechada,

além de configurar a antítese (emprego de termos opostos), também conota o som que a boca faz ao mastigar um alimento, produzindo a sinestesia do anúncio. Neste caso, a mensagem linguística exerce a função de complementaridade da mensagem visual, reforçando o sentido de movimento da boca que não ficaria tão claro somente com o uso da imagem. Figura 4: Anúncio do lanche McDonald s Fonte: <http://www.criatives.com.br/2012/03/campanhas-publicitarias-do-mcdonalds/anunciospublicitarios-mcdonalds-12/>. Acesso em 13 de agosto de 2015. No anúncio acima (figura 4), da rede de fast-food McDonald s, os livros são posicionados de forma que lembrem visualmente um lanche, caracterizando assim uma metáfora. Neste caso, a mensagem linguística é predominante denotada, clara e sem duplos sentidos, mas ajuda a fixar o sentido conotado de que aquele lanche é produzido por experts que entendem de culinária. Para Eco, diante de tantas figuras de linguagem possíveis nos mais diversos tipos de publicidade, a antonomásia (figura de linguagem usada para relacionar a parte com o todo) se destaca: Cada entidade isolada que aparece na imagem é, o mais das vezes, o representante, por antonomásia subentendida, do próprio gênero ou da própria espécie. Uma jovem ao tomar uma bebida comporta-se como todas as jovens. Pode-se dizer que a citação do caso isolado assume o valo de exemplum, do argumento de autoridade. Cada caso isolado é idealmente precedido por aquele signo lógico que se chama quantificador universal e que faz com que o símbolo x, ao qual é preposto, seja entendido como todos os x. Esse mecanismo, que se rege por processos

psicológicos de identificação (e, portanto extra-semiológicos) mas em que o processo de identificação é permitido por artifícios retóricos que tornam convencionalmente reconhecível como universal e exemplar o caso isolado proposto (e eis-nos de novo diante de um mecanismo semiológico), é fundamental na comunicação publicitária (ECO, 1987, p. 163, grifo do autor). Deve-se entender que o fenômeno de construções simbólicas discutido aqui vai além da publicidade, pois está estreitamente ligado à comunicação de massa como um todo, desde os jornais, o cinema, a televisão, o rádio, até nas embalagens de produtos. Como afirma Barthes, é quase certo que, atualmente, nunca recebemos mensagens senão mensagens conotadas: Nunca se encontra (pelo menos em publicidade) uma mensagem literal em estado puro; mesmo que conseguíssemos elaborar uma imagem inteiramente ingênua, a ela se incorporaria, imediatamente, o signo da ingenuidade e a ela se acrescentaria uma terceira mensagem, simbólica (BARTHES, 1990, p. 34). Entretanto, como diz Barthes (1990), a pluralidade de leituras que os processos de conotação permitem não significa que as diversas interpretações sejam feitas de forma anárquica, pois elas dependem de saberes, como o saber prático, o estético, o cultural, entre outros, que devem estar subentendidos ao leitor. A publicidade funciona somente quando há signos abertos à interpretação e leitores que dominam os códigos para interpretá-los. 3. O texto publicitário Segundo Volli (2003), por texto devemos entender não só excertos de linguagem oral ou escrita, mas também imagens, tais como desenhos e fotografias, filmes publicitários e outros materiais audiovisuais, músicas, animações, objetos eletrônicos e hipertextuais (VOLLI, 2003, p. 16). A publicidade recorre aos textos graças ao seu poder de mediação. Através dele, ela cria uma narrativa dentro de um espaço-tempo artificial que, enquanto representa a realidade fornecendo informações sobre o produto, busca relacioná-la à nossa experiência de mundo, processo chamado de valorização pela semiótica (VOLLI, 2003, p. 18). Grande parte das características do texto publicitário depende do suporte utilizado (televisão, jornal, rádio, internet, etc.), da organização textual interna e da sua condição de

leitura. Segundo Volli, a publicidade deve adequar-se não apenas à realidade social que lhe serve de suporte [...] como também ao modo pelo qual cada um dos media interpela o seu público (VOLLI, 2003, p. 59; grifo do autor). A análise semiótica da publicidade, portanto, não pode se restringir a criar classificações ou basear-se em conteúdos característicos, pois a publicidade atua de diferentes formas nos diferentes meios. Os diferentes suportes do texto publicitário (ou as diferentes substâncias de expressão, para a semiótica) torna impossível estabelecer uma gramática comum a todos os tipos de anúncios. Ainda assim é possível observar dois requisitos básicos no texto publicitário: a saliência perceptiva e a compreensibilidade (VOLLI, 2003, p. 80). Para entendê-las, precisamos primeiramente compreender as seis funções da linguagem: a função referencial, ligada ao contexto da comunicação, ou seja, ao assunto da mensagem; a função emotiva, própria da atitude do emissor em relação àquilo de que está falando; a função conativa, referente às sentenças imperativas; a função poética, centrada na mensagem em si, ou melhor, no caráter expressivo dos signos; a função fática, para estabelecer o canal de comunicação e verificar seu funcionamento; e a função metalinguística, para explicar o código da mensagem, portanto, se o receptor compreende o emissor (JAKOBSON, 1977, p. 123-129). Diante do exposto, é importante notar que qualquer ato comunicativo e, por isso, qualquer publicidade, contém pelo menos em potência, todos os fatores da comunicação e compreende todas as suas funções, contudo, a publicidade nasce, sem dúvida, para exercer principalmente uma função conativa; o seu objetivo é a ação simbólica sobre o destinatário tendente a modificar o comportamento e pensamento deste (VOLLI, 2003, p. 82; grifo do autor). Portando, considerando a relevância da função conativa, nota-se que a função fática do texto é a que primeiro se desenvolve na linguagem publicitária, pois busca-se chamar a atenção do consumidor e estabelecer um canal. Isto é o que Volli compreende como saliência perceptiva, um requisito básico do texto publicitário (VOLLI, 2003, p. 80-81). Já a compreensibilidade diz respeito à função metalinguística, que controla o código usado na mensagem, e também à função poética, relacionada à criatividade do texto e sua organização interna. Quando mais poética for uma mensagem, mais ela arrisca sua compreensibilidade. Por outro lado, se ela respeita demais as regras gramaticais (é voltada

demasiadamente à função metalinguística), a mensagem corre o risco de cair na banalidade (VOLLI, 2003, p. 83-84). Umberto Eco pensa de modo semelhante: A técnica publicitária, nos seus melhores exemplos, parece baseada no pressuposto informacional de que um anúncio mais atrairá a atenção do espectador quanto mais violar as normas comunicacionais adquiridas (e subverter, destarte, um esquema de expectativas retóricas) (ECO, 1987, p. 157). 4. A valorização publicitária Jean-Marie Floch (1993) realizou a mais conhecida categorização das valorizações publicitárias. Para ele, a valorização de um objeto dentro das campanhas publicitárias pode ser baseada em sua utilidade (valorização prática), em seu sentido social (valorização utópica), em sua capacidade de atrair a simpatia e o divertimento do leitor (valorização lúdica) ou em sua conveniência econômica (valorização crítica). Floch toma como ponto de partida a oposição entre valores de base e valores de uso para analisar as estratégias de valorização na publicidade. Essa distinção é muito utilizada em narrações publicitárias, em que frequentemente a personagem, para atingir um objetivo (valor de base), precisa primeiro tomar posse de algum instrumento útil (valor de uso). É importante lembrar que esses objetos, que possuem tanto um valor de uso quanto um valor de base, podem ser materiais ou abstratos (VOLLI, 2003, p. 66). A partir do momento em que se reconhece a contrariedade entre os valores de uso e os de base, é possível identificar quatro grandes tipos de valorização: - a valorização prática, que corresponde aos valores de uso concebidos como contrários aos valores de base (também pode-se dizer valores utilitários, que são a maneabilidade, o conforto, a robustez...); - a valorização utópica, que corresponde aos valores de base concebidos, mais uma vez, como contrários aos valores de uso (também se poderia dizer valores existenciais, que são a identidade, a vida, a aventura...); - a valorização lúdica, que corresponde à negação dos valores utilitários (a valorização lúdica e a valorização prática são, portanto, contraditórias entre elas; os valores lúdicos são o luxo, a gratuidade, o refinamento, a pequena loucura...); - a valorização crítica, que corresponde à negação dos valores existenciais que podem ser atribuídos ao produto (a valorização crítica e a existencial são contraditórias, as relações qualidade/preço ou inovação/custo são valores críticos) (FLOCH, 1993, p. 147-148).

Floch dispõe então as valorizações em um quadrado semiótico, ilustrando a posição das valorizações e suas relações de negação e de contradição (Figura 5): Figura 5: Quadrado semiótico das valorizações publicitárias Fonte: FLOCH, 1993, p. 148 O quadrado semiótico é uma representação gráfica do que ocorre ao nível fundamental das estruturas semio-narrativas, ou seja, das estruturas mais fundamentais e abstratas, entretanto fundamentais, da geração de sentido (FLOCH, 1993, p. 142). Pode-se observar que as valorizações situadas no lado horizontal superior referem-se às valorizações propostas pelo próprio produto, enquanto as situadas na zona inferior dizem respeito à comunicação. As situadas à esquerda referem-se a propriedades reais, concretas. Já as da direita dizem respeito a qualidades imateriais (VOLLI, 2003, p. 68). Floch (1993) também admite uma conciliação entre os valores de base e de uso. Ele usa como exemplo um anúncio do automóvel Simca 1100 TI, de 1973, apresentado em dois planos: no plano superior do anúncio, o carro é exibido em meio ao cenário natural, seguido da frase O carro que você deseja ; já no plano inferior do anúncio, é exibido o desenho técnico do mesmo automóvel, seguido de explicações sobre suas peças e da seguinte frase O carro que você necessita. Por fim, o anúncio termina com a seguinte frase: Seu desejo e sua necessidade finalmente de acordo. Não é preciso aprofundar a análise para perceber a relação entre desejo/necessidade e valores de base/valores de uso. Seria como juntar o útil ao agradável, ou com o poder ao mesmo tempo, dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, ser aventureiro e ao mesmo estar inscrito em uma seguridade social (FLOCH, 1993, p. 147).

Recentemente a Honda lançou um spot publicitário semelhante, mostrando o automóvel Fit percorrendo o cérebro humano. Por meio do conceito Pense, compre um Fit. Não pense, compre um Fit, a campanha buscou mostrar que o produto agrada os dois hemisférios do cérebro (o lado racional e o lado emocional), portanto, o produto agrada tanto aqueles compradores motivados por valores de uso quanto aqueles motivados por valores de base. A mesma ideia é notada no anúncio do Volkswagen Jetta (Figura 6), cujo objetivo também é agradar os dois tipos de valorizações. De um lado, todas as características funcionais do carro tentam persuadir o leitor que preza pela valorização crítica; do outro, a imagem externa do carro, seguida da expressão Uia!, conota que sua aparência é suficiente para agradar aqueles que apreciam um carro elegante (valorização lúdica). Figura 6: Anúncio do Volkswagen Jetta Fonte: <https://qtalmarketing.files.wordpress.com/2011/06/jetta3.jpg>. Acesso em 16 de agosto de 2015. 5. A narrativa publicitária Assim como uma estrutura geológica, a geração de sentido possui níveis diferentes de complexidade de significações (FLOCH, 1993, p. 140). Após entender como se dão as valorizações dentro de um discurso, é necessário compreender também sua estrutura narrativa. Os tipos de valorização esquematizados por Floch no tópico anterior são

percebidos através do esquema narrativo dos roteiros publicitários, segundo uma hipótese de caráter muito amplo que vê na narração um mecanismo muito propagado, se não mesmo universal, de geração de sentido (VOLLI, 2003, p. 106). Em um mesmo spot publicitário, por exemplo, no caso do anúncio do automóvel Citroen BX analisado por Floch (1993), é possível notar claramente três tipos de valorizações distintas que se negam ao mesmo tempo em que fazem parte da sequência lógica do roteiro narrativo. O esquema narrativo canônico é um modelo hipotético da estrutura geral da narrativa. Cumpre o papel de ser a organização de referência a partir da qual são examinadas as expansões e variações, bem como estabelecidas as comparações entre as narrativas (BARROS, 1990, p. 36). Vejamos então o esquema narrativo canônico formulado pela semiótica gerativa greimasiana (Figura 7): Figura 7: Estrutura sintagmática da narrativa Fonte: VOLLI, 2003, p. 106. Este esquema baseia-se na ideia de que toda narração consiste em uma determinada performance (ação) de um sujeito estimulado por um objeto de valor (material ou abstrato) como, por exemplo, a riqueza ou a mulher amada. Mas para esse sujeito desejar ou necessitar esse objeto, é necessária uma manipulação, estabelecendo um contrato em que o sujeito se compromete a conseguir o objeto. A manipulação do sujeito pode ocorrer de quatro formas que são bem exemplificadas a partir da relação entre mãe e filho: através da provocação ( duvido que você seja capaz de comer todo o espinafre ); da intimidação ( coma tudo senão você apanha ); da tentação ( se você comer tudo, a mamãe leva você para ver o filme da Mônica ); e da sedução ( você é um menino tão bonito e que gosta tanto da mamãe, você vai comer tudo, não é? ). O tipo de manipulação dependerá da relação entre o manipulador e o manipulado (BARROS, 1990, p. 30).

A fase da manipulação também estabelece o dever (necessidade) e o querer (desejo) do sujeito para que ele realize a ação. Porém, o sujeito não pode agir sem uma ajuda; ele precisa adquirir uma competência, um poder ou um saber, para então conseguir o objeto desejado por meio da performance. A fase final da conquista é chamada no esquema narrativo de sanção. A sanção pode ocorrer de duas formas: por meio da interpretação, quando o sujeito da ação é julgado para comprovar se realizou ou não a ação proposta na fase da manipulação; ou por meio da retribuição, quando o sujeito recebe uma recompensa por executar sua missão, ou uma punição por não cumprir com suas obrigações assumidas na hora da manipulação (BARROS, 1990, p. 33-35). Mesmo que todas as fases não estejam explícitas na narração, uma pressupõe a anterior. Se uma história começa com um herói a procura de um objeto, por exemplo, há de se supor que o contrato entre ele e um fator de manipulação já esteja feito. Sendo assim, apesar do esquema da narração se apresentar basicamente como o mesmo, ele pode variar, explorando mais ou menos cada fase. A respeito das narrativas publicitárias, Volli identifica três formas freqüentes de explorar o sistema narrativo: (1) contrato-sanção, onde a marca propõe explicitamente um contrato ao cliente apresentado como passivo e comprometido a realizar a performance exigida para então mostrar uma sanção positiva decorrente da satisfação do cliente por confiar na marca; (2) competência, onde o anúncio se foca não no produto, mas nas competências da marca, geralmente as exibindo em uma performance e mostrando que, ao obtê-las, o consumidor conquista o sucesso; e (3) sanção-pura, centrada unicamente no prazer que o consumidor pode desfrutar ao adquirir determinado produto (VOLLI, 2003, p.108-109). 6. A enunciação publicitária A análise da enunciação pretende estudar como se dão as diferentes formas nas quais o texto pode se apresentar, ou seja, as formas de manifestação textual por parte do enunciador. Para a semiótica, trata-se do nível mais rico e mais complexo semanticamente: As estruturas narrativas convertem-se em estruturas discursivas quando assumidas pelo sujeito da enunciação. O sujeito da enunciação faz uma

série de escolhas, de pessoas de tempo, de espaço, de figuras, e conta ou passa a narrativa, transformando-a em discurso. O discurso nada mais é, portanto, que a narrativa enriquecida por todas essas opções do sujeito da enunciação, que marcam os diferentes modos pelos quais a enunciação se relaciona com o discurso que enuncia. A análise discursiva opera, por conseguinte, sobre os mesmos elementos que a análise narrativa, mas retoma aspectos que tenham sido postos de lado, tais como as enunciações no enunciado, os recursos de persuasão utilizados pelo enunciador para manipular o enunciatário ou a cobertura figurativa dos conteúdos abstratos (BARROS, 1990, p. 53-54). Analisar o discurso é, portanto, analisar as condições de produção do texto e as relações entre o enunciador e enunciatário. Tais relações dizem respeito a condições e papeis sociais bastante complexos (BARROS, 1990, p. 54). Os textos são dotados de certa autonomia, ou seja, a partir do momento em que são produzidos, se tornam independentes de quem os produziu e daqueles para os quais se dirigem. Eles se tornam públicos, passíveis de más interpretações, de ser ignorado, adorado, copiado, etc. Entretanto, os textos conseguem simular em seu interior um enunciador e um enunciatário. Esse fenômeno é chamado de embreagem, e procura reproduzir os efeitos reais que um texto pode gerar (VOLLI, 2003, p. 95). Para representar o enunciador, o texto pode recorrer a assinaturas ou, no caso da publicidade, à marca de um produto. Já para representar um possível leitor, ele tenta atender ao máximo as expectativas do seu potencial receptor-alvo, gerando assim a identificação entre o leitor-modelo e o leitor-real (VOLLI, 2003, p. 95-96). Para simplificar essa relação podemos chegar a uma equação da enunciação que não se aplica somente à publicidade, mas a todos os outros campos da comunicação: E¹ [E² (E³ D³) D²] D¹ Nesta equação, o enunciador real é representado por E¹. Ele seria, por exemplo, um empresário anunciante, além da agência contratada. No entanto, ele próprio não aparece no anúncio, sendo personificado pela sua marca (E²) que, por sua vez, se utiliza de um apresentador (E³). O apresentador divulga determinado produto a um destinatário-modelo (D³), que poderia ser representado por uma dona de casa (D²), por exemplo, que tenta ao

máximo se identificar com o público-alvo, ou seja, com os destinatário-reais (D¹) que assistem ao spot televiso (VOLLI, 2003, p. 97). Essa equação apresenta uma estratégia textual na qual o emissor-real tenta criar um modelo de destinatário que atenda aos mesmos desejos e gostos do destinatário-real. É importante notar que eles não se correspondem, mas quanto mais os dois se identificarem tantro mais eficaz é o anúncio (VOLLI, 2003, p. 98-99). Nos textos publicitários essa representação do destinatário real é geralmente exagerada: a personagem da publicidade sempre está mais feliz, mais bela e mais eufórica do que seu correspondente real. Algumas características da personagem, como classe social e nacionalidade, não são representadas a fim de melhor estabelecer essa identificação. Na verdade, o que mais importa para que esse processo seja bem sucedido não são tanto as características da personagem, mas suas relações perante a sociedade (ser identificada como mãe, esposa, etc.). O objetivo é criar, a partir dessas relações, uma narração que associe o destinatário real com os valores da oferta comercial do enunciador (VOLLI, 2003, p. 101). O distanciamento por meio de enunciatários fictícios tem o papel de distanciar o enunciador real do destinatário real, disfarçando assim as reais intenções consumistas por trás do discurso aparentemente objetivo. Quem vai proporcionar a felicidade prometida em determinado anúncio não é determinado produto, mas sim o próprio investimento do consumidor na mercadoria. Após estabelecida a identificação entre o destinatário real e o personagem do anúncio, são utilizados mecanismos de estímulos de desejo, o chamado desejo mimético, ou seja, o desejo que se projeta sobre o desejo do outro. Trata-se do desejo de ser desejado por outro ou simplesmente do desejo de desejar a mesma coisa que os outros. Esse desejo, projetado sobre o destinatário através da identificação com o personagem da narração, somente é saciado, ou melhor, transformado em prazer, através da obtenção de determinado objeto, acarretando assim o consumo (VOLLI, 2003, p. 102-103). O desejo costuma ocupar o lugar inicial nos anúncios, aquele que, no nível narrativo, é atribuído ao contrato, enquanto o prazer constitui a sanção final do processo (VOLLI, 2003, p. 103). Esse mecanismo de identificação entre o leitor real e o leitor-modelo também está muito presente nos textos visuais, no qual entra em jogo a relação observado/observador. O ponto de vista retratado na imagem pode atribuir ao observador diferentes posições que

ultrapassam o espaço virtual do cartaz e passam para a dimensão real do destinatário. Um enquadramento de cima para baixo, por exemplo, põe o observador em uma relação de submissão, enquanto que uma visão de cima para baixo o coloca em uma relação de poder. Segundo Volli, essa dimensão espacial faz referência, em certo grau, à discussão de papéis sociais (VOLLI, 2003, p. 103-105). 6. Conclusão Neste artigo apresentamos de forma sucinta o que chamamos de quinta fase dos estudos sobre a semiótica da publicidade, dando continuidade a proposta original de Souza e Santarelli (2008). Isto significa uma longa história que começa em seus textos bases, atribuídos a Barthes e Eco, até como a conhecemos atualmente, como ferramenta para a construção de peças publicitárias. Compreendê-la de forma orgânica como Volli propõe é fundamental para analisarmos sua aplicação no sistema de comunicação de massa atual, e também como ela se relaciona fundamentalmente com vários aspectos de nossa vida cotidiana, com nossos parâmetros de beleza, idealizações e valores sociais, mas, sobretudo, com o consumo. REFERÊNCIAS BARROS, D. L. P. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 1990. BARTHES, R. A aventura semiológica. Lisboa: Edições 70, 1987.. O óbvio e o obtuso: ensaios críticos III. Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1990. ECO, U. A estrutura ausente. São Paulo: Perspectiva, 1987. FLOCH, J.-M. Semiótica, marketing y comunicación: bajo los signos, las estrategias. Buenos Aires: Paidós, 1993. LONDERO, R. R. Teorias da publicidade na América Latina: a perspectiva da recepção em Eliseo Verón. In: MORAES, A. L. C.; LISBÔA FILHO, F. F.; BARCELLOS, M. A. (orgs.). História da mídia: campos da publicidade e da comunicação institucional. Santa Maria: FACOS-UFSM, 2013. PÉNINOU, G. Semiótica de la publicidad. Barcelona: Gustavo Gili, 1976. JAKOBSON, R. Linguística e poética. In: Linguística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1977.

JOLY, M. Introdução à analise da imagem. Campinas: Papirus, 1996. SANTAELLA, L.; NOTH, W. Estratégias semióticas da publicidade. São Paulo: Cengage Learning, 2010. SOUZA, S. M. R.; SANTARELLI, C. P. G. Contribuições para uma história da análise da imagem no anúncio publicitário. Intercom Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, São Paulo, v. 31, n. 1, p. 133-156, jan./jun. 2008. VOLLI, U. Semiótica da publicidade: a criação do texto publicitário. Lisboa: Edições 70, 2003.