Capítulo 4 AÇÕES DE RECUPERAÇÃO EM APRM: PROJETOS DE URBANIZAÇÃO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO 4.3.1 O Bairro Ecológico Jardim Canaã O loteamento Jardim Canaã 17 está localizado na Estrada Galvão Bueno, no Bairro Jardim da Represa, ocupando uma gleba com área de aproximadamente 173.666,95 m² de propriedade da Associação Comunitária Nova Canaã e também responsável por sua implantação. (SHAMA, 2002) O loteamento foi implantado às margens da represa Billings e ainda apresenta resquícios de vegetação natural e uma lagoa, que estão sendo degradados pelo uso e ocupação indiscriminados e predatórios de moradores e das atividades de lazer. (FIGURAS 4.3 e 4.4) O loteamento possui 14 quadras, 570 lotes, 67.392,48 m² de área verde, da qual 50.857,72 m² em área de 1ª Categoria, 7.000 m² de área institucional e 23.793,75m² de vias de circulação, e é dotado de rede de água, energia elétrica e iluminação pública. Os moradores da área correspondente a 1ª Categoria foram removidos e do mesmo modo, o comércio ilegal e as atividades de lazer às margens da represa e da lagoa. Ali, pretende-se implantar o Parque Ecológico do Jardim Nova Canaã, como medida de recuperação paisagística e ambiental das margens da Billings. Lagoa Projeto - Parque Remanescente de mata natural Figura 4.3. Jardim Canaã. margens da represa Billings, a lagoa e o loteamento Fonte: Google Earth 17 Os dados apresentados do Jardim Canaã foram extraídos do Processo nº SB/27.597/02/54 Projeto de Intervenção para Educação e Compensação Ambiental. (SHAMA). O processo foi aberto em 2002 e o TAC foi firmado em 14/12/2002. A visita ao Jardim Canaã teve o acompanhamento do funcionário da SHAMA, Marinaldo Faustino Negreiros, o Nardo, e ocorreu em 22.Out.2008. 139
MANANCIAIS E URBANIZAÇÃO. Recuperação Ambiental na Sub-bacia Billings: Os Bairros Ecológicos em São Bernardo do Campo, São Paulo (1997 a 2007) Figura 4.4. Obras do Rodoanel devastação em área vizinha ao bairro Fonte: ITIKAWA, 05.Nov.2008 A Associação de moradores, ex-proprietários e prefeitura discutem os termos para o acordo a ser firmado com o Ministério Público, conforme Figura 4.5. Figura 4.5. Participação da Comunidade do Jardim Canaã na Assinatura do TAC Fonte: SHAMA (2002) Pelo acordo firmado, a Associação Comunitária comprometeu-se a retificar a área total do terreno em Cartório de Registros de Imóveis; conceder os títulos de compra e venda dos lotes; doar as áreas de rua e de espaços institucionais ao município; e recomprar os lotes onde se encontra a nascente (cotizados entre os moradores). A Associação e os ex-proprietários, a JF Medina Braga Participação e Administração Ltda. e OMAT Participações Ltda., comprometeram-se a apresentar as diretrizes técnicas gerais para a realização de intervenção urbanística: controle de erosão e do assoreamento, drenagem de águas pluviais, calçamento ecológico, saneamento básico incluindo o cadastro de rede de água existente (FIGURA 4.6), paisagismo, arborização das vias, recuperação do entorno da lagoa (FIGURA 4.7) e da área de 1ª Categoria da represa Billings, recuperação e revegetação da nascente existente no local. O poder público, por sua vez, comprometeu-se a assessorar na implantação das calçadas ecológicas; fiscalizar para coibir a expansão e adensamento, impedir o acesso às áreas revegetadas e o comércio irregular na orla da represa; promover ou subsidiar campanha de educação ambiental (FIGURA 4.8); executar e manter sistemas de drenagem; implantar rede coletora de esgotos dotada de estações elevatórias; e, monitorar a qualidade das águas superficiais drenadas. O Movimento em Defesa da Vida do Grande ABC MDV, por outro lado, comprometeu-se a colaborar propondo e participando de campanhas e movimentos em defesa do ambiente; realizar ações de educação ambiental; e, monitorar o cumprimento dos termos acordados. 140
Capítulo 4 AÇÕES DE RECUPERAÇÃO EM APRM: PROJETOS DE URBANIZAÇÃO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO Figura 4.6. Antes da implantação do programa, o esgoto corria a céu aberto Figura 4.7. Vista do lago Figura 4.8. Reunião da prefeitura com a comunidade Figura 4.9. Terrenos recomprados para preservar uma nascente Figura 4.10. A calçada ecológica 141
MANANCIAIS E URBANIZAÇÃO. Recuperação Ambiental na Sub-bacia Billings: Os Bairros Ecológicos em São Bernardo do Campo, São Paulo (1997 a 2007) Das ações empreendidas destacam-se as seguintes: pavimentação, calçada ecológica (FIGURA 4.9), participação da comunidade, e a preservação da nascente 18 (FIGURA 4.9). Importante ressaltar que somente a preservação da lagoa não foi eficaz, atualmente completamente eutrofizada 19 (FIGURA 4.11). Nesse loteamento, os reflexos das obras do Rodoanel são visíveis: o aterramento de um braço da represa e o desmatamento da parte mais preservada da mata vizinha ao loteamento. (FIGURAS 4.12, 4.13 e 4.14) Figura 4.11. O lago encontra-se eutrofizado Figura 4.12. As obras do Rodoanel na represa Figura 4.13. Moradores não têm acesso à prainha. Figura 4.14. Vista das obras do Rodoanel 18 A nascente que esta localizada num dos lotes e foi preservada por meio da recompra dos lotes envolvidos. 19 Eutrofização: (s.f. Geoq.) : Enriquecimento das águas superficiais por compostos nutrientes, em particular os nitrogenados e fosforados, que levam a um grande crescimento de algas e outras espécies vegetais aquáticas. A morte e apodrecimento desta flora aquática provoca um grande consumo do oxigênio dissolvido no corpo de água, levando à morte os animais por asfixia. As principais fontes de efluentes e produtos que provocam a eutrofização são: esgotos humanos, fezes de animais domésticos, em particular bovino, suíno, fertilizantes, efluentes de certas indústrias, em especial: papel e pasta de celulose, destilarias para a produção de álcool e bebidas alcoólicas, abatedouro e processamento de produtos de origem animal, produção de açúcar, curtumes, entre outras. Disponível em: http://www.dicionario.pro.br/dicionario/index.php?title=eutrofiza%c3%a7%c3%a3o. Acesso em: 20 Nov.2008. 142
Capítulo 4 AÇÕES DE RECUPERAÇÃO EM APRM: PROJETOS DE URBANIZAÇÃO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO 4.3.2 O Bairro Ecológico Nosso Senhor do Bonfim O loteamento Nosso Senhor do Bonfim localiza-se às margens da rodovia dos Imigrantes e possui 249 edificações 20. É pequeno em relação aos loteamentos anteriormente citados, e está em bom estado de conservação. Figura 4.15. Jardim Senhor do Bonfim Fonte: Google Earth Não foi possível localizar o processo referente a esse loteamento, exceto o de implantação das ações de compensação ambiental (Processo nº RR981/2000), sendo assim, a pesquisa foi baseada em depoimentos de Vera Rotondo 21 e Marinaldo Faustino Negreiros 22, o Nardo. Segundo Vera Rotondo, a participação dos moradores é fundamental para a implantação do programa. A conscientização da comunidade é feita por meio de reuniões, campanhas, palestras, cursos e folhetos sobre educação ambiental. Para ela, o trabalho de convencimento é árduo e requer muita persistência. 20 Disponível em: http://www.camarasbc.sp.gov.br/camara_materia.asp?id=3312. Acesso em: 20 Out.2008. 21 Vera Rotondo é ambientalista, fundou um Movimento Ecológico, o Terra Viva, por meio da qual lutou e protestou contra o bombeamento do Rio Pinheiros para a Billings; atualmente é Chefe de Divisão de Educação Ambiental e uma das coordenadoras do Programa Bairro Ecológico. Concedeu entrevista em 09 Set. 2008 22 A visita ao Bairro Ecológico Nosso Senhor do Bonfim teve acompanhamento de funcionário da SHAMA, Marinaldo Faustino Negreiros, e ocorreu em 22.Out.2008. 143
MANANCIAIS E URBANIZAÇÃO. Recuperação Ambiental na Sub-bacia Billings: Os Bairros Ecológicos em São Bernardo do Campo, São Paulo (1997 a 2007) O papel da liderança é fundamental. Nesse bairro, em especial, segundo Nardo, o líder Luis de Deus Tavares tem presença marcante. O fato de o loteamento ser um dos mais agradáveis dentre os bairros ecológicos deve-se a sua supervisão. Luis apaixonou-se pela luta e acabou por fazer curso de Gestão Ambiental para poder entender e administrar melhor o seu bairro. O loteamento havia sido implantado sem qualquer preocupação ambiental, ruas sem pavimentação (FIGURA 4.15), esgoto sendo lançado diretamente no córrego (FIGU- RA 4.16) e movimentações de terra, que deixaram o solo exposto às intempéries com risco de deslizamentos (FIGURA 4.17). Com o esclarecimento do líder, e o apoio de outros moradores, conseguiu-se afastar dali atividades incompatíveis com a manutenção do asfalto ecológico, como por exemplo, uma oficina mecânica, que poderia impermeabilizar a pavimentação com o óleo. Outra ação importante foi a preservação de uma nascente (FIGURA 4.19), impedindo que desse lugar se originasse uma rua. Agora, ela escoa languidamente pelo bairro e às suas margens encontram-se áreas de lazer e descanso com mesas e bancos para piqueniques. (FIGURA 4.20). As moradias apresentam-se com padrões construtivos distintos, desde as mais simples até as de padrão médio ou médio-alto. Segundo Nardo, as casas bem construídas chegam a custar R$ 100 mil ou mais (FIGURA 4.21). Figura 4.16. As ruas não tinham pavimentação Figura 4.18. Antes da implantação do programa havia encostas desprotegidas Figura 4.17. O esgoto era lançado diretamente no córrego 144
Capítulo 4 AÇÕES DE RECUPERAÇÃO EM APRM: PROJETOS DE URBANIZAÇÃO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO Figura 4.19. Mata e nascente preservadas Figura 4.20. Mesas e bancos para piquenique ao longo do córrego Figura 4.21. Casas com três pavimentos de bom padrão construtivo 4.3.3 O Bairro Ecológico João de Barro O loteamento João de Barro está localizado na Avenida João de Barro, no Bairro dos Alvarenga situado a aproximadamente 10 km do centro do município. Tratando-se de um loteamento irregular situado em APRM da represa Billings, na Sub-bacia Lavras/ Alvarenga. (FIGURA 4.22) Figura 4.22. João de Barro Fonte: Google Earth 145
MANANCIAIS E URBANIZAÇÃO. Recuperação Ambiental na Sub-bacia Billings: Os Bairros Ecológicos em São Bernardo do Campo, São Paulo (1997 a 2007) A gleba pertencia a Almiro de Oliveira Sales, que a cedeu à Associação de Construção Comunitária Por Mutirão João de Barro, com área registrada de 225.000 m². Porém, a área ocupada excede à descrita, abrangendo outras duas áreas lindeiras. No Núcleo João de Barro tentam-se sistematizar as ações consideradas características do Programa Bairro Ecológico antes realizadas de acordo com a necessidade. Para tanto, foi contratada uma empresa para desenvolver os projetos de drenagem, geométrico, paisagismo e urbanização, objetivando alcançar a regularização fundiária. Conforme informações do arquiteto Claudionor Camillo, da SHAMA, o projeto ainda está no início de sua implantação. Esse processo não é muito pacífico, ocorrendo certa resistência por parte de alguns moradores, devido ao fato de terem que ceder em seus posicionamentos para o bem da comunidade. Ainda segundo Camillo, num loteamento regular, as obras de infra-estrutura antecedem a compra dos lotes, o que não acontece nos irregulares. A implantação desses serviços ocorre posteriormente, com as famílias morando no local. Assim, a implantação do projeto tem que se submeter à realidade local. No caso da pavimentação é necessário o nivelamento da rua e como as casas foram construídas aleatoriamente, algumas ficam acima do nível e outras abaixo. (FIGURA 4.23) Algumas construíram escadas de acesso no passeio público, o que dificulta ou impossibilita a circulação de pedestres. Para implementação das ações é imprescindível a colaboração de todos, moradores e prefeitura, para que haja um equacionamento entre os interesses individuais e os coletivos. Para tanto, é necessária a conscientização dos moradores em relação à sua importância no processo para melhoria da qualidade de vida e do ambiente. Para este loteamento, o Plano Emergencial aprovado previa a execução de infraestrutura constando de: sistema de esgotamento e tratamento de esgoto; drenagem de águas pluviais com retenção e remoção de resíduos sólidos; contenção de erosão com recuperação; pavimentação de vias públicas; tratamento de taludes; passeio público gramado e com plantio de árvores; fornecimento de energia elétrica; desassoreamento de córrego; recomposição vegetal de fundo de vale e áreas de uso comum do loteamento. (FIGURAS 4.24 e 4.25) No TAC firmado, cabe ao Município subsidiar e assessorar nas campanhas de educação ambiental promovidas pela Sociedade de Amigos, orientar na criação de áreas de permeabilidade e, executar emergencialmente o sistema de coleta e tratamento local ou regional de efluentes sanitários, no prazo de 24 meses, em consórcio com as comunidades da região do Alvarenga. Sistema este que funcionará até a implantação 146
Capítulo 4 AÇÕES DE RECUPERAÇÃO EM APRM: PROJETOS DE URBANIZAÇÃO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO Figura 4.23. Via sem pavimentação com terrenos abaixo do nível da rua Figura 4.24. As ruas com maior declividade sem sistema de drenagem sofreram processo de erosão Figura 4.25. Vista do bairro Figura 4.27. Algumas casas de padrão mais elevado contrastam com as mais humildes Figura 4.26. Implantação da calçada ecológica Figura 4.28. Pavimentação das ruas 147
MANANCIAIS E URBANIZAÇÃO. Recuperação Ambiental na Sub-bacia Billings: Os Bairros Ecológicos em São Bernardo do Campo, São Paulo (1997 a 2007) definitiva do sistema de tratamento proposto pela concessionária SABESP para áreas de proteção aos mananciais da Represa Billings. Deve ainda a administração municipal contratar projeto de recuperação ambiental visando identificar as áreas de 1ª categoria e áreas de risco, propondo a adequação do projeto de loteamento à recuperação e proteção das áreas de preservação; a eliminação das áreas de risco e relocação de construções; e o acréscimo de áreas livres para garantia de permeabilidade, institucional e de lazer. No projeto deve ser previsto sistema de monitoramento da quantidade e qualidade das águas superficiais e subterrâneas, visando constante aprimoramento das intervenções, com o acompanhamento da comunidade. Nesse loteamento, as áreas de preservação permanente totalizam 19.304,34m². Dessas áreas serão removidas 64 famílias, 37 das áreas de 1ª Categoria e 27 das áreas de risco geotécnico. Com o objetivo de proteger e aumentar a produção de água e como medida de compensação ambiental mitigação dos impactos ambientais causados pela urbanização, serão implantados: poços de infiltração junto aos passeios/ sarjetas ao longo de todo o sistema viário, a cada 100 metros; passeios gramados e recuperação das áreas vegetadas; arborização das vias com a utilização de espécies tropicais nas áreas de preservação permanente; e dispositivos de drenagem (galerias) com fundo permeável. As galerias de drenagem concebidas de modo tradicional, devido a existência de ruas com declividade acentuada, serão adaptadas conciliando soluções compensatórias aos sistemas convencionais como a mplantação de trincheiras de infiltração, preenchidas com material granular graúdo, em pontos pré-definidos, considerando a estabilidade geotécnica e a desocupação das áreas em risco ou risco potencial, considerando o retaludamento do terreno e a recomposição vegetal. Por enquanto as obras restringiram-se à colocação de guias e sarjetas, à pavimentação das ruas com asfalto ecológico pela prefeitura e à feitura das calçadas ecológicas, que têm que ser executadas pelos próprios moradores. (FIGURAS 4.26, 4.27 e 4.28) Estes bairros escolhidos a priori ajudaram a ilustrar o conjunto de práticas que atualmente vêm sendo implementadas nos Bairros Ecológicos de SBC. Entretanto, é a partir da análise de dois casos específicos, um loteamento irregular o Jardim dos Pinheiros e, uma favela Favela Jardim Carminha, que os principais parâmetros de recuperação de mananciais serão, a seguir, discutidos no capítulo 5. 148