João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016 ESTIMATIVA DAS EMISSÕES DE METANO E ÓXIDO NITROSO DA PRODUÇÃO DE LEITE NO TERRITÓRIO DE IDENTIDADE MÉDIO SUDOESTE DA BAHIA Laurine Santos de Carvalho (IFBA ) laurinecarvalho@hotmailcom Felipe Ungarato Ferreira (FAINOR ) ungarato@yahoocombr Luciano Brito Rodrigues (UESB ) rodrigueslb@gmailcom No presente trabalho as emissões de metano e óxido nitroso em uma fazenda produtora de leite do Território de Identidade Médio Sudoeste da Bahia foram estimadas com o intuito de analisar e utilizar os resultados para apontar os pontos crítiicos da atividade relacionados ao potencial de aquecimento global, bem como sugestões de melhorias, de forma a auxiliar os tomadores de decisão na gestão da produção Visitas in loco e entrevistas não-estruturadas com o produtor rural e com os auxiliares do processo produtivo foram realizadas visando obter a maior quantidade de dados primários possíveis, que representassem o sistema produtivo na propriedade estudada da melhor forma A metodologia proposta pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) foi utilizada para a estimativa dos fatores de emissão Além da metodologia do IPCC, os relatórios de referência do Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação foram utilizados na obtenção das estimativas nacionais para a realização dos cálculos, já que as fornecidas pelo IPCC são para toda a América Latina Os resultados apresentaram uma elevada estimativa de emissões de metano provenientes da fermentação entérica dos animais quando em comparação com outros trabalhos Com relação a esse aspecto, possíveis alterações no regime alimentar do rebanho poderiam contribuir para a redução de tais emissões Além disso, destaca-se também como alternativa o melhoramento genético dos animais com o intuito de aumentar a produtividade através da conversão alimentar, tendo assim uma redução no plantel, bem como das emissões de gases por eles gerados, entretanto, com a manutenção ou aumento da produção de leite Palavras-chave: Gestão Ambiental, Agroindústria, Pecuária
1 Introdução Em todo o mundo, estima-se que a agropecuária seja responsável por aproximadamente 18% do total da emissão de gases causadores do efeito estufa, sendo 9% de dióxido de carbono (CO 2 ), 37% de metano (CH 4 ) e 65% de óxido nitroso (N 2 O) (FAO, 2015) Segundo Slade et al (2016), os Gases de Efeito Estufa (GEE) são os maiores contribuintes para o aquecimento global e alterações climáticas Além disso, estima-se que as emissões de GEE provenientes da agricultura e associadas à mudança no uso da terra contribuíram com 30% das emissões antropogênicas globais em 2010 (SLADE et al, 2016) Desse total de emissões, a produção de gado contribui com cerca de dois terços (Figura 1a), com emissões diretas que emanam principalmente da fermentação entérica bovina (Figura 1b) Estima-se ainda que a produção de carne e leite seja responsável por 60% das emissões totais de produção agropecuária (Figura 1c) Figura 1 - Contribuições globais para as emissões diretas de GEE pela agropecuária a) Contribuições para todas as emissões agrícolas diretas com as emissões da produção pecuária dividida em duas formas alternativas: b) de acordo com os diferentes tipos de emissões e c) diferentes tipos de gado Fonte: Slade et al (2016) O metano produzido a partir da fermentação entérica é considerado uma das principais causas de produção GEE globalmente A produção de CH 4 é parte do processo digestivo dos herbívoros ruminantes e ocorre no rúmen (PEDREIRA e PRIMAVESI, 2011) O óxido nitroso é um GEE cuja concentração na atmosfera aumenta a uma taxa de 0,26% ao ano 2
(BRASIL, 2010a) Acredita-se que a tendência de aumento das concentrações de N 2 O irá continuar nas próximas décadas, principalmente pela expansão da área agrícola nos países em desenvolvimento, aos quais se associa o crescente consumo de fertilizantes nitrogenados Os fatores de emissão fornecem um indicativo da quantidade de GEE que são emitidos a partir de uma determinada fonte ou atividade e podem ser obtidos através dos métodos desenvolvidos pelo IPCC (2006a,b) Porém, tais métodos não estimam as emissões de CO 2, pois, as emissões anuais de dióxido de carbono líquido são assumidas como zero, onde, o CO 2 usado na fotossíntese pelas plantas é devolvido para a atmosfera como CO 2 respirado Entretanto, uma porção de carbono é retornado como metano e por este motivo requer uma consideração separada (IPCC, 2006a) As formas para estimar as emissões de CH 4 e N 2 O são diferenciadas de acordo com a sua precisão e detalhes A abordagem Tier 1 é indicada quando faltam fatores de emissão específicos para o país, ou limitações quanto aos dados de atividade A Tier 2 é aconselhada quando existem fatores de emissão disponíveis específicos para as principais condições do país ou região e/ou maior detalhamento para os dados das atividades A Tier 3, se refere ao uso de procedimentos metodológicos desenvolvidos especificamente pelo país, que podem incluir modelagem e maior detalhamento das medidas dos inventários Diante do contexto apresentado, no que tange à problemática da emissão de GEE da produção de leite, este trabalho foi realizado com o intuito de estimar as emissões de metano e óxido nitroso em uma propriedade rural do Território de Identidade Médio Sudoeste da Bahia, bem como propor sugestões de melhorias na atividade que permitam a redução das emissões de GEE, de forma a auxiliar os tomadores de decisão na gestão da produção 2 Metodologia A pesquisa realizada com este trabalho classifica-se, quanto à natureza, como aplicada e quanto à abordagem do problema, como qualitativa e quantitativa Com relação aos objetivos, esta pesquisa pode ser classificada como exploratória, descritiva e explicativa Para o local de estudo, uma fazenda produtora de leite bovino foi definida como modelo representativo, devido ao seu volume de produção e nível de tecnologia superiores em relação às demais propriedades existentes na região A coleta de dados foi efetuada através de visitas in loco e entrevistas não-estruturadas com o produtor rural e com os auxiliares da produção, sendo realizada a caracterização da 3
propriedade, através da identificação do tamanho da propriedade, da produtividade, do rebanho e do sistema de produção A fazenda compreende uma área de 67,8 hectares, com um rebanho de 128 animais composto por 52 vacas em lactação, 38 vacas secas, 18 novilhas e 20 bezerras Os animais são criados em sistema semi-intensivo, que consiste em pasto com suplementação com concentrado Durante a coleta de dados, a produtividade média de leite era de aproximadamente 970 litros por dia (6808,65 litros/vaca/ano) Há o cultivo de palma e milho para a produção do volumoso e da silagem A área de pasto irrigado compreende 11 hectares O pastejo é rotacionado com a área dividida em 100 piquetes, onde são usados três tipos de gramíneas, a saber: Mombaça, Xaraés MG5 e Tifton A pastagem é adubada anualmente com nitrogênio (ureia) e super simples (16% a 18% de P 2 O 5 e 18% a 20% de Cálcio) Os animais são alimentados de acordo com a categoria representada No caso das vacas com maior produtividade, além do pasto, a dieta é suplementada com o fornecimento de concentrado a base de milho As vacas de produtividade intermediária têm a dieta composta por pastagem, enquanto que aquelas com menor produtividade se alimentam de resíduos da pastagem A ordenha é mecânica e ocorre em dois períodos, durante a manhã todas as vacas em lactação são ordenhadas Um segundo período de ordenha é realizado à tarde com as vacas em lactação que possuem maior produtividade O leite obtido é resfriado em tanque com volume nominal de 2050 litros e destinado em dias alternados às indústrias de laticínios da região para processamento A Figura 2 apresenta um diagrama da produção de leite na fazenda estudada levando em consideração as emissões de GEE estimadas neste trabalho, as entradas (insumos) e saídas (resíduos, efluentes, emissões, carne e leite) da produção As emissões consideradas no estudo foram as provenientes da fermentação entérica (metano), dos dejetos (metano e óxido nitroso), e fertilização das pastagens (óxido nitroso) Figura 02 Sistema de produção na fazenda estudada 4
21 Fatores de emissão Para obtenção dos fatores de emissão de CH 4 provenientes da fermentação entérica, bem como do manejo dos dejetos foi utilizado o método Tier 2 contido no décimo capítulo do quarto volume das Diretrizes para Inventários Nacionais de Gases de Efeito Estufa do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC): Agriculture, Forestry and Other Land Use Emissions From Livestock and Manure Management (IPCC, 2006a) Destaca-se que para comparação com estudos nacionais, realizados por Olszensvski (2011), a emissão de metano proveniente do manejo de dejetos também foi estimada pelo método Tier 1 do referido volume O capítulo 11 (Agriculture, Forestry and Other Land Use - N 2 O Emissions from Managed Soils, and CO 2 Emissions from Lime and Urea Application (IPCC, 2006b)), do volume 4 foi utilizado para estimar as emissões de N 2 O provenientes do uso da fertilização nitrogenada e do manejo dos dejetos na fazenda estudada, que são depositados no solo conforme são produzidos Além das equações do IPCC, os relatórios de referência do Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação (BRASIL, 2010a,b) foram utilizados na obtenção das estimativas nacionais para a realização dos cálculos, já que as fornecidas pelo IPCC são para toda a América Latina A seguir são apresentadas as equações que foram utilizadas para os cálculos dos fatores de emissão 211 Fermentação entérica 5
Os fatores de emissão de metano gerados pela fermentação entérica para cada uma das categorias animais (vacas, novilhas, bezerras) são apresentados pela Equação 01 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): FE FE é o fator de emissão de metano pela fermentação entérica; EB é a ingestão de Energia Bruta; e Y m é a taxa de conversão do metano (0,06 de acordo com IPCC (2006a)) A Equação 02 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a) foi utilizada para o cálculo da ingestão de energia bruta (EB) para cada categoria animal: NE m é a energia necessária para a manutenção; NE a é a energia necessária para a atividade; NE l é a energia necessária para a lactação; NE t é a energia necessária para o trabalho, calculada apenas para os animais de tração, considerada para as categorias animais deste trabalho como zero; NE g é a energia necessária para a gestação; NE c é a energia necessária para o crescimento; RND é a razão da energia líquida, consumida para manutenção, lactação, trabalho e gestação, para a energia digerível consumida; RNDc é a razão entre a energia líquida consumida para o crescimento e a correspondente energia digerível consumida; e DE é a Digestibilidade do alimento fornecido Para o gado de leite, a energia requerida para a manutenção (NE m ) é apresentada pela Equação 03 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): 6
W é o peso do animal (kg) (Tabela 01); Tabela 01 - Dados do rebanho leiteiro nacional Fonte: Brasil (2010a) A energia líquida necessária para a atividade (NE a ) é avaliada como uma parte da energia requerida para a manutenção, conforme observado pela Equação 04 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): Para o cálculo da energia líquida necessária para a lactação (NE l ) a Equação 05 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a) foi utilizada: PL é a produção de leite (kg/cabeça/dia); e %G é o percentual de gordura do leite (4,3% conforme relatório BRASIL (2010a)) A energia líquida necessária para a gestação (NE g ) é representada como uma fração da energia líquida necessária para a manutenção e pôde ser obtida através da Equação 06 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): 7
PR é a taxa de prenhez (%) (Tabela 01) A energia líquida necessária para o crescimento (NE c ) é avaliada apenas para os bovinos jovens e foi obtida através da Equação 07 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): W é o peso do animal; WG é o ganho de peso do animal jovem (kg/cabeça/dia) Os Valores de RND e RNDc foram obtidos pelas Equações 08 e 09 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a) respectivamente: 212 Manejo de dejetos Para o cálculo dos fatores de emissão de metano provenientes do manejo dos dejetos animais (FE ME ) a Equação 10 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a) foi utilizada, sendo calculada para cada uma das categorias animais avaliadas EDsv é a excreção diária média de sólidos voláteis, por animal, para cada categoria (kg/cabeça/dia); BOi é a capacidade máxima de produção de metano para os dejetos produzidos pelo animal (m³ CH 4 /kg) Para o gado leiteiro, foi utilizado o valor padrão (IPCC, 2006) para países em desenvolvimento (0,13 m³ CH 4 /kg); MCF é o fator de conversão de metano para o sistema de manejo de dejetos, considerando o clima da região (2,0% conforme IPCC, 2006a); 8
MS é a fração de animais por categoria, relacionada ao sistema de manejo de dejetos na região A excreção diária média de sólidos voláteis (ED sv ), em kg matéria seca (MS)/dia, é obtida pela Equação 11 (IPCC, 2006a; BRASIL, 2010a): EB é a ingestão diária média de energia bruta (MJ/cabeça/dia); De é a taxa de digestibilidade do animal (%); e ASH é a fração do conteúdo de cinzas nos dejetos produzidos pelo animal, foi utilizado o valor padrão (IPCC, 2006) (8%) 213 Emissões nitrogenadas As emissões diretas de N 2 O ocorrem pela adição aos solos de fertilizantes sintéticos (F SN ) e estercos animais (F AM ), pelo cultivo de plantas fixadoras de N 2 (F BN ), pela incorporação no solo de resíduos de colheita (F CR ), e pela mineralização de nitrogênio associada ao cultivo de solos orgânicos (F OS ) Em síntese, as emissões diretas de N 2 O de solos agrícolas pelo Tier 1 são calculadas pela Equação 12 (IPCC, 2006b; BRASIL, 2010b): N- N 2 O é a emissão direta anual de N 2 O de solos agrícolas; F SN é a quantidade anual de Nitrogênio (N) como fertilizante nitrogenado aplicada ao solo, descontadas as quantidades de N que volatilizam como NH 3 e NO x ; F AM é a quantidade anual N em estercos animais, intencionalmente aplicada ao solo, descontadas as quantidades de N que volatilizam como NH 3 e NO x ; F BN é a quantidade de N fixado biologicamente por culturas a cada ano; F CR é a quantidade de N em resíduos de colheita que retornam anualmente ao solo; F OS é a área de solos orgânicos cultivada anualmente; 9
FE 1 é o fator de emissão direta de N 2 O aplicado as quantidades de N adicionadas aos solos (F SN, F AM, F BN e F CR ), em kg N-N 2 O por kg N adicionado; FE 2 é o fator de emissão direta de N 2 O de solos orgânicos cultivados, em kg N- N 2 O/ha Para ajustar as quantidades de N como fertilizante, aplicadas ao solo, em função das quantidades volatilizadas de NH 3 e NO x, para obtenção de F SN, utilizou-se a Equação 13 (IPCC, 2006b; BRASIL, 2010b): FRAC GASF é a fração do N aplicado que volatiliza na forma de NH 3 e NO x : 10%, valor padrão, de acordo com o IPCC (2006b) A quantificação do total de N na forma de dejetos aplicados ao solo como adubo foi obtida através da Equação 14 (IPCC, 2006b; BRASIL, 2010b): t é a categoria do rebanho; N (t) é o número de animais por categoria; N ex(t) o total de N excretado anualmente por animal de cada categoria; FRAC GASM é a fração do N adicionado que é perdida por volatilização de NH 3 e NO x (Valor padrão segundo o IPCC (2006b) é 0,20); e FRAC PRP é a fração do N total excretado pelos animais diretamente em pastagens A emissão de N 2 O dos dejetos depositados diretamente na pastagem (N 2 O-N (mm) ) foi calculada pela Equação 15 (IPCC, 2006b; BRASIL, 2010b): 10
F P é a quantidade anual de N excretado diretamente na pastagem; e EF 3 é o fator de emissão direta para pastagens A quantidade de N que retorna anualmente ao solo com os resíduos agrícolas (F CR ) foi calculada pela Equação 16 (IPCC, 2006b; BRASIL, 2010b): Crop é a produção útil de todas as culturas na propriedade Os subscritos O e BF referem-se a culturas não fixadoras e fixadoras de N 2 atmosférico, respectivamente; FRAC NCR é a fração do N da matéria seca; FRAC R é a fração do N total acumulado pela planta removido com a colheita (0,50, segundo IPCC, 1996); FRAC Burn é a fração do N total dos restos culturais que são queimados, baseado nos dados do Inventário das Emissões de CH 4 e N 2 O pela queima de Resíduos Agrícolas 3 Resultados e discussão 31 Fermentação entérica Os resultados das equações utilizadas para estimar o consumo de energia bruta diária para o rebanho da propriedade estudada, bem como os fatores de emissão de metano proveniente da fermentação entérica para cada categoria animal são apresentados na Tabela 02 Tabela 02 - Fatores de emissão do metano Fermentação Entérica 11
NEm = Energia necessária para Manutenção; NEa = Energia necessária para Atividade; NEl = Energia necessária para lactação; NEg = Energia necessária para a gestação; NEc = Energia necessária para o crescimento; EB = Energia Bruta; Fe FE = Fator de Emissão para a Fermentação Entérica O resultado obtido para as vacas leiteiras nesse trabalho foi superior ao relatado pelo IPCC (2006a), onde os fatores de emissão de metano originado da fermentação entérica do gado leiteiro são estimados em torno de 63 kg CH 4 /cabeça/ano O valor apresentado pelo IPCC é semelhante ao relatado por Olszensvski (2011) para a propriedade extensiva, onde o fator de emissão de CH 4 foi de 62,77 kg CH 4 /cabeça/ano, enquanto que na propriedade intensiva, 107,27 kg CH 4 /cabeça/ano Resultados de pesquisas desenvolvidas por Pedreira et al (2009) utilizando a técnica do gás traçador SF6, indicaram uma variação da emissão de metano por vacas em lactação de 14 a 16 g por hora, ou seja, aproximadamente 131 kgch 4 /cabeça/ano De acordo com Pedreira e Primavesi (2011), tais variações estão associadas ao fator potencial de produção, considerando-se que os animais permanecerão quase o ano todo consumindo as dietas daquele período, o que não ocorre em condições reais no campo, pois durante uma parte do ano os animais passam por escassez de alimentos e não tem acesso a aditivos, o que gera menor quantidade de metano, embora a produção fique comprometida Além disso, a intensidade da emissão de metano proveniente da fermentação entérica depende principalmente do tipo de animal, do consumo de alimentos e do grau de digestibilidade da massa digerida Dessa forma, as indicações para a redução das emissões de metano pela pecuária estão relacionadas à melhoria dos pastos e da dieta, com fornecimento de carboidratos rapidamente digestíveis, à manutenção de altos níveis de ingestão, à utilização de forragens de melhor qualidade, à suplementação alimentar, à qualidade e melhoramento genético dos animais, bem como outras medidas que reflitam na melhor eficiência produtiva, resultando em ciclos de produção mais curtos (PEDREIRA e PRIMAVESI, 2011) 12
Ainda com relação às práticas de alimentação, o uso de concentrados geralmente aumenta a emissão de CH 4 por unidade animal, mas também aumenta a produção de leite e carne, e o resultado final é uma redução total das emissões de CH 4 por unidade de produto (kg leite ou de carne) (CARDOSO, 2012) Segundo Pedreira et al, (2009) usando-se a mesma dieta e manejo, as emissões por vacas da raça Holandesa foram superiores do que pelas vacas leiteiras mestiças, entretanto, eles ressaltam que as vacas da raça Holandesa permitem a diluição das emissões de CH 4 por kg de leite devido a sua maior produção de leite O efeito ambiental é observado na prática, a exemplo do que ocorreu com os Estados Unidos, que em 1944 possuía 25,6 milhões de vacas leiteiras produzindo 53,0 bilhões de quilos de leite, e em 2007 tinha 9,2 milhões de vacas produzindo 84,2 bilhões de quilos de leite (CAPPER et al, 2009) Se a produtividade tivesse permanecido a mesma em 2007 seriam necessárias 43,7 milhões de vacas ordenhadas para produzir o que apenas 9,2 milhões de vacas produziram Uma diferença de aproximadamente 33 milhões de cabeças, o que representa uma grande diferença para as emissões de GEE (CARDOSO, 2012) 32 Manejo dos dejetos Os fatores de emissão de metano para cada categoria animal provenientes do manejo de dejetos, com base na metodologia do IPCC (2006a), e das estimativas de BRASIL (2010a), para as abordagens Tier 1 e 2 são apresentados na Tabela 03 Tabela 03 - Fatores de emissão do metano Manejo dos dejetos EDsv = Excreção Diária Média de Sólidos Voláteis; Fe ME = Fatores de Emissão para Manejo de dejetos Olszensvski (2011), utilizando a abordagem Tier 1 relatou fatores de emissão da ordem de 1889,38; 915,98; e 89,67 kgch 4 /cabeça/ano, para vacas, novilhas e bezerras, respectivamente Entretanto, destaca-se que conforme BRASIL (2010a), para o gado bovino e suíno, devido à importância das emissões provenientes dessas criações, é aconselhável o uso da abordagem Tier 2 para o cálculo dos fatores de emissão decorrentes do manejo de dejetos, evitando-se assim uma superestimava das emissões 13
Além disso, destaca-se que na propriedade em estudo os dejetos não são manejados, e se depositam na pastagem, secando-se e se decompondo no campo, em condições aeróbias, de modo que são esperadas quantidades mínimas de emissão de CH 4 a partir dessa fonte, quando em comparação com outras formas de manejo dos dejetos, tais como o armazenamento ou o tratamento com base líquida (em lagoas, lagos, tanques ou poços), onde os dejetos se decompõem anaerobicamente e podem produzir uma quantidade significativa de CH 4 Outro fator relacionado à emissão de metano é a composição do dejeto, que é determinada pela dieta animal, de modo que quanto maior o conteúdo de energia e a digestibilidade do alimento, maior a capacidade de produção de CH 4 Um gado alimentado com uma dieta de alta qualidade produz um dejeto com maior potencial de gerar metano, ao passo que um gado alimentado com uma dieta mais fibrosa produzirá um dejeto contendo material orgânico mais complexo, tal como celulose, hemicelulose e lignina (BRASIL, 2010a) Esta segunda situação estaria mais associada ao gado criado a pasto em condições tropicais, conforme situação verificada nesse trabalho 32 Emissões nitrogenadas Tomando como base a metodologia proposta pelo IPCC (2006b), considerando as emissões diretas provenientes do manejo do solo, através do uso de fertilizantes nitrogenados, bem como da deposição do dejeto sem manejo sobre a pastagem, obteve-se um total de 1,10 kg de N 2 O emitidos para cada litro de leite produzido na propriedade estudada Além disso, destacase uma média anual de excreção de nitrogênio pelas fezes e urina de aproximadamente 70,08; 56,06 e 14,02 kg N/cabeça/ano, para vacas, novilhas e bezerras respectivamente Segundo Cardoso (2012) a pecuária tecnicamente conduzida apresenta potencial de mitigar as emissões de GEE O nitrogênio, por exemplo, é um elemento que limita a produtividade da pastagem (BODDEY et al, 2004), e a adição de fertilizantes nitrogenados contornariam esse problema e elevariam a produtividade (De OLIVEIRA et al, 2004) No entanto, a maior adição de fertilizantes aumenta as emissões de N 2 O, e o mesmo poderia acontecer com o uso de leguminosas em pastagens (CARDOSO, 2012) 4 Conclusão Os resultados obtidos neste trabalho permitiram verificar uma elevada estimativa de emissões de metano provenientes da fermentação entérica dos animais Com relação a esse aspecto, 14
possíveis alterações no regime alimentar do rebanho poderiam contribuir para a redução de tais emissões A alimentação do rebanho está relacionada com a categoria de mudanças climáticas, sendo que quanto mais digestíveis forem os alimentos, maior as emissões oriundas da fermentação entérica Logo, o oferecimento do alimento com maior digestibilidade, entretanto, com alta qualidade nutricional para atender a demanda diária do animal, já seria um fator responsável pela redução das emissões Além das alterações no regime alimentar do rebanho, destaca-se também como alternativa o melhoramento genético dos animais com o intuito de aumentar a produtividade através da conversão alimentar, tendo assim uma redução no plantel, bem como das emissões de GEE por eles gerados, entretanto, com a manutenção ou aumento da produção de leite REFERÊNCIAS BODDEY, R M; MACEDO, R; TARRÉ, RM; FERREIRA, E; OLIVEIRA, O C de; REZENDE, C de P; CANTARUTTI, R B; PEREIRA, J M; ALVES, B J R; URQUIAGA, S Nitrogen cycling in Brachiaria pastures: The key to understanding the process of pasture decline Agriculture, Ecosystems & Environment, Amsterdam, 103(2): 389-403, 2004 BRASIL - MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO MCTI Emissões de metano por fermentação entérica e manejo de dejetos de animais Segundo inventário brasileiro de emissões antrópicas de gases de efeito estufa 2010 BRASIL - MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO MCTI Emissões de óxido nitroso de solos agrícolas e de manejo de dejetos Segundo inventário brasileiro de emissões antrópicas de gases de efeito estufa 2010 CAPPER, J L; CADY, R A & BAUMAN, D E The environmental impact of dairy production: 19944 compared with 2007 Journal of Animal Sicence, 87: 2160-2167, 2009 CARDOSO, AS Avaliação das emissões de gases de efeito estufa em diferentes cenários de intensificação de uso das pastagens no Brasil Central Seropédica, 2012 DE OLIVEIRA, O C; DE OLIVEIRA, I P; ALVES, B J R; URQUIAGA, S; BODDEY, R M Chemical and biological indicators of decline/degradation of Brachiaria pastures in the Brazilian Cerrados Agric, Ecosystem Environ 103, 289-300, 2004 FAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED - Environmental performance of large ruminant supply chains - Guidelines for assessment 2015 15
INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE - IPCC Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories Agriculture, Forestry and Other Land Use - Emissions from Livestock and Manure Management v 4, cap 10 2006a INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE - IPCC Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories Agriculture, Forestry and Other Land Use - N 2 O Emissions from Managed Soils, and CO 2 Emissions from Lime and Urea Application v 4, cap 11 2006b OLSZENSVSKI, FT Avaliação do ciclo de vida da produção de leite em sistema semi extensivo e intensivo: estudo aplicado Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) Universidade Federal de Santa Catarina, 2011 PEDREIRA, MS; PRIMAVESI, O Quantificação das emissões e nutrição para redução da produção de metano por bovinos In: Desertificação e mudanças climáticas no semiárido brasileiro 2011 PEDREIRA, MS; PRIMAVESI, O; LIMA, MA; FRIGHETTO, R; OLIVEIRA, SG; BERCHIELLI, TT Ruminal methane emission by dairy cattle in southeast Brazil Scientia Agricola, Piracicaba, 66(6): 742-750, 2009 SLADE, EM; RIUTTA, T; ROSLIN, T; TUOMISTO, HL The role of dung beetles in reducing greenhouse gas emissions from cattle farming Scientific Reports 6:18140 DOI: 101038/srep181402016 Disponível em: wwwnaturecom/scientificreports/2016 16