Estudo comparativo da resposta do tecido ósseo em técnica de regeneração tecidual guiada avaliação macroscópica. Parte 1



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224 Artigo Original (Original Articles) FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). Estudo comparativo da resposta do tecido ósseo em técnica de regeneração tecidual guiada avaliação macroscópica. Parte 1 Comparative study of bone response guided tissue regeneration technique - macroscopic evaluation. Part 1 Renato Martins - Mestre em Biologia Oral pela Faculdade de Odontologia da Universidade Sagrado Coração. Ângela Mitie Otta Kinoshita - Doutora em Física Aplicada à Medicina e Biologia pela Universidade de São Paulo Nara Tathiane do Amaral Carvalho - Mestre em Odontologia, Reabilitação Oral pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Uberlândia. Sérgio Augusto Catanzaro Guimarães - Pós-Doutorado pela Temple University School Of Medicine Usa. Resumo O reparo de defeitos ósseos é um desafio para diversas áreas, pois a invasão de células fibroblásticas no defeito, resulta em tecido conjuntivo cicatricial. Assim, os princípios de Regeneração Tecidual Guiada (RTG) estão bem estabelecidos para tratamento de defeitos ósseos. Essa técnica consiste na utilização de biomembranas que agem como barreiras e evitam a invasão dos fibroblastos e permite o povoamento com células osteoprogenitoras. O presente trabalho propôs-se avaliar o crescimento e potencial regenerativo em defeitos ósseos através de avaliações macroscópicas e radiográficas. Para tanto, 27 coelhos foram divididos em 3 grupos experimentais de acordo com o tratamento: Controle (A), Látex (B) e PTFE (C). Então, subdivididos em 3 grupos para análise de neoformação periódica: 15 (I); 30 (II) e 60 dias (III). As cobaias foram submetidas à cirurgia para confecção de defeitos ósseos críticos em calvária e tratamento específico de cada grupo. Após os períodos os animais foram sacrificados e obtidas as peças anatômicas para as radiografias pelo método Digora e fotografias digitais. As análises macroscópicas permitiram observar crescimento ósseo e áreas radiopacas sugestivas de tecido ósseo. No período de 15 dias a densidade óssea nos grupos experimentais no defeito foi semelhante. Contudo, aos 60 dias, verificou-se formação óssea homogênea para Látex e vários níveis de radiopacidade para PTFE e controle. Dentro das limitações, conclui-se que biomembranas são bem indicadas em processos cirúrgicos para regeneração óssea, visto que as barreiras impedem ou dificultam a migração de células incompatíveis com o tecido a ser neoformado e promove a osteogênese. Descritores: Regeneração óssea, látex, politetrafluoretileno. Abstract The repair of bone defects is challenge for many areas, since the invasion of fibroblast cells in the defect, resulting in scar tissue. Thus, the principles of Guided Tissue Regeneration (GTR) are well established for treatment of bone defects. This technique is the use of bio-membranes that act as barriers and prevent the invasion of fibroblasts and allows the placement of osteoprogenitor cells. The proposition of this study is evaluate the mechanical growth and regenerative potential in bone defects by macroscopic and radiographic analyses. Twenty-seven rabbits were divided into 3 groups according to treatment: control (A), Latex (B) and PTFE (C). Then divided into 3 groups for analysis of periodic neoformation: 15 (I), 30 (II) and 60 days (III). The animals were subjected to surgical preparation of bone defects in critical calvaria and specific treatment of each group. After the period, they were sacrificed and collected the body parts for X-rays by the Digora method and digital photographs. Macroscopic analysis allowed observed bone growth and areas suggestive of bone tissue. During 15 days of bone density in the experimental groups in the defect was similar. However, after 60 days, there was bone formation for homogeneous in group of Latex and various levels of radiopacity to PTFE and control. Within the experimental conditions, the biomembranes are well indicated in surgical procedures for bone regeneration, since the barriers preventing or hindering cell migration incompatible with the tissue to be newly formed and promotes osteogenesis. Descriptors: Bone regeneration, latex, polytetrafluoroethylene. Correspondência com o autor: drrenato@uol.com.br Recebido: 26/03/2010 Aceito: 15/04/2010

FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). Martins, R., Kinoshita, A.M.O., Carvalho N.T.A., 225 Introdução O reparo de defeitos ósseos é um desafio para diversas áreas da medicina e odontologia, principalmente nas especialidades de Cirurgia Buco-maxilo-facial, Periodontia, Prótese e Implantodontia. Os procedimentos de regeneração óssea guiada são uma alternativa para contornar as dificuldades nos processos de reparo de tecido ósseo em defeitos críticos (Dahlin 9 1994; Bosch, Melsen e Vargervik 5 1995; Lundgren, Lundgren e Taylor 14 1998). O objetivo é evitar, prevenir e impedir a invasão de células não osteoblásticas no defeito ósseo durante o processo de reparo (Nymam 17 1991). Dahlin 9 et al. (1994) documentaram a possibilidade da exclusão de células incompatíveis com a neoformação de tecido ósseo no repovoamento do leito por meio de barreiras mecânicas, isso favoreceria a proliferação celular adequada e a cicatrização com o tecido compatível e desejável. As biomembranas são utilizadas como barreiras com objetivo de impedir a proliferação de células epiteliais e conjuntivas para o interior do defeito ósseo e prover um tempo adicional para as células osteogênicas, cuja migração é mais lenta, repovoarem a área do defeito e, por fim garantir com eficiência a neoformação óssea (Zhang 26 2010). De acordo com Carranza 6 et al. (2004), as propriedades ideais para as membranas são biocompatibilidade, manutenção do espaço, oclusividade celular, boas propriedades de manuseio e capacidade de absorção. O látex natural é um material biocompatível com alta resistência mecânica além de apresentar elasticidade e baixo custo (Mazocco 16 2002). Segundo Alves 2 (2003) o látex natural é capaz de acelerar a angiogênese. Ainda, Sader 19 et al. (2000), Alves 2 (2003), Pinho 18 et al. (2003), Balabanian 3 et al. (2006), Ereno 10 (2006) estudaram o uso do filme de látex em forma de membrana ou de biomembrana. A membrana de PTFE, politetrafluoretileno, é uma substância praticamente inerte, apresenta como características principais o baixo coeficiente de atrito, impermeabilidade, baixa aderência e ótima aceitabilidade pelo corpo humano. Garg 12 (2004) relatou que algumas membranas de PTFE têm como vantagem, quando exposta à cavidade oral, não comprometer o processo de regeneração óssea. Strietzel 23 et al. (2006) e Barber 4 et al. (2007) publicaram trabalhos que ilustram o uso de biomembranas de PTFE. Proposição Baseados na literatura, o presente estudo avaliou a resposta biológica para neoformação óssea foi comparada em procedimentos de RTG (Regeneração Tecidual Guiada) com biomembranas de Látex e PTFE e o grupo controle (somente coágulo, sem membrana). Analisouse o crescimento e o potencial regenerativo em defeitos ósseos críticos de calvária de coelhos, por meio de avaliações macroscópicas das peças e análises radiográficas. A hipótese nula testada é de que não existe diferença estatisticamente significante entre os grupos analisados nos diferentes bioensaios realizados. Material e método Vinte e sete coelhos adultos (New Zealand), com peso médio de 3 kg, idade entre três e quatro meses, obtidos do Biotério Geral da Universidade de São Paulo (Ribeirão Preto), foram submetidos ao estudo após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Sagrado Coração (14/07). Delineamento experimental Os animais foram aleatoriamente divididos de acordo com o tratamento (figura 1) em 3 grupos experimentais (n=9): Grupo A (controle) sem membrana; Grupo B - membrana de látex natural (USP-RP); Grupo C - membrana de PTFE densa e não reabsorvível (Bionnovation Biomedical) e em seguida subdivididos em grupos para análise de neoformação ossea periódica: Grupo I 15 dias; Grupo II 30 dias e Grupo III 60 dias. GRUPO CONTROLE GRUPO EXPERIMENTAL Figura 1 - Imagens esquemáticas dos tratamentos experimentais. Tratamento experimental Grupo A Controle Em processo cicatricial, o sangue extravasado forma o coágulo, composto de colágeno, plaquetas, trombina e fibronectina que liberam citocinas e fatores de crescimento que iniciam a resposta inflamatória. O coágulo de fibrina serve como um arcabouço para neutrófilos, monócitos, fibroblastos e células endoteliais, além de concentrar citocinas e fatores de crescimento. Em seguida, forma-se tecido de granulação, com novos vasos sanguíneos, colágeno e células (fibroblastos e macrófagos). Após a diferenciação celular e a maturação da matriz forma-se o calo ósseo composto de elementos vasculares, cartilagenosos e celulares que serão substituídos por osso e restabelecerá a forma e função. Grupo B Membrana de látex natural O látex é derivado da seringueira Hevea brasilienses e forma um sistema coloidal polifásico e polidisperso. Após a polimerização, o látex transforma-se em um filme (Figura 2) com características desejáveis para uso em procedimento de regeneração óssea guiada, como elasticidade, flexibilidade, alta resistência mecânica, biocompatibilidade, baixo custo e capacidade de acelerar a angiogênese. Além disso, é de origem vegetal, o que diminui o potencial de transmissão de doenças infecciosas. Grupo C Membrana de PTFE A membrana de PTFE (figura 3) apresenta-se como

Martins, R., Kinoshita, A.M.O., Carvalho N.T.A., 226 FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). um plástico denso, biocompatível, não absorvível, extremamente hidrofóbica, baixo coeficiente de atrito, impermeável e baixa aderência. É formada por uma rede intrincada de células abertas e poros multidirecionais o que lhe confere uma combinação única de capacidade filtrante e força estrutural. A molécula fluorcarbono, politetrafluoretileno (base química da PTFE), não pode ser quebrada quimicamente em condições fisiológicas, o que permite que sua toxicidade seja praticamente nula. Processo cirúrgico Técnica cirúrgica Inicialmente, os animais foram submetidos à préanestesia (Diazepan, 0,1 ml/kg) e anestesia geral via intramuscular (Ketamina 0,25 ml/kg). A tricotomia regional no osso frontal foi realizada após assepsia com polivinilpiloridona (PVPI) tópico e de infiltração. Isolouse a área a ser operada com campos cirúrgicos estéreis, incisão mucoperiostal linear com lamina de bisturi 15 (aproximadamente 4 cm), dissecção e divulsão para exposição da superfície óssea. Em seguida, foi realizado um defeito ósseo crítico (2 cm x 1 cm) com broca trefina (10 mm) (Figura 4) e aplicado o tratamento experimental. 3a Figura 3 - Membrana de Politetrafluoretileno - PTFE (grupo C). Grupo C Membrana de PTFE Após o procedimento cirúrgico inicial, as cobaias receberam como tratamento a membrana de PTFE da Bionnovation Biomedical, ocluindo o defeito crítico (figura 5C). Então, suturou-se o periósteo e a pele com fio de sutura (seda 4.0, reabsorvível), sem envolver a biomembrana. Após os procedimentos cirúrgicos, como profilaxia a infecções, administrou-se por via intramuscular Ampicilina Sódica (1ml/kg) e todos os animais mantidos em gaiolas individuais, sem imobilização e preservação da funções vitais. Decorridos os períodos pré-determinados em cada subgrupo (15, 30 e 60 dias) os animais foram sacrificados com superdosagem de anestésico 3b 2a 4a 4c 2b 2c 2d Figura 2 - Membrana de látex natural (grupo B). Tratamento experimental Grupo A Controle Após a confecção do defeito ósseo, suturou-se o periósteo e a pele com fio de seda 4.0, reabsorvível (figura 5A). Grupo B Membrana de látex natural As cobaias receberam membrana de Látex para ocluir o defeito crítico criado durante o processo cirúrgico inicial (figura 5B). Após a instalação, o tecido, periósteo e pele, foi suturado (fio seda 4.0 reabsorvível). 4b Figura 4 - Defeito ósseo crítico com dimensões de 2 cm x 1 cm. geral Ketalar (4 ml). Análise radiográfica As radiografias foram obtidas por aparelho de raios- X odontológico (70kVp e 8mA), perpendicularmente

FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). Martins, R., Kinoshita, A.M.O., Carvalho N.T.A., 227 ao filme (Kodak Dental Intraoral-E Speed Film) (40 cm e 2 mas). As imagens foram digitalizadas pelo software Digora for Windows e tratadas nos padrões visuais de inversão de contraste (negativo-padrão), realce de relevo (3D padrão) e de intensidade do nível de cinza, medida pelos valores de pixels da área do defeito ósseo. As análises foram realizadas nas ampliações de 0,5; 1,0 e 2,0 vezes, observadas as diferenças de radiopacidades, revela os e tons da cor cinza nas imagens e construído o histograma da densidade radiológica dos pixels para fins comparativos. Análise macroscópica As peças foram coletadas com disco diamantado Schenk 21 (1994) relatou que o reparo em tecido ósseo normalmente ocorre por regeneração e resulta em uma organização estrutural semelhante à original. Contudo, o principal obstáculo para o sucesso do reparo ósseo é a invasão de células fibroblásticas na loja cirúrgica, o que resulta em tecido conjuntivo cicatricial. Isto ocorre porque as principais células do tecido conjuntivo, os fibroblastos, proliferam-se mais rápido que as células osteoprogenitoras responsáveis pela neformação óssea. Assim, a utilização de biomembranas como barreiras evita, ou até mesmo impede, a invasão dos fibroblastos, o que permite um maior intervalo de tempo para que as células osteoprogenitoras alojem a área do defeito e promovam a neoformação óssea. Em vista disso, diferentes tipos de membranas podem ser usadas a fim de evitar a colonização do defeito ósseo por 6a 6b 5 6c 5 5 Figura 5 - Tratamentos experimentais. a) Controle; b) Látex e c) PTFE. montado em micromotor cirúrgico e fixadas em formol a 10%. Em seguida, foram submetidas as análises macroscópicas quanto a deteriorização e oclusão da biomembrana para os grupos experimentais (b e c). Obteve-se fotografias digitais para avaliação visual do tecido ósseo neoformado em todas as amostras. Então, foram descritas as suas peculiaridades observadas nas análises. Figura 6 - Imagens radiográficas dos grupos: a (Controle), b (Látex) e c (PTFE), em análise 15 dias após a implantação (subgrupo I). 7a 7b Resultados As figuras 6, 7 e 8 ilustram as imagens radiográficas dos subgrupos I, II e III, para análise da neoformação óssea nos diferentes grupos experimentais (a, b e c). As setas indicam as áreas que apresentaram neoformação óssea. As fotografias digitais obtidas para análise macroscópica permitem observar nas imagens (figuras 9, 10 e 11) o tecido ósseo formado na área do defeito ósseo. Discussão Os princípios de Regeneração Óssea Guiada ( GTR ) estão bem estabelecidos no tratamento de defeitos ósseos e procedimentos de aumento do volume ósseo. 7c Figura 7 - Imagens radiográficas dos grupos: a (Controle), b (Látex) e c (PTFE), em análise 30 dias após a implantação (subgrupo II).

Martins, R., Kinoshita, A.M.O., Carvalho N.T.A., 228 FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). 8a 8b 8c Figura 8 - Imagens radiográficas dos grupos: a (Controle), b (Látex) e c (PTFE), em análise 60 dias após a implantação (subgrupo III). 6a 9b 9c Figura 9 - Imagens digitais dos grupos: b (Látex) e c (PTFE), em análise 15 dias após a implantação (subgrupo I). tecido conjuntivo não osteogênico. De acordo com Catanzaro 7 et al. (2002) a técnica de regeneração óssea guiada demonstrou sucesso em vários modelos experimentais e clínicos(dahlin9 1994; Sader 19 2000; Alves 2, 2003; Pinho 18 2003; Sakata 20 2004; Garg 12 2004; Strietzel 23 2006; Barber 4 2007; Enero 11 2007). O uso de uma membrana como barreira para prevenir invasão de células indesejáveis no defeito ósseo durante a reparação, permite a repopulação da área por células específicas. A escolha da membrana de PTFE deve-se ao fato de ter sua eficácia comprovada e largamente utilizada na prática clínica e em estudos experimentais (Dahlin 9 1994; Aaboe 1 1998; Da Silva Pereira 8 2000; Mardas, Kostopoulos e Karring 15 2002; Verna 25 2002; Strietzel 23 2006; Zhang 26 2010). O látex, além da biocompatibilidade, apresenta capacidade de acelerar a angiogênese (Alves 2 2003; Pinho 18 2003), propriedade relacionada aos processos de osteogênese. Além disso, é de origem vegetal, não tendo o potencial de transmissão de doenças infecciosas (Pinho18 2003). Balabarian3 et al. (2006) e Ereno10 (2006) avaliaram a propriedade de biocompatibilidade do látex como membrana oclusiva em processos odontológicos para animais. A análise radiográfica digital através do sistema Digora foi adotada por oferecer uma melhor precisão para a realização da interpretação radiográfica durante a evolução da regeneração óssea dos grupos experimentais, sendo considerado um exame rápido e preciso na busca e análise da imagem, o que pode determinar os níveis de cinza em uma ampla escala em comparação com a radiografia convencional (Tavano 24 1999). Baseados nas análises radiográficas, observou-se que no período de 15 dias, a densidade óssea nos grupos experimentais na região do defeito ósseo foi semelhante. A radiopacidade nas películas dos grupos tratados são mais intensas, após 30 dias de implantação. Em relação aos grupos tratados observa-se melhores resultados nos animais que receberam a biomembrana de Látex. No período de 60 dias, a análise radiográfica digital pelo sistema Digora, permitiu verificar que os grupos experimentais apresentaram formação óssea homogênea. Enquanto que nas amostras do grupo controle, encontrou-se níveis variados de radiopacidade na área do defeito. A análise macroscópica por inspeção visual e acompanhamento das cobaias no decorrer do período experimental, permitiu avaliar a resposta imunológica das cobaias, visto que os achados não indicaram sinais de reações alérgicas e/ou de rejeição. Não houve infecções pós-operatórias e evidências de inflamação tipo corpo estranho. Durante o pós-operatório foi observada excelente recuperação dos coelhos. Apesar de serem biomateriais não-absorvíveis, não observou-se reação inflamatória tipo corpo estranho nos tecidos em contato com as membranas. Em análise das fotografias digitais obtidas logo após a separação das peças, verificou-se a presença de tecido ósseo neoformado em todos os períodos e grupos experimentais. Dessa forma, os resultados indicaram que as biomembranas, quando utilizada adequadamente, mostraram se efetivas como barreiras oclusivas em processos de regeneração óssea guiada.

FULL Dentistry in Science. 2010; 1(3). Martins, R., Kinoshita, A.M.O., Carvalho N.T.A., 229 10a 10b 10c Figura 10 - Imagens digitais dos grupos: a (Controle), b (Látex) e c (PTFE), em análise 30 dias após a implantação (subgrupo II). 11a 11c 11b Figura 11 - Imagens digitais dos grupos: a (Controle), b (Látex) e c (PTFE), em análise 60 dias após a implantação (subgrupo III). No presente estudo optou-se por avaliar o processo de regeneração óssea em defeito intra-ósseo crítico em que as dimensões da lesão são menores possíveis, contudo a reparação não ocorre de forma espontânea. Desse modo, os resultados obtidos quanto a potencial osteogênico do implante, enxerto ou medicamento poderá ser extrapolado para condições reais (Schimitz e Hollinger 22 1986). Além disso, o conceito de defeito ósseo de tamanho crítico minimiza diferenças relacionadas à idade, espécie e sítio anatômico em estudos in vivo, o que permite a padronização para comparações experimentais (Hollinger e Kleinschimidt 13, 1990; Bosch, Melsen e Vargervik 5, 1995). A utilização da membrana de látex natural como barreira oclusiva em defeitos críticos na calvária de coelhos foi um estudo preliminar. Nossos resultados indicaram que a biomembrana de látex natural, comparativamente à membrana de PTFE, quando utilizadas adequadamente, mostrou-se tão efetiva ou superior como barreira oclusiva em processos de regeneração óssea guiada, sendo, portanto, considerada um material promissor para futuros estudos em modelos de cicatrização óssea guiada. Conclusão Dentro das limitações deste estudo conclui-se que o uso de biomembranas em processos cirúrgicos para regeneração óssea é bem indicado, visto que as barreiras impedem ou dificultam a migração de células incompatíveis com o tecido a ser neoformado e promovem a osteogênese. Por fim, os animais tratados com biomembranas de látex apresentaram melhores resultados quando comparados aos tratados com membrana PTFE. O gru- po controle, devido a desorganização do tecido frouxo, que age como obstáculo, apresentou resultados menos favoráveis para o processo analisado. Em vista disto, a metodologia que emprega biomembranas é considerada efetiva em processo de regeneração óssea. Referências bibliográficas 1. Aaboe, M et al. Incomplete bone regeneration of rabbit calvarial defects using different membranes. Clin Oral Implants Res.1998; 9: 313-20. 2. Alves, MCO. Teste da angiogênese estimulada por membrana de látex natural. 2003. Dissertação (Mestrado), Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras USP, Ribeirão Preto. 3. Balabanian, CACA et al. Biocompatibility of natural latex implanted into dental alveolus of rats. Journal of Oral Science. 2006; 48: 201-5. 4. Barber, H. D. et al. Using a dense PTFE membrane without primary closure to achieve bone and tissue regeneration. J. Oral Maxillofac. Surg. 2007; 65: 748 52. 5. Bosch, C; Melsen, B; Vargervik, K. Guided Bone Regeneration in Calvarial Bone Defects Using Polytetrafluoroethylene Membranes. Cleft Palate Craniofac J.Denmark. 1995; 32: 311-17. 6. Carranza, A F et al. Periodontia Clínica. 9.ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2004. 7. Catanzaro Guimarães SA et al. Autogenous desmineralized dentin matrix for tissue engineering applications: radiographic and histomorphometric studies. Int. J. of Oral e Maxilofacial Implants. 2002; 17, n. 4, 2002. 8. Da Silva Pereira, SL et al. Comparasion of bioabsorbable and non-bioabsorbable membranes in the tratment of dehiscence-type defects. A histomorphometric study in dogs. J Periodontol. 2000; 71: 1306-14. 9. Dahlin, C et al. Restoration of mandibular nonunion bone defects. An experimental study in rats using an osteopromotive membrane

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