VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS NO CONTEXTO FAMILIAR: uma reflexão necessária

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Transcrição:

VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS NO CONTEXTO FAMILIAR: uma reflexão necessária Mariana Cavalcanti Braz Berger 1 Déborah Santiago Leite Cardozo 2 Resumo: Este artigo possui como finalidade refletir acerca da violência familiar contra a pessoa idosa, que perpassa tanto agressões verbais quanto físicas e psicológicas, praticadas no seio familiar. Metodologicamente o trabalho consiste em um estudo bibliográfico e documental. Aborda as expressões e os tipos de violência mais denunciados, nos quais os maiores agressores são os próprios filhos. O número de denúncias vem crescendo, mas ainda são frágeis, dificultando o exercício dos órgãos do Poder Público em defender os idosos contra abusos e agressões cometidos e sinalizando que esta é uma problemática que envolve diversas variáveis. Palavras-chave: Idoso, família, violência familiar. Abstract: This paper aims to reflect about family violence against the elderly people, which permeates verbal, physical and psychological abuse, committed within the family. It comprises a documental and bibliographical methodological study. The types of the most reported violence abuses and its expressions are discussed, where the biggest bullies are their sons. The number of complaints has been growing, but it is still fragile, hindering the exercise of the Public authorities to defend the elderly people against the abuse and aggressions committed and signaling that this is a problem that involves several variables. 1 Mestre. Universidade Federal do Maranhão (UFMA). maricsbraz@yahoo.com.br 2 Bacharel. Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

1. INTRODUÇÃO Keywords: Elderly, family, family violence. Trata-se de uma reflexão acerca da violência contra a pessoa idosa no Brasil, enfatizando a violência familiar, que se acentua gradativamente nos dias atuais. Destaca-se nessa reflexão o processo de envelhecimento pujante pelo qual passa a sociedade brasileira, posto que a complexidade do envelhecimento representa um desafio para muitos setores da sociedade academia, sociedade civil, instituições públicas que precisam se preparar para receber essa população idosa de um futuro cada vez mais próximo. O envelhecimento traz em seu seio questões diversificadas, que refletem tanto na sociedade em geral, como na esfera familiar. De acordo com Silva e Lacerda (2007), estimase que na segunda metade deste milênio existirá mais de 31 milhões de pessoas com idade acima de 60 anos no país, o que deixará o Brasil com a sexta população mais envelhecida do planeta. Nesse cenário têm sido crescentes os casos de denúncia de violência contra idosos, em sua maioria ocasionada (a violência) pela própria família, que desconhece as variadas facetas do envelhecimento e as garantias legais designadas a essa parcela da população. As causas do aumento da violência são diversas e vão desde conflitos interpessoais índices de vulnerabilidade social, alterações na estrutura familiar e suas novas configurações até a impunidade oficial, omissão do poder público ao deixar de cumprir o que está determinado em lei no que diz respeito à garantia dos direitos humanos dos idosos. A efetividade das denúncias dentro desse grupo etário possui muitos dificultadores pela situação específica em que se encontra essa população, tornando-se, assim, um alvo fácil, por, na maioria dos casos, depender de seus familiares em muitos aspectos, seja nos cuidados da saúde, na dependência financeira ou até mesmo pela simples convivência familiar permeada por afetos e mágoas. Ressaltando que a violência contra o idoso não se restringe apenas a violência física, mas também a outros tipos de violência, não menos dolorosas, como: negligência, violência psicológica, abuso financeiro e econômico, abandono e outros. Sendo assim, a questão da violência familiar é vista como um assunto delicado que requer atenção e participação do Poder Público para tentar solucionar o problema e enfatizar a consciência nacional. Desse modo, esse tipo de violência representa uma grave violação dos direitos humanos dessa parcela da população.

2. TIPOLOGIA E EXPRESSÕES DA VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA No tocante a tipologia da violência contra a pessoa idosa, contida no Plano de Ação para o Enfrentamento da Violência contra a Pessoa Idosa (2007), destacam-se os seguintes tipos de violência mais habituais praticados contra a população idosa: a) Negligência: caracterizada pela recusa ou à omissão de cuidados devidos e necessários aos idosos por parte dos responsáveis familiares ou institucionais; b) Violência Psicológica: corresponde a agressões verbais ou gestuais com objetivo de aterrorizar os idosos, humilhá-los, restringir sua liberdade ou isolá-los do convívio social; c) Abuso Financeiro e Econômico: consiste na exploração imprópria ou ilegal dos idosos ou ao uso não consentido por eles de seus recursos financeiros e patrimoniais. Esse tipo de violência ocorre, sobretudo, no âmbito familiar; d) Violência Física: caracterizada pelo uso da força física, para forçar os idosos a fazerem o que não desejam, para feri-los, provocar-lhes dor, incapacidade ou morte; e) Abandono: consiste na ausência ou deserção dos responsáveis sejam governamentais, institucionais ou familiares de prestarem socorro e assistência a uma pessoa idosa que necessite de proteção. Além dessa tipologia, a violência contra os idosos expressa-se de três formas de acordo com Minayo (2005): i) Violência social ou estrutural: a base para todos os outros tipos de violência, estando ligada as relações sociais e as estruturas econômicas e políticas. ii) Violência institucional: caracterizada pela aplicação ou omissão na gestão das políticas sociais pelo Estado e pelas instituições de assistência. Existente nas instituições, nos abrigos públicos ou privados em que se humilha e infantiliza o idoso, em que não se ouve a sua opinião e não se respeita a sua autonomia. iii) Violência familiar ou interpessoal: refere-se ao ambiente familiar e caracterizase pelas formas de comunicação e de interação cotidiana. A violência familiar e doméstica 3 3 Apesar dos conceitos de violência familiar e violência doméstica serem bem próximos, existe uma sutil diferença entre ambos. A violência familiar implica na existência de laços de parentesco e/ou afetividade entre a vítima e o agressor. Podendo ocorrer dentro ou fora do lar da vítima. Já a violência doméstica implica na proximidade do agressor para com sua vítima, não exatamente ligada aos laços de parentesco, podendo ser

ocorre nas relações interpessoais, onde existe concomitantemente uma cumplicidade, que se impõe pelo imaginário e simbolismo de confiança entre vítima e agressor, e pelo medo causado pelo autoritarismo do agressor, perpassado por chantagens, ameaças e dependência afetiva, física por parte dos idosos. Assim, a violência contra a população idosa se expressa em termos gerais dessas três formas e está presente em todas as relações sociais, caracterizando-se pela relação entre um agressor e um agredido. Nesse debate faz-se necessário diferenciar as causas externas da violência, as quais os idosos estão vulneráveis, pois segundo Minayo (2005, p.13), possuem conceitos diferentes. Sendo a primeira caracterizada pelos resultados das agressões e dos acidentes, dos traumas e das violências, já a violência consiste nos [...] processos e às relações sociais interpessoais, de grupos, de classes, de gênero, ou objetivadas em instituições, quando empregam diferentes formas, métodos e meios de aniquilamento de outrem, ou de sua coação direta ou indireta, causando-lhes danos físicos, mentais e morais. Dentre as tipologias de violência apresentadas estão os maus-tratos e abusos enquanto formas de violência contra os idosos, que podem sofrer mais de um tipo de maustratos (físico, emocional, sexual e financeiro). No próximo item abordaremos a questão da violência familiar, pois esta é considerada um problema social de grande magnitude que atinge toda a sociedade, afetando, de forma continuada, principalmente as parcelas mais vulneráveis da sociedade, onde se encontram os idosos. Focaremos nossa reflexão no campo da violência familiar, ou intrafamiliar como é abordada em alguns documentos oficiais de domínio público, vez que chama-nos atenção o fato de ser a teia familiar contraditoriamente o espaço onde encontram-se os maiores agressores. 3. CARACTERÍSTICAS DA VIOLÊNCIA FAMILIAR CONTRA A PESSOA IDOSA Atualmente, a violência apresenta-se mais visível em todos os países do mundo, principalmente nos países que estão em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, pois à medida que o envelhecimento populacional acentua-se em todo o mundo, as expressões da violência contra os idosos tornam-se mais evidentes, pois as pessoas denunciam com mais exercida por pessoas que compartilham o espaço doméstico do idoso, como empregados, agregados ou visitantes, sendo assim é toda violência consubstanciada no espaço doméstico.

frequência, em razão da presença de um aparato legal, que embora seja frágil pode contribuir para coibir tais atos. Daí a importância do reconhecimento dos direitos sociais por meio da normatização de instrumentos legais, que são imprescindíveis na garantia dos direitos dos idosos. Contudo, apesar da existência desse aparato materializado na Constituição Federal de 1988, na Política Nacional do Idoso de 1994 e no Estatuto do Idoso (lei nº 10.741) de 2003, entre outros, percebe-se a ausência de políticas sociais eficazes por parte do Estado que visem garantir que a família cumpra seu papel no que se refere à proteção e ao cuidado ao idoso, tendo em vista que esta é uma questão que envolve inúmeras variáveis e a necessidade de uma articulação em rede. Consideramos a família como o primeiro núcleo de socialização dos indivíduos, onde se desenvolvem e exercem os vínculos básicos e confere identidade aos sujeitos. Diante da diversidade de formas de organização familiar, podemos inferir que as mesmas, assim como qualquer outro espaço de convivência, experimentam muitas situações de violência, que são por vezes ocultadas e/ou mascaradas pelos seus membros e pela própria sociedade. Sendo assim, a violência encontra, nas relações familiares, um espaço fértil para sua instalação e propagação, além de outras formas de violência que são observadas nas relações do grupo familiar com a sociedade e o poder público. Nesta direção, o âmbito familiar é caracterizado por uma ambiguidade, em razão de ao mesmo tempo ali predominarem relações íntimas e afetivas, e também relações conflituosas e abusivas. Nesse momento, a família deixa de ser vista como o espaço de proteção e cuidado para ocupar o lugar onde, em muitos casos, as relações de opressão, abusos físico e emocional, crime e ausência de direitos individuais prevalecem. Quando se trata da violência familiar, deve-se considerar qualquer tipo de relação de abuso praticado no contexto particular da família contra qualquer um dos seus membros. Segundo o Ministério da Saúde (2001), a violência intrafamiliar é toda ação ou omissão que interfira no bem-estar, na integridade física, psicológica ou na liberdade e no direito ao desenvolvimento de outro membro da família. Pode ser perpetrada dentro ou fora do lar por algum membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir a função parental, ainda que sem laços de consanguinidade, e em relação de poder à outra. Alguns estudos sobre o tema mostram que as causas que levam à violência contra os idosos no ambiente familiar são inúmeras, contudo as que se constatam com maior intensidade são: relações familiares desgastadas pelo tempo, o relacionamento familiar

intergeracional, conflitos e situações mal resolvidas com filhos e cônjuge, problemas financeiros, cansaço excessivo decorrente da exaustiva tarefa de cuidar, limitações pessoais do cuidador para oferecer o apoio adequado, problemas de saúde física ou mental do idoso ou do seu cuidador e outras que permeiam o universo familiar (SILVA; LACERDA, 2007). Minayo (2005) afirma que a violência familiar consiste em um problema nacional e internacional, onde pesquisas realizadas em várias partes do mundo têm revelado que 2/3 dos agressores são filhos e esposos, pois, de modo geral, os cuidados com a pessoa idosa continuam a ser, na maior parte das sociedades, de responsabilidade das famílias. Assim é no seio familiar que ocorrem todas as formas de violência contra o idoso, sendo, em grande parte mantida em segredo pela família. O que dificulta tanto a sua investigação quanto a notificação, ainda pontuais e praticamente inexistentes, fazendo parte da chamada cifra negra (ALVES, 2007, p.03/04). Daí, a violência familiar ser entendida como uma violência calada, que muitas vezes é sofrida em silêncio, sendo praticada por filhos (as), netos (as), esposos (as), irmãos, conhecidos ou vizinhos que estejam próximos à vítima. De acordo com Faleiros (2007, p.40), implica na: [...] ruptura de um pacto de confiança, na negação do outro, podendo mesmo ser um revide ou troco. Alguns filhos pensam dar o troco de seu abandono ao entregar idosos em abrigos ou asilos e ao informarem endereços falaciosos para não serem contatados. Em geral, os casos de violência no Brasil são registrados em situações policiais, tratando-se, portanto, de casos de violência explícita, facilmente constatada. No entanto, existem casos de violência psicológica, difíceis de serem percebidos e diagnosticados, tanto no nível institucional quanto pelo agressor ou pela própria vítima. A recusa de denúncia pelo idoso ou de seus familiares/cuidadores dificulta a obtenção de dados informativos para o desenvolvimento de pesquisas neste campo. Tornase expressivo o número de idosos que sofrem todos os tipos de maus-tratos e violência, no entanto, na maioria das vezes, se calam por medo de represália da própria família, ou do cuidador, ou mesmo por desinformação, ou impossibilidade de locomoção. Desse modo, podemos verificar como a literatura aponta que os maiores agressores dos idosos são seus entes mais próximos, como filhos, esposos (a), netos e que esses conflitos são originados por diversos motivos que vão desde a dependência financeira dos filhos ou das pessoas que convivem com o idoso até o usos de drogas. Assim, diante da fragilidade do Estado em formular e sustentar políticas públicas

verifica-se um aumento de casos de conflitos econômicos e sociais vinculados às relações familiares, levando à necessidade de intervenção estatal. Ademais, torna-se urgente e cada vez mais necessária a prática e apuração das denúncias, seja através do disque 100, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, ou das Delegacias Especializadas de Atendimento aos idosos em algumas capitais, ou dos Núcleos de Atendimento do Ministério Público e das Defensorias, a exemplo do Centro Integrado de Apoio e Prevenção à Violência contra a Pessoa Idosa (CIAPVI) em São Luís do Maranhão. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A violência contra a pessoa idosa representa uma grave violação de seus direitos como cidadãos, sinalizando um retrocesso no campo social quanto às afirmações dos direitos humanos. A violência familiar é a que mais contraria os princípios desses direitos previstos no ordenamento jurídico internacional e brasileiro, que deveriam resguardar e proteger a pessoa idosa, pois é um problema complexo, além de desafiar os órgãos públicos em combater as agressões desumanas e indignas praticadas contra esse segmento da população. A dificuldade que o idoso expõe ao proteger seu agressor familiar, por medo de denunciá-lo, em virtude de muitas vezes, temer por sofrer represálias ou piorar o seu convívio, retarda a efetivação de seus direitos defendidos pelos instrumentos legais de proteção. Atrelado a estas dificuldades tem-se a falta de conhecimento, especificamente, por parte dos idosos a respeito dos seus direitos, haja vista a sua violação (das mais variadas formas) ser considerada crime, conforme o Estatuto do Idoso. A reflexão apresentada neste trabalho mostra que há muitos idosos que não denunciam seus algozes, por serem na maioria dos casos seus filhos (as), netos (as), esposos (as) e outros integrantes da família. Este é um elemento dificultador para que não haja mais denúncias, pois se sentem como se estivessem rompendo com o pacto feito com os familiares. Quando optam por denunciar, os idosos não conseguem disfarçar o constrangimento, a emoção e/ou temor às retaliações de seus agressores (LEITE, 2012). Assim, pode-se dizer que a violência familiar ocorre motivada por questões de cunho sociais, econômicos, culturais e políticos, uma vez que ainda são frágeis os programas,

projetos e benefícios que auxiliem efetivamente no cuidado aos idosos. Embora existam significativos mecanismos legais e normativos para o enfrentamento da violência contra o idoso. Nesse ano de 2013 o Estatuto do Idoso completa dez anos, o que nos desafia a efetivar os direitos dessas pessoas. Por isso são indispensáveis políticas públicas que visem garantir que o Estado e a família cumpram sua parte no que se refere à proteção e ao cuidado ao idoso, além da contribuição da sociedade nesta questão. Requerendo assim a participação dessas três esferas (Estado, família e sociedade) no tocante a proteção digna e saudável aos idosos. 5. REFERÊNCIAS ALVES, Alice Gonçala Ferreira de Azevedo. Segredos de família: considerações sobre os casos de violência contra a pessoa idosa. 2007. Disponível em: mpdft.gov.br/senss/anexos/anexo_7.17_-_alice_alves.pdf. Acesso em 18 de janeiro de 2013. BRASIL. Ministério da Saúde. Violência intrafamiliar: orientações para prática em serviço. Secretaria de Políticas de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2001.. Lei Federal nº 10.741 de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências.. Subsecretaria de Direitos Humanos. Plano de ação para o enfrentamento da violência contra a pessoa idosa. Brasília: Subsecretaria de Direitos Humanos, 2007. FALEIROS, Vicente de Paula. Violência contra a pessoa idosa: ocorrências, vítimas e agressores. Brasília: Universa, 2007. 394 p. LEITE, Déborah Santiago Costa. Violência Intrafamiliar Contra a Pessoa Idosa: estudo acerca do Centro Integrado de Apoio e Violência contra a Pessoa Idosa (CIAPVI). 2012. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do Maranhão, São Luís. MINAYO, Maria Cecília. Violência contra os idosos: O avesso do respeito á experiência e à sabedoria. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2 edição, 2005. SILVA, Elaine Alves de Oliveira; LACERDA, Ângela Maria Gomes de Matos. A violência e os maus-tratos contra a pessoa idosa. In Fragmentos de Cultura, v.17, n.3/4, p.239-255,2007.