Um Estudo Sobre a Abordagem da História da Matemática em Livros Didáticos

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Transcrição:

Artigo Teórico Página 28 Um Estudo Sobre a Abordagem da História da Matemática em Livros Didáticos Maria Lucivânia Souza dos Santos 15 Edelweis Jose Tavares Barbosa 16 Resumo Neste artigo, apresentamos um estudo em que investigamos como a História da Matemática (HM) é abordada em livros didáticos dos anos finais do ensino fundamental. Com o objetivo de fundamentar esta análise, delineamos alguns estudos sobre autores que defendem o uso da HM como recurso didático no ensino. Adotamos como orientação teórico-metodológica as pesquisas de Vianna (1995) e Bianchi (2006) que apresentam algumas categorias de uso didático da HM informação, motivação, estratégia didática e uso imbricado ou flash que foram utilizadas ao tecer nossa análise sobre coleções de livros didáticos adotadas no município Caruaru, no Agreste Pernambucano. Os resultados deste estudo apontam que a utilização da HM, nos livros, ainda tem se limitado a aparições como informação e/ou motivação; esporadicamente encontramos associação do conhecimento histórico na elaboração de novas sequências ou estratégias didáticas que contribuam para a construção do conhecimento matemático, apoiado no processo de desenvolvimento histórico da Matemática. Palavras-chave: História da Matemática. Livro Didático. Categorização. Introdução Em meio aos diversos fatores que podem interferir no processo de ensino e aprendizagem da Matemática, dois se sobressaem, de acordo com Miguel et al. (2009): o primeiro é o desinteresse dos estudantes em aprender a Matemática, do modo como ela é apresentada em sala de aula; o outro fator se refere aos questionamentos que frequentemente ouvimos dos estudantes quanto aos porquês matemáticos sobre os conteúdos abordados pelo professor e que ele poucas vezes sabe responder. Perante esse fato, a Matemática ainda figura no topo da lista das disciplinas menos atrativas aos olhos dos estudantes que prosseguem seu percurso escolar acumulando insucessos em sua aprendizagem. 15 Mestranda em Educação Contemporânea (UFPE/CAA). Docente do Núcleo de Formação Docente da Universidade Federal de Pernambuco Centro Acadêmico do Agreste, Caruaru, PE, Brasil. E-mail: lucivaniasousa1@gmail.com 16 Doutorando em Ensino das Ciências (UFRPE); Docente do Núcleo de Formação Docente da Universidade Federal de Pernambuco Centro Acadêmico do Agreste, Caruaru, PE, Brasil. E-mail: edelweisb@yahoo.com.br

Página 29 Acredita-se que por meio de um ensino mais prático e dinâmico, em que os estudantes consigam perceber certa familiaridade cotidiana para os aspectos matemáticos, apresentados durante as aulas, e que disponham de justificativas convincentes sobre os porquês matemáticos, é possível tornar as aulas mais interessantes e significativas. Miguel et al. (2009) ressaltam que a história pode ser uma forte aliada na busca desses objetivos, se adaptada pedagogicamente, configurando-se em atividades que podem ser realizadas na sala de aula ou até mesmo extraclasse. Reforçando esta ideia, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) citam a História da Matemática como um recurso que pode contribuir para com a busca de respostas a esses porquês. Outros autores também destacam o valor didático da história como recurso no ensino da Matemática (BARONI; TEXEIRA; NOBRE, 2005; MIGUEL; MIORIM, 2008; STRUIK, 1985; FAUVEL, 1991 apud MIGUEL et al., 2009). De acordo com esses autores, a história pode aumentar a motivação para a aprendizagem da Matemática, satisfazendo nosso desejo de saber como os conceitos matemáticos se originaram e se desenvolveram; pode humanizar a Matemática, contribuir para as mudanças de percepções dos estudantes com relação à Matemática, suscitar oportunidades para a investigação, ilustrar e tornar mais interessantes o ensino da Matemática, nos levar a entender nossa herança cultural através das relações da Matemática com outras disciplinas como Física e Astronomia, além das Artes, a Religião, a Filosofia e, inclusive, com as técnicas artesanais. Em vista disso, busca-se discutir, neste trabalho, o papel da história como recurso didático no ensino da Matemática, por entender que a abordagem dos conteúdos matemáticos, apoiada pela sua história, pode contribuir para desenvolver o interesse, a criatividade, a curiosidade e a construção de conceitos significativos no processo de ensino e aprendizagem. Verifica-se, assim, como a História da Matemática se manifesta em livros didáticos voltados para os anos finais do Ensino Fundamental, por meio da análise dos livros didáticos mais adotados pela rede municipal de ensino da cidade de Caruaru, no Agreste Pernambucano, referentes ao PNLD 2014. Abordagens da História da Matemática como Recurso Didático no Ensino A partir do final da década de 1980, percebe-se um crescente aumento de manifestações da utilização da história em textos voltados à prática pedagógica da

Página 30 Matemática. Dentre estes, pode-se citar os livros didáticos, os paradidáticos e as propostas elaboradas por professores, escolas ou órgãos governamentais responsáveis pela elaboração de diretrizes para os ensinos fundamental, médio e superior (MIGUEL; MIORIM, 2008). Esse discurso histórico tem se manifestado de diferentes modos nessas produções, como é possível constatar nas pesquisas acerca desse tema. Na Proposta Curricular para o Ensino de Matemática 1º grau (Estado de São Paulo), produzida em 1980, por exemplo, Miguel e Miorim (2008) identificaram a participação da História da Matemática sob, pelo menos, três formas diferentes: como elemento orientador da sequência de trabalho com um tema específico, os números; na apresentação de diferentes métodos históricos; na discussão de problemas de natureza histórica (p. 44). Os Parâmetros Curriculares Nacionais, divulgados em 1998, argumentam que a história pode possibilitar ao professor desenvolver atitudes e valores mais simpatizantes do aluno diante da Matemática. Além disso, conceitos abordados em conexão com sua história constituem-se veículos de informação cultural, sociológica e antropológica de grande valor formativo (BRASIL, 1998, p. 34). A História da Matemática, desse modo, é entendida como um instrumento de resgate da própria identidade cultural. Além desses documentos, diferentes autores destacam claramente de que maneiras a história pode ser apresentada como recurso no ensino da Matemática. Bianchi (2006) apresenta, em sua pesquisa, uma categorização das manifestações da História da Matemática em livros didáticos; são elas: informação geral, informação adicional, estratégia didática e flash (no texto dos livros) e informação, estratégia didática e questionamento sobre a história da matemática (nas atividades). Ela observou que as manifestações mais frequentes nos livros são informação geral e informação adicional. Fossa (2011) investiga três maneiras em que a História da Matemática pode ser utilizada como um instrumento pedagógico: o uso da História da Matemática como apoio à motivação do aluno, como um agente de formação cultural e como um agente de formação cognitiva na sala de aula. Corroborando com estas ideias, Mendes (2009) concebe a História da Matemática como agente fomentador do ato cognitivo em sala de aula, desde que configurado na forma de atividade para o aluno (p. 108).

Página 31 Outro autor que destaca o valor didático da história no ensino da Matemática é Antônio Miguel que, em sua tese de Doutorado, estudou as possibilidades pedagógicas do uso da História da Matemática. Ele elaborou uma lista de funções pedagógicas atribuídas à História da Matemática por diversos autores, como Félix Klein (1849-1925), Henri Poincaré (1854-1912), Morris Kline (1908-1992), Clairaut (1713-1765) Angel Ruiz Zúñiga, Phillip Jones e Paulus Gerdes. Jankvist (2009) categorizou as manifestações da História da Matemática e sugere três abordagens: na primeira, o ensino da matemática é complementado por informações históricas; na segunda, ele sugere unidades de ensino dedicadas à história, e, muitas vezes, elas são baseadas em casos. A última categoria de abordagem abrange tópicos diretamente inspirados por ou com base no desenvolvimento e história da matemática. Complementando nosso estudo teórico, citamos Vianna (1995) que observou as aparições da História da Matemática em livros didáticos de 5ª a 8ª série, paradidáticos e livros destinados ao 3º Grau. As manifestações mais recorrentes em sua análise dos livros didáticos, objeto de nosso estudo, foram motivação, informação, estratégia didática e como parte integrante do desenvolvimento do conteúdo (uso imbricado). Categorias estas, definidas pelo próprio autor à luz das propostas de uso didático apresentadas em Miguel (1993), Weil (1991) e Struik (1985). Dentre os autores estudados, Vianna (1995) parece ser o que melhor sintetiza as possíveis aparições da História da Matemática descritas. Além disso, as três primeiras categorias citadas por ele aparecem em grande parte dos estudos sobre as funções pedagógicas da História da Matemática. Diante disso, o seu trabalho foi utilizado como referencial teórico-metodológico deste estudo, sendo complementado pelo estudo de Bianchi (2006) e Miguel et al. (2009). Metodologia O estudo aqui apresentado constitui uma pesquisa de natureza qualitativa e quantitativa, que toma como objeto de estudo as diferentes manifestações da História da Matemática em livros didáticos, voltados para os anos finais do ensino fundamental. A partir do estudo teórico realizado, adotamos como referencial teórico-metodológico o trabalho de Vianna (1995), que verificou as seguintes manifestações de uso da História da

Página 32 Matemática em livros didáticos: motivação, informação, estratégia didática e como parte integrante no desenvolvimento do conteúdo (uso imbricado). Desde a pesquisa realizada por Carlos Vianna, outros estudos e categorizações surgiram, como o de Bianchi (2006). Dessa forma, optou-se por usar este trabalho para complementar a categorização adotada, especialmente por apresentar resultados mais atuais. Além desses, utilizou-se as ideias de Miguel et al (2009) sobre investigação histórica na sala de aula. Assim, as quatro categorias foram redefinidas, como segue: Motivação: pode ser apresentada como uma anedota, uma lenda, um texto introdutório a alguns capítulos do livro ou como problemas históricos que podem desafiar o estudante motivando-o a resolvê-los. Informação: informações através de curiosidades, datas, pequenas biografias, objetos antigos, quadros informativos dentro do texto ou entre exercícios, mas que não completam nem auxiliam na resolução das atividades. Estratégia didática: construção de conceitos e conhecimentos matemáticos através da investigação histórica. Uso imbricado ou flash: informações ou comentários históricos que podem aparecer implicitamente no desenvolvimento do texto ou atividade quase que de forma imperceptível. Cabe ressaltar que essa categorização é limitada, que é possível incluir novas categorias ou ainda utilizar, ao mesmo tempo, duas ou mais categorias de análise. Para a análise foram escolhidas duas coleções de livros didáticos de Matemática, as duas mais adotadas pela rede municipal de ensino de Caruaru, no Agreste Pernambucano, referentes ao PNLD 2014, a saber: Coleção Vontade de Saber Matemática, dos autores Patrícia Rosana M. Pataro e Joamir Roberto de Souza e Coleção Praticando Matemática Edição Renovada, dos autores Álvaro Andrini e Maria José Vasconcellos. O Campus Agreste da Universidade Federal de Pernambuco, instituição onde o estudo foi realizado, está localizado na cidade de Caruaru PE, este foi um dos critérios de seleção para a escolha do Município em questão, além deste, destaca-se ainda o resultado das últimas avaliações do IDEB, no qual se percebe que o município conseguiu atingir as

Página 33 metas projetadas. O passo inicial do presente estudo foi realizar o mapeamento de todas as escolas de ensino fundamental do Município de Caruaru e as respectivas coleções de livros didáticos escolhidas no PNLD 2014. Este mapeamento deu-se através de busca no site do SIEPE Sistema de Informações de Educação de Pernambuco. O passo seguinte foi verificar e anotar todas as aparições da História da Matemática em cada volume tanto em textos como em atividades e, inclusive, nas orientações destinadas aos professores. Depois, a partir da categorização já explicitada, buscamos agrupar cada aparição para assim poder estabelecer comparações entre os volumes e entre as duas coleções. Análise e Discussão A História da Matemática aparece numa quantidade semelhante nas duas coleções analisadas, embora seja possível perceber que grande parte das aparições é organizada de forma diferente. Na coleção Vontade de saber Matemática é frequente a aparição da história em meio ao conteúdo e em atividades/exercícios; na coleção Praticando Matemática, além de ser recorrente em meio ao conteúdo e nas atividades/exercícios, aparece num quantitativo bem maior no manual do professor. O resultado deste trabalho é apresentado de forma reduzida, tendo em vista a grande quantidade de aparições categorizadas, por se tratarem de oito volumes. Assim, apresentaremos apenas os gráficos que sintetizam a análise feita. Gráfico 1 Abordagens da HM na coleção Vontade de Saber Matemática. Fonte: relatório da pesquisa.

Página 34 Gráfico 2 Abordagens da HM na coleção Praticando Matemática. Fonte: relatório da pesquisa. Analisando os gráficos, podemos perceber que a categoria mais recorrente em todos os volumes, nas duas coleções, é informação e que a categoria estratégia didática ainda é pouco recorrente. Cabe ressaltar que algumas aparições de HM apresentaram características comuns a mais de uma categoria, assim, foram contabilizadas nas duas ou mais categorias em que se enquadravam. Em seu estudo, Vianna (1995) encontrou menos de 6% de aparições da História da Matemática na coleção analisada e lançou o questionamento Isso é realmente pouco? (p. 75). Em nosso estudo verificamos até 10% de aparições em uma das coleções, mas lançamos o mesmo questionamento, será que isso é realmente pouco? Há também que se considerarem os aspectos qualitativos das abordagens históricas presentes nessas coleções. Na coleção Praticando Matemática Edição Renovada, por exemplo, são poucas as aparições categorizadas como estratégia didática, mas em compensação parecem ter sido mais bem elaboradas; na outra coleção, no entanto, há muita incidência dessa categoria, mas aparece como uma tentativa de estratégia didática, digamos que seria um começo de utilização da História da Matemática no sentido investigativo e, embora tenhamos incluído algumas destas questões nesta categoria, não são questões completas que possam permitir uma investigação aprofundada por parte do aluno. Considerações Finais O elemento que mais chamou atenção na análise foi a forte presença da História da

Página 35 Matemática no manual do professor e como ela é apresentada nessas obras, geralmente através de textos que complementam o pouco de história trazido no capítulo destinado ao aluno, proporcionando ao professor um aprofundamento sobre o que se está discutindo. A história também aparece no manual do professor em forma de atividades de investigação histórica, inclusive com a proposta de resolução de problemas antigos retirados de papiros matemáticos. O fato de estar presente no manual e de se configurar como uma boa fonte de aprofundamento da história enfraquece o argumento questionador de que o professor não tem tempo e nem preparo para trabalhar em sala de aula com o apoio da História da Matemática. Em contrapartida, concordamos com a posição de alguns autores quando afirmam ser difícil inserir a história na sala de aula, mas também acreditamos que o professor deve pensar no sentido prático e utilitário da história no ensino. Alguns livros didáticos já estão melhorando este aspecto, a integração da História da Matemática como recurso didático, não apenas como motivação, informação ou mesmo de forma desconexa com o conteúdo. Tal integração ocorre por meio da criação de sequências didáticas aportadas por investigação histórica que possam permitir a construção do conhecimento matemático, contribuindo, assim, para que o aluno tenha uma aprendizagem mais significativa. Referências BARONI, R. L. S; TEIXEIRA, M. V; NOBRE, S. R. A investigação científica em história da matemática e suas relações com o programa de pós-graduação em educação matemática. In: BICUDO, M. A; BORBA, M. C. (orgs.). Educação Matemática: pesquisa em movimento. 2 ed. revisada São Paulo: Cortez, 2005. BIANCHI, M. I. Z. Uma reflexão sobre a presença da história da matemática nos livros didáticos. 2006. Dissertação de Mestrado. Rio Claro, SP: ICGE/UNESP, 2006. BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática (3o e 4o ciclos do Ensino Fundamental). Brasília: SEF/MEC, 1998. FOSSA, J. A. Matemática, História e Compreensão. Revista Cocar, v. 2, n. 4, p. 7-16, 2011. JANKVIST, U. T. A categorization of the'whys' and'hows' of using history in mathematics education. Educational Studies in Mathematics, v. 71, n. 3, p. 235-261, 2009.

Página 36 MENDES, I. A. Atividades históricas para o ensino da trigonometria. In: MIGUEL, Antônio et al. História da Matemática em atividades didáticas. 2 ed. rev. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2009. MIGUEL, A.. Três Estudos sobre História e Educação Matemática. 1993. Tese de Doutorado Universidade Estadual de Campinas SP, 1993. MIGUEL, A. et al.. História da Matemática em atividades didáticas. 2 ed. rev. São Paulo: Editora da Física, 2009. MIGUEL, A.; MIORIM, A. História na Educação Matemática: propostas e desafios. 1 ed., 2 reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. STRUIK, D. J. Por que estudar história da matemática? Trad. C.R.A. Machado & Ubiratan D'Ambrosio. In: GAMA, R. (Org.) História da técnica e da tecnologia, T. A. Queiroz & EDUSP, São Paulo, 1985. VIANNA, C. R.. Matemática e História: algumas relações e implicações pedagógicas. 1995. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Educação, USP, 1995. WEIL, André. História da matemática: por que e como. Matemática Universitária, n. 13, p. 17-30, 1991. Ainda não é Sócio?! Filie-se agora e faça parte da comunidade de Educadores Matemáticos! Regionais em todo território nacional! Veja mais em www.sbembrasil.org.br