A Síndrome da Alienação Parental no Ordenamento Jurídico Brasileiro

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Transcrição:

A Síndrome da Alienação Parental no Ordenamento Jurídico Brasileiro Autor: Cláudia Mara Rodrigues Camelo Área do Direito: Direito Civil Titulação: Bacharel em Direito Filiação institucional: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais PUC Minas Endereço para correspondência: Rua dom Pedrito, nº191, ap.405, Bairro Nova Vista BH/MG Cep 31070-080 Email: claudiamrcamelo@gmail.com PÁGINA 1

Resumo: Esse trabalho tem por objetivo pesquisar a Síndrome de Alienação Parental (SAP), seus registros históricos, conceito, bem como a sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro. Destacou-se a Lei 12.138/2010, que regulamenta a Alienação Parental e constitui um importante marco uma vez que tipificou as condutas de genitor alienante, reconhecendo esta conduta como abuso moral e emocional em face da criança e do adolescente, objetivando a proteção dos direitos da criança e do adolescente na medida em que ao garantir que os direitos fundamentais estejam resguardados. Palavras-chave: Direito Civil. Direito de Família. Lei 12.318/2010. Síndrome da Alienação Parental. Abstract: This work conducts to a search about the Parental Alienation Syndrome (SAP), written history, concept, and its insertion in the Brazilian legal system. Stood out 12.138/210 Law, which regulates the Parental Alienation and is an important milestone as it typified the conduct of the alienating parent, recognizing this behavior as moral and emotional abuse in the face of children and adolescents, and focuses on protecting the rights Child and adolescent in that by ensuring that fundamental rights are safeguarded. Keywords: Civil Law. Family Law. Law 12.318/2010. Parental Alienation Syndrome. Sumário: Introdução. 1.Registros Históricos. 2. Conceito. 3. A Alienação Parental no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Conclusão. Referências PÁGINA 2

A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 1. Registros Históricos A Síndrome da Alienação Parental (SAP) foi identificada em 1985 pelo médico-psiquiatra norte-americano e professor especialista do Departamento de Psiquiatria Infantil da Universidade de Columbia e perito judicial, Richard Gardner que se interessou pelos sintomas que as crianças desenvolviam nos divórcios litigiosos, publicando um artigo sobre as tendências em litígios de divórcio e guarda. Em sua obra, Alienação Parental: Comentários à Lei 12.318/2010, Douglas Phillip Freitas, relata que: Considerado um dos maiores especialistas mundiais nos temas de separação e divórcio, Gardner observou que, na disputa judicial, os genitores deixavam muito claro em suas ações que tinham como único objetivo a luta incessante para ver o ex-cônjuge afastado dos filhos, fazendo muitas vezes uma verdadeira lavagem cerebral na mente das crianças. Richard Gardner foi o primeiro a definir a Alienação Parental como uma síndrome. Em um artigo de 1985, ele definiu a SAP como: um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita para com a criança e que não tem nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor genitor alienante - o que faz a "lavagem cerebral, programação, doutrinação" - e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo genitor alienado (GARDNER, 1985) Gardner (1985) afirma também que a doutrinação pode ser deliberada ou inconsciente por parte do genitor alienante. A SAP foi originalmente desenvolvida como uma explicação para o aumento de relatos de abuso infantil PÁGINA 3

nos anos 80. Gardner (2001) acreditava inicialmente que um dos genitores (geralmente a mãe) fazia falsas acusações contra o outro genitor (geralmente o pai), a fim de evitar contato entre ele e a criança (GARDNER, 2001). Embora Gardner tenha descrito de início que a mãe era o genitor alienante em 90% dos casos, ele mais tarde declarou que ambos os pais tinham a mesma probabilidade de alienar (JAFFE, 2002). Concluindo mais tarde que, segundo sua experiência, na maioria dos casos de SAP não estavam presentes acusações de abusos (JAFFE, 2002). Ainda em sua obra, Douglas Phillips Freitas informa que muitos outros estudiosos e pesquisadores, assim como Blush e Ross, desenvolveram pesquisas e trabalhos para identificar a SAP, suas causas, bem como o seus sintomas:...baseados em experiências profissionais também como peritos em tribunais de família, traçaram um perfil dos pais separados, observando que as falsas acusações de abuso sexual e distanciamento de um dos genitores também eram causas de alienação, chegando a ser definida como Síndrome de SAID Alegações Sexuais no Divórcio, em que o genitor conta uma história para a criança sobre ela ter sofrido um falso abuso sexual, acusando o outro genitor. Nomenclatura paralela dada foi a de Síndrome da Mãe Maliciosa, associada diretamente ao divórcio, quando a mãe impõe um castigo da mulher contra o ex-marido, interferindo ou mesmo impedindo o regime de visitas e acesso às crianças. Outros estudos apontam nomeiam como Síndrome da Interferência Grave, que é a postura adotada por um progenitor que se nega ao regime de visitação ou acesso às crianças motivado pelo ressentimento pelo ex-cônjuge, tal ressentimento pode ir desde a mágoa da separação ou uma traição ou pela falta de pagamento da pensão alimentícia. Outros estudiosos, a denominaram como a Síndrome da Medéia, em que os pais separados adotam a imagem dos filhos como a extensão deles mesmos. Apesar das várias denominações apresentadas, todos os autores, psiquiatras e psicólogos apontaram definições diferentes para sintomas comuns, apontando para a síndrome, em virtude da mesma forma de ação e reação psicológica nas crianças e adolescentes vítimas da síndrome. Esse neologismo PÁGINA 4

Síndrome da Alienação Parental proposto por Richard Gardner foi o que mais traduziu os fatos relacionados às diversas situações pesquisadas, chegando ao Brasil por meio de pesquisas de profissionais vinculadas ao desenvolvimento infantil e ao direito de família. Segundo Freitas, no cenário internacional, a admissibilidade da SAP foi rejeitada por um painel de peritos do Tribunal de Apelação da Inglaterra e País de Gales, no Reino Unido, e o Departamento de Justiça do Canadá desaconselham seu uso. Entretanto, a admissibilidade ocorreu em algumas Varas de Família nos Estados Unidos, formou uma consciência social em muitos estados norte-americanos, que passaram a reconhecer, em seus tribunais, os danos psicológicos causados aos filhos por meio da SAP. Nos Estados da Califórnia e da Pensilvânia, em seu regramento punitivo, há a advertência de que se, o possuidor da guarda legal da criança impede, com intenção maliciosa, o outro genitor de exercer o direito de visita, é castigado com prisão máxima de um ano e multa, além de penas alternativas e restritivas de direito como suspensão ou supressão da carteira de motorista. No Estado do Texas, o genitor alienador, por ter provocado intencionalmente o desequilíbrio emocional na criança e por ter procedido de maneira imprudente, pode ser inquirido pelo tribunal, como punição mais severa que nos anteriormente citados. Na Europa, no país da Espanha mais precisamente, diversos julgados mencionam a SAP como forma direta de agressão psicológica às crianças nos casos de divórcio, entretanto está apenas começando a considerar como um problema grave. No México, a última reforma do Código Civil incluiu dispositivos sobre a Síndrome da Alienação Parental. No Brasil, segundo Freitas, a divulgação da SAP obteve maior atenção por parte do Poder Judiciário em 2003, quando surgiram as primeiras decisões reconhecendo esse fenômeno, muito comum e antigo nas lides familistas. Esta percepção, começou a tomar visibilidade através de uma participação frequente e fundamental de equipes interdisciplinares nos procedimentos familistas e de pesquisas e divulgações realizadas por institutos como a APASE Associação dos Pais e Mães Separados, IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Família, dentre outros. Em sua obra, Freitas informa que, a Alienação Parental ganhou disciplina própria através da Lei no 12.318/2010, que prevê uma série de ferramentas jurídicas para que o comportamento inadequado do genitor PÁGINA 5

alienador diminua ou cesse, proporcionando ao magistrado condições de definir e perceber práticas de alienação parental, intervindo de forma positivada com maior segurança no ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma, entende-se que os resultados das pesquisas e trabalhos nos âmbitos internacional e nacional foram importantes para a difusão da compreensão da SAP entre os profissionais atuantes do Direito e para profissionais de áreas correlatas, tornando-se necessária a criação de uma lei para tratar especificamente da Síndrome da Alienação Parental, a Lei 12.318/2010. 2. Conceito A Síndrome da Alienação Parental, segundo definição de Richard Gardner, é um distúrbio da infância que surge quase que exclusivamente no contexto das ações judiciais em que há disputa pela guarda dos filhos. Segundo Gardner, define a SAP: A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita para com a criança e que não tem nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor genitor alienante - o que faz a "lavagem cerebral, programação, doutrinação" - e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo genitor alienado. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável. (GARDNER, 2001) O conceito legal da Síndrome da Alienação Parental está disposto no artigo 2º da Lei 12.318 de 2010, da seguinte forma: Artigo 2º - Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância para PÁGINA 6

que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. A SAP é um transtorno psicológico que se caracteriza por um conjunto sintomático através do qual um genitor, denominado cônjuge ou genitor alienador, modifica a consciência de seu filho, por meio de estratégias de atuação, com o objetivo de impedir, obstaculizar ou destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge ou genitor alienado. Em seu parágrafo único, o artigo 2º da Lei 12.318, exemplifica alguns sintomas da síndrome: Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós. Para Douglas Philips Freitas, a conduta do alienador, por vezes, é intencional, mas muitas vezes sequer é por ele percebida visto que se trata de uma má interpretação e direcionamento equivocado das frustações decorrentes PÁGINA 7

do rompimento afetivo com o outro genitor, alienado. Essa conduta intencional ou não, desencadeia uma campanha de modificação nas emoções do alienador e da criança ou adolescente, que faz produzir um sistema de cumplicidade e compreensão da conduta do alienante, ora justificando, ora praticando atos que visam a provocação do alienante que joga e chantageia sentimentalmente o menor com expressões do tipo: Você não quer ver a mãe triste, né?, dentre outras (FREITAS, 2015). As características e/ou sintomas da SAP estão além do rol exemplificativo do artigo 2º supracitado. Maria Pisano Motta apresenta outros exemplos de condutas de Alienação Parental: É a recusa de passar as chamadas telefônicas; passar a programação de atividades com o filho para que o outro genitor não exerça o seu direito de visita; apresentação do novo cônjuge ao filho como seu novo pai ou mãe; denegrir a imagem do outro genitor; não prestar informações ao outro genitor acerca do desenvolvimento social do seu filho; envolver pessoas próximas na lavagem cerebral dos filhos; tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro genitor; sair de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o outro genitor, ainda que esteja disponível e queira cuidar do filho; ameaçar o filho para que não se comunique com o outro genitor. (MOTTA, 2007, p. 44) A partir do conceito e sintomas apresentados, é perceptível que os elementos identificadores da Síndrome da Alienação Parental traduzem-se em elementos próprios de uma sociopatia aparente; à imaturidade e a irresponsabilidade dos cônjuges que não sabem separar a dissolução do vínculo conjugal da vida parental, levando para a relação entre pais e filhos, os conflitos pós-ruptura e fazendo da relação parental um verdadeiro cabo de guerra em que a luta pela guarda do filho é apenas um instrumento de poder e controle, e não um desejo de cuidado e afeto para com a criança ou adolescente. PÁGINA 8

3. A Alienação Parental e o Ordenamento Jurídico Brasileiro A Alienação Parental não é novidade, tanto no campo médico como no jurídico, nem tampouco um problema novo para a sociedade. A doutrina e, na esteira, a jurisprudência já identificavam, na década de 80, a Alienação Parental e, com fartos recursos e forçosos estudos hermenêuticos, construíram algumas soluções jurídicas para saná-la ou, pelo menos, minorá-las nas lides relacionadas à família, em que se constatam a sua presença. Infelizmente, muitos profissionais e operadores do direito não sabiam lidar com a presença da Síndrome da Alienação Parental nos litígios em que estavam envolvidos, ora não a identificando, por vezes não obtendo a tutela necessária para resolver a situação. Com o advento da Lei 12.318, publicada em 27.08.2010, no Diário Oficial, e sancionada no dia anterior, alguns novos instrumentais jurídicos foram apresentados para que o comportamento inadequado do genitor alienador diminua ou cesse, proporcionando ao magistrado condições de definir e perceber práticas de alienação parental, intervindo de forma positivada com maior segurança no ordenamento jurídico brasileiro. A referida lei, que tutela especificamente a síndrome, chamando-a apenas de Alienação Parental, conceitua e de forma exemplificativa, elenca alguns exemplos para identificação da síndrome: Art. 2 o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: PÁGINA 9

I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós. Nos ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves verificamos: Esta Lei tem como objetivo reforçar o direito da criança protegido constitucionalmente, bem como assegurar o direito do art. 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente onde dispõe que nenhuma criança será objeto de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma descrita em lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (GONÇALVES, 2017) Assim como a Constituição Federal, o Código Civil e o Estatuto da Criança e o Adolescente, a Lei da Alienação Parental tem como objetivos proteger a criança e o adolescente e os seus Direitos Fundamentais, preservar o seu direito ao convívio com a família e preservar a moralidade da criança ou adolescente diante da separação dos pais, fatos que por si, já atinge emocionalmente, psicologicamente e socialmente. A Lei 12.318/2010 possui o intuito de inibir e até mesmo reprimir a conduta do alienante e visando o melhor interesse do menor, conforme expõe Maria Berenice Dias: Por ser a Síndrome da Alienação Parental uma forma de abuso do poder familiar e de desrespeito aos direitos de personalidade da PÁGINA 10

criança, por privá-la do convívio com o outro genitor gerando consequências nocivas ao seu desenvolvimento, é necessário que tal conduta seja reprimida, visto que é cada vez mais presente nos lares brasileiros. Tal lei prevê medidas como o acompanhamento psicológico e a aplicação de multa, a inversão de guarda, e até mesmo a suspensão e perda do poder familiar. (DIAS, 2017) CONCLUSÃO A Lei da Alienação Parental constitui um marco importante uma vez que tipificou as condutas de genitor alienante, reconhecendo esta conduta como abuso moral e emocional em face da criança e do adolescente, objetivando a proteção dos direitos da criança e do adolescente na medida em que ao garantir que os direitos fundamentais estejam resguardados. Por outro lado, oferece ao genitor alienado a possibilidade da interposição de ação de indenização, na qual o alienador poderá ser responsabilizado civil e criminalmente pelos atos e comportamentos praticados, dificultando a prática do ato ilícito e imoral cometido pelo alienador, além de propiciar uma segurança aos genitores alienado através de medidas assertivas ao genitor alienante e proporciona o restabelecimento da relação entre pais e filhos, prevalecendo o direito e a justiça. REFERÊNCIAS BRASIL. Portal da Presidência da República, Brasília, 2017. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 22 nov. 2017. DALLAM, SJ. Expose: The failure of family courts to protect children from abuse in custody disputes, 1999 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 12ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. FREITAS, Douglas Phillips. Alienação Parental: Comentários à Lei12.318/2010. 4ª ed. rev., atual. e ampl.. Rio de Janeiro: Forense. 2015. GARDNER,R.A. Parental alienation syndrome vs. parental alienation: Which diagnosis should be used in child-custody litigation? IN. The American Journal of Family Therapy GARDNER, Richard. (2001) Parental Alienation Syndrome (PAS): Sixteen Years Later. Academy Forum 45 (1): 10-12child PÁGINA 11

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. v. 6. JAFFE, PG; Lemon, NKD; Poisson SE. Child Custody &Domestic Violence., 2002. 52-54. CAPLAN, PJ. IN: Caplan PJ; Cosgrove L. Bias in psychiatric diagnosis., 2004-62. MOTTA, Maria Pisano. A Síndrome da Alienação Parental. In: APASE Associação de Pais e Mães Separados (Org.) Síndrome da Alienação Parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Porto Alegre: Equilíbrio, 2007. p. 44. PÁGINA 12