ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS: COMPETÊNCIAS DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E DILEMAS DA PRÁTICA PEDAGÓGICA



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Transcrição:

ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS: COMPETÊNCIAS DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E DILEMAS DA PRÁTICA PEDAGÓGICA DUARTE, Luiza Franco 1 DUARTE, Luzia Franco SOUZA, Maria Cecília Braz Ribeiro de Introdução O presente texto apresenta resultados pertinentes a pesquisas bibliográficas, de cunho científico, que versam sobre as constatações da realidade escolar a partir da ampliação do Ensino Fundamental (EF) desenvolvidas no Grupo de Estudos e Pesquisas. A investigação teve como objetivo compreender a implantação e a organização do Ensino Fundamental de Nove anos, enfocando as discussões e leis de regulamentação desse processo de ampliação obrigatória da criança de seis anos ao universo escolar. Nosso objetivo é contribuir com os estudos sobre as Políticas Educacionais para a Educação Básica, problematizar os debates do Ensino Fundamental de Nove Anos no que se referem especificamente as competências atingidas por essas políticas educacionais para uma educação de qualidade através da superação dos obstáculos, dilemas e impasses que permearam a prática pedagógica com o ingresso de crianças pequenas na educação formal, no intento de refletir sobre as condições de formação do docente que atua nos anos iniciais do EF da Educação Básica. A metodologia utilizada nesta pesquisa foi revisão bibliografia de documentos oficiais que fomentaram diversos olhares sobre a temática. Assim, após muitas leituras orientadas desde dispositivos legais e documentos oficiais até a observação do cotidiano escolar em suas entrelinhas foram apreendidos elementos que são socializados no decorrer do presente texto. A organização textual se dá a partir de um resgate histórico da necessidade de Nove anos de escolarização básica para os brasileiros, para em seguida abordarmos as 1 Universidade Estadual do Oeste do Paraná UNIOESTE. E-MAIL: lulu.fd@hotmail.com 1

Fundamentações legais do Ensino Fundamental Ampliado. No terceiro momento, discorremos sobre a organização do trabalho pedagógico nesta nova etapa da educação básica no Brasil, e nas considerações finais, pincelamos as interfaces entre as competências da política educacional e os dilemas da prática pedagógica presente na atual estrutura do ensino fundamental de nove anos. Marco histórico para o Ensino Fundamental de Nove Anos Neste primeiro momento, a proposta de trabalho pauta-se na fundamentação teórica quanto às adequações e transformações necessárias à implantação e consolidação do Ensino Fundamental de Nove Anos no Brasil. Desse modo, recorremos à leitura e entendimento das políticas educacionais que deram suporte legal ao processo organizacional. Recorrendo a história da Educação brasileira constatou-se a demanda de ampliação do número de anos do ensino obrigatório. O primeiro passo, a Lei nº 4.024, de 1961, que estabelecia quatro anos. Outro momento foi o Acordo de Punta Del Este e Santiago, no qual o governo federal assumiu a obrigação de estabelecer a duração de seis anos de ensino primário para todos os brasileiros, prevendo cumpri-la até 1970. Em 1971, a Lei nº 5.692 estendeu a obrigatoriedade para oito anos (BRASIL, 2006). O importante acontecimento se deu em 1996, com a Lei nº 9.394, que instituiu a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) e sinalizou para a ampliação do ensino obrigatório, concorrendo numa interpretação de que o mínimo de escolaridade seria de oito anos. Assim, uma nova meta foi estabelecida para a educação nacional por meio da Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprovou o Plano Nacional da Educação (PNE). Cabe, ainda ressaltar que o Ensino Fundamental de Nove Anos é um movimento mundial e, mesmo na América do Sul, são vários os países que o adotam, fato que chega até a colocar jovens brasileiros em uma situação delicada, uma vez que, para continuar seus estudos nesses países, é colocada a eles a contingência de compensar a defasagem constatada (BRASIL, 2006, p. 14). 2

A compreensão da situação educacional brasileira diante de outros países possibilitou, apesar de conter um caráter de política paliativa, acrescentar mais um ano no Ensino Fundamental, cujo principal objetivo foi que os alunos apropriassem-se de conhecimentos culturalmente significativos com mais qualidade, também com a intenção de elevar os índices de aproveitamento nas avaliações realizadas para diagnosticar a qualidade da educação e, ao mesmo tempo, permitir que ocorram intervenções no processo de aprendizagem para corrigir as possíveis insuficiências apresentadas, principalmente nas áreas de leitura e escrita. Dessa forma, a Lei Federal nº 11.274/2006 garantiu as crianças brasileiras o acesso à escola a partir do seis anos de idade, com matrícula obrigatória. Uma política afirmativa de inclusão social que visa preencher algumas lacunas existentes no processo ensino aprendizagem, sobretudo, nos três primeiros anos do ensino fundamental envolvendo precipuamente a alfabetização e o letramento. Cabe frisar que o Ministério da Educação pretende acompanhar e, se necessário, intervir no cumprimento desta Lei por meio de alguns mecanismos como a Provinha Brasil, que é realizada no início e final do 2º ano, e também a Prova Brasil realizada por turmas de 4ª série/ 5 ºano do Ensino Fundamental da Educação Básica. Desse modo, o direito da criança a um maior tempo de escolaridade obrigatória deve ser compreendido como ampliação de suas possibilidades de aprender e de interagir com parceiros da mesma idade e com outros mais experientes. Finalmente, considerar a especificidade da faixa etária das crianças significa reconhecê-las como cidadãs e, portanto, como possuidoras de direitos, entre eles educação pública de qualidade, proteção e cuidado por parte do poder público (BRASIL, 2006, p. 22). Em síntese, a ampliação da obrigatoriedade do ensino e as adequações não só envolvem apenas as turmas de primeiro ano do Ensino Fundamental, que englobam as crianças de 6 anos, mas repercutem e suscitam olhares para todas as esferas educacionais. Fundamentações legais do Ensino Fundamental Ampliado 3

Para alcançar o entendimento do nosso objeto de estudo, analisamos os documentos oficiais que se fizeram indissociáveis na implantação do ensino de nove anos para construir elementos articuladores que respaldam a compreensão teórica de sua influência na(s) prática(s) pedagógica(s). Segundo as orientações legais e normas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) a data de corte ou data de ingresso das crianças no Ensino Fundamental é a partir dos seis anos de idade, completos ou a completar até o início do ano letivo, conforme estabelecido pelo respectivo sistema de ensino. Assim, a legislação que ampara a implantação do Ensino Fundamental de Nove Anos, em âmbito federal compõe-se: do Parecer/CNE nº 06 de 6 de junho de 2005; da Resolução/CNE nº 03 de 03 de agosto de 2005; do Parecer/CNE nº 18 de 15 de setembro de 2005; da Lei nº 11.274 de 06 de fevereiro de 2006. Em âmbito estadual, o Paraná por meio da Deliberação/CEE nº 03 de 9 de junho de 2006 legalizou a ampliação dos anos obrigatórios de frequência ao Ensino Fundamental. Em 2008, a discussão acerca da idade de acesso ao 1º ano do ensino fundamental de nove anos gerou muita polêmica no Paraná. Contudo, acalmou-se quando entrou em vigor a Lei Estadual nº 16.049 de 2009, que oferta o direito à matrícula de crianças com 5 anos no 1º ano do Ensino Fundamental de Nove Anos. A Secretaria de Estado de Educação do Paraná apresentou a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos como política afirmativa de equidade social, que tem como objetivo garantir o acesso a democratização do saber escolar e a permanência de todas as crianças na escola. Além disso, nesse contexto para a SEED (2006) dentre as implicações na ampliação do Ensino Fundamental de Nove anos está a reorganização do Ensino Fundamental nas séries iniciais e finais, tendo em vista não apenas os primeiros anos, mas toda a estrutura do Ensino Fundamental de Nove Anos; outro aspecto é a obrigatoriedade da matrícula para criança de seis anos de idade; a relevância de reelaboração de orientações nos currículos, permeando assim a necessidade de revisão do projeto político-pedagógico dos estabelecimentos de ensino. Além do mais se exige impreterivelmente o planejamento e adequação de oferta de vagas, espaços físicos, número de professores e profissionais de apoio necessário, equipamentos e material 4

pedagógico, assim como política de formação continuada para todos os profissionais da educação. Com isso, a nomenclatura indicada pelo CNE para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental estrutura da seguinte maneira: Educação Infantil até cinco anos de idade, que compreende Creche até três anos de idade e, Pré-Escola 4 e 5 anos de idade; Ensino Fundamental até 14 anos de idade, abrangendo Anos Iniciais de 6 a 10 anos de idade e, Anos finais de 11 a 14 anos de idade. O desenvolvimento e sistematização dessa política pública visou debater com a sociedade um outro conceito de currículo e escola, com novos parâmetros de qualidade. Uma escola que seja um espaço e um tempo de aprendizados de socialização, de vivências culturais, de investimento na autonomia, de desafios, de prazer e de alegria, enfim, do desenvolvimento do ser humano em todas as suas dimensões (BRASIL, 2006, p. 11). Nesse sentido, as próprias orientações legais e teóricas do governo caracterizamse pelo debate de que a ampliação não é uma questão meramente administrativa. Isso porque o trabalho pedagógico, por sua vez exige dos professores o conhecimento e atenção às características etárias, sociais e psicológicas no processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças de seis anos de idade (BRASIL, 2006). Assim, esse processo implica numa oportunidade aos educadores para uma nova práxis, numa abordagem de reflexão para desenvolver e sistematizar o caminho da escola de qualidade social. O ser humano constitui um tempo de vida que se encontra em permanente construção social. Assim, também e, mais ainda, a criança. Ao longo dos tempos e em cada momento histórico, as concepções sobre a infância vêm se modificando. Além disso, a diversidade e a pluralidade cultural presentes nas várias regiões brasileiras determinadas pelas diferentes etnias, raças, crenças e classes sociais, bem como as lutas sociais pelas conquistas dos direitos, também contribuem para a transformação dessas concepções (BRASIL, 2006, p. 18). Em outras palavras, justifica-se a ampliação do acesso ao universo escolar às crianças de seis anos porque 5

Nessa faixa etária a criança já apresenta grandes possibilidades de simbolizar e compreender o mundo, estruturando seu pensamento e fazendo uso de múltiplas linguagens. Esse desenvolvimento possibilita a elas participar de jogos que envolvem regras e se apropriar de conhecimentos, valores e práticas sociais construídos na cultura. Nessa fase, vivem um momento crucial de suas vidas no que se refere à construção de sua autonomia e de sua identidade. Estabelecem também laços sociais e afetivos e constroem seus conhecimentos na interação com outras crianças da mesma faixa etária, bem como com adultos com os quais se relacionam. Além disso, fazem uso pleno de suas possibilidades de representar o mundo, construindo, a partir de uma lógica própria, explicações mágicas para compreendê-lo. Especificamente em relação à linguagem escrita, a criança, nessa idade ou fase de desenvolvimento, que vive numa sociedade letrada, possui um forte desejo de aprender, somado ao especial significado que tem para ela freqüentar uma escola (BRASIL, 2006, p. 19). No entanto, compete esclarecer que não passou despercebido em nossa análise o porquê da ampliação se dar no início do processo de escolarização por meio da matrícula obrigatória de crianças aos seis anos de idade em vez de prolongá-la para depois dos 14 anos. Nesse sentido se faz necessário pontuar algumas questões que embasam as condições materiais e ideológicas que permeiam esse posicionamento do governo desse período. Em primeiro lugar, a opção pela faixa etária dos 6 aos 14 e não dos 7 aos 15 anos para o Ensino Fundamental de nove anos segue a tendência das famílias e dos sistemas de ensino de inserir progressivamente as crianças de 6 anos na rede escolar. A inclusão, mediante a antecipação do acesso, foi uma medida contextualizada nas políticas educacionais focalizadas no Ensino Fundamental (BRASIL, 2006). Além do mais, a ampliação, no sentido de universalização e obrigatoriedade poderia ter sido efetivada via Educação Infantil, contudo esta etapa da Educação Básica ainda não está estruturada para atender a demanda, devido aos escassos investimentos e financiamento público neste setor da educação básica. Assim, a ampliação do Ensino Fundamental deu-se com a integração do último ano da pré-escola às primeiras séries do ensino Fundamental de oito anos. Por isso recordando, no Ensino Fundamental de nove anos, foi ampliado o tempo dos anos iniciais de 4 anos para 5 anos, a proposta não é o aumento dos conteúdos, mas a qualificação da aprendizagem, dando à criança um período mais longo para solidificar suas aprendizagens, inclusive da alfabetização. 6

Dessa forma, de acordo com os documentos oficiais ressalta-se também que esta política pública se ampliação do Ensino Fundamental requer planejamento e diretrizes norteadoras para o atendimento integral da criança em seu aspecto físico, psicológico, intelectual e social, além de metas para a expansão do atendimento, com garantia de qualidade. Essa qualidade implica em assegurar um processo educativo respeitoso e construído com base nas múltiplas dimensões e na especificidade do tempo da infância, do qual também fazem parte as crianças de sete e oito anos. A organização do trabalho pedagógico nesta nova etapa da Educação no Brasil O ingresso na escola deve expressar para criança a importância de seu papel social, a continuidade de suas experiências anteriores, em síntese, a contextualização de suas necessidades. Nesse processo, a escola deve considerar a curiosidade, o desejo e o interesse das crianças, utilizando a leitura e a escrita em situações significativas para elas. Entretanto, possibilitar o acesso aos diversos usos da leitura e da escrita não é suficiente para que elas se alfabetizem. É necessário, além disso, um trabalho sistemático, centrado tanto nos aspectos funcionais e textuais, quanto no aprendizado dos aspectos gráficos da linguagem escrita e daqueles referentes ao sistema alfabético de representação. O fato de as crianças serem alfabetizadas formalmente a partir dos seis anos não constitui uma novidade no meio educacional brasileiro. Sabemos que um grande número de crianças das camadas populares que têm experiências relacionadas à alfabetização na instituição de educação infantil, ou mesmo em casa, demonstra condições cognitivas necessárias a este aprendizado (BRASIL, 2006, p. 21). Ao mesmo tempo, possibilita também a necessária e emergente reflexão dos profissionais da educação sobre a sua prática pedagógica para a construção de um projeto político-pedagógico autônomo, bem como a implementação das diretrizes de democracia do acesso, condições para permanência e de democracia da gestão, são essenciais para a qualidade social da educação. É essa a escola que o governo está construindo com os profissionais da educação (BRASIL, 2006, p. 26). 7

Dessa forma, o processo de ampliação do ensino fundamental implica, ainda, na tomada de providências para o atendimento das necessidades de recursos humanos professores, gestores e demais profissionais de educação para lhes assegurar, entre outras condições, uma política de formação continuada em serviço, o direito ao tempo para o planejamento da prática pedagógica, assim como melhorias nos planos de carreiras. Nesse sentido, a forma como se organizará o trabalho pedagógico a ser realizado no Ensino Fundamental estará vinculado ao sentido que é atribuído à escola e à sua função social, ou seja, [...] aos modos como entendemos a criança; aos sentidos que damos à infância e à adolescência e aos processos de ensino-aprendizagem; [...] ao espaço físico da própria escola e às atividades que aí ocorrem; [...] muitos fatores então condicionam a organização do trabalho pedagógico (BRASIL, 2006, p. 86). Ao observar as crianças e os adolescentes de nossas escolas brincando, podemos conhecê-los melhor, ultrapassando os muros da escola, pois uma parte de seus mundos e experiências revela-se nas ações e significados que constroem nas suas brincadeiras. Isso porque o processo do brincar referencia-se naquilo que os sujeitos conhecem e vivenciam. Com base em suas experiências, os sujeitos reelaboram e reinterpretam situações de sua vida cotidiana e as referências de seus contextos socioculturais, combinando e criando outras realidades (BRASIL, 2006, p. 36). Além disso, os espaços educativos, os materiais didáticos, o mobiliário e os equipamentos precisam ser repensados para atender às crianças com essa nova faixa etária no ensino fundamental, bem como à infância que já estava nessa etapa de ensino com oito anos de duração. Os anos iniciais do Ensino Fundamental, principalmente o 1º e o 2º ano constituem como uma possibilidade para qualificar o ensino e a aprendizagem dos conteúdos da alfabetização e do letramento. Mas, não se deve restringir o desenvolvimento das crianças de seis anos de idade à exclusividade da alfabetização. Por isso, é importante que o trabalho pedagógico implementado assegure o estudo das diversas expressões e de todas as áreas do conhecimento humano disponíveis em dado momento histórico. 8

Pela natureza dos objetivos do Ensino Fundamental, definidos na LDBEN nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, toda criança dessa etapa de ensino tem o direito ao conhecimento de todas as áreas do conhecimento estabelecidas na base nacional comum e não somente a linguagem escrita. Desse modo, não se tratar de realizar um arranjo dos conteúdos da primeira série do Ensino Fundamental de 8 oito anos. Faz-se necessário elaborar uma nova proposta curricular coerente com as especificidades não só da criança de seis anos de idade, como também das demais crianças de sete, oito, nove e dez anos de idade que constituem os cinco anos iniciais do Ensino Fundamental, como os anos finais dessa etapa de ensino. Os conteúdos desenvolvidos no Ensino Fundamental de Nove anos são de competência dos sistemas de ensino, para subsidiar essa discussão é importante observar os seguintes documentos: Constituição Federal; LDB nº. 9.394/1996; Plano Nacional de Educação; Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental; Pareceres e resoluções do CNE e do respectivo sistema de ensino; documento Ensino Fundamental de nove anos: orientações para inclusão das crianças de seis anos de idade (publicação do MEC/SEB/DPE/COEF); propostas pedagógicas das Secretarias de Educação; projetos políticos e pedagógicos das escolas; pesquisas educacionais; literatura pertinente. Diante do apresentado acima, o 1 ano do Ensino fundamental de Nove anos não se trata de reunir conteúdos de duas etapas da educação básica: última etapa da préescola e antiga 1ª série do EF de 8 anos, ao contrário, pressupõe a construção de uma proposta pedagógica coerente com as especificidades da infância. Ao longo desses nove anos de escolarização percebe-se a possibilidade de qualificação do ensino e da aprendizagem em processos de alfabetização e letramento, pois a criança terá mais tempo para se apropriar desses conteúdos. No entanto, reiteramos a premissa de que o processo de ensino nesse primeiro ano ou nesses dois primeiros anos não deverá se reduzir a essas aprendizagens. Dessa forma, compreendemos a relevância acerca do Projeto Político- Pedagógico das escolas numa construção coletiva em busca da identidade. Ou seja, os princípios, objetivos e metas de cada projeto originam-se do diagnóstico da escola sobre os anseios da comunidade e da sociedade quanto à formação e desenvolvimento das 9

potencialidades e habilidades humanas e refletem o que este realmente deseja e pode realizar a partir do provimento de determinadas condições necessárias. Logo a natureza do trabalho docente requer um continuado processo de formação dos sujeitos sociais historicamente envolvidos com a ação pedagógica, sendo indispensável o desenvolvimento de atitudes investigativas, de alternativas pedagógicas e metodológicas na busca de uma qualidade social da educação (BRASIL, 2006, p. 25). De acordo com Saito (2007), a observação do espaço escolar sob vários olhares é alicerce fundamental na compreensão das práticas educativas que decorrem como constituição material dos documentos oficiais e dos dispositivos legais que implicam no processo de formação humana, pois, os documentos em si mesmo não podem ser tidos como objetos cristalizados. Considerações finais Ressaltamos os efeitos pedagógicos desse processo de ampliação do Ensino Fundamental no espaço escolar, como a reorganização do tempo e do ambiente escolar prevista no artigo 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica; à adequação do mobiliário, equipamentos, acervo bibliográfico e materiais didáticos; o respeito às condições socioculturais e educacionais, tendo em vista a melhoria da qualidade da formação escolar. Mas o principal é articulação com a pré-escola, no sentido de dar continuidade ao atendimento da criança com adequações na proposta curricular prevendo a não transferência dos conteúdos da atual 1ª série/ano para as crianças de seis anos de idade (SEED, 2006). É necessário assegurar que a transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental ocorra da forma mais natural possível, não provocando nas crianças rupturas e impactos negativos no seu processo de escolarização. No entanto, se percebe que no ano de 2011, diante dos inúmeros avanços, ainda não houve ainda o real desenvolvimento de formação da consciência do coletivo das escolas em relação o que vem a ser o ensino de nove anos, que interesses estão incutidos nessa política educacional e, ao mesmo tempo, toda mudança e reflexão que se faz necessária para essa prática educativa. 10

Além do mais, esse ano a mais no Ensino Fundamental não é a verdadeira solução para os problemas e defasagens educacionais enfrentadas pelo Brasil, contudo pode, como política afirmativa, estar atrelada com outras ações pedagógicas que busquem além da permanência do aluno no espaço escolar, almeje o ensino brasileiro público de qualidade. Nesse sentido, o processo de ampliação e expansão do Ensino Fundamental implica na conscientização, envolvimento e comprometimento dos educadores, todavia, mais que isso, exige da sociedade, em particular do Governo investimentos necessários. Uma vez que de nada adianta esperar resultados milagrosos acerca do rendimento escolar cristalizado pelo IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), se não houver cooperação de todos os agentes envolvidos. Temos clareza que o processo de implantação do Ensino Fundamental de Nove Anos, regulamentada pela Lei nº 11.274 de 2006, requer da instância escolar uma reestruturação e reorganização curricular, pedagógica, administrativa, de aspecto físico, do corpo docente. Cabe lembrar que neste processo de democratização da educação pública, não basta ofertar o acesso à escola, mas busca-se assegurar a permanência de modo a privilegiar uma formação humana de qualidade. Contudo, compreendendo os reais objetivos do Governo com esta política afirmativa de inclusão, que por sua vez, está atrelada às alianças internacionais. É de extrema relevância que esse processo de reestruturação do Ensino brasileiro em busca de qualidade na educação tenha na prática também efetivas mudanças para o professor, isto é, aos professores sejam ofertados cursos de formação continuada, além de momentos de troca de experiências entre os grupos de professores, pois muitas vezes a ação educativa fica apenas nas paredes da sala de aula. Também consideramos essencial que outras ações sejam elaboradas, isto é, pensadas, planejadas e executadas de acordo com as características do sistema e da região na qual está inserida. Nesse sentido, diversos são os desafios colocados às equipes pedagógicas. Portanto, é fundamental que possamos entender as determinações legais e todos os aspectos evidenciados pelo processo de integração, não apenas como uma necessidade a ser cumprida, e sim como uma conquista histórica em busca de educação de qualidade para as crianças brasileiras, tendo como base os direitos já conquistados e 11

dedicados às crianças e às famílias, principalmente concebendo a criança como cidadã ativa e sua educação como essencial ao seu desenvolvimento pleno. Referências BRASIL. Ensino fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. Ministério da Educação. Brasília: FNDE, Estação Gráfica, 2006. BRASIL. Lei nº. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Estabelece o ingresso da criança de 6 anos no Ensino Fundamental de 9 anos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11274.htm>. Acesso em: 14 jul. de 2009. SAITO, Heloisa Toshie Irie. A influência dos documentos oficiais na prática educativa da infância. In: RODRIGUES, Elaine & ROSIN, Sheila Maria. Infância e Práticas educativas. Maringá: Eduem, 2007. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, (SEED). Ampliação do Ensino Fundamental: perguntas e respostas. Faxinal do Céu, Paraná, 2006. 12