TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES: A INTERAÇÃO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

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Transcrição:

TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES: A INTERAÇÃO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA SILVANA SOARES SIQUEIRA ROCHA (UEM), MARILURDES ZANINI (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ). Resumo A exiguidade de estudos sobre o processo de transposição didática em sala de aula nos envolve numa pesquisa que conflui o saber científico às práticas pedagógicas orientadas pelo Interacionismo. Assim, nesta comunicação, objetivamos refletir, a partir de uma pesquisa qualitativo interpretativa, sobre o processo que gerou a elaboração de atividades centradas nas Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná e no material de apoio que orienta o ensino de língua materna no Curso Normal Superior licenciatura para os anos iniciais do ensino fundamental, na modalidade de Educação a Distância, da Universidade Estadual de Maringá, as quais compõem o caderno de atividades de seus alunos. A reflexão nos aponta que articular teorias linguísticas às atividades de uso da linguagem em interação na sala de aula, em quaisquer modalidades, em especial, no ensino a distância, implica um grande desafio ao tutor, responsável por essa mediação. Porém, evidencia também a grande contribuição do processo de transposição didática para a formação de docentes, uma vez que, na elaboração das atividades, os participantes tutor e alunos do Curso estabelecem o diálogo entre a teoria e a prática, compreendendo a importância dessa interação na organização de um trabalho sistematizado e articulador de leitura, escrita e análise linguística. Palavras-chave: Transposição didática, Interação, Formação docente. 1. INTRODUÇÃO Os problemas encontrados no processo ensino-aprendizagem parecem estar ligados, em princípio, à formação daquele a quem cabe diretamente a responsabilidade de melhorar a qualidade do ensino - o professor. Apesar de as produções científicas que abordam o tema ainda serem em número escasso, são significativas e motivadoras de novas pesquisas. Esse é um dos motivos que nos levam a nos envolver em estudos que, ao analisarem "o processo de transposição didática na interação em sala de aula - articulando conhecimentos científicos" (MATTÊNCIO, 2001, p. 37), promovam a reflexão sobre sua interferência na prática de ensino-aprendizagem. Assim, inserimo-nos num trabalho que, a partir de uma pesquisa-ação, objetiva analisar o processo que culminou com a elaboração de atividades articuladas de leitura, escrita e análise linguística, centradas nas Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná - DCEs e no material de apoio que orienta o ensino de língua portuguesa no Curso Normal Superior - licenciatura, para os anos iniciais do ensino fundamental, na modalidade de Educação a Distância, da Universidade Estadual de Maringá, as quais compõem o caderno de atividades de seus participantes. Com a análise, esperamos levantar pontos que permitam ao professor em formação e àqueles que atuam nos cursos de licenciatura - presencial ou a distância - refletirem sobre a necessidade de articular conhecimentos científicos às práticas pedagógicas.

A pesquisa-ação, metodologia que orienta este trabalho, justifica-se porque tem como foco as ações desencadeadas por uma das autoras, que atua como tutora presencial do Curso contexto da pesquisa. 2. A Educação a Distância e a figura do tutor. A Educação a Distância, modalidade de educação apropriada para o alcance de metas de políticas públicas, principalmente em países como o Brasil, onde há grande dispersão geográfica dos alunos, tem no tutor a ponte de interação entre o conhecimento e o aluno, que, diferentemente daquele que se insere no ensino facea-face, encontra-se, no processo, em contextos sociais dos mais variados e distintos da sala de aula convencional. Munhoz (2002) define o tutor como aquele que cria os espaços em que os alunos poderão desenvolver, sob sua orientação e colaboração, o processo de construção individual do conhecimento. Por isso, é concebido como um profissional participativo, que estuda juntamente com o aluno os caminhos que possam transformar a atividade de aprendizagem em um ato significativo, engajando-o ativamente no processo de aquisição da informação e de sua transformação em conhecimento. Trata-se de um profissional que conhece e respeita as diferentes formas de aprender dos alunos e, embora não apareça fisicamente com frequência, faz-se sempre presente no processo ensino-aprendizagem. As funções atribuídas ao tutor, na Educação a Distância, são adequadas às variáveis de cada área de conhecimento. No caso desta pesquisa, o tutor é o orientador de estágio supervisionado de regência dos alunos do Curso Normal Superior a Distância, os quais atuarão nas séries iniciais - 1ª. à 4ª. série do ensino fundamental. As atividades envolvidas nesse estágio são da área de linguagem, nas quais as habilidades de leitura e de escrita são priorizadas. 3. O ensino de língua materna e a crise na escola. A partir de 1980, a crise na escola pauta-se nas dificuldades encontradas pelos alunos quando são expostos a situações de leitura e de produção de textos. Desde então o ensino da língua materna passou a ser objeto de estudo e de pesquisas daqueles que se preocuparam com a sua melhoria. Entretanto, já se passaram quase três décadas, e ainda estamos em crise, quando nos reportamos ao ensino da língua portuguesa. Nesse contexto, os questionamentos que orientam este trabalho se fecham numa questão: "Como se ensina?". Para respondê-la, propomo-nos a discutir e a apresentar uma transposição didática que culmina com uma sequência didática descrita de forma a evidenciar a organização de um trabalho sistematizado de leitura, escrita e análise linguística. 4. Leitura, escrita e análise linguística: promoção da educação linguística. A promoção da educação linguística, essencial para os sujeitos vencerem as barreiras com as quais se deparam na leitura e na produção de textos em nossos

dias, implica, no processo ensino-aprendizagem de língua materna um "conjunto de atividades de ensino-aprendizagem", que, acreditamos, crie uma situação que permite aos alunos conhecerem recursos da sua língua e sejam capazes de usá-los "de maneira adequada para produzir textos a serem usados em situações específicas de interação comunicativa para produzir o(s) efeito(s) de sentido pretendido(s)." (TRAVAGLIA, 2004: 26) Nessa perspectiva, o que é ensinar língua portuguesa? Não podemos negar a relação que as práticas de leitura e de escrita estabelecem com a análise e reflexão sobre a língua, isto é, com a análise linguística - reflexão sobre o sistema linguístico e os usos da língua, com vistas ao tratamento escolar de fenômenos gramaticais, textuais e discursivos, contrapondo-se ao ensino tradicional de gramática. Contraposição que não descarta esse ensino, antes cria condições para que os alunos aprendam também as variedades que não conhecem, ou com as quais não têm familiaridade; aí incluída a variedade padrão culta. Dessa forma, articular atividades de leitura, de escrita e de análise linguística não exclui um trabalho como a gramática normativa. Porém, o trabalho é com a gramática do texto, no texto e pelo texto, desafio que linguistas e professores têm que enfrentar juntos. 5. Transposição didática: do saber científico às práticas pedagógicas Neste trabalho, a nossa atenção se volta para encontrar respostas às perguntas: como criar situações que permitam ver a língua como um sistema de signos a serem mobilizados por usuários tão diferentes entre si, em esferas sociais específicas? Como mediar o acesso de profissionais em formação à compreensão de que a língua não é estática e, por isso, deve propor aos alunos um ensinoaprendizagem significativo? Se esse processo se constitui num desafio no ensino presencial, mais desafiador se torna no ensino a distancia e o público-alvo é um aluno que está se formando para ensinar outros alunos. Desafio à parte, o importante é que, na elaboração do material - tutor e alunos do Curso Normal a Distância - estabelecem o diálogo entre a teoria e a prática e podem compreender a importância dessa relação na organização de um trabalho sistematizado. 6. O texto como unidade, e o gênero como objeto de ensino: uma proposta possível. A noção de gênero textual vinculada às teorias de Bakhtin assinala que as esferas de atividades humanas constroem na sociedade tipos de enunciados relativamente estáveis, denominados gêneros do discurso. Isso significa que os gêneros textuais são os textos que circulam em nossa sociedade, presentes no nosso dia-a-dia, seja em casa, no trabalho, na rua, na igreja, no mercado; enfim, estão espalhados por todos os lugares. Dentre os gêneros, um é trazido para este trabalho: o jornalístico, na especificidade da notícia. Justifica-se a opção, devido à importância que têm e que a sociedade lhes atribui. Isso porque as notícias sempre existiram, uma vez que a comunicação

entre os homens acerca de situações novas sempre se fez por meio de notícias, as quais, antes do surgimento dos jornais, eram transmitidas de "boca em boca". Assim, como os demais gêneros, a notícia é um texto materializado que encontramos em nossa vida diária, com características sociocomunicativas definidas por conteúdo temático, propriedades funcionais, estilo e organização composicional, dimensões que refletem a esfera social em que é produzida. A notícia, gênero textual presente em todas as esferas sociais, faz parte da história dos usuários de uma língua. E, se o ensino deve partir do conhecimento que o nosso aluno tem sobre o uso da língua, este gênero textual, certamente, é um objeto significativo para o ensino-aprendizagem da leitura, da escrita e da análise linguística. Nesse contexto, uma transposição didática que surge como pertinente é a proposta metodológica apresentada por Dolz, Noverraz e Scheneuwly (2004), a sequência didática (SD): "um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual (oral ou escrito)". 6.1 Transposição didática: uma proposta de SD, a partir do gênero textual notícia A SD aqui proposta tem como âncora uma SD desenvolvida numa sala de aula de 3ª série do ensino fundamental, durante o estágio supervisionado pela tutora, e que, após, passou a compor o caderno de exercícios do Curso Normal Superior a Distância. A SD foi organizada, segundo estas etapas: a) apresentação de uma situação, ou seja, uma necessidade, um motivo para a produção, que, no caso do material organizado, foi a leitura de um jornal de circulação regional, suporte mais comum na cidade. Dessa forma, estabelece-se a ponte entre a vida e a escola. A seleção do gênero leva em conta o contexto. Assim, tendo em vista que o jornal havia divulgado fatos relacionados à cidade, os leitores - alunos - interessaram-se em obter informações sobre o Torneio de Handebol que na ocasião movimentava o município e, em especial, sobre o próprio estágio, segundo a notícia "Estudantes da 3ª série C recebem estagiária da UEM". É a fase mais importante da SD, pois é quando se prova ao aluno a funcionalidade da língua ou as situações reais de uso. b) a primeira produção, momento em que os alunos se envolvem com a leitura, mediada pelo professor por meio de perguntas que permitem aos leitores ler o texto, o seu entorno, permitindo inferências, que tornam significativos os usos linguísticos. A partir daí, criam-se as condições de produção: o que se dizer, por quê? para quem? como? em que local de circulação? Cria-se, assim, o momento em que os alunos tentam elaborar o primeiro texto. Na turma em que se desenvolveu a SD, os alunos escolheram divulgar acontecimentos da própria escola e turma. c) os módulos de atividades que têm como objetivo trabalhar os problemas que apareceram na primeira produção, apresentando aos alunos os instrumentos necessários para superá-los. Nessa etapa, os alunos se envolvem com o próprio texto, refletindo sobre o uso da linguagem, pertinência ou não dos elementos linguísticos selecionados em função dos objetivos propostos. A professora, por meio

de perguntas, orientou os alunos na leitura, de modo a que tivessem acesso, além do assunto, a organização - elementos composicionais - da notícia. d) a segunda produção - ou outras que se fizerem necessárias - envolve a produção, considerando-se as questões enfatizadas nos módulos de atividades. Atividades que se constituíram de perguntas que requeriam respostas ora interpretativas, ora objetivas, cruzadinhas. 7. Conclusão: análise dos resultados A transposição didática é um grande desafio que se propõe a professores em serviço ou em formação e justifica-se por razões, tais como: atender às concepções e bases teóricas sustentadoras dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa para o Ensino Fundamental; formar professores de Língua Portuguesa com maior rigor técnico, com maior criatividade e independência. Neste sentido, o trabalho pedagógico desenvolvido no Centro de Educação a Distância-SCI, do Curso Normal a Distância, nos leva a refletir e a confirmar a necessidade de um trabalho que relacione as teorias estudadas com as práticas adotadas em sala de aula. Cabe-nos também afirmar que a produção do material no qual se efetivasse uma transposição didática coerente às concepções de língua, de linguagem e de ensino, assumidas teoricamente, trouxe algumas dificuldades. Entretanto, acreditamos que estamos dando os primeiros passos rumo a uma formação profissional coerente com o perfil do profissional contemporâneo, capaz de associar teoria e prática. O material, embora ainda mereça atenção em alguns pontos na próxima produção, apresenta atividades que levam o aluno a perceber que a leitura, a escrita e a análise linguística, em cujas etapas se encontra a metalinguagem estão interligadas. Sobre a SD, podemos dizer que se trata de uma forma de transposição didática que se reveste de teorias interacionistas que não dispensam o estruturalismo, quando se faz necessário sistematizar a língua. Podemos considerá-la como uma, dentre as inúmeras, possibilidade de aproximar as aulas de língua materna da realidade dos nossos alunos. E neste sentido, tentou cumprir dois objetivos: orientar, como tutora, a organização do material para o Estágio Supervisionado na Área de Linguagem, de modo que as acadêmicas transpusessem didaticamente as teorias estudadas no material do Curso; desenvolver as atividades propostas na SD que organizaram, refletindo sobre a sua validade ou não na promoção da educação linguística. O processo não foi fácil. Contudo, a interação permitiu que, juntas - tutora e acadêmicas - pensassem um ensino-aprendizagem mais significativo para seus alunos e para si mesmas. 6. REFERÊNCIAS BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: primeiro e segundo ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília, 1998.

DOLZ, J. NOVERRAZ, M. & SCHNEUWLY, B. Sequências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: DOLZ, J. & SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004. MATÊNCIO, Maria de Lourdes M. Estudo da língua falada e aula de língua materna. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2001. TRAVAGLIA, Luís Carlos. Gramática: Ensino Plural. São Paulo: Cortez, 2006.