CIBERDEMOCRACIA: POSSIBILIDADE OU UTOPIA?

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Transcrição:

PONTO DE VISTA CIBERDEMOCRACIA: POSSIBILIDADE OU UTOPIA? Moema Gomes Moraes 1 A presentamos aqui o nosso ponto de vista sobre o livro O futuro da internet: em direção a uma ciberdemocracia planetária (LEMOS; LÉVY, 2010). Esta obra foi elaborada em dois momentos e espaços distintos. Inicialmente em 2002, Cyberdérmocracie: Essai de Philosophie Politique, escrita por Pierre Lévy na França. No final desta mesma década, André Lemos, em acordo com o primeiro autor, traduziu e modificou alguns aspectos do conteúdo e da estrutura. Além disto, foi feito uma atualização dos endereços eletrônicos que são indicados pelo autor francês. Lévy e Lemos iniciaram as discussões por correio eletrônico e em 2008 as concluíram presencialmente na McGill University de Montreal. Desta forma, o livro é destinado ao contexto brasileiro, sob o olhar de um filósofo e um sociólogo. Lévy é professor do departamento de comunicação da Universidade de Ottawa (Canadá) e pesquisador de temas relacionados aos desdobramentos das tecnologias na sociedade contemporânea. André Lemos, professor da Universidade Federal da Bahia e pesquisador em temas relacionados às tecnologias, comunicação e mobilidade no contexto atual. * Recebido em 02/02/2014, aceito em 11/10/2014. 1 Professora da Universidade Federal de Goiás (UFG); Pesquisadora do Kadjót - Grupo de estudos e pesquisas sobre as relações entre as tecnologias e a educação, cadastrado no CnPq; Doutoranda em Educação pela PUC-GO. E-mail: <gmoraes002@gmail.com>. educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014 643

O livro aborda o desenvolvimento dos recursos de redes de computadores e internet e seus reflexos nos contextos políticos, econômicos, sociais e culturais. A análise dos reflexos da expansão do ciberespaço na sociedade contemporânea é feita em 11 capítulos. A partir da introdução, os autores fazem uma descrição dos serviços e dos comportamentos dos usuários da internet e do ciberespaço. Tratam sobre os desafios gerados nas mudanças promovidas por estes recursos e apresentam uma solução que engloba uma nova perspectiva de democracia e de governo intercontinental. Para os autores, a compreensão é que a tecnologia é neutra e pertence a uma esfera digital e pública. Por isto é necessário compreender o comportamento dos usuários da internet e consequentemente do ciberespaço. É destacado ainda que a relação entre a espécie humana e a técnica é indissociável, e a partir deste posicionamento iniciam-se as discussões sobre as questões políticas, sociais e culturais. A neutralidade da tecnologia é um aspecto marcante na análise que os autores fazem dos efeitos deste pensamento determinista 2 para a sociedade. É por meio das transformações tecnológicas e científicas que surge o progresso. Portanto, a tecnologia é essencial ao homem. Seu desenvolvimento acontece de forma autônoma e espontânea, assim como a interconexão planetária. Observar isto é relevante, pois contribui para o projeto de governo transparente com as características da ciberdemocracia. Neste raciocínio, a percepção é que a natureza da técnica é política. Por isto, o desenvolvimento dos recursos tecnológicos possui implicações diretamente proporcionais ao crescimento das cidades e dos governos. Visualiza-se então, a direção do desenvolvimento: a informatização mundial. 2 A compreensão da expressão determinismo tecnológico utilizada aqui é baseada na abordagem de Andrew Feenberg que considera que os objetos técnicos são neutros e responsáveis pelas mudanças e consequências de seu uso na sociedade. 644 educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014

É neste olhar que são resgatados nas reflexões atuais conceitos de obras anteriores dos autores, tais como: ciberespaço, inteligência coletiva, cibercultura, blogosfera, blog e web 2.0. São apresentados, também, dados quantitativos das pesquisas realizadas pelo Ibope/NetRating que ilustram a análise comparativa entre o contexto mundial e o Brasil, diante do desenvolvimento e acesso às diferentes mídias. A análise da expansão da internet e das tecnologias móveis anuncia que a sociedade da informação é uma realidade mundial (p. 23). Lemos destaca, neste momento, a justificativa da ausência de reflexões que façam uma análise crítica dos dados apresentados, em função dos objetivos do livro. A partir da constatação desta realidade, Lemos e Lévy desenvolvem a ideia de um projeto de democracia. Esta ideia é apresentada como uma previsão do desenvolvimento tecnológico e também dos diversos segmentos da sociedade. Surge então o termo ciberdemocracia. A compreensão deste termo inicia-se com o resgate do conceito de cibercultura inserido em uma sociedade pós-moderna. Neste livro, a reflexão é ampliada ao observar seus princípios: liberação da palavra, conexão mundial e sua reconfiguração. Estes princípios, segundo os autores, são responsáveis em promover nos indivíduos o pensamento colaborativo, plural e aberto. Aspectos importantes que devem estar presentes em uma ciberdemocracia. Além de identificar os princípios, são destacados também os pilares que sustentam este novo projeto de organização da sociedade: a governança mundial, o estado transparente, a cultura da diversidade e a ética da inteligência coletiva. Estes pilares compõem um percurso natural, idealizado pelos pesquisadores, a longo prazo, em direção ao progresso social. A partir desta ideia, os autores desenvolvem a ideia de que as transformações da sociedade industrial para uma sociedade da informação são sustentadas em perspectivas que geram e conduzem as relações políticas da cibercultura. Diante disto, são questionadas as perspectivas futuras desta governança planetária ou política da ci- educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014 645

bercultura. Os autores reforçam que é necessário avançar nesta proposta teórica com coragem em um projeto que favoreça os ideais de liberdade, livre negociação e colaboração. A visão de neutralidade da técnica também está presente nos conceitos que são abordados no livro: computação social, inteligência coletiva e ciberespaço. Estes conceitos se convergem e contribuem para a construção da compreensão do termo ciberdemocracia. A compreensão da computação social vai além da descrição dos recursos atuais disponíveis na internet. Trata-se de compreender as formas de usos que são possíveis, isto é, o receptor das mensagens pode agora interagir e divulgar suas ideias neste novo espaço sem fronteiras territoriais: o ciberespaço. Diante destas possibilidades presentes neste espaço público existe a necessidade de novas práticas de convivência pública bem como de uma nova organização social. A percepção é que a tecnologia favorece, de forma livre para todos os seus usuários, a atualização e o compartilhamento das potencialidades de comunicação diante da mobilização cultural, criativa e também política. Na mesma direção Lévy e Lemos avançam nas discussões que já foram realizadas por eles em outros textos. O conceito de inteligência coletiva é ampliado diante das possibilidades favorecidas pelo ciberespaço. A liberdade de expressão, ampliação da memória e a navegação estão presentes neste novo espaço sem fronteiras territoriais. As possibilidades de comunicação ampliam-se e modificam-se e permitem a mobilização cultural, financeira, econômica e política. Os discursos unilaterais são rompidos e a função das mídias é alterada. Elas criam um espaço que exige novas condições de comunicação e também cidadania. A democracia e o ciberespaço buscam a liberdade de ideias, e juntos compõem as características da inteligência coletiva. Diante disto é indicado dois desafios a serem superados: O primeiro é a exigência de uma reorganização contínua deste espaço a fim evitar o caos diante da quantidade de informações disponíveis. Além de alterar as estruturas técnicas que atendam 646 educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014

a esta necessidade, é importante observar uma nova mediação entre quem transmite e quem recebe mensagem. O segundo desafio está relacionado à linguagem, presente na cultura deste movimento de transformação. Ela é indispensável para a formação da inteligência coletiva. O segundo desafio está relacionado à formação de um governo único e planetário. Ele exigirá lideranças que saibam interagir de forma colaborativa. Para isto se faz necessário uma reorganização dos poderes e das políticas em direção aos novos grupos continentais e colaborativos. Neste instante os autores declaram-se utópicos, mas avisam que esta utopia é historicamente necessária no movimento de mudanças. Eles visualizam a necessidade de surgimento de um Estado universal e transparente, e para que isto ocorra, é necessário haver pensamentos utópicos. No livro, surge também a reflexão sobre inclusão digital. Lemos traz para este capítulo seus estudos acerca dos projetos realizados pelo governo federal no território brasileiro. Ele pontua que apesar das desigualdades econômicas e sociais do país, é necessário não desconsiderar o desafio de programas que visem a inclusão digital. Cita alguns programas do governo a partir das informações disponibilizadas na internet e faz reflexões oriundas de pesquisas das quais participou. Para este autor, a inclusão deve estar relacionada a ações que promovam o desenvolvimento dos capitais social, cultural, técnico e intelectual. Elas não podem se restringir apenas a aquisição de recursos materiais e técnicos. Em sua contribuição com a discussão deste tema, ele apresenta um quadro que indica aspectos relacionados a propostas espontâneas e induzidas de inserção das tecnologias. Para os autores, o acesso às tecnologias promove a interconexão entre seus usuários, facilitando, assim, a circulação das informações, o livre comércio e as possibilidades de acesso a diferentes culturas. Destacam, então, que esta perspectiva não cabe em regimes políticos que não são democráticos, pois estes não possuem tolerância à diversidade cultural, religiosa e de ideias. educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014 647

Estes aspectos também estão presentes na compreensão que é feita sobre as comunidades. Além de possuírem características que valorizam a diversidade, elas não isentam as possibilidades que a internet promove de reunir pessoas que estão separadas geograficamente ou fisicamente. A característica que define a comunidade passa, então, para as relações que estão presentes na forma de organização dos grupos. Antes de concluir a obra os autores retomam os conceitos de inteligência coletiva e ciberespaço, aliados ao diálogo, como possibilidade de contraposição da lógica econômica e política do mundo. Seus argumentos estão baseados em três fatores: livre comunicação e expressão planetária e o surgimento de uma lei única para o planeta e o ciberespaço que permita maiores possibilidades de escolhas nas relações de consumo, trabalho e investimento. Vale destacar o esclarecimento feito pelos próprios autores de que a análise da expressão inteligência coletiva é feito a partir do ponto de vista deles mesmos, isto é, não trazem referências do campo da psicologia ou da pedagogia, aspecto que merece atenção diante do interesse daqueles estudiosos que buscam estes referenciais para suas pesquisas e projetos sobre temas relacionados às tecnologias em ambientes educacionais. É importante observar, também, que a obra trata de uma série de questões relacionadas aos desafios contemporâneos da educação, que são amplamente discutidos pela comunidade acadêmica. É necessário, no entanto, não desconsiderar o ponto de vista e o contexto dos autores da obra, por isto, a leitura e interpretação deve considerar estes aspectos para não cometer equívocos ou conclusões que não aprofundem sobre os reais desafios vividos pela sociedade. A visualização utópica dos autores é baseada em pontos de vistas que partem da ideia de que a tecnologia é neutra e que, por isto, ela conduz o desenvolvimento social, político, econômico e até mesmo cognitivo em prol de um novo governo que pertença a um Estado transparente, gerido pela inteligência coletiva. 648 educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014

Esta perspectiva, da neutralidade técnica, também se faz presente no desenvolvimento das ideias e nas discussões dos conceitos que são apresentados. Cabe ao leitor o olhar atento às perspectivas dos autores diante dos pontos de vista assumidos para que se possa usufruir das contribuições que o livro traz. REFERÊNCIA LEMOS, André; LÉVY, Pierre. O futuro da internet: Em direção a uma ciberdemocracia planetária. São Paulo: Paulus, 2010. 258p. educativa, Goiânia, v. 17, n. 2, p. 643-649, jul./dez. 2014 649