ARTIGO DATALUTA ARTIGO DO MÊS EVENTOS

Documentos relacionados
Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC Centro de Ciências Humanas e da Educação FAED PLANO DE ENSINO

O COOPERATIVISMO E A REFORMA AGRÁRIA POPULAR

ARTIGO DATALUTA ARTIGO DO MÊS EVENTOS

ARTIGO DATALUTA ARTIGO DO MÊS EVENTOS

RESENHA. Protesto: uma abordagem culturalista. Suelen de Aguiar Silva. Universidade Metodista de São Paulo

Grupo de Estudo sobre Trabalho, Espaço e Campesinato Departamento de Geociências/UFPB Programa de Pós-graduação em Geografia/UFPB

Reforma agrária e conflitos no campo em Minas Gerais: Contribuições da pesquisa DATALUTA

III ENCONTRO ESTADUAL DE AGROECOLOGIA E II FESTA ESTADUAL DAS SEMENTES CARTA POLÍTICA E AGENDA DE LUTAS

DISCIPLINA DE GEOGRAFIA

Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc

ARTIGO DATALUTA ARTIGO DO MÊS EVENTOS

VIGILÂNCIA SOCIOASSISTENCIAL COMO DEFESA DE DIREITOS 1

Movimentos Sociais do Campo

VIVÊNCIA DE UM GRUPO DE SENTIMENTOS NO CAPS PRADO VEPPO- SM-RS.

O CONCEITO DE TERRITÓRIO COMO CATEGORIA DE ANÁLISE

PLANO DE CLASSIFICAÇÃO DO FUNDO MST NÚMERO DE CAIXA

Fórum Social Mundial Memória FSM memoriafsm.org

Seminário Rede Socioassistencial Centro, Sul e Sudeste. Angélica da Costa Assistente Social

POLÍTICA DE SEGURANÇA ALIMENTAR E AGROECOLOGIA: UMA REFLEXÃO SOBRE OS DESAFIOS ASSOCIAÇÃO DOS GRUPOS ECOLÓGICOS DE TURVO (AGAECO)

131 - Núcleo de Agroecologia Ivinhema: ATER diferenciada valorizando saberes, conhecimentos e experiências no Território do Vale do Ivinhema, MS

Proposta Curricular de Duque de Caxias

Para uma nova cultura política dos direitos humanos

O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA DO BRASIL COLÉGIO PEDRO II PROFESSOR: ERIC ASSIS

Território e planejamento de longo prazo: a experiência do Estudo da Dimensão territorial do planejamento

Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, ISSN PAISAGEM E IDENTIDADE: ALGUMAS ABORDAGENS

RESUMO EXPANDIDO VIII CONPEEX VIII CONGRESSO DE PESQUISA, ENSINO E EXTENSÃO DA UFG

EDUCAÇÃO DO CAMPO: HISTÓRIA, PRÁTICAS E DESAFIOS. Entrevista com Bernardo Mançano Fernandes, por Graziela Rinaldi da Rosa.

CURSO DE FORMAÇÃO PARA LIDERANÇAS SOCIAIS

PLANO DE CURSO DISCIPLINA:História ÁREA DE ENSINO: Fundamental I SÉRIE/ANO: 5 ANO DESCRITORES CONTEÚDOS SUGESTÕES DE PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

APRESENTAÇÃO DA SÉRIE ORGANIZAÇÕES CAMPONESAS

ANEXO I: Modelo de Programa de Disciplina (elaborar em conformidade com o Projeto Pedagógico do Curso)

CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO. Av. Alberto Bins, Porto Alegre

FRONTEIRAS POLÍTICAS: A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE POLÍTICA NA AMÉRICA DO SUL

Transformações socioeconômicas e gestão territorial: o caso do município de Boa Esperança PR

O homem é mais ou menos cidadão, dependendo do lugar onde vive. Milton Santos

Boletim Trabalho no Rio de Janeiro

Ressignificação da juventude

SITE DA REVISTA SAÚDE EM DEBATE. Reformulação.

Relatório Oficina de Trabalho

Geografia - 6º AO 9º ANO

Um olhar sobre as experiências de Grupos de Consumo Responsável no Brasil

ESTUDO EXPLORATÓRIO DO PERFIL DA ÁREA DE RECURSOS HUMANOS NA CIDADE DE JUIZ DE FORA - MG

ASPECTOS DA LUTA PELA TERRA NA PARAÍBA: A DINÂMICA RECENTE DOS PROCESSOS DE OCUPAÇÃO.

Material de divulgação da Editora Moderna

Oficina Base. A Segurança Alimentar e Nutricional e o Sistema de SAN

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL. Plano de Ensino

SUGESTÕES DE AVALIAÇÃO

DOCENTE: JORDANA MEDEIROS COSTA

RELATÓRIO 2012 COORDENAÇÃO

MATRIZ DE REFERÊNCIA DE HISTÓRIA - ENSINO FUNDAMENTAL

Desenvolvimento Local: Concepção, Avanços e Desafios

UM DICIONÁRIO CRÍTICO DE EDUCAÇÃO 1

Proposta para a 1ª Conferência Estadual de Educação Básica

CARTOGRAFIA COMO POSSIBILIDADE DE METODOLOGIA INTERDISCIPLINAR

PLATAFORMA DE INDICADORES DE MONITORAMENTO CONSTRUÇÃO DO SISTEMA DE MONITORAMENTO

GEOGRAFIA - 1 o ANO MÓDULO 51 DITADURA MILITAR: MARCHA FORÇADA E ANOS 80

PLANO DE TRABALHO DOCENTE 2015 PROFESSORA: Daianny de Azevedo Lehn DISCIPLINA: Geografia ANO: 7º A

Desafios e perspectivas do comércio justo

2ª CIRCULAR - SINGA GOIÂNIA 2015

dossiê devir menor (org.: susana Caló)

DIEESE. Departamento Intersindical de Estatística. e Estudos Sócio-Econômicos PROJETO DIEESE SINP/PMSP

Ações de luta pela terra no estado de Mato Grosso em Cuestión agraria actual y el territorio hídrico

Movimentos sociais e Cidadania Palavras Chave: cidadania, educação, direitos 1

Desafios da Educação de Jovens Adultos integrada à Educação Profissional: a experiência da pesquisa em rede no OBECUC EJA

da rede) para organização da proposta e das estratégias de comunicação dialógica da rede;

Sistemas de Inovação, Desigualdade e Inclusão contribuição para uma agenda de pesquisa na América Latina

INSTRUÇÃO CONJUNTA N 001/2010 SEED/SUED/SUDE

Projeto: Sala ambiente e Grafite. Cajado Temático

Promovendo o engajamento das famílias e comunidades na defesa do direito à saúde sexual e reprodutiva de adolescentes e jovens

A OIT e as Agendas de Trabalho Decente Oficina de Troca de Experiências para a Construção de Agendas Subnacionais de Trabalho Decente

Projeto de Fortalecimento de Capacidades para o DHL CNM/PNUD TERMO DE REFERÊNCIA (Nº )

RELAÇÕES DE TRABALHO E SUBJETIVIDADE EM EQUIPES INTERDISCIPLINARES DE ATENÇÃO À SAÚDE 1 ELIANE MATOS 2 DENISE PIRES 3

MODELOS DE PLANEJAMENTO E GESTÃO DE TERRITÓRIOS TURÍSTICOS. Prof. Dr. Marcos Aurélio Tarlombani da Silveira

EMENTA OBJETIVOS DE ENSINO

Curso PROEJA FIC ENSINO FUNDAMENTAL BILÍNGUE LIBRAS/PORTUGUÊS COM PROFISSIONALIZAÇÃO EM FOTOGRAFIA DIGITAL: EDIÇÃO DE IMAGENS

Perspectivas da Gestão Estratégica de Pessoas para as Organizações Públicas

Mosaico Mantiqueira. Clarismundo Benfica. São Paulo, Maio de 2009

CONTEÚDOS GEOGRAFIA - 4º ANO COLEÇÃO INTERAGIR E CRESCER

QUESTÃO SOCIAL, POLÍTICA SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL: BREVES CONSIDERAÇÕES. Eixo temático: Questão Social e Serviço Social

Governança de Terras em Países Emergentes

PLANO DE AÇÃO ANO 2015

Aproximando o debate da saúde ambiental e da soberania alimentar a partir da experiência da Tenda Josué de Castro

Abertura V Seminário PAEC-OEA-GCUB 17/05/2017

Segunda Conferencia Regional para América Latina y el Caribe sobre el Derecho a la Identidad y Registro Universal de Nacimiento

HISTÓRICO. Histórico

As linhas políticas do MTST:

PLANO DE ENSINO DADOS DO COMPONENTE CURRICULAR

CONSELHO MUNICIPAL DA EDUCAÇÃO DE LIMEIRA DELIBERAÇÃO CME Nº. 01, DE 23 DE NOVEMBRO DE 2010.

Propor que os cursos de Pedagogia e outras licenciaturas incentivem o conhecimento e atuação nestes espaços. Incluir algumas horas de

ARTIGO DATALUTA O contexto das lutas sociais do campo nas cidades: mapeamento das manifestações no período de ARTIGO DO MÊS EVENTOS

FORMAÇÃO CÍVICA E HUMANA

EDUCAÇÃO DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS

OFICINA DAS CORES. Eduardo Dias Mattos. Artes Visuais. Professor. Escola Estadual Júlio Conceição Cubatão / SP. DER-Santos

Curriculum Vitae. Graus académicos Licenciatura em Geografia Faculdade de Letras Coimbra

Formação espacial do Brasil. Responsável: Prof. Arilson Favareto

PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR PNAE: IIII Encontro Catarinense de Alimentação Escolar

ATLAS MUNICIPAL DE CAMPOS DOS GOYTACAZES: A SITUACÃO DO ENSINO DE CARTOGRAFIA

CONFERÊNCIA NACIONAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA INTRODUÇÃO

#protestos: análises das ciências sociais. / Organizado por Antonio David Cattani. Porto Alegre : Tomo Editorial, p.

CRÔNICA DE EVENTOS CONFERENCE REPORT. Turismo no Mercosul: VII Jornadas Nacionales y II Simpósio Internacional de Investigación em Turismo

Transcrição:

Uma publicação do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária NERA. Presidente Prudente, julho de 2016, número 103. ISSN 2177-4463. www.fct.unesp.br/nera ARTIGO DATALUTA Atuações dos movimentos sócio-territoriais da luta pela terra nas manifestações em prol da democracia: acampamento de Porto Alegre em 2016. ARTIGO DO MÊS Panorama do fechamento de escolas no campo do estado de Goiás de 2007 a 2015. www.fct.unesp.br/nera/artigodomes.php EVENTOS XVIII Encontro Nacional de Geógrafos ENG 2016 A construção do Brasil: geografia, ação política e dem ocracia UFMA-UEMA/São Luis Maranhão, 24 a 30 de julho de 2016. Conferencia Internaci onal: Tierra y territorio en las Am éricas: acaparam ientos, resistencias y alternativas Universidad Externado de Colombia/Bogotá - 26 al 29 de Agosto de 2016. PUBLICAÇÕES, VÍDEOS E POD TERRITORIAL Las luchas socialespor la tierra en América Latina: un análisis histórico, comparativo y global. Edits.: Hanne Cottyn, Javier Jahncke, Luis Montoya, Ela Pérez, Mattes Tempelmann. La edición estuvo en manos del Seminario de Economía Social, Solidaria y Popular de la Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad Nacional Mayor de San Marcos del Perú; el Departamento de Historia y el Centro de Estudios Globales de la Universidad de Gante, de Bélgica; y la Red Muqui. Sementes de Angelim. Produção: Fabíola Melca. PodCast Unesp Pod Territorial. Autores: Vários O filme trata a experiência de Retomada Quilombola da terra em curso na comunidade de Angelim, município de Conceição da Barra, Espírito Santo. As imagens mostram como a prática agroecológica torna possível a transição do monocultivo de eucalipto para a produção de alimentos. Para ver: https://www.youtube.com/watch?v=fvkbzewp G2E. O Podcast Unesp, em parceria com a Cátedra Unesco Educação do Campo e Desenvolvimento Territorial, publica semanalmente noticiário sobre Reforma Agrária, povos de diferentes etnias, questões geográficas e outros assuntos que colaboram significativamente no desenvolvimento social. Para ouvir/baixar: http://podcast.unesp.br/. EQUIPE: Editoração: Danilo Valentin Pereira, Pedro Henrique C. de Morais (bolsista PIBIT) e Lucas Pauli (bolsista FAPESP). Revisão: Juliana G. B. Mota, Tiago E. A. Cubas (bolsista FAPESP), Leandro N. Ribeiro (bolsista CAPES), Ana L. Teixeira, Hellen C. C. Garrido (bolsista AUIP/PAEDEX), Helen C. G. M. da Silva (bolsista CNPQ), Lara C. Dalpério (bolsista FAPESP) e Rodrigo S. Camacho. Coordenação: Janaína F. S. C. Vinha, Eduardo P. Girardi, Valmir J. de O. Valério e Danilo Valentin Pereira. Leia outros números do BOLETIM DATALUTA em www.fct.unesp.br/nera 1

ATUAÇÕES DOS MOVIMENTOS SÓCIO-TERRITORIAIS DA LUTA PELA TERRA NAS MANIFESTAÇÕES EM PROL DA DEMOCRACIA: ACAMPAMENTO DE PORTO ALEGRE EM 2016 Elvis Albert Robe Wandscheer Dr. em Geografia e Membro do NEAG da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS elvishz@yahoo.com.br Taís de Freitas Munhoz Graduanda em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS taisfmunhoz@gmail.com Michele Lindner Dra. em Geografia e Pós-Doutoranda da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS michelindner@gmail.com Rosa Maria Vieira Medeiros Profa. Dra. da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS rmvmedeiros@yahoo.com.br O ATO E SEU CONTEXTO NA LUTA PELA TERRA O mês de Abril é marcado como um mês que historicamente envolve o MST com ações que denunciam e relembram a violência no campo brasileiro[1]. Porém, no ano de 2016, com o cenário de crise política instaurada no país, as atividades desenvolvidas contaram com o somatório de manifestações de outro cunho, ou seja, diretamente relacionadas à democracia, ao direito de expressão do cidadão brasileiro. O Abril Vermelho[2], como é comumente chamado, foi então o mês de manifestações contra e a favor do processo de impeachment ora em curso. Essa questão é considerada de amplo interesse para os movimentos socioterritoriais, ao demonstrar os enlaces do processo de impeachment nas mais diversas questões nacionais, sobretudo aquelas voltadas aos interesses sociais. Para compreender a participação das pessoas representantes desses movimentos, buscou-se estabelecer um diálogo com elas no efetivo local das manifestações. Foram realizadas entrevistas com perguntas semi-estruturadas e de caráter qualitativo que possibilitassem a esses sujeitos expressarem sua posição política. As respostas foram diversas, mas todas com o mesmo teor político partidário, o que demonstra o elo ideológico dos manifestantes. A manifestação social ocorreu de 11 a 17 de abril, na Praça da Matriz, no Centro Histórico de Porto Alegre-RS e redimensionou o valor desse espaço enquanto local que abrigou a resistência histórica contra o golpe militar no Movimento da Legalidade em Agosto de 1961 (Figura 1). Conforme Maria, Mais de 50 anos depois os movimentos tomam novamente a Praça da Matriz, que será um espaço de resistência e de fortalecimento da nossa luta pela democracia. Não deixaremos o Brasil dar nenhum passo atrás neste sentido (MST, 2016). Disponível em www.fct.unesp.br/nera 2

Figura 1. Monumento Júlio de Castilhos na Praça da Matriz em Porto Alegre Fonte: NEAG/UFRGS, 2016. Para o entrevistado 1: Não é uma luta do movimento em particular, é uma luta pelo estado [...] é manter a democracia [...] manter as conquistas de anos Os atores sociais deixaram clara a sua visão sobre o processo político em curso no Brasil, bem como o que o mesmo representa para os integrantes do MST. Atualmente, o retrocesso e o enfraquecimento de ações existentes são as maiores preocupações, o que frente aos atos e as mobilizações futuras em caso de efetivação de novo governo já são encaradas como preocupantes. Esta preocupação fica evidente na fala do entrevistado 2: A violência e a repressão contra nós vai aumentar. Para ele há um receio crescente de que seu direito de manifestar seja controlado, sufocado pelo direito explosivo da direita emergente. O acampamento da Praça da Matriz não contou apenas com a participação do MST, estavam ali presentes, por exemplo, entidades como a CUT[3], o MNLM[4], e o Levante Popular da Juventude. A participação do MST, diante desse cenário, foi extensa no espaço físico da praça, o que ressalta a preocupação dos indivíduos que deixaram suas tarefas laborais cotidianas e se dispuseram a incorporar e apoiar a atividade, mesmo que isso tenha gerado contratempos em suas produções e/ou ocupações corriqueiras. O número de indivíduos estimados foi de cerca de 600 pessoas que permaneceram acampadas no local em vigília constante. A origem dos manifestantes do MST que se deslocaram até o acampamento é diversa. Vieram de vários municípios de norte a sul do estado do Rio Grande do Sul (Figura 2), contando tanto com assentados Disponível em www.fct.unesp.br/nera 3

quanto com acampados, demonstrando a importância e a dinâmica da composição dos núcleos socioterritoriais no estado. Figura 2: Mapa de Localização da origem dos entrevistados na manifestação. Fonte: NEAG/UFRGS, 2016. Essa realidade, permite observar uma forte aglutinação de forças que extrapola o limite do entorno das áreas conquistadas ou reivindicadas, de formas que, o que se verifica são atores que produzem dinâmicas sociais que imprimem as características de cada território, determinando as limitações, mas também as transposições desses limites políticos e administrativos através das ligações em redes (GALVÃO, FRANÇA,BRAGA, 2009, p. 33). Até o final do mês de Abril, o MST efetuou no estado do Rio Grande do Sul três manifestações (contabilizando a da Praça da Matriz) e três ocupações. Sobre esses números o que foi frisado por alguns entrevistados é que os mesmos só não foram maiores em 2016 em razão do foco central do movimento estar voltado para Brasília, para os processos políticos correntes, cujos desdobramentos dessas das ações podem desencadear um novo golpe no país. Essa realidade, se confirmada, colocaria em xeque diversas Disponível em www.fct.unesp.br/nera 4

pautas do MST como alavancar alimentos ecológicos, a relação produtor-consumidor e outras reivindicações dos camponeses e indígenas (entrevistado 2), de forma que a estratégia atual se expressa muito mais como resistência das conquistas do que de avanço das condições idealizadas. A MANIFESTAÇÃO: DA INDIVIDUALIDADE AO COLETIVO Ainda que a percepção exposta pelos entrevistados tenha advindo de uma deliberação coletiva, as concepções particulares parecem refletir um contexto em que os indivíduos se consideram sujeitos ativos e, para além disso, vislumbram a autonomia do coletivo do movimento socioterritorial, ou seja do MST, a partir das decisões que englobam pautas levantadas tanto pelos assentados quanto pelos acampados, sempre valorizando as suas vivências, perspectivas e desafios. Conforme entrevistado 3: Em toda a decisão do coletivo em relação a essa manifestação não houve posicionamento contrário. A decisão de estar aqui e lutar foi de todos. Sabemos que existem problemas, mas observo que temos que fazer parte de um algo maior, algo que temos que lutar. Manter nossos direitos não é tarefa fácil. Essa manifestação demonstra uma forte articulação e organização coletiva confirmada pelo entrevistado ao afirmar que Temos que mostrar que queremos manter a nossa posição, a nossa luta, o que é a nossa identidade. E nessa identidade, podemos perceber que o território da luta pela terra é composto por identidades e diferentes aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais permitem [...] compreender a miríade de processos, redes, rearranjos, a heterogeneidade, contradições, os tempos e os territórios de maneira a contemplar a (i)materialidade do mundo da vida (SAQUET, 2007, p. 183). Ao encontro dessa assertiva, os atores sociais da manifestação expressaram em todas as entrevistas o agrupamento ao qual se consideram parcela indissociável de luta e de conquista. É tarefa do coletivo, e só a partir dos avanços coletivos é que se dariam as conquistas individuais (entrevistado 3). A esse entendimento é importante expor as noções de Sauer (2011, p. 243) que aborda em termos de perspectivas as relações travadas no âmbito da luta pela terra como: [...] a luta pela terra e as conquistas de território é um processo de construção (constituição) de lugares, de espaços de vida e identidade. Nesse sentido, terra e território são lugares de morada, endereços e referenciais indentitários, materializando, mesmo que provisoriamente, heterotopias[5] [...] No que se refere à organização do acampamento, a estrutura planejada abarcou núcleos de trabalho, onde a divisão do trabalho e o auxílio mútuo em tarefas envolveram os setores de segurança, cozinha e limpeza, além dos núcleos de oficinas como estêncil[6] e teatro de rua, por exemplo. Todas as ações, segundo entrevistado 4: se complementam e se auxiliam, permitindo o funcionamento do acampamento [...] todos tem uma tarefa em prol do coletivo [...] é uma estrutura que está dentro do possível, poderíamos melhorar se houvessem mais condições. Cabe salientar que todas as atividades propostas nas oficinas estavam abertas à participação das pessoas, bem como a alimentação servia não apenas aos acampados como também às demais pessoas que estavam no local interagindo com a manifestação. Disponível em www.fct.unesp.br/nera 5

Por fim, resta abordar a relação do acampamento com os outros movimentos sociais, o que para além de uma interação momentânea, pode vir a construir ações conjuntas entre os mesmos, o que representa maior participação e fortalecimento de reivindicações que envolva pautas idênticas ou semelhantes. Quanto a essa interação, observou-se uma relação bastante tímida, porém, uma importante consciência de necessidade de aproximação. O entrevistado 5 afirma que: Não existem ações conjuntas. A luta que é conjunta. Ao encontro da tímida interação o entrevistado 6 diz que: Está havendo discussão com todos e a interação está sendo construída. Como expressão mais geral, dos entrevistados um manifestante chama a atenção para a tendência de aproximação dos movimentos com os seus setores, no caso do MST e a relação com instituições ligadas ao rural, como por exemplo o MPA. Esta situação parece derivar de duas situações distintas: i) a manifestação por envolver uma ação em prol do executivo nacional envolve muitas lutas e como tal, uma diversidade e perplexidade de pautas que dificultam o estabelecimento de questões unilaterais, uma vez que a constituição do todo é multifacetada; ii) os movimentos como um todo tem adentrado em particularidades específicas dentro de suas estruturas, o que torna cada entidade múltipla em debates, o que representa maior complexidade de convergência plena em sua estrutura, apresentação e exposição. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo buscou apresentar o papel do MST nas mobilizações de Abril em Porto Alegre-RS contra o processo de impeachmeant que se somaram às habituais manifestações do Abril Vermelho. Salienta-se a importância ímpar do mês de Abril em significado para os movimentos socioterritoriais de luta pela terra. Ficou evidente a visão do conjunto do movimento acerca da necessidade de manutenção das conquistas obtidas, bem como o temor pelo retrocesso de um governo opositor das pautas sociais. Destacou-se também a expectativa de novas conquistas com a permanência de um poder do estado nacional que mesmo diante de decepções no quadro geral, ainda contempla o tema da reforma agrária no contexto de sua agenda política. A partir dessa constituição identitária do movimento socioterritorial, foram apresentadas expressões que demonstram a unidade em torno das pautas do MST, deixando claro que a luta pela terra não cessou, pelo contrário, encontra-se em processo de avaliação e reivindicação permanente, mas que carece de maior articulação conjunta quando se trata de uma manifestação de maior porte tal qual a manutenção da democracia brasileira. Destarte, tudo indica que após as decisões políticas que envolvem a constituição do impeachment ou não, o MST, a exemplo de outras instituições que participaram da manifestação deverão debater os rumos futuros com vistas ao resultado do processo. Esse debate deve se dar em torno de direções que envolvam a luta por avanços em caso de permanência (como a ampliação da produção de alimentos saudáveis para atender as necessidades da população brasileira), ou ações que visem evitar o retrocesso em relação às conquistas dos últimos governos nacionais no caso da confirmação do impeachment. Disponível em www.fct.unesp.br/nera 6

REFERÊNCIAS FELICIANO, C. A. Raízes da violência no campo brasileiro. Boletim DataLuta, São Paulo, p. 01-05, mar. 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/nera/boletimdataluta/boletim_dataluta_3_2015.pdf >. Acesso em: 10 maio 2016. GALVÃO, A. R.; FRANÇA, F. M.; BRAGA, L. C. O território e a territorialidade: Contribuições de Claude Raffestin. In: SAQUET, M. A.; SOUZA, E. B. C. de (Orgs.). Leituras do conceito de territórios e de processos espaciais. 2009. p.33-46. MEDEIROS, R. M. V.; LINDNER, M.; MELCHIORS, J. O Abril Vermelho no Rio Grande do Sul. Boletim DataLuta, São Paulo, p. 01-08, jun. 2014. Disponível em: < http://www2.fct.unesp.br/nera/boletimdataluta/boletim_dataluta_6_2014.pdf>. Acesso em: 09 maio 2016. MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA - MST. No RS, Movimentos Populares constroem acampamento em defesa da democracia. 11 de abr. de 2016. Disponível em: <http://www.mst.org.br/2016/04/11/no-rs-movimentos-populares-constroem-acampamento-em-defesa-dademocracia.html>. Acesso em: 08 de maio de 2016. SAQUET, M. A. Abordagens e concepções de território. São Paulo: Expressão Popular, 2007. SAUER, S. Mercado de terras: Estrangeirização, disputas territoriais e ações governamentais no Brasil. In: SAQUET, M. A.; SUZUKI, J. C.; MARAFON, G. J. (Orgs.). Territorialidades e diversidade nos campos e nas cidades latino-americanas e francesas. 2011. p.227-246. [1] [...] o Banco de Dados Dataluta, através de seu relatório anual vem divulgando há 16 anos: a desigualdade socioterritorial e uma luta de classes onde a violência no campo é fruto de uma Questão Agrária não resolvida pela sociedade, onde a Reforma Agrária não é incorporada como uma opção de desenvolvimento para o país (FELICIANO, 2015, p. 2). [2] O mês de abril [...] que não só relembra a tragédia camponesa, mas, sobretudo, atrai a atenção da sociedade brasileira para a luta camponesa pelo direito à terra. É o "Abril Vermelho com sua jornada nacional, cujo símbolo é o massacre de Eldorado dos Carajás e cuja reivindicação é a Reforma Agrária. (MEDEIROS, LINDNER e MELCHIORS, 2014, p. 2). [3] Central Única dos Trabalhadores. [4] Movimento Nacional da Luta pela Moradia. [5] Camadas ou tecidos de significações ou lugares de forma complexa na estrutura a qual se encontra inserida. [6] Termo adaptado ao português da denominação inglesa stencil. A mesma consiste em uma técnica para criar um molde com recortes em uma base para posterior aplicação de desenho, ilustração ou símbolo em outro material. É comumente aplicado com tinta ou aerossol. Disponível em www.fct.unesp.br/nera 7