Mucocelo do Lábio Inferior: Relato de Caso Atípico.

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CASO CLÍNICO Mucocelo do Lábio Inferior: Relato de Caso Atípico. Marcus Woltmann*, Marcos Frech**, Felipe Eilert Santos*** Gabriel Haddad Kalluf ****, Patrícia dos Santos Cé ***** Resumo: Os autores descrevem um caso clinico atípico de uma lesão de lábio inferior de aproximadamente 4 cm de diâmetro, associada a trauma de mordida em um adolescente de 15 anos, com uma evolução de 6 meses. A lesão foi diagnosticada clinicamente como mucocelo sendo realizada a sua exérese cirúrgica e confirmado diagnóstico através do exame anatomo-patológico. Palavras-Chave: Mucocelo; Fenómeno de extravasamento de muco; Fenómeno de retenção de muco Abstract: An atypical case of a down lip lesion with an approximately 4cm diameter was described by these authors. The lesion, having a six months evolution, was associated with a bite trauma in a fifteen years old teenager. It was clinically diagnosticated as a mucocele and after surgical remotion, the diagnosis was confirmed within the anatomy-pathological test. Key-words: Mucocele; Mucous extravasation phenomenon; Mucous retention phenomenon (Woltmann M, FrechM, Santos FE, Kalluf GH, Cé PS. Mucocelo do Lábio Inferior: Relato de Caso Atípico. Rev Port Estomatol Cir Maxilofac 2008;49:165-169) *Especialista em Anatomia Cirúrgica da Face (USP-SP), Especialista em Cirurgia Bucomaxilofacial (Santa Casa - São Paulo-SP), Mestrando Implantodontia (SLMandic-SP), Professor Cirurgia Bucomaxilofacial (FURB-SC) **Especialista e Mestre em Cirurgia Bucomaxilofacial (Ufpel-RS), Especialista Implantodontia (IPENO) Professor Cirurgia Bucomaxilofacial (FURB-SC) ***Especialista e Mestre em Cirurgia Bucomaxilofacial (Ufpel-RS), Professor Cirurgia Bucomaxilofacial (FURB-SC) ****Especialista em Cirurgia Bucomaxilofacial (Santa Casa Piracicaba-SP), Mestre em Cirurgia Bucomaxilofacial (UFU-MG) *****Graduanda em Odontologia (FURB-SC), Estagiaria da disciplina de Cirurgia Bucomaxilofacial (FURB-SC) INTRODUÇÃO Mucocelo é o nome dado à manifestação clínica de dois fenómenos distintos que podem acometer as glândulas salivares menores: fenómeno de extravasamento e o fenómeno de retenção de muco (1-4). Quando encontradas no assoalho bucal são chamadas rânula, pois o aumento de volume lembra o ventre de uma rã (5). O fenómeno de extravasamento de muco é causado por traumas exercidos sobre o ducto excretor ou o parênquima glandular, levando ao acumulo de fluídos produzidos nos ácinos para o tecido conjuntivo circunjacente a glândula afectada. Já no fenómeno de retenção de muco ocorre a obstrução do ducto excretor, este pode ser resultante de um fragmento de cálculo no interior do ducto, da contracção de tecido conjuntivo cicatricial à volta do ducto depois de uma lesão traumática, ou até mesmo de cálculos nos ductos de glândulas salivares acessórias ou sialolitíase (5,6). Um mucocelo apresenta-se como uma lesão nodular, com consistência flutuante a palpação se superficial, ou fibrosa se mais profunda, sua coloração é semelhante aos tecidos adjacentes ou levemente azulada quando superficial. O tamanho varia de poucos milímetros até 1 ou 2 cm. Tem forma oval e superfície lisa. Pode aparecer repentinamente (fenómeno de extravasamento) ou lentamente (fenómeno de retenção), sem sintomatologia dolorosa. Frequentemente, o paciente relata seu esvaziamento após o rompimento com saída de um líquido do interior e posterior recorrência (4). A localização preferencial do mucocelo de extravasamento é o lábio inferior por ser a área mais susceptível a trauma, devido às cúspides dos dentes superiores. Outras regiões envolvidas são a mucosa jugal e palato (3-5). O fenómeno de retenção de muco raramente ocorre no lábio inferior, acometendo principal- 165

Woltmann M et al mente o palato, bochecha, e assoalho bucal (3,5-7). Os mucocelos de extravasamento são mais comuns em crianças e adultos jovens, enquanto as de retenção são mais frequentes em pacientes com idade avançada. Não há predilecção óbvia por qualquer dos sexos (1,5). A variedade de extravasamento consiste em um fino tecido de granulação circundado por uma condensação de tecido conjuntivo com variadas células inflamatórias e elementos vasculares. O tecido conjuntivo condensado pode ser confundido com o epitélio (5). O mucocelo revestido por epitélio representa uma lesão do fenómeno de retenção (2,8). Há três técnicas para tratar os mucocelos de lábio inferior as quais também podem ser aplicadas para a mucosa jugal e palato. As lesões pequenas podem ser completamente excisadas, certificando-se incluir o tecido glandular associado bem como todas as glândulas marginais antes do fechamento primário. Os grandes mucocelos podem ser tratados por um procedimento não invasivo (marsupialização), pois a excisão ou dissecação podem ser problemáticas às estruturas vitais, tais como o ramo labial do nervo mentuniano (5). O terceiro procedimento envolve a dissecação do mucocelo junto com as glândulas mucosas anexas. Esta técnica é preferida para lesões de tamanho moderado. Tal como a técnica de excisão, todas as glândulas marginais devem ser removidas antes do fechamento primário (5). Paciente G.A.S., 15 anos, género masculino, compareceu ao ambulatório da disciplina de cirurgia bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da FURB (Blumenau-SC), referindo aumento de volume no lábio inferior há 6 meses, indolor e com períodos de aumento e diminuição de volume após traumas repetitivos por mordedura acidental, com eventual saída de liquido do seu interior. Ao exame clínico, observou-se a presença de uma lesão tumoral em lábio inferior de aproximadamente 4 cm em seu maior diâmetro, com consistência flutuante a palpação, coloração rósea semelhante aos tecidos circunjacentes, e presença de pequena área ulcerada em fase cicatricial em local da última mordedura (Figura 1). Com as informações colhidas a hipótese de diagnóstico era de mucocelo. Realizou-se a intervenção cirúrgica sob anestesia local através do bloqueio do nervo mentoniano bilateral, seguido de uma incisão labial semi-lunar, os tecidos foram delicadamente divulsionados afim de não ocorrer o rompimento da lesão (Figura 2). Procedeu-se o pinçamento da glândula afectada de maior tamanho, sua divulsão em relação ao plano muscular subjacente bem como as glândulas associadas à lesão (Figuras 3 e 4). Realizou-se a sutura simples da mucosa (Figura 5) e o rompimento da lesão para constatar o extravasamento de mucina confirmando o diagnóstico em questão (Figura 6). O mucocelo apresentava um tamanho atípico e as glândulas associadas davam um aspecto de cachos de uva (Figura 7). O exame anátomo-patológico corroborou o diagnóstico de mucocelo de extravasamento (Figuras 8 e 9). Figura 1 - Lesão tumoral em lábio inferior à esquerda com presença de pequena úlcera. CASO CLÍNICO Figura 2 - Aspecto da lesão após incisão semi-lunar e glândulas acessórias anexas Figura 3 - Pinçamento da lesão principal 166

Mucocelo do Lábio Inferior: Relato de Caso Atípico Figura 4 - Aspecto do leito cirúrgico após remoção da lesão Figura 8 - Fotomicrografia, mostrando lesão cística sem revestimento epitelial e com parede constituida por tecido fibroso denso e de granulação. O conteúdo é de histiócitos e material basofílico e amorfo ( muco). HE- 100X. Figura 5 - Aspecto final após suturas Figura 9 - Fotomicrografia, mostrando em detalhe a lesão. HE- 200X DISCUSSÃO Figura 6 - Lesão medindo 4 cm em seu maior diâmetro, mostrando glândulas acessórias anexas a lesão principal. Figura 7 - Lesão principal rompida propositalmente mostrando saída de liquido semelhante a mucina. Diversos estudos (3,9-11) relatam haver maior prevalência entre a segunda e terceira décadas de vida, enquanto que Neville (13) e Shaffer (4), afirmam não haver predilecção por grupo etário, já que pode ocorrer em qualquer idade. Em relação ao género a maioria dos autores (2,10,13,14) observaram não haver diferença significativa na distribuição de mucocelos entre homens e mulheres. Já Evenson (16) relata maior incidência em mulheres e Largura et al (2) em homens. A literatura corrente sobre mucocelos (2-5,8,16) é unânime em apontar o lábio inferior como local acometido com maior frequência. O mucocelo normalmente é causado por traumas exercidos sobre o ducto excretor ou o parênquima glandular (5,6), e frequentemente o paciente relata seu esvaziamento após o rompimento com saída de um liquido do interior e posterior recorrência (4).Em nosso caso clinico o paciente relatava o habito de mordiscar o lábio, e fases de aumento e diminuição de volume labial com saída de um liquido da lesão compatível com os relatos descritos na literatura. 167

Woltmann M et al Tipicamente o mucocelo costuma apresentar um tamanho segundo a literatura que varia de poucos milímetros até 1 ou 2 cm (4), no caso clínico em questão o tamanho da lesão de aproximadamente 4 cm mostra-se bastante atípico, não somente pela dimensão aumentada como pelo número de glândulas acessórias anexas a lesão principal. De acordo com Amui (8) há a necessidade de diagnóstico diferencial, uma vez que, os mucocelos assemelham-se a outras lesões, tais como o hemangioma (pela coloração azul intensa) (17,18), lipoma (pela coloração e localização sublingual), linfangioma, neurofibroma, neoplasma de glândulas salivares, carcinoma adenocístico e o tumor misto benigno (3). Embora existam opções de tratamento para oas mucoceloes, tais como marsupialização, remoção cirúrgica total do mucocelo e glândulas associadas, dissecção do mucocelo (5), drenagem do líquido mucoso (16), e crioterapia (19), o tratamento ideal para qualquer forma de mucocelo é sua completa excisão cirúrgica com a remoção das glândulas salivares acessórias envolvidas (3,10,14,17,20). Concordamos com a técnica de remoção total da lesão e glândulas anexas por entendermos que se trata do método com menor probabilidade de recidiva, método escolhido para a resolução do caso clínico. Mariano et al. (17) concordam com as possibilidades de recidiva da lesão e recomendam a sua proservação. Segundo Neville (13) o tecido excisado deve ser enca-minhado para anátomo-patológico para confirmar o diagnóstico e afastar a possibilidade de um tumor de glândulas salivares. CONCLUSÕES A revisão da literatura e o presente caso clínico nos permitem as seguintes considerações: 1. Os mucoceles podem ocorrer em qualquer idade, sendo as de extravasamento mais comuns em pacientes jovens, e as de retenção em adultos; 2. A localização preferencial do mucocelo de extravasamento é o lábio inferior por ser a área mais susceptível a trauma; 3. Devido a possibilidade de recidivas, os mucocelos devem ser tratadas preferencialmente pela excisão cirúrgica completa bem como glândulas salivares anexas; 4. Deve-se instruir o paciente quanto à remoção do hábito de mordedura do lábio, bem como realizar a proservação do caso; 5. Embora os dados clínicos e a saída de saliva da lesão sejam quase que patognomónicas de mucocelo, o anátomo-patológico faz-se necessário para descartar neoplasias de glândula salivar. BIBLIOGRAFIA 1 - Harrison JD. Salivary mucoceles. Oral Surg 1975; 39:268-78. 2 - Largura LZ, Grando LJ, Raul LH, Gil JN. Remoção Cirúrgica de Mucocele. Revista da APCD 1998; 52:435-438. 3 - Regezi JA, Sciuba JJ. Doenças das Glândulas Salivares.In:Patologia bucal: correlações clinicopatológicas. 1ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991:162-205. 4 - Shafer WG, Hine MK, Levy BM. Lesões físicas e químicas da cavidade bucal. In: Tratado de Patologia Bucal. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987:486-548. 5 - Harold DB. Mucoceles and Ranulas. J Oral Maxillofacial Surg 2003;61:369-378. 6 - Carneiro Leão J, Gomes DO. Mucoceles características clínicas e tratamento. Jornal da Radioface 2001; 2:4. 7 - Gill D. Two simple treatments for lowerlip mucoceles. Austr J Derm 1996; 37:220. 8 - Amui RF, Amui MO, Miranzi RMNF, Lima MA. Mucocele (fenômeno de extravasamento mucoso) envolvendo a superfície ventral da língua: apresentação de caso. Revista da Faculdade de Odontologia da Bragança Paulista 1999; 17:107-112. 9 - Amui RF, Carvalho PSP, Filho AH, Araújo MS. Mucocele de Assoalho Bucal. Revista da APCD 2000; 54:136-9. 10 - Chaudry AP, Reynolds DH, LaChapelle CF, Vickers RA. A clinical and experimental study of mucocele (retention cyst). J Dent Res 1960; 39: 1253-1962. 11 - Oliveira KC, Bezerra, AR; Sampaio, RKPL. Mucocele aspectos clínicos, histológicos e de tratamento. Rev Bras Odont 2000, 57: 46-50. 12 - Robinson L; Hjorting-Hansen E. Pathlogical associated with mucous retention cyst of minor salivary glands. Oral Surg Oral Med Oral Pathol 1964;18:191-205. 168

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