ATUAÇÃO DO ESTADO ENQUANTO NORMATIZADOR DO TERRITÓRIO: ESPACIALIZAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS NO RIO GRANDE DO NORTE

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Transcrição:

ATUAÇÃO DO ESTADO ENQUANTO NORMATIZADOR DO TERRITÓRIO: ESPACIALIZAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS NO RIO GRANDE DO NORTE Lorene Kássia Barbosa Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN Lorenekassia8@yahoo.com.br Celso Donizete Locatel Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN celso.locatel@gmail.com Resumo O presente artigo traz a discussão do Estado enquanto formulador políticas públicas, entendidas aqui como normas, além da espacialização do PAA no Rio Grande do Norte, por meio da distribuição do número de agricultores fornecedores por município, fazendo uma comparação destes com o número de produtores rurais. Para contemplarmos o que se objetivava neste artigo foram realizadas pesquisas na literatura sobre a atuação do Estado na formulação de políticas públicas, as normas enquanto reguladoras do território e sobre a concepção de território normado e de território como norma ; além de pesquisas nos materiais institucionais e banco de dados do MDA PAA DATA. O PAA como norma, territorializa-se de forma desigual no RN, constituindo-se uma política de grande abrangência territorial, porém de pouca participação por parte dos agricultores familiares. Palavras-chave: Estado. Norma. Políticas Públicas. Território. Introdução Este trabalho faz parte de uma pesquisa maior que tem por objetivo analisar os impactos socioterritoriais causados pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no Rio Grande do Norte. A pertinência desta pesquisa se dá na medida em que poucos trabalhos foram realizados tendo como foco os impactos socioterritoriais causados por tais programas, e suas importâncias, enquanto normas, para a reconfiguração dos territórios e nas mudanças das relações sociais existentes. Nessa perspectiva, Mendes (2005, p.56) afirma que por mais recente e progressista que se pretenda uma lei 1, ela já é fruto de necessidades passadas, e o seu papel é o de promover uma espécie de congelamento ou, no melhor dos casos, de estabilização das relações sociais no espaço e no tempo. Entretanto, entendemos que a implementação de uma nova norma em determinado lugar no espaço, considerando como norma aqui as políticas públicas, novos territórios são criados através de mudanças nas relações sociais existentes, e com essas mudanças sociais rebatimentos territoriais iram acontecer. 1

Porém, para o presente artigo teremos como objetivo trazer a discussão do Estado mostrando sua importância para a formulação de políticas públicas, normadoras do território e modificadoras das relações sociais, além de mostrar como se dá a espacialização do PAA no território norteriograndense, através da distribuição de agricultores fornecedores por município. Para contemplar a discussão que se pretende neste artigo realizamos pesquisas bibliográficas sobre a atuação do Estado na formulação de políticas públicas e sobre a configura e reconfiguração dos territórios através das normas, que aqui trataremos como sendo as políticas públicas; leituras de fontes oficiais sobre o PAA; Pesquisa e seleção de informações no PAA DATA, banco de dados com informações do PAA a nível nacional; e Criação e sistematização de um pequeno banco de dados contendo informações sobre o PAA no Rio Grande do Norte. A atuação do Estado e normatização do território Historicamente no Brasil a atuação do Estado (Liberal), através de políticas públicas 2 e programas de governo 3, territorializa-se de forma desigual no campo, tendendo a beneficiar os grandes latifundiários, empresas rurais e agroindústrias. Na última década, foram implementadas algumas políticas públicas direcionadas aos agricultores familiares, buscando melhorar a inserção destes na economia de mercado. Para alguns autores, como Höfling (2001, p.01) é importante que em uma avaliação de políticas públicas se considere a concepção de Estado que existe para, só assim, entendermos as políticas públicas que são implementadas, em uma determinada sociedade, em determinado período histórico. Neste sentido precisamos ter clareza que o Estado atua como regulador das relações sociais a serviço da manutenção das relações capitalistas em seu conjunto (Offe, 1984), tendo em vista a análise da realidade brasileira, mas especificamente a do Rio Grande do Norte. Para reforçar esta ideia, Santo & Silveira (2001, p.304) afirmam que Brasília pode criar as grandes normas impulsionadoras ou limitadoras da ação, mas o uso dessas normas está subordinado ao interesse dos agentes mais poderosos, tendo como norma, as políticas públicas criadas e implementadas no território nacional. Segundo Mendes (2005, p.55-56), as normas produzidas para cada setor da sociedade, servem como ferramentas, operacionais, portanto, nos processos sociais em que vem dirimir conflitos e, assim, realizar o papel mais típico do direito: a manutenção de uma dada ordem 2

social. Trazendo assim, um reforço a discussão acima apontada por Offe (1984), onde o Estado aparece como um agente legitimador das relações capitalistas e mantedor da hierarquia social de poder. Nesta perspectiva, as normas irão regular, segundo Mendes (2005), a produção dos sistemas e objetos técnicos e as ações que incidem sobre tais objetos, variando conforme o contexto socioeconômico de cada período histórico. A criação e a execução dessas leis ficam a cargo de instituições e organizações variadas (Mendes, 2005, p. 75). Para entendermos um pouco mais sobre a relação entre território e norma trazemos a discussão de Santos (1994) apud Mendes (2005, p.60), quando este fala em território normado, como sendo a normatização pelas ações; e território como norma quando a configuração territorial é produtora da norma. No entanto, para este artigo temos como foco a discussão do território normado, tendo como norma o PAA normatizando o território brasileiro, mas especificamente o território do Rio Grande do Norte. Neste sentido a relação entre Estado, norma e território se dão na medida em que o Estado é agente hegemônico principal de criação e regulamentação das normas; e estas passando a exercer uma espécie de imposição para a criação de novas relações sociais, econômicas, políticas e culturais, modificam os espaços, criando novos territórios, reconfigurando os até então existes e modificando as relações sociais. Segundo Mendes (2005, p.71) a norma, para a geografia, pode ser vista como o resultado da tensão e/ou da harmonia entre objetos e ações que constituem o espaço geográfico. Para falar de uma crise de regulação do Estado, Mendes (2005) afirma que esta crise não se dá em função de uma obsolescência de sua forma e de seu ente; reside, antes, na crença de que ele é o único a regular o território em que está circunscrito. Para ele existem outros agentes que contribuem para criação das normas e para a regulação do território, como por exemplo, as grandes empresas e os grupos sociais que exercem grande poder em determinados territórios. Nesta perspectiva uma crítica deriva deste afastamento do Estado na criação de normas que resultem em resoluções reais dos problemas sociais existentes, implicando no aumento das desigualdades e da violência. Assim, o Estado é chamado a corroborar com as decisões tomadas. 3

O PAA como norma e sua espacialização no Rio Grande do Norte Para situarmos no tempo e no contexto social a política pública ora estudada neste artigo, o PAA, faz-se necessário realizarmos uma breve explanação das políticas públicas criadas anteriormente, para poder assim, entendermos as mudanças no panorama político que acontecia naquele momento da criação do programa. O primeiro programa com um caráter social mais abrangente de grande repercussão no cenário nacional foi o PRONAF, criado em 1995. Esse programa surgiu como uma linha de crédito de custeio que destinava recursos para serem aplicados na produção agrícola explorada em regime familiar. Em 1996 deixou de ser apenas linha de crédito e passa a adquirir status de programa de governo, vinculando-se a Secretaria de Desenvolvimento Rural do Ministério da Agricultura SDR/MA. Em 1999, o PRONAF se integra ao Ministério do Desenvolvimento Agrário MDA, onde está locado até hoje. Atualmente o PRONAF tem sido uma política prioritária, passando a alcançar praticamente todo o território do país, onde segundo dados do MDA, no calendário agrícola 2007/2008 foram atendidos 5.379 municípios, abrangendo um total de 794.729 contratos de custeio e 756.020 de contratos de investimento, sendo destinados, respectivamente, 4.916.759.180,55 e 3.747.969.870,25 para a agricultura familiar, segundo dados do Banco Central no ano de 2008. Em 2002, foi criado o programa Garantia-Safra, vinculado ao PRONAF, que visa possibilitar um ambiente de tranquilidade e segurança para o exercício da atividade agrícola na região semiárida brasileira. Caso o agricultor perca a safra por motivo de seca, ele será ressarcido. Este programa foi implantado nas regiões do Nordeste, no Norte de Minas Gerais (Vales do Mucuri e Jequitinhonha) e no Norte do Espírito Santo. Cabe destacar que o Garantia-Safra só beneficia os agricultores que já possuem contratos do PRONAF, e como nem todas as famílias conseguem financiamento desse programa, em caso de perda da produção também não serão contemplado com o seguro. Vale salientar que esse seguro aos pronafianos não resolve os problemas sociais e nem cobre as perdas geradas por longas estiagens, pois o valor do benefício varia de acordo com a safra, no entanto, no ano agrícola 2009/2010 o valor pago para os agricultores foi de R$ 680,00, pagos em cinco parcela, o que o torna um benefício compensatório e não estruturante. Nesse processo de mudança no direcionamento das políticas para o meio rural, foi criado em 2003 o Programa Territórios Rurais, com o intuito de uma melhor atuação e 4

articulação das políticas públicas para a promoção do desenvolvimento rural. Esta nova abordagem, o enfoque territorial, começou a ser trabalhada em 2003, juntamente com a criação da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário SDT/MDA, passando a utilizar este enfoque na orientação de iniciativas e políticas públicas para os espaços rurais. Atualmente existem 160 Territórios Rurais no Brasil, sendo que destes 07 encontram-se no Rio Grande do Norte, sendo eles: Açú-Mossoró, Alto Oeste, Mato Grande, Potengi, Seridó, Sertão do Apodi e Trairí (Mapa 01). Mapa 01: Mapa dos Territórios Rurais no Rio Grande do Norte Fonte: Sistema de Informações Territoriais. Secretaria do Desenvolvimento Territorial MDA, 2012. Na esteira dessas mudanças está incluído o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que foi criado em 2005, para colaborar com a erradicação da fome e da pobreza no Brasil e, ao mesmo tempo, fortalecer a agricultura familiar. Para isso, o programa utiliza mecanismos de comercialização que favorecem a aquisição direta de produtos de agricultores familiares ou de suas organizações, estimulando os processos de agregação de valor à produção. Parte dos alimentos é adquirida pelo governo diretamente dos agricultores familiares, assentados da reforma agrária, comunidades indígenas e demais 5

povos e comunidades tradicionais, para a formação de estoques estratégicos e distribuição à população em maior vulnerabilidade social. Os produtos destinados à doação são oferecidos para entidades da rede socioassistencial, nos restaurantes populares, bancos de alimentos e cozinhas comunitárias e ainda para cestas de alimentos distribuídas pelo Governo Federal. O PAA é executado com recursos dos Ministérios do Desenvolvimento Agrário (MDA), nas modalidades: Apoio à Formação de Estoques pela Agricultura Familiar e a Compra Direta da Agricultura Familiar; e do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) que executa as modalidades: Compra com Doação Simultânea, e Incentivo à Produção e ao Consumo do Leite, em parceria com estados, municípios e com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Se compararmos os anos de 2005 e 2010, percebemos uma evolução com relação aos recursos destinados e o número de agricultores familiares participantes do PAA no território brasileiro como um todo, sendo os valores destinados de R$ 333,06 milhões em 2005 e R$ 680,75 milhões em 2010. Com relação ao número de agricultores familiares tivemos uma evolução de 87.292 em 2005 para 155.166 em 2010. Assim, entendendo o PAA como norma, um arranjo institucional se forma para a execução desta política no território brasileiro (Quadro 01). Tomando estes agentes sociais (Instituições e agricultores familiares) envolvidos em todas as etapas do processo de execução do PAA, como sendo agentes criadores e modificadores de territórios. Quadro 01: Arranjo Institucional do PAA por Modalidade Modalidade Compra Direta da Agricultura Familiar Apoio a Formação de Estoques pela agricultura familiar Incentivo à Produção e Consumo de Leite PAA leite Compra com Doação Simultânea Fonte do Recurso MDS/MDA MDS/MDA MDS MDS Executor CONAB CONAB Estados da região Nordeste e Norte de Minas Gerais. CONAB, estados e municípios. Fonte: Ministério do Desenvolvimento Agrário/Secretaria da Agricultura Familiar. PAA DATA, 2012. No Rio Grande do Norte, a espacialização do PAA se dá de forma bem rarefeita, ou seja, o número de agricultores integrados ao programa é muito baixo, como pode ser 6

observado no Mapa 02. Percebemos que o PAA predomina quase que em todo o território do Rio Grande do Norte, ficando de fora apenas alguns municípios. Para melhor compreensão da concentração da atuação do PAA nos municípios, criamos 08 categorias para análise, agrupando-os por número de fornecedores. No Rio Grande do Norte observamos uma maior predominância das três primeiras categorias que são: (a) de 02 a 10 agricultores fornecedores; (b) de 11 a 20 agricultores fornecedores; e (c) de 21 a 30 agricultores fornecedores. Ficando as outras cinco categorias com a variação de quatro a um fornecedor por município. Para o momento além do mapa, criamos uma tabela que ilustra a quantidade de agricultores fornecedores para o PAA por município, e a quantidade de produtores rurais por município, no intuito de fazermos uma comparação da quantidade total de produtores rurais com a quantidade de agricultores fornecedores para o PAA. 7

Mapa 02: Mapa da Espacialização do PAA no Rio Grande do Norte por município 2011 Fonte: PAA DATA. Secretaria da Agricultura Familiar MDA, 2011. 8

No entanto, percebemos que apesar de abranger boa parte do território do Rio Grande do Norte, o PAA ainda é pouco expressivo se compararmos o número de produtores rurais com o número de produtores fornecedores para o PAA (Tabela 01). Tabela 01: Número de agricultores fornecedores (PAA 2011) e número de produtores rurais (2006) por município e Território Rural - RN Porcentagem Número de Número de dos agricultores produtores Território Municípios agricultores fornecedores- rurais em contemplados PAA 2011 2006 no PAA (%) Açú-Mossoró Alto Oeste Alto do Rodrigues 7 1655 0,4 Areia Branca 11 872 1,3 Baraúna 16 3882 0,4 Ipanguaçu 73 2462 3,0 Itajá 5 147 3,4 Mossoró 75 5079 1,5 Pendências 3 520 0,6 São Rafael 1516 0,0 Serra do Mel 9 4107 0,2 Alexandria 20 2784 0,7 Antônio Martins 14 1254 1,1 Coronel João Pessoa 11 1015 1,1 Currais Novos 27 1785 1,5 Doutor Severiano 6 1463 0,4 Frutuoso Gomes 7 644 1,1 João Dias 10 655 1,5 José da Penha 10 1658 0,6 Lucrécia 5 461 1,1 Luís Gomes 10 1246 0,8 Major Sales 9 308 2,9 Marcelino Vieira 51 1363 3,7 Martins 8 995 0,8 Paraná 9 702 1,3 Pau dos Ferros 8 1490 0,5 Portalegre 7 2523 0,3 Rafael Fernandes 23 811 2,8 Riacho da Cruz 8 357 2,2 Riacho de Santana 10 1480 0,7 São Francisco do Oeste 430 0,0 9

Mato Grande Potengi Seridó São Miguel 6863 0,0 Serrinha dos Pintos 7 931 0,8 Taboleiro Grande 7 405 1,7 Tenente Ananias 15 1426 1,1 Venha-Ver 9 1644 0,5 Bento Fernandes 19 1515 1,3 Caiçara do Norte 11 1548 0,7 João Câmara 13 2610 0,5 Maxaranguape 9 506 1,8 Parazinho 5 508 1,0 Pedra Grande 8 565 1,4 Poço Branco 27 1025 2,6 Pureza 21 1882 1,1 São Bento do Norte 21 1105 1,9 São Miguel do Gostoso 30 1710 1,8 Taipu 13 1663 0,8 Touros 54 5826 0,9 Barcelona 5 967 0,5 Bom Jesus 31 1229 2,5 Ielmo Marinho 10 3437 0,3 Lagoa de Velhos 10 421 2,4 São Paulo do Potengi 36 976 3,7 São Pedro 13 1324 1,0 São Tomé 10 3289 0,3 Senador Elói de Souza 6 2463 0,2 Acari 18 1110 1,6 Bodó 13 467 2,8 Caicó 5 2454 0,2 Carnaúba dos Dantas 28 925 3,0 Cerro Corá 42 5946 0,7 Cruzeta 7 1128 0,6 Currais Novos 27 1785 1,5 Equador 20 1223 1,6 Florânia 13 1076 1,2 Ipueira 4 166 2,4 Jardim de Piranhas 2 747 0,3 Jardim do Seridó 16 1435 1,1 Jucurutu 24 2477 1,0 Lagoa Nova 22 6643 0,3 Ouro Branco 46 1221 3,8 Parelhas 28 1294 2,2 10

Sertão do Apodi Trairí Santana do Matos 18 3260 0,6 Santana do Seridó 17 383 4,4 São Fernando 8 468 1,7 São João do Sabugi 5 926 0,5 São José do Seridó 6 875 0,7 São Vicente 22 1663 1,3 Serra Negra do Norte 8 870 0,9 Apodi 24 9712 0,2 Caraúbas 18 4650 0,4 Gov. Dix-Sept Rosado 5 3709 0,1 Itaú 17 442 3,8 Janduís 19 859 2,2 Messias Targino 11 301 3,7 Patu 18 914 2,0 Rafael Godeiro 10 832 1,2 Rodolfo Fernandes 23 458 5,0 Severiano Melo 5 1643 0,3 Triunfo Potiguar 6 1138 0,5 Umarizal 33 1092 3,0 Upanema 46 2568 1,8 Boa Saúde 24 2364 1,0 Campo Redondo 29 2947 1,0 Coronel Ezequiel 13 2128 0,6 Jaçanã 29 1486 2,0 Japi 22 1001 2,2 Monte das Gameleiras 17 824 2,1 Passa e Fica 21 1789 1,2 Santa Cruz 63 1182 5,3 São Bento do Trairí 13 749 1,7 São José do Campestre 11 1293 0,9 Sítio Novo 28 1185 2,4 Tangará 15 1739 0,9 Fonte: IBGE - Censo Agropecuário, 2006; Ministério do Desenvolvimento Agrário/PAA DATA, 2011. Considerando que o PAA tem como objetivos a distribuição de renda, assegurar a circulação do dinheiro na economia local, a exploração mais racional do espaço rural, o incentivo à agrobiodiversidade e a preservação da cultura alimentar regional, diante dos dados apresentados, percebe-se que tais objetivos estão longe de serem atingidos, pois somente 1,00% dos agricultores do estado foram contemplados pelo Programa no ano de 2011. 11

Considerações finais Na abordagem aqui apresentada percebemos que a atuação do Estado realiza-se de forma desigual no território do Rio Grande do Norte, retratando no espaço as desigualdades sociais. É a partir da norma, que para a Geografia, pode ser vista como o resultado da tensão e/ou da harmonia entre objetos e ações que constituem o espaço geográfico (Mendes, 2005), que territórios são criados e recriados através das relações sociais existentes ou não em determinado espaço geográfico. Assim, para entendermos as mudanças territoriais provocadas pela inserção do PAA no território norte-rio-grandense, precisamos trazer a discussão do território normado, como sendo aquele criado através de ações. Neste sentido, concluímos que ainda existe pouca participação, por parte dos agricultores familiares, no PAA aqui no Rio Grande do Norte. Quando comparamos o número de produtores rurais por município com o número de agricultores fornecedores por município, percebemos a pouca inserção existe por parte dos agricultores no programa. Considerando o tempo de existência desta política, e a pouca participação dos produtores, ensejamos que o PAA possui muitos problemas na sua implementação, execução e regularidade. Ainda, para que de fato os objetivos desse Programa sejam atingidos e que isso repercuta em melhores condições de vida para os agricultores familiares, o Estado terá que aperfeiçoar os mecanismos de execução do mesmo, além de ter que aumentar a destinação de recursos para essa finalidade. Somente com programas dessa natureza, com objetivos bem delimitados, aplicação de recursos suficientes, compromisso do poder local em operacionalizar tais políticas é que se poderá diminuir a grau de sujeição dos agricultores familiares aos atravessadores e às agroindústrias, que monopolizam o mercado, e assim garantir renda e melhor qualidade de vida a essa população. Notas 1 A lei aqui é considerada como norma. 2 Para Höfling (2001) as políticas públicas é o Estado implantando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade. 3 Segundo Höfling (2001) Estado é diferente de governo, sendo este o Conjunto de programas e projetos que parte da sociedade (políticos, técnicos, outros) propõe para a sociedade como um todo, configurando- 12

se a orientação política de um determinado governo que assume e desempenha as funções de Estado por um determinado período. Referências ANTAS JR., Ricardo Mendes. Território e regulação: espaço geográfico, fonte material e não-formal do direito. São Paulo: Associação Editorial Humanitas: Fapesp, 2005. BACEN - Banco Central. Anuário Estatístico do Crédito Rural 2008. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/htms/creditorural/2008/pronaf.asp?idpai=relrural2008>. Acesso em 09 jul. 2012. OFFE, Claus. Problemas estruturais do Estado capitalista. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984. SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001. SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. HÖFLING, Eloisa de Mattos. Estado e Políticas (Públicas) Sociais. Cadernos Cedes, ano XXI, nº 55, novembro/2001. Sites consultados: HTTP://www.mda.gov.br. Acesso em 26 de junho de 2012. HTTP://www.mdt.gov.br. Acesso em 26 de junho de 2012. http://www.bcb.gov.br/htms/creditorural/2012/pronaf.asp?idpai=relrural2012. Acesso em 09 de julho de 2012. HTTP://www.ibge.gov.br. Acesso em 09 de julho de 2012. 13