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Transcrição:

Acompanhamento Juvenil 1 Gislei Domingas Romanzini Lazzarotto Júlia Dutra de Carvalho Julia Lângaro Becker Introdução Nosso ponto de partida para pensar as relações entre o Acompanhamento Terapêutico e os modos de trabalhar com jovens é um Programa de Trabalho Educativo assessorado pelo Projeto de Extensão ESTAÇÃO PSI (Estudos e Ação de Subjetivar e Inventar) do Departamento de Psicologia Social e Institucional no Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Este Programa, existente desde 2002 numa organização federal, tem por objetivo acompanhar jovens que passaram ou passam por processo de institucionalização nos estabelecimentos que compõe a rede executora de medidas socioeducativa 1 e protetiva 2 FASE (Fundação de Assistência Socioeducativa), FPE (Fundação de Proteção Especial) e PEMSE/FASC (Programa executor de medidas em meio aberto). No referido programa jovens entre 16 e 18 anos desenvolvem um estágio em atividades previstas na organização do trabalho. Nesta organização, dentro do estabelecimento que propõe o Programa, servidores públicos orientam jovens no desenvolvimento de suas funções laborais dentro do setor. Essa iniciativa é desenvolvida com uma concepção que associa o estágio 3 com a noção de trabalho educativo 4, conforme Artigo 68 do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990). O procedimento central que sustenta a proposta é um convênio com as organizações executoras de medidas que encaminham os adolescentes em medida socioeducativa e de proteção. Esse modo de criar relações entre diretrizes e legislações referentes às regulamentações de cunho juvenil, educacional e de trabalho, diz respeito a uma ação interinstitucional que constrói outras possibilidades de operar as normas de uma macropolítica. Ou seja, do ponto de vista da regulamentação, estão previstos o estágio ou a proposta de trabalho educativo, mas sem um diálogo entre essas normatizações para conceber uma estratégia direcionada a esse público. São as configurações de alianças micropolíticas que fazem emergir a invenção que atualiza as diretrizes nas relações macro-micropolíticas com novas práticas. Jovens e servidores recebem assessoria universitária no desenvolvimento desta proposta através da ação de extensão docente e de estágios de psicologia social supervisionados. Neste sentido, a presença da Universidade não diz respeito a noção de um conhecimento que orienta como deve ser o Programa, ou que busca esse Programa para pesquisar. Propomos a extensão como mais um saber que, no diálogo com outros saberes, afirmam um modo de construir ações públicas. A intervenção com jovens e equipes, a formação de profissionais de psicologia e a produção de conhecimento, são componentes dessa responsabilidade compartilhada. Nesse sentido, nos orientamos por Aguiar e Rocha (2007) que pensam a produção de conhecimento como uma ação que busca a interferência 1 Texto apresentado com o titulo Acompanhando micropolíticas juvenis no III Congresso Internacional. IV Congresso Iberoamericano. II Congresso Brasileiro de Acompanhamento Terapêutico. Texto de Simpósio Temático. Universidade Federal do rio Grande do Sul. Porto Alegre, Outubro, 2008.

coletiva na produção de micropolíticas, tendo a experiência como uma positividade que produz a pesquisa na intervenção, princípio da pesquisa-intervenção. Desde o início de nosso trabalho, nos questionamos como deveria ser para este jovem viver no embate dessas duas lógicas institucionais: a do trabalho e a jurídica (cumprimento de medida). Essa linha divisória entre o lugar do trabalho e o lugar de cumprimento da medida ganhava forma à medida que percebíamos um jovem construindo relações de responsabilidade, cooperação e abertura para falar de si nas relações criadas no trabalho em estágio, em contraposição com um lugar regido pelo controle da institucionalização do cumprimento da medida de internação (socioeducativa) e a de abrigagem (proteção). O trabalho educativo, passou a constituir para o Programa um lugar de diálogo sobre os modos de trabalhar-aprender com essas relações juvenis, em que jovens e equipes passaram a analisar a função deste Programa e da política pública que o sustentava. Ao invés de separarmos a lógica do trabalho e a lógica jurídica, optamos por percorrer a linha que criava tensão entre esses modos de se relacionar com o jovem, fazendo desta a orientação para compor o percurso de análise dos processos de subjetivação. A tensão, conforme propõe Lazzarotto (2009), pode ser tomada como um incômodo, constituindo uma imobilidade no/do fazer. Esta imobilidade acontece quando experimentamos esta tensão em nossas práticas apenas como efeito reprodutor de um regime de verdade que nos mantém institucionalizados. Entretanto, ao seguirmos, e entendermos este incômodo como produtor no caráter processual das linhas que compõem as práticas institucionais, podemos situar a tensão como sinal de movimento dessas linhas que contornam o trabalho, o cumprimento da medida e os saberes que sustentam os modos de intervir. Tensão que nos ensina a escutar os percalços institucionais adjacentes, e que os coloca como o próprio objeto do nosso trabalho. Foucault (2003, p.348) ao ser questionado sobre o efeito de suas análises nos educadores penitenciários enfatiza: meu projeto é fazer de tal modo que eles não saibam o que fazer : que os atos, os gestos, os discursos que até então lhes pareciam andar sozinhos tornem-se problemáticos, perigosos, difíceis. Esse efeito é desejado. O autor destaca que é neste processo que podemos despertar para um conjunto de problemas que a dificuldade de agir faz aparecer. É preciso um longo trabalho de vaivém, de trocas, de reflexões, de tentativas e análises bem diversas. Na experiência produzida nas práticas institucionais, as questões discutidas entre jovens, servidores públicos e equipe de psicologia extrapolavam por vezes os limites estabelecidos, a saber: estar em local de trabalho e estar cumprindo medida socioeducativa e de proteção. Nesta perspectiva, a questão que se formulava envolvia pensar com os jovens suas escolhas entre lógicas institucionais que regram suas vidas, sendo que alguns espaços construídos eram privilegiados (grupo dispositivo dos jovens, reuniões com servidores, atendimento individual); outros, inusitados, pois se davam no encontro em um elevador do prédio público, ou mesmo na rua, quando algo era demandado pelo jovem. Esses movimentos nos levaram a compreender que ali ele pedia um acompanhamento, um suporte possível de fazer com para a vivência do desconhecido. Ao optarmos por estar com nesse processo, o Programa com o qual trabalhamos passa a ser um analisador de como as relações são constituídas com este jovem na rede de políticas públicas. Para nós percorrer as ações nessa rede implicava em estar na vida da cidade organizada por conexões de equipamentos públicos nos quais os jovens circulam. Neste percurso, ampliamos a análise tanto do evento que levou a decidir por ter uma etapa da vida juvenil regida por uma medida jurídica, como dos modos de subjetivar constituídos na violência do contemporâneo.

É assim que o Acompanhamento Juvenil (AJ) passa a ser constituído como uma ferramenta de intervenção clínico-institucional, criando uma estratégia própria e sob interferências do diálogo com o Acompanhamento Terapêutico ( AT). Construindo um modo de Acompanhar Enunciações Juvenis O Acompanhamento Juvenil (AJ) ganha maior atenção no Projeto de Extensão ESTAÇÃO PSI a partir do ano 2006, quando através da cartografia da própria Extensão percebemos o que nos levava a buscar o diálogo com as instituições executoras de medidas. Estávamos efetivamente nos dispondo a seguir as linhas apresentadas pelos jovens, e ver afinal o que eles estavam tentando nos mostrar. Assim, evidencia-se também o exercício consigo, exercício do acompanhante no processo de cartografar modos de viver no percurso feito com um jovem. È preciso mapear as condições que produzem nosso lugar entre esses modos de viver juvenis enunciados pela infração e pelo abandono. Como somos lançados nessa trama juvenil-institucional? Andar com, estar com. Ao seguirmos com as linhas atualizadas pelos jovens chegamos a momentos de angústia, nos quais não sabíamos o que fazer com aqueles pedidos, aquelas denúncias, e no limite, aquelas vidas. Algo nos dizia efetivamente que precisávamos retornar para a rede de execução para saber o que fazer, e como poderíamos ajudar aquele jovem. Tínhamos sido fisgados pela afetação juvenil, um exercício de relações de força que tensionava na psicologia um lugar juvenil, enunciado em nossa sociedade como um modo de viver marcado apenas pela infração e pelo abandono. Conforme Lazzarotto (2009) é neste processo que se colocam os véus do problema juvenil sobre a infração social. É pela condição juvenil insistente e insurgente que as forças constitutivas dessa produção social tomam a potência como problema e pelo regime hegemônico criam um falso problema: afirmar a juventude como disfunção a ser corrigida no indivíduo. Ao colocar em análise a própria produção social da violência e as práticas institucionais do trabalho, do cumprimento da medida, da psicologia, constrói-se o mapa que opera os modos contemporâneos de nossa existência. Nesse sentido, o contexto do Programa em que emerge o AJ envolve os modos de se relacionar com a infração juvenil e o abandono, construindo uma crítica para pensar os jovens e as forças que compõem a infração social que vivemos, desterritorializando os contornos delimitados pelos modos de operar as medidas socioeducativa e de proteção. As afetações que fazem vacilar os modos de praticar-acompanhar são efetuações de uma potência que o devir propaga, conforme referem Deleuze e Guattari (1997). A potência, conceito abordado por Deleuze (1988, 2005), é o poder de afetar e ser afetado, a relação de uma força com outras forças, e nestas relações são territorializados corpos que acionam forças e enfrentam outras forças. Bocco (2006, p. 53) propõe pensar a juventude como um (...) plano vital sem início, término ou duração pré-determinados que consiste em uma inquietação com o mundo, um inconformismo com o status quo e uma força propulsora de mudanças. Para a autora tal plano não estaria atrelado a uma etapa de vida, tratando-se de uma linha que pode atravessar a todos e qualquer um durante sua existência. São esses pressupostos conceituais que sustentam a criação dessa prática clínicainstitucional desenvolvida na prática com o jovem. Neste sentido, dialogamos com Foucault (2003), que destaca as práticas como alvo ponto de ataque para construir as análises das problematizações que emergem no jogo de forças das relações institucionais. Sua hipótese é de que as práticas têm sua própria regularidade, sua lógica, sua evidência, sua estratégia. Trata-se, portanto, (...) de fazer a análise de um regime de práticas as práticas sendo consideradas como o lugar de encadeamento do que se diz e do que se faz, das regras que se impõem e das razões que se dão, dos projetos e das evidências. (FOUCAULT, 2003, p. 338).

A tensão emerge nas práticas como efeito da coexistência de tendências que produzem modos de trabalhar, de operar uma medida, de fazer psicologia, ou seja, a tensão enuncia algo por se fazer. Estar atento aos trajetos de nossas práticas e as intensidades das relações que as compõem, diz de um processo sempre paradoxal que constitui os modos de viver e que indaga para quê, guia para construirmos a cartografia de nosso fazer. Portanto, a questão que formulamos enuncia que acompanhar, neste contexto, é uma tarefa orientada pelo princípio da multiplicidade que compõe os modos de ser juvenis, e pelo princípio inventivo que produz as práticas institucionais. Então, que regime de práticas com jovens estava sendo construído no encontro entre macro e micropolíticas juvenis? Um Regime de Praticar-Acompanhar com Jovens Marcamos reuniões com a rede, ouvimos outras tantas vozes, seguimos em produções de trabalho conjunto com alguns técnicos que operam as medidas na rede, e pudemos pensar outras formas de fazer. Observamos que essas práticas, nem sempre podiam dar conta das questões daquele jovem que nos fez o pedido, mas que efetivamente geravam processos de análise com equipes que reverberariam nas produções com outros jovens, e na rede, indubitavelmente. Mas insistia o movimento de fazer esse percurso com o jovem, pois ele mantinha formas de expressão tanto no desenvolver de seu estágio de trabalho educativo, como em retornos ao Programa e na equipe de psicologia, após finalizar seu estágio, para falar de si e de suas andanças pela escola, na busca de emprego, na procura de um lugar para morar, no impasse de fugir de ameaças. A escolha por pensar as práticas emerge de uma trajetória ligada à análise institucional e que evidencia um modo de propor nosso modo de intervir. Nesse sentido, Oliveira e Fonseca (2007) apresentam a problematização entre instituição e subjetivação a partir da compreensão de que ambas são dobras de um plano social, o qual é constituído na continuidade entre o que lhe é exterior e interior. Considerando o conceito de dobra, concebido por Gilles Deleuze (1988), as autoras evidenciam que não há como separar o dentro e o fora, pois é com o fora que o ser se configura, se dobra e se individua. O processo de transformação simultânea do fora e do dentro revoga um interior pessoal separado do social, pois a interioridade se dá como dobramento das forças do exterior. Os modos de subjetivação não são provenientes de um sujeito que mergulha em sua interioridade, mas invenções de um coletivo constituído nos agenciamentos do viver, isto é, os sujeitos e as instituições são vistos como efeitos, resultados dos jogos entre os encontros entre formas e forças que habitam o mundo. (OLIVEIRA; FONSECA, 2007, p. 133). Voltando, portanto, à prática no Programa, temos que essas dobras que se dão no artesanato das nossas vidas, se dão também dentro do estabelecimento no qual o jovem se cria e recria no embate e encontro com as instituições - lógicas vigentes. Lugares de trabalho e lugares de cumprimento da medida, aparentemente antagônicas no que diz respeito à liberdade, mas que no encontro com o jovem produziram que o mesmo ensaiasse suas primeiras questões com relação ao que ele quer, ao que gosta, e no limite: o que mais ele pode. Ou seja, o que já o constituía neste percurso e o que pode ser acessado ao deslocarmos os limites deste território existencial marcado pela infração e pelo abandono. Para nós, equipe de psicologia, estava sendo formulada a questão de análise clínico-institucional: compor o acompanhamento problematizando a prática jurídica de cumprir uma medida e propondo experimentar a medição, não como escala fixa do tempo a ser cumprido, mas como o trajeto de um processo micropolítico feito de antes, durante e depois da medida.

Ao propormos problematizar a vida juvenil sendo feita numa trajetória a ser acompanhada, somos convocados a pensar também as formações históricas que produziram nossas práticas neste contexto. Se hoje buscamos por um lado, operar os pressupostos do Estatuto da Criança e do Adolescente, que orienta uma abordagem em rede que afirme este adolescente como sujeito de direito, por outro, herdamos a condição de menor institucionalizado em organizações orientadas pelo controle, disciplina e assistencialismo. Neste sentido, a rede que compõe as ações que executam as medidas e buscam as linhas que enlaçam as políticas de saúde, educação, assistência social, ainda é marcada por práticas isoladas que dizem da função de cada um, mas criam poucos elos para constituir a intervenção com a medida como processo. A ênfase nas etapas a serem cumpridas e regidas por um processo judicial, propicia um distanciamento das possibilidades de um acompanhamento processual que opere conjuntamente as ações judiciais, educativas, comunitárias, familiares e de saúde. Neste processo evidencia-se a importância de estratégias intersetoriais no modo de acompanhar o jovem na interface com as organizações executoras da medida e a composição da rede de políticas públicas. A execução da medida socioeducativa e de proteção tende a organizar-se pela associação de seu tempo de cumprimento, definido judicialmente, e da responsabilização institucional de quem opera o cumprimento da medida em estabelecimentos. A intervenção numa rede implica conceber a medida para além do processo judicial, possibilitando a circulação do jovem para compor a rede no seu percurso. Cabe ressaltar ainda que, no acompanhamento aos jovens, quando das discussões em fóruns que reúnem estabelecimentos que compõem a rede intersetorial de atendimento em políticas públicas, era recorrente a preocupação com o aumento de diagnósticos psicopatológicos, e um questionamento de uma certa naturalização da associação das medidas socioeducativa e protetiva a identificação destes diagnósticos.. Scisleski (2006) evidencia em seu estudo um processo de patologização e judicialização de determinadas categorias sociais da juventude. Tal processo segundo as autoras é sustentado pela articulação entre os saberes médicos e jurídicos, manifestada no próprio encaminhamento à internação psiquiátrica por determinação judicial. A autora destaca que a ordem judicial exerce uma dupla função: por um lado uma estratégia de acesso ao serviço de saúde; por outro, o encaminhamento serve como um recurso auxiliar à disciplinarização dos adolescentes, constituindo uma relação entre "medicar" e "punir", sendo freqüente que a internações psiquiátricas de adolescentes usuários de drogas ilícitas são tomadas como uma medida prévia à internação em medida socioeducativa. Em diálogo com a concepção de sujeito de direito, temos as diretrizes em saúde mental infanto-juvenil que indicam a noção de responsabilidade, o direito ao cuidado e a singularidade, problematizando as práticas orientadas por uma forma homogênea e indiferenciada. O princípio deste acompanhar implica em estar atento ao que se diz desses jovens como substituto de sua própria palavra, o que implica que as demandas formuladas por outros sejam ouvidas como demandas juvenis, conforme aponta a Política de Saúde Mental Infanto-Juvenil (BRASIL, 2005). E ainda, que a análise dessa demanda seja tomada por um discurso naturalizado, que enuncia mais uma adaptação de jovens e profissionais ao funcionamento institucionalizado, do que propriamente uma análise de demanda. Neste sentido, entendemos o AJ com uma dupla função que se dá, a saber: na criação de espaços de estar com o jovem na experiência consigo nos percursos institucionais vividos na cidade e a construção de relações institucionais que reverberem mudanças nas políticas públicas juvenis. A intervenção experimentada com o jovem nos lança para um retorno para rede e esse retorno se coloca como um princípio orientador de nossa prática, pois diferente da lógica de encaminhamentos que vigora tanto na rede de execução de medidas, quanto na saúde, adotamos a ideia de uma políticas de alianças e de exercício de relações-forças.

Esta costura entre os serviços, possibilita abrirmos territórios geográficos e existenciais para o jovem circular, e para os profissionais de uma rede se perceberem em outro lugar nesta relação. Poder voltar para o serviço no qual cumpriu medida para contar sobre seu estágio para os monitores, ou técnicos, reinventar uma relação não mais de controle, mas de testemunho e parceria significa se descolar da palavra de ordem que o decalcou e que impede seu movimento na cidade, nas escolhas e na invenção de sua existência. Perceber naquele que o acompanhou no cumprimento de sua medida uma diferença de olhar, uma possibilidade de o perceber de outra forma, inscrevendo nesta percepção outra história de vir a ser, de por vir. Irmos à escola com o jovem para reativar sua matrícula e percebermos o medo da professora e o lugar de ameaça assumido pelo jovem, que até então se colocava como apaziguador, vai afirmando que é no trajeto da vida que outros sentidos podem ser convocados em nossa intervenção. Que sentido teria uma medida socioeducativa se o jovem e a prática escolar foram mantidas numa relação construída na ameaça? Quem compõe essa medida, antes, durante, depois... Tomamos a cidade em sua organização na rede de equipamentos públicos como suporte deste percurso que também diz dos riscos associados a violência a que esses jovens estão expostos e por conseguinte quem o acompanha. Ter claro essa linha institucional como território de prudência para seguir no fluxo da produção juvenil neste acompanhamento, implica em afirmar em nosso fazer o critério de expansão da vida e o respeito aos limites que a experimentação indica no próprio processo de cartografar, conforme nos indicam Rolnik (2006) e Deleuze e Guattari (1996). Mas como sustentamos a análise clínico-institucional quanto ao modo de constituir e manter uma equipe de psicologia que pratica e constrói essa prática num percurso da experimentação? A Escrita no Percurso do Acompanhamento Juvenil Quanto ao modo de analisar a estratégia do acompanhamento juvenil, optamos pela escrita como ferramenta clinico-institucional da equipe de psicologia. A escrita constitui-se como modo de manter o movimento de percorrer a prática e perdurá-la em análise. O uso de um diário coletivo, ferramenta criada numa lista de discussão da equipe de psicologia em ambiente à distancia, conforme propõe Lazzarotto (2009), compõe uma pragmática do escrever em intervenções institucionais. O diário coletivo propicia o acolhimento do que se vive através de um modo próprio de escrever em mensagens elaboradas em qualquer tempo, em qualquer lugar, que compartilham o que está acontecendo consigo (pelo próprio ato de escrever) e com o outro (a equipe de psicologia que se constitui como um leitor-escritor que seguirá com essa escrita em desdobramentos da mensagem). A conjugação deste diário coletivo com espaços presenciais de seminário desta equipe, vai construindo uma cartografia do escrever do praticar-acompanhar- analisar as relações entre processos de subjetivação juvenis, lógicas institucionais e modos de intervir-pesquisar ( LAZZAROTTO, 2009). Esse modo de escrever cria um regime de visibilidade daquilo que se inventa ao praticar-acompanhar, colocando em análise os efeitos de prescrição em relação ao que se deve fazer e os efeitos de codificação em relação ao que se deve saber no sentido abordado por Foucault (2003). Ao operarmos as práticas de acompanhamento juvenil, experimentamos a tensão do fazer profissional que escapa ao saberes prescritos. Somos convocados para uma escrita produzida na eminência do vivido nos trajetos da cidade sob os contornos juvenis. A escrita é um prolongamento das práticas de circulação no acompanhamento, pois o movimento de escrever na duração do processo que produz um modo de compor o acompanhamento, mantem o movimento de análise da própria equipe no processo de seu fazer.

A feitura desse diário compartilhado em nosso grupo de psicologia tem sido uma condição para compor a pragmática clinico-institucional do acompanhar. Ao escrever encontramos entre palavras de ordem, componentes de passagem que fazem a linguagem entrar em um devir minoritário, conforme analisam Deleuze e Guattari (1995). A palavra de ordem remete aos comandos e a todos os atos que estão ligados aos enunciados por uma obrigação social, e segundo os autores, existem senhas sob as palavras de ordem. Enquanto as palavras de ordem marcam paradas, composições estratificadas, a mesma palavra, tem esta dupla natureza: é preciso extrair uma da outra transformar as composições de ordem em componentes de passagens. (Deleuze; Guattari, 1995, p. 59) Ao escrevermos, as afetações experimentadas com o acompanhar são atualizadas Entre as possibilidades de passagem que as palavras de ordem carregam, o cartógrafo habita possibilidades de experimentar a tensão de novas distinções de suas práticas nos trajetos e nas intensidades do escrever. Deleuze e Guattari ( 1995), evidenciam o caráter coletivo e político da linguagem, deixando de ser um sistema de representação, para se tornar uma prática que exprime um regime de linguagem, uma língua própria ao contexto em que se produz. Assim, a língua é composta tanto pelo ordenamento que mantém a constância e reprodução do que se diz, como pela variação que faz surgir novas distinções. Em nossas práticas é a variação que afeta e nos força a uma escrita-intervenção, escrita que compõe o acompanhamento como produção coletiva à medida que uma tecnologia, uma metodologia e uma rede de relações macro-micropolítica configuram essa possibilidade Rolnik (1993) evidencia que é assim que se faz o trabalho do pensamento, pois dá para dizer que só se pensa porque se é forçado a fazê-lo. O pensamento, nesta perspectiva, não é fruto da vontade de um sujeito já dado que quer conhecer um objeto já dado, descobrir sua verdade, ou adquirir o saber onde jaz esta verdade; o pensamento é fruto da violência de uma diferença posta em circuito, e é através do que ele cria que nascem, tanto verdades quanto sujeitos e objetos. Quando o escrever se dá na eminência de uma prática entre a prescrição e o acontecer, estamos compondo mais um movimento que compõe a cartografia. A enunciação de algo que se produz no processo de afetar e ser afetado numa escrita compartilhada. Nessa concepção, não nos centramos na análise do autor, do acompanhante, do acompanhado, do técnico ou da equipe, mas no mapa de práticas que emergem numa enunciação coletiva. Nesse sentido, problematizamos a autoria como relação, um estilo a ser criado entre signos que circulam, insistem, afetam, e nos forçam a percorrer outras possibilidades em nossas práticas. Diálogos entre AT e AJ: uma Ética, uma Política, uma Inspiração O Acompanhamento Juvenil foi constituindo-se no movimento de percorrer a multiplicidade dos modos de ser juvenis, no percurso do vivido entre práticas institucionais. Neste exercício primeiro de se perceber sendo outro, e paradoxalmente o mesmo que era antes de acompanhado, o jovem faz ensaios nas práticas institucionais afirmando-se em outro território, afeito a outras lugares e reconhecimentos sociais. Com este sentido, seguimos como metodologia a tecnologia do Acompanhamento Terapêutico já existente, e amplamente utilizado nos serviços de Saúde Mental, cartografando singularidades que foram dando outras tintas para o AT. Assim, o diálogo com AT (Palombini, 2004) abriu possibilidades para afirmar as práticas de circulações com os jovens como um modo de intervir, uma possibilidade-inspiração de acesso ao jovem (acesso dele ao nosso trabalho e de nosso trabalho a ele).

Seguindo estas linhas, fomos lançados às ruas com os jovens e percorremos seus trajetos, seus desvios e seus espaços, construindo assim, novos sentidos para cada caminhada. Este encontro marcado pelo acaso é ferramenta clínica de se perceber no mundo. Um acaso que só acontece por estarmos abertos a experimentação de percorrer trajetos e intensidades da micropolítica juvenil. Prosseguimos com perguntas como: O que mais este jovem pode? O que este jovem quer? O que mais este jovem é? Neste sentido, as andanças com os jovens possibilitam a experiência com sua multiplicidade, e nossas práticas passam a se dar sob essa interferência. Percebemos que ao utilizar o espaço da cidade enquanto oportunidade, novidade, experimentação em circulações diferentes produzimos uma outra forma de falar de si, de se perceber no contato com a rede. Para iniciar um diálogo entre estas modalidades, precisamos pensar numa aproximação que se dá pela via ética do trabalho, de compor zonas de vizinhança para potencializar modos de intervir e de oferecer indicações de como construir novas relações com a cidade. Ao mesmo tempo, pensamos na diferença entre os modos de acompanhar. Mesmo sob a denominação de Acompanhamento Terapêutico encontramos variações que dizem de zonas conceituais que dialogam e, ao mesmo tempo, vão configurando práticas próprias a cada intervenção (Santos, 2006). Nesse sentido, assegurar uma nomeação diz da natureza do regime de práticas que temos cartografado. Sob esta perspectiva, persistimos na condição de indagar nossas práticas e de estarmos atentos às invenções e atualizações metodológicas destes percursos no Acompanhamento Juvenil. Referências Bibliográficas: Aguiar, K. F.; Rocha, M. L. (2007). Micropolítica e o Exercício da Pesquisa intervenção: referenciais e dispositivos em análise. Psicologia Ciência e Profissão, 27(4), 648-663. Bocco, F. (2006). Cartografias da Infração Juvenil. Dissertação de Mestrado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Universidade Federal Fluminense, Niterói. Brasil. (1990). Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília. Brasil. (2005). Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Caminhos para uma Política de Saúde mental infantojuvenil. Brasília; editora do ministério da saúde. Brasil. (2008). Lei n. 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o Estágio de Estudantes. Diário Oficial da União, Brasília. Deleuze, G. (1988). Foucault. São Paulo: Brasiliense. Deleuze, G. & Guattari, F. (1995). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Ed. 34, V. 2. Deleuze, G. & Guattari, F. (1996). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Editora 34, V. 3. Deleuze, G. & Guattari, F. (1997). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro, Editora 34, V. 4. Deleuze, G & Parnet. Dialogos. Deleuze, Gilles. São Paulo: Escuta, 1998. Foucault, M. (2003). Mesa-Redonda de 20 de Maio de 1978. Ditos e Escritos IV: estratégia, poder-saber. (pp.334-351). Rio de Janeiro: Forense Universitária. Lancetti, A. (2006) A amizade e o acompanhamento terapêutico. In. Santos, R. G. Textos, texturas e tessituras no acompanhamento terapêutico. São Paulo: Instituto A Casa/ Editora Hucitec.

Lazzarotto, G. D. R. (2009). Pragmática de uma Língua Menor na Formação em Psicologia: um diário coletivo e políticas juvenis. Tese de Doutorado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul Margarete Axt. Porto Alegre, RS. Oliveira, A. M. & Fonseca, T. M. G. (2007). Contribuições de Deleuze: o acontecimentalizar no social e as sinuosas linhas da trama institucional. PSICO, 38 (2),133-138. Palombini, A. E col. ( 2004). Acompanhamento terapêutico na rede pública: a clínica em movimento. Porto Alegre: Editora da UFRGS. Rolnik, S. (1993). Pensamento, Corpo e Devir: uma perspectiva ético/estético/política no trabalho acadêmico. Cadernos de Subjetividade, 1 (2), 241-251. Rolnik, S. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulina; Editora UFRGS, 2006. Santos, R. G. (2006). Textos, texturas e tessituras no acompanhamento terapêutico. São Paulo: Instituto A Casa/ Editora Hucitec. Scisleski, A. C. C. (2006). Entre se quiser, saia se puder : os percursos dos jovens pelas redes sociais e a internação psiquiátrica. Dissertação de Mestrado não publicada, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 1 Conforme artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), verificada a prática de ato infracional (contravenção penal praticado por sujeitos menores de 18 anos), será determinado pela autoridade competente medidas socioeducativas que, conforme o tipo de infração, envolve desde a advertência até internação com privação de liberdade. O caráter socioeducativo comporta aspectos coercitivos (responsabilização pelo ato infracional) e aspectos educativos (articulação de questões pedagógicas, terapêuticas e sociais). 2 Por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável o/a adolescente passa a residir em entidade sob responsabilidade do Estado, conforme artigos 98 e 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O acompanhamento a essa realidade indica longa permanência de crianças e adolescentes nessas instituições, bem como dificuldades para uma organização autônoma após 18 anos, quando devem ser desligados. 3 4 Conforme lei 11.788, o estágio é um ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo do educando que esteja freqüentando o ensino regular em uma instituição. Realiza 4 (quatro) horas diárias, totalizando 20 (vinte) horas semanais, recebendo uma bolsa auxílio mensal e auxílio-transporte. Conforme Artigo 68 do Estatuto da Criança e do Adolescente, lei 8.069 de 1990, o Trabalho Educativo compreende uma atividade laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo. Nos programas de trabalho educativo referidos as atividades são planejadas conciliando a preparação para o trabalho (estágio), assegurando que nesta atividade laboral prevalecem as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando. As atividades do processo de trabalho ocorrem em setores da organização que oferece essa proposta. As equipes desses setores acompanham o jovem no que denominam estágio de trabalho educativo na orientação de atividades (como arquivo, protocolo de processos, apoio a secretaria, recepção, manutenção predial, almoxarifado); identificação de necessidades especificas como treinamento em informática ou apoio escolar; questões decorrentes da situação de cumprimento de medida em contatos com técnicos e organizações das política públicas governamentais nesta área. Como estagiário o jovem cumpre vinte horas semanais e recebe uma bolsa mensal.