Caminhos de superação da violência Dra. Marlene Inês Spaniol

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Transcrição:

Dra. Marlene Inês Spaniol Encontro de Abertura 22/11/2017 Teatro Dante Barone Porto Alegre/RS

Tema a ser desenvolvido: Os (difíceis mas possíveis) caminhos de superação da violência partindo do objetivo geral proposto: Refletir sobre a superação da violência, a partir do mundo da educação, contribuindo para a construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária, através da participação e o exercício da cidadania Marlene Inês Spaniol Doutora em Ciências Sociais e Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS, Capitã da Reserva da Brigada Militar(BM/RS), Conselheira do do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Integrante dos Grupos de Pesquisa: GPESC (Políticas Públicas de Segurança e Administração da Justiça Penal) e GECEG (Gestão Integrada da Segurança Pública) ambos da PUCRS, Professora da Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal da Uniritter, E-mail: marlenespaniol@hotmail.com

Para entender o caminho da superação da violência precisamos entender de onde ela veio e como se forma e contra quem ela se dirige. Divide-se em 3 eixos: histórico-antropológica, sócio estrutural e manifestações Violência e suas manifestações na sociedade. 01 A violência na convivência humana a Definição de violência; b A violência na história do Brasil; c Constatação da cultura da negação do outro (fenômenos: individualismos, não abertura a alteridade (o outro); criação ideológica de necessidades e felicidade, enfraquecimento dos projetos de vida, cultura do descarte). 02 A violência e as estruturas sociais a Economia/ mercado; b Acumulação do capital; c Consumo; d Desigualdade e violência promovida pela lógica do mercado; e Violação dos direitos básicos. 03 A violência e algumas das suas manifestações na sociedade a Drogas; b Processo de criminalização institucional (negligência do Estado em relação às políticas sociais; justiça punitiva); c Sujeitos violentados: juventude pobre e negra; povos indígenas, mulheres, exploração sexual e tráfico humano; d Violência no contexto urbano e rural; e Intolerância (raça, gênero e religião); f violência verbal; g violência no trânsito; h violência doméstica.

Fim do mito de que o brasileiro é ordeiro e pacífico. É possível descrever a história do Brasil como a história social da violência". Vídeo A origem da violência no Brasil, Prof. Sérgio Adorno do NEV-USP, Duração: 6min, Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=xuz1sv5nft0 O necessário envolvimento dos poderes constituídos. A participação conjunta do poder legislativo em todas as esferas é fundamental (municipal, estadual e federal). Nunca foi e nunca será um problema só do executivo. (Não há solução para a violência fora das discussões que ocorram no âmbito da política - Robson Sávio dos Reis)

O próprio texto da campanha da fraternidade 2018, da CNBB, que neste ano debate os caminhos para esta superação reconhece que a violência hoje no Brasil está multifacetada pois possui múltiplas faces e características e epidêmica sendo que para a OMS, locais com índices iguais ou superiores a 10 homicídios por taxa de 100 mil habitantes são tidos como zonas endêmicas (típicas de uma região) de violência, sendo que o Brasil registrou 61,6 mil mortes violentas em 2016, de acordo com o Anuário Brasileiro da Segurança Pública, sendo o maior patamar da história do país. Em média, foram contabilizados 7 assassinatos por hora. Com o crescimento do número de mortes intencionais, a taxa de homicídios no Brasil por 100 mil habitantes ficou em 29,9. dependendo da gravidade uma zona violenta endêmica (pontual de uma área) pode se tornar epidêmica (amplamente disseminada).

A interiorização da violência Ela deixou de se um problema apenas das grandes metrópoles, hoje está presente nos pequenos e médios municípios pela facilidade de migração da criminalidade e pelo pequeno aparato estatal para combatê-la nestes locais. Hoje a violência é um problema de todo o país e não há como negar a ineficácia do atual sistema de segurança e justiça criminal para este enfrentamento. O aumento desenfreado dos índices criminais se deu justamente pós-redemocratização, após a década de 1980, pois não houve tratamento preventivo à violência urbana na questão do tráfico de drogas e das armas e nem no sentido de evitar sua expansão.

Um dos grandes problemas que precisam ser enfrentados é que em uma mesma cidade encontramos áreas muito seguras e outras marcadas por extrema violência, que se deve a 3 fatores: 1. A ação ou omissão do poder público como nas periferias por exemplo, onde ocorre a quase ausência do estado, justamente onde ele deveria estar mais presente, deixando os cidadãos a mercê da criminalidade, da desordem social e das políticas preventivas e de proteção. 2. O poder financeiro que faz disparar os investimentos em segurança privada, angariando uma série de privilégios negados à maioria dos cidadãos sem recursos. 3. O tratamento seletivo pelos órgãos públicos, dos 3 poderes, em relação à garantia de direitos, como o acesso à justiça, por exemplo, caracterizando a violência institucional.

Os necessários caminhos para a superação da violência: Há luz no final deste túnel? Sim. A implantação de políticas públicas de prevenção à violência, com o envolvimento obrigatório da união, estados e municípios, nos moldes do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI). O grande desafio é tornar estas políticas públicas efetivas e contínuas e não apenas de um governo só como também aconteceu com o PRONASCI, mesmo sendo um governo de continuidade (Lula para Dilma que optou por investir na ENAFRON). O envolvimento e a participação da comunidade como acontece nos Gabinetes de Gestão Integrada (GGI), por exemplo. Mudanças legislativas e na Constituição Federal tornando obrigatória a participação e aporte financeiro da União para as questões de segurança pública e inserindo os municípios como entes fundamentais na questão de implantação de políticas públicas de prevenção à violência e não apenas (podendo) atuar de forma periférica como acontece hoje com base no 8º do art. 144 da Constituição Federal.

Um exemplo eficaz de implantação de políticas públicas municipais de prevenção à violência ativas há mais de 20 anos: o caso de Diadema em SP Evolução da taxa de homicídios em Diadema/SP entre 1994 e 2015 (taxa por 100 mil habitantes) Fonte: Elaborado pela autora da tese, Marlene Inês Spaniol, com base nos dados: de 1994 a 2007 (Miki, 2008, p. 107); de 2008 a 2015 extraídos da tabela 12, com dados SSP/SP, Fundação SEADE.

Como superar a violência a partir do mundo da educação? Problemas graves a serem enfrentados atualmente: - A violência fora e dentro das escolas, inclusive contra os professores(as); - A grave questão das drogas dentro e fora das escolas; - A terceirização que muitos pais fazem deixando para a escola a educação que deveria vir de casa (a escola ensina, os pais educam); - Enfrentar o fato de que muitas vezes o primeiro não na vida do aluno se dá em sala de aula e não de quem deixou de educá-lo em casa.

Como superar a violência a partir do mundo da educação? Possibilidades: - Aproximação dos integrantes das forças de segurança pública com as escolas, quer através de projetos sociais (como o PROERD por exemplo), principalmente às Polícias Militares e Guardas Municipais, incentivar ações de polícia comunitária ou cidadã ou de desmistificação da atividade policial; - Educar para uma cultura de paz nesta busca por uma sociedade mais livre, justa e solidária; - Educar para que eles sejam atuantes e participativos na sua comunidade e que percebam que isso pode fazer e faz a diferença; - Buscar sempre desenvolver atividades que envolvam também os pais dos alunos.

MUITO OBRIGADA!