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Transcrição:

1 Valor Econômico 01 de outubro de 2010 Orçamento: O presidente eleito, antes de tomar posse, terá de desativar armadilhas que podem explodir as contas públicas. Bombas do próximo governo Por Ribamar Oliveira De Brasília 01/10/2010 1 - Reajuste do Judiciário 2 - Aumento do subsídio do STF 3 - Lei Kandir 4 - Salário mínimo 5 - Benefício previdenciário 6 - Subsídios do PSI 7 - A receita da Receita Antes de sua posse, o futuro presidente do Brasil terá que participar de pelo menos quatro negociações que poderão resultar em forte impacto nas contas públicas em 2011 e restringir o orçamento em seu primeiro ano de governo. Em três delas, as decisões que tomar, quaisquer que sejam, passarão a valer a partir de 1º de janeiro. O presidente eleito terá que decidir se manterá o salário mínimo sem aumento real em 2011, pois a proposta orçamentária encaminhada ao Congresso pelo presidente Lula prevê apenas a correção pela inflação deste ano. Com isso, o mínimo passaria dos atuais R$ 510 para R$ 538,15 a partir de 1º de janeiro. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, já admitiu ser muito provável que os parlamentares façam um "arredondamento", passando o valor para R$ 540. Mas a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) determina que o governo negocie com as centrais sindicais um aumento real para o mínimo. O relator da LDO, senador Tião Viana (PT-AC), chegou a propor R$ 550, o que representaria um aumento real de 2,2%, mas recuou, pois o governo não aceitou a proposta. O ministro Paulo Bernardo explicou que o governo decidiu manter o acordo fechado anteriormente com as centrais sindicais, que prevê um reajuste real para o salário mínimo equivalente ao crescimento real da economia de dois anos anteriores. Como em 2009 o produto interno bruto (PIB) registrou uma queda real de 0,2%, segundo o IBGE, não haveria nenhum aumento para o mínimo em 2011. O presidente eleito poderá manter esse acordo, preservando a fórmula que vigorou no segundo mandato do governo Lula, mas que nunca se transformou em lei. De

2 qualquer forma, o futuro presidente terá que decidir essa questão e, eventualmente, sofrer o desgaste político da decisão junto ao movimento sindical. A outra negociação determinada pela LDO diz respeito à fixação do reajuste real das aposentadorias do INSS acima do salário mínimo. A proposta orçamentária prevê apenas a correção dos valores pela inflação deste ano. Se optar por conceder aumento real para o piso salarial, o novo presidente deverá sofrer forte pressão para conceder igual benefício aos aposentados do INSS, como ocorreu este ano. O novo valor do salário mínimo terá que ser fixado por meio de medida provisória a ser assinada ainda pelo presidente Lula. Quando essa MP estiver tramitando no Congresso, os parlamentares poderão tentar estender o mesmo reajuste do piso aos aposentados do INSS, como fizeram este ano. O presidente da República eleito terá também que negociar diretamente com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, o reajuste que será concedido ao subsídio mensal de ministro do Supremo. A proposta orçamentária para 2011 prevê um reajuste de apenas 5,2%, equivalente à previsão de inflação do Ministério da Fazenda para este ano. O governo incluiu no orçamento uma verba de R$ 156,7 milhões para cobrir essa despesa. Pela proposta do governo Lula, o subsídio de ministro do STF iria para R$ 28,1 mil. Mas o projeto de lei 7.749/2010, de autoria do próprio Supremo, que tramita na Câmara dos Deputados, propõe reajuste de 14,79%, o que elevaria o subsídio para R$ 30.675.00 a partir de 1º de janeiro. Essa definição é crucial para o próximo governo, pois o subsídio de ministro do Supremo é o teto dos vencimentos do serviço público. O seu valor define os salários de toda a magistratura do país e termina sendo o parâmetro para as demais carreiras de Estado, que de alguma forma conseguem manter uma equivalência com o teto. Contudo, se a proposta do Supremo terminar por prevalecer, o gasto adicional deverá subir para R$ 290 milhões. A quarta negociação envolve também um projeto de lei de autoria do Supremo Tribunal e que tramita na Câmara dos Deputados desde 2009. O projeto de lei prevê um reajuste salarial médio de 56% para os servidores do Judiciário. Não é apenas o custo anual de R$ 6,4 bilhões que preocupa o governo, mas o fato de que, se este projeto for aprovado, dará início a uma nova rodada de negociações salariais no Executivo e Legislativo, com consequências imprevisíveis, em termos de custo fiscal. Em recente entrevista à repórter Luciana Otoni, do Valor, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, manifestou preocupação justamente com a aprovação de

3 projetos que resultem em aumento de despesas em 2011. "A preocupação é evitar que algumas proposições que estão em tramitação no Congresso venham a ser implementadas, particularmente no que se refere a ajustes salariais. Entendemos que o ciclo (de reajuste salariais) se completou. Temos as carreiras com equilíbrio bastante razoável e é importante não se desfazer isso", afirmou Augustin. Regis Filho/Valor Entre outras questões, o ministro Paulo Bernardo está às voltas com a revisão do salário mínimo e o estabelecimento do piso para os policiais militares Entre essas proposições, o secretário do Tesouro citou a proposta de emenda à Constituição (PEC) nº 300, que estabelece que o piso salarial para policiais militares dos Estados não deverá ser inferior ao vencimento básico dos policiais do Distrito Federal. O ministro Paulo Bernardo já estimou o custo dessa PEC em R$ 30 bilhões. Essa proposta, que é patrocinada pelo PMDB, foi aprovada em primeiro turno na Câmara, no início de março. Embora a preocupação do governo Lula com a aprovação dessa proposta seja grande, ela não criará limitações para o futuro presidente em seu primeiro ano de governo. Isso por que a PEC ainda precisa ser aprovada em segundo turno pela Câmara e, depois, pelo Senado. Após aprovada, ainda terá que ser regulamentada, com a aprovação de uma lei fixando o piso inicial para os policiais militares. Ou seja, essa poderá ser uma preocupação do novo governo para 2012 ou 2013. O que o governo menos quer agora é retomar as negociações salariais com o funcionalismo público, depois de todos os reajustes concedidos pelo presidente Lula nos últimos anos. A estratégia desenhada pela atual equipe econômica é manter, por pelo menos alguns anos, as despesas com salários do funcionalismo em queda como proporção do PIB. A razão para isso é que o governo, qualquer que seja o futuro presidente da República, precisa abrir espaço no orçamento da União para aumentar expressivamente os investimentos públicos, indispensáveis para diminuir as deficiências da infraestrutura brasileira, principalmente na área de logística. A elevação dos investimentos é uma necessidade também por causa da realização da Copa do Mundo de futebol de 2014 no Brasil e da Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro. Mas não basta controlar o crescimento das despesas com pessoal, como proporção do PIB. Analistas de várias tendências, inclusive de dentro do atual governo, consideram que é impossível manter o mesmo ritmo de valorização do salário mínimo ocorrido o governo Lula. O aumento real do mínimo, de 2003 a 2010, foi de 53,67%. Para aumentar os investimentos públicos, o economista Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acha que o governo terá que decidir entre a elevação da carga tributária e a redução do ritmo de alta do salário mínimo.

4 Levantamento feito por Mansueto Almeida e pelo economista Samuel Pessoa, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), mostra que 80% do total do aumento das despesas primárias da União (não consideram o pagamento de juros e amortizações das dívidas), no período de 2002 a 2009, decorreram da elevação do salário mínimo. Atualmente, a área econômica do governo estima que o impacto do aumento de 1% no valor do salário mínimo deverá aumentar as despesas primárias da União em R$ 1,5 bilhão. Para cada real a mais no mínimo, a despesa aumenta em R$ 300 milhões. Toda vez que se reajusta o piso salarial, os gastos com benefícios previdenciários, abono salarial e seguro desemprego sobem na mesma proporção, pois utilizam o salário mínimo como referência. O governo Lula foi, do ponto de vista do gasto público, um governo de transferência de renda para as pessoas. Uma tabela disponível no sítio do Ministério da Fazenda na internet, e que faz parte do boletim "Economia Brasileira em Perspectiva", relativo ao bimestre junho/julho, mostra que as transferências a pessoas equivaliam a 6,57% do PIB em 2002. Em 2009, tinham subido para 9% do PIB - um aumento de 2,43 pontos percentuais do PIB. Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, não foram os gastos com o programa Bolsa Família que mais cresceram. No período de 2002 a 2009, as despesas do Bolsa Família aumentaram 0,26 ponto percentual do PIB. Em relação a 2002, considerou-se, para efeito de comparação, os gastos com o Bolsa Escola. As despesas que apresentaram a maior expansão foram os benefícios previdenciários do regime geral de Previdência Social, mais conhecido como INSS, que passaram de 5,96% do PIB para 7,15% do PIB no mesmo período - uma elevação de 1,19% do PIB. Alguns analistas consideram que o aumento dos gastos públicos durante o governo Lula foi de tal ordem que será necessário fazer um forte ajuste fiscal no próximo governo, qualquer que seja ele, para reequilibrar as contas públicas. Outros especialistas divergem dessa abordagem e preferem apostar no que se convencionou chamar de "proposta Palocci". Em 2005, o então ministro da Fazenda Antônio Palocci propôs um ajuste fiscal que consistia, em síntese, no crescimento das despesas correntes (exceto o pagamento de juros das dívidas) abaixo do crescimento nominal do PIB. Com isso, o ex-ministro imaginava que seria possível abrir espaço para os investimentos públicos.

5 O atual governo trabalha com a previsão de crescimento real da economia de 5,5% ao ano daqui para a frente. Com uma expansão dessa ordem, as despesas correntes (exceto o pagamento de juros) poderiam aumentar, em termos reais, 3% a 4% ao ano, o que abriria espaço considerável para a expansão dos investimentos públicos. Nessa perspectiva, não haveria necessidade de corte de gastos. Ao contrário, as despesas continuariam em forte expansão real, mas abaixo do crescimento real do PIB. A análise da proposta orçamentária para 2011 mostra que algumas questões não foram consideradas. A primeira delas é o ressarcimento dos Estados pela desoneração do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre matériasprimas e produtos semielaborados, promovida pela chamada lei Kandir. Todo ano, o valor repassado aos governadores é de R$ 3,9 bilhões, mas não consta da proposta orçamentária. Outra despesa que pode ter sido subestimada está relacionada aos subsídios do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Por meio do PSI, o Tesouro Nacional equaliza as taxas de juros de operações de crédito feitas pelo BNDES com empresas privadas destinadas a investimentos, até o montante de R$ 134 bilhões. O governo estimou gastar R$ 3,7 bilhões com os subsídios do PSI em 2011. Mas os técnicos da área orçamentária consideram que o valor poderá ser maior por que a medida provisória 501, que elevou o valor do PSI em R$ 10 bilhões, é posterior ao envio da proposta orçamentária ao Congresso. Uma última preocupação da área técnica com o orçamento do próximo ano diz respeito à previsão da receita administrada pela Secretaria da Receita Federal (SRF). Projeta-se uma "arrecadação extraordinária" de R$ 31 bilhões, que vem a ser a receita proveniente de eventos atípicos ou não contemplados pelo modelo tradicional de

6 previsão, que considera a evolução dos preços (inflação), a quantidade produzida e as alterações na legislação tributária. Para 2010, a SRF estimou uma "arrecadação extraordinária" de R$ 31,5 bilhões. No relatório de avaliação das receitas e despesas orçamentárias do quarto bimestre, o governo admitiu uma frustração de R$ 23,1 bilhões da receita administrada pela SRF, em relação ao estimado na proposta orçamentária para 2010 enviada ao Congresso. A principal causa da queda da receita administrada está relacionada com o comportamento da arrecadação do Imposto de Renda. Diante do resultado de 2010, os técnicos se perguntam qual será a frustração da receita administrada pela SRF no próximo ano. Dependendo do valor, o orçamento do primeiro ano do futuro presidente poderá ficar mais apertado e o contingenciamento das verbas orçamentárias, tradicional no início de cada exercício financeiro, ainda maior.