Teoria Laboviana: uma análise das variações linguísticas à luz de Famigerado de Guimarães Rosa

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Transcrição:

Teoria Laboviana: uma análise das variações linguísticas à luz de Famigerado de Guimarães Rosa Introdução Dentre os diferentes manuais especializados, a sociolinguística é definida como disciplina que se propõe a estudar cientificamente a linguagem, ou seja, os instrumentos que possibilitam o processo de comunicação entre os membros de uma comunidade. Para Benveniste (1963), é dentro da, e pela língua, que o indivíduo e sociedade se determinam mutuamente, dado que ambos só ganham existência pela língua. Logo, a língua é a ferramenta utilizada para se comunicar e interagir. Entretanto, não se pode entendê-la como uma estrutura autônoma, alheia à realidade dos falantes e imutável. Precisamos pensar em língua e nos seus múltiplos processos e analisar a linguagem em uso. Por isso, é importante observar como as diferentes vertentes teóricas definem o conceito de língua para então nos posicionarmos diante de uma delas. A Língua e seus desdobramentos O primeiro a pensar em língua como objeto de estudo foi Ferdnand Saussure, linguista conhecido mundialmente, cuja obra é estudada por todas as gerações seguintes a ele. Saussure define a língua como parte social da linguagem, exterior ao indivíduo que por si só não pode criá-la nem modificá-la. A partir desse conceito e seus desdobramentos, muitos outros linguistas completaram o trabalho de Saussure. Em contrapartida, Labov inaugura uma vertente de estudos de orientação antissaussuriana, que deu origem ao Curso de Linguística Geral. Assim, ao invés de langue, como fez Saussure, Labov centra seus estudos na parole, ou seja, na fala, no uso. E ainda enfoca o estudo fala/uso de um ponto de vista social e não individual. Nesse paradoxo que entrelaça o conceito da língua, abordá-la-emos a partir da reflexão de Willian Labov (1964), sociolinguista norte americano que ficou conhecido por seus trabalhos sobre variações linguísticas externas (Idade, sexo, posição social, origem étnica, grau de escolaridade) e internas (fonéticas, lexicais etc.). Utilizando, portanto, a sua teoria para analisar essas variantes presentes no conto Famigerado de Guimarães Rosa. Correlacionando esses fatores aos conceitos da Sociolinguística.

Correlação da Sociolinguística com o conto Famigerado Podemos dizer que o objeto da Sociolinguística é o estudo da língua falada, observada, descrita e analisada em seu contexto social, isto é, em situações reais de uso. Seu ponto de partida é a comunicação linguística, um conjunto de pessoas que interagem verbalmente e que compartilham um conjunto de normas com respeito aos usos linguísticos. Surgiram grandes contribuições no cenário dos estudos sociolinguísticos, no início da década de 60. Dentre elas, destacam-se os estudos voltados à relação língua e sociedade com a finalidade de sistematização da variação da fala, realizada por Labov que considera que a língua não constitui um sistema coerente e racional, mas um sistema marcado por alterações, ou seja, por variações linguísticas relacionadas com o social. Benveniste (1968) afirma que: A língua é necessariamente o instrumento de comunicação que é e deve ser comum a todos os membros da sociedade, o instrumento próprio para descrever, para contextualizar, para interpretar tanto a natureza quanto a experiência. Além disso, a língua dá forma à sociedade ao exibir o semantismo social que consiste, principalmente, de designações, de fatos de vocabulário. Assim, a abordagem variacionista baseia-se em pressupostos teóricos que permitem ver a regularidade e a sistematicidade por de trás do aparente caos do dia a dia. Trataremos, então, de observar como a teoria variacionista serve de aparato para a análise da obra Famigerado, de Guimarães Rosa. Rica em diversos aspectos, como a criatividade com que elabora o enredo e o trato especial que dá à linguagem, Guimarães Rosa é um dos maiores escritores da literatura brasileira. O Conto Famigerado narra a história de dois homens de personalidade e formação antagônicas. Um provável médico, pessoa letrada, que recebe a visita de um jagunço de nome Damazio Siqueira, um perigoso matador que queria saber o significado da palavra famigerado, palavra que ouvira um moço do governo chamá-lo. O médico, um pouco receoso, lhe diz que é inóxio, douto. Damazio não entende e pede para que ele use a fala de pobre de dia de semana, sendo assim, o médico explica que famigerado quer dizer célebre, notório, notável. O famigerado matador se vê vencido pelo poder da palavra e da ciência. Já o médico usa do seu conhecimento de língua para se prevalecer da situação e não se colocar numa situação conflituosa. Assim, cabe-nos, portanto, analisar a interferência da lígua, numa perspectiva laboviana, na obra elegida. Em Famigerado, Rosa tematiza a importância da linguagem e o conhecimento determina as posições sociais. Ele alia a informalidade da linguagem coloquial à complexidade da linguagem poética. Podemos destacar alguns tipos de variação e seus fatores, estudados e apresentados por Labov.

De uma perspectiva geral, podemos descrever as variações linguísticas a partir da variação geográfica ou diatópica e a variação social ou diastrática. Em Famigerado, percebemos a variação geográfica ao analisar em Damazio, um homem rude, matador do sertão que não entendendo uma palavra vai até o médico que mora na cidade para lhe esclarecer o significado dessa palavra _ Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmigerado... faz-megerado... falmisgerado... familhas-gerado...?. Obsersavamos, então, que a linguagem varia de uma região para outra e de um falante para outro. Assim o repertório verbal nunca é o mesmo. Outra variação é a diastrática que se relaciona com a identidade do falante e também com a organização sociocultural da comunidade de fala. Dentro do conto, podemos ver is seguintes fatores relacionados às variações de natureza social. Vamos que as palavras utilizadas por Damazio como preguntar e pregunta são usadas pela fala de uma comunidade linguística pertencente a uma classe mais baixa, menos favorecida. A fala do médico quando este diz: Vilta nenhuma, nenhum doesto. São expressões neutras, de outros usos, as palavras vilta e doesto pertencem à classe mais favorecida e, por isso, não são compreendidas com clareza pela classe mais baixa. O emprego ou a ocupação do falante também interfere em sua fala, por exemplo, o médico que é uma profissão em que se precisa ler muito acaba adquirindo uma linguagem mais culta, obtêm-se, então, o português padrão. Olhe: eu, como o Sr. me vê, com vantagens, hum, o que eu queria uma hora destas era ser famigerado, bem famigerado, o mais que pudesse!.... Já quando Damazio diz: Vosmecê agarante pra a paz das mães, mão na Escritura? percebemos que ele usa o português não padrão nos dando a entender que quem fala agarante não faz parte da mesma comunidade linguística de um médico. Damazio está em um terreno que lhe é pouco habitual, o diálogo verbal, a troca linguística que, de certa forma, é superior hierarquicamente a ele, e em cujo mundo ele não rege nada. Ele reconhece-se vencido pelo poder da palavra. Demonstrando humildade pede para que o médico lhe conceda o significado em fala de pobre. Tal pedido é o mesmo que pedir ao outro que temporariamente desça alguns degraus da escala social. O jagunço sabe que existem níveis de linguagem. No entanto a palavra famigerado apresenta dois sentidos, o primeiro, dicionarizado que é aquele que tem fama, famoso, celebre, notável; esse significado nos retoma a linguagem padrão que faz parte do léxico de uma classe social mais alta e que possui estudos, como o médico. O segundo significado é de malfeitor, mal afamado, perverso, obscuro, temível. Essa diferença de sentido é por que o segundo significado é popular, ou seja, pertencente ao português não padrão se opondo ao primeiro significado que é português padrão.

Percebemos então que apesar do moço do governo pertencer a uma classe mais alta e usar uma palavra do português padrão famigerado ele usa o significado do português não padrão para denominar o jagunço Damazio Siqueira. Observamos também a variação estilística ou de registro, que são variações linguísticas relacionadas ao contexto, ocorrem quando os indivíduos diversificam sua fala, usam estilos ou registros distintos. Isso pode ser comprovado com a fala do médico quando diz: Aquele homem, para proceder da forma, só podia ser um brabo sertanejo, o jagunço até na escuma do bofe. O médico aqui adquiriu uma linguagem mista, em alguns momentos a de gente do sertão, denotando que assimilou modos de dizer do local em que passou a viver. Há uma forte presença do regionalismo do sertão nas falas de Damazio quando este diz: Só pra azedar a mandioca... percebemos pela palavra mandioca, comum na região do sertão, podendo ser associada também à variação lexical, como também nas palavras arrenegar e agarante em que há marcas de arcaísmo. Como diz a personagem Tia Irene do livro A língua de Eulália, por Marcos Bagno. quanto mais distante, mais arcaica. Essa mesma relação faz com que a língua das zonas rurais sejam mais arcaizante do que a língua das grandes cidades, onde as transformações linguísticas são acompanhadas no mesmo ritmo das transformações sociais. Considerações finais Após estudo analisado, percebemos que a linguagem estabelece um processo de humanização com o conto famigerado de Guimarães Rosa integrado à teoria variacionista de Willian Labov. Finalmente, cabe assinalar outra consideração relevante de Benveniste (1968) que acredita que a língua permite que o homem se situe na natureza e na sociedade; o homem se situa necessariamente em uma classe, seja uma classe de autoridade ou classe de produção. Em consequência, a língua, sendo uma prática humana, revela o uso particular que grupos ou classes de homens fazem [dela]. Com isso, a relação língua e sociedade atuam no plano geral da construção do humano e, particularmente, no plano das relações concretas e contingentes estabelecidas na vida social. Referências Bibliográficas ROSA, José Guimarães. Primeiras estórias. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1988. BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico: o que é como se faz? Ed. Loyola, 2005.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. Ed. Ática, 1982. BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso, por uma pedagogia da variação linguística. Parábola Editorial: São Paulo, 2012. MUSSALIM, Fernanda e BENTES, Ana Cristima (orgs). Introdução à linguística: Domínios e Fronteiras. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2001. Bagno, Marcos. A língua de Eulália : novela sociolinguística. 15º ed. São Paulo: Contexto, 2006.