Aula 8 DINÂMICA DAS REAÇÕES MOLECULARES: TEORIA DA COLISÃO. META Apresentar ao aluno os conceitos da Teoria da Colisão.

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Transcrição:

DINÂMICA DAS REAÇÕES MOLECULARES: TEORIA DA COLISÃO Glauber Silva Godoi META Apresentar ao aluno os conceitos da Teoria da Colisão. OBJETIVOS Ao fi nal desta aula, o aluno deverá: Conhecer os fatores que determinam a velocidade das reações químicas em termos da Teoria da Colisão. PRÉ-REQUISITOS Lei Empírica de Arrhenius; Teoria Cinética dos Gases;

Cinética Química INTRODUÇÃO Caro aluno, agora vamos abordar uma questão muito importante sobre teorias que tentam explicar o que ocorre em termos moleculares durante uma reação química, e quais os fatores que influenciam os seus diferentes parâmetros cinéticos. Primeiro iremos falar sobre a primeira teoria desenvolvida com este propósito, conhecida como Teoria de Colisão. Originalmente proposta por dois químicos, sendo um alemão, Max Trautz (10-1960), e o outro britânico, William Lewis (169-1963), a principal característica desta teoria, baseada na Teoria Cinética dos Gases, é que as moléculas reagentes são tratadas como esferas rígidas colidindo entre si. Este modelo bastante simplificado se mostrou bastante conveniente para explicar dados experimentais de reações no estado gasoso, porém apresentou falhas para reações mais complexas, principalmente aquelas que ocorriam em soluções (reação no estado líquido). 90

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão TEORIA DA COLISÃO Trautz publicou o seu trabalho sobre Teoria da Colisão em 1916, enquanto que Lewis em 191. Curiosamente, nenhum dos dois estava ciente do trabalho do outro, principalmente em virtude de que neste período a Europa se encontrava durante a Primeira Guerra Mundial (1914-191). Uma característica marcante desta teoria é que ela deve ser aplicada basicamente a reações elementares bimoleculares em fase gasosa, como no exemplo mostrado na reação (1): A + B P (1) De onde podemos escrever: v = k 2 [A][B] (2) Onde P representa o produto da reação, v é a velocidade da reação e k2 a constante de velocidade de ordem 2. Uma análise física do problema (reação química) nos permite dizer que a constante k2 depende dos seguintes fatores: freqüência de colisões das moléculas (fator de freqüência), energia mínima necessária para que uma colisão tenha energia suficiente para resultar no produto da reação (fator energético), e por último, da probabilidade de que a colisão entre as moléculas ocorra em uma orientação favorável à transformação dos reagentes em produtos (fator estérico). Isto nos permite escrever a velocidade de reação como sendo dependente dos fatores mencionados conforme a relação: v fator de freqüência x fator energético x fator estérico (3) Agora você pode estar se perguntando o que vem a ser realmente cada termo descrito acima. É isso que iremos ver nas secções seguintes. Freqüência de colisão Como foi dito, a constante de velocidade de uma reação química depende da freqüência de colisão z entre as moléculas reagentes. Para podermos quantificar esta freqüência de colisão vamos considerar a seguinte situação apresentada na figura 1. 91

Cinética Química Figura 1: Representação esquemática para determinação da freqüência de colisão. Adaptado de: ATKINS, P. W.; Físico-Química, vol. 1 e 2, ed., Editora LTC, São Paulo, 200. Nesta figura todas as moléculas de um determinado gás estão com suas respectivas posições congeladas no intervalo de tempo t. Apenas a molécula na posição 1, a esquerda do tubo, se encontra em movimento com velocidade média. Deste modo, após o intervalo de tempo t a molécula irá percorrer a distância t. Durante o seu percurso, ela irá se chocar com todas as moléculas que estejam dentro do tubo de comprimento t e de raio d, onde d representa o diâmetro da própria molécula. A partir destas informações, podemos definir o volume V do tubo de colisão como sendo: V = t (4) onde representa a área da secção transversal de colisão dada pela equação (5): = d2 (5) Considerando que o número N de moléculas estacionárias dentro do tubo de colisão é dado pelo produto entre o número de densidade de moléculas por unidade de volume e o volume do tubo, dado pela relação: N= V (6) Portanto, da equação (4) e (6): N = t (7) Para saber finalmente o número de moléculas que colidem em certo intervalo de tempo, ou seja, a freqüência de colisão z, basta dividir o número obtido na equação (7) por t: z = () 92

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão Neste exemplo mais simples, determinamos a freqüência de colisão envolvendo o mesmo tipo de moléculas. Porém, quando queremos determinar esta freqüência envolvendo moléculas distintas, por exemplo, A e B, a secção transversal do tubo de colisão deve levar em conta d como sendo a semi-soma dos diâmetros moleculares, ou seja, a soma dos seus respectivos raios, como está ilustrado na figura 2. Ou matematicamente falando: = d 2, d = Onde da e db são respectivamente os diâmetros moleculares da molécula A e B, respectivamente. Afigura 2 nos permite visualizar mais facilmente o motivo da área de secção transversal apresentado na equação (5) ser definido em função de d. Naquele caso, nós tínhamos apenas moléculas de um mesmo tipo, e, portanto com o mesmo diâmetro d, o que seria equivalente a escrever a equação (9), da seguinte forma: (9) = d 2, d = = = d (10) Figura 2: Representação esquemática para determinação da área de secção transversal de colisão. Adaptado de: ATKINS, P. W.; Físico-Química, vol. 1 e 2, ed., Editora LTC, São Paulo, 200. 93

Cinética Química Agora que o conceito de freqüência de colisão já foi apresentado podemos definir um conceito mais genérico denominado densidade de colisão, que é nada mais do que o número de colisões que ocorrem entre as moléculas de A e de B em certo intervalo de tempo t, e em um volume V. Para um sistema envolvendo apenas moléculas A e B, a densidade de colisão ZAB é definida simplesmente pela equação: ZAB = z B (11) Onde z = rel A, de modo que a equação final obtida é: ZAB = rel A B (12) Nesta equação vale lembrar que tem o mesmo significado apresentado na equação (9), e que a velocidade média relativa rel representa a velocidade média das moléculas de A em relação à das moléculas de B. É importante frisar que neste caso introduzimos a velocidade média relativa no cálculo de ZAB, equação (12), devido ao fato de ser mais fácil realizar este cálculo em termos de velocidade relativa, semelhante ao que descrevemos na figura 1 quando foi dito que todas as moléculas dentro do tubo de colisão estavam estacionárias, e apenas a molécula na posição 1, à esquerda do tubo, estava em movimento. De maneira semelhante podemos também introduzir um novo conceito denominado massa reduzida. Este conceito é importante quando queremos descrever o movimento relativo de duas partículas, neste caso moléculas, em rota de colisão, como se fosse o movimento de uma única partícula, formada a partir daquelas, e de massa reduzida. A equação (13) nos mostra como pode ser determinada a massa reduzida para um evento envolvendo a colisão de uma molécula A de massa m A com uma molécula B, de massa m B. (13) Uma relação importante que nos permite definir o valor da velocidade relativa em termos da temperatura absoluta e da massa reduzida obtida é mostrada na equação (14): rel = (14) 94

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão Caso estivéssemos falando de colisões envolvendo apenas moléculas de A, ao definir o valor de = (basta usar a equação 13 e lembrar que neste caso m A = m B = m) obteríamos a seguinte relação entre a velocidade média e a velocidade média relativa rel: rel =, = (15) Onde k é a constante de Boltzmann, T a temperatura absoluta em Kelvin e m a massa da molécula. Após definir todas estas relações podemos finalmente definir a densidade de colisão ZAB como sendo: A B (16) Lembrando que: A =N A [A], e B =N A [B] (17) Onde NA é o número de Avogadro, [X] é a concentração molar (mol m-3), do componente X, ou seja, A ou B. Obtemos: N A 2 [A][B] (1) Se considerarmos que em toda colisão a reação ocorre, o número de colisões após um intervalo de tempo e por unidade de volume, Z AB, seria a própria velocidade de desaparecimento de A ou B, por unidade de volume: N A 2 [A][B] (19) Na realidade nem toda colisão resulta efetivamente em produto de reação, mas apenas aquelas que apresentam energia suficiente. 95

Cinética Química Agora que você já tem conhecimento sobre o termo relacionado à freqüência de colisão em uma reação química, ou mais especificamente, à densidade de colisão, vamos ver agora como podemos interpretar a existência de uma energia mínima necessária para ocorrência da reação. Energia mínima para ocorrência da reação Uma maneira relativamente simples para incorporar este aspecto da energia mínima necessária para ocorrência da reação no cálculo da velocidade de reação é considerar que a área de secção transversal de colisão depende da energia cinética relativa das moléculas envolvidas, ou seja, ( ). Neste caso, a secção transversal será nula caso esta energia esteja abaixo de um valor mínimo necessário para que a reação ocorra. Este tipo de consideração nos permite realizar algumas operações matemáticas de modo que o resultado final que iremos obter para a velocidade de reação pode ser escrito conforme a equação (20): NA 2 [A][B] (20) Nesta equação o termo é o fator de Boltzmann responsável pela distribuição de velocidades apresentada pelas moléculas em colisão, e por conseqüência, da dependência da secção transversal de colisão com a energia cinética relativa das moléculas, como mencionado anteriormente (fator energético). Nós podemos ainda realizar a divisão da equação (20) pelo produto das densidades de moléculas de A e B, A B, com o objetivo de obter o valor da constante de velocidade em unidades moleculares (SI: m3 s -1 ). Se multiplicarmos este resultado pela constante de Avogadro, NA, obtemos k 2 em unidades molares (SI: m3 mol -1 s -1 ): (21) A análise da equação (21) nos permite identificar facilmente, a partir da comparação com a equação de Arrhenius,, a seguinte relação: (22) 96

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão Um aspecto importante de ser observado é que a dependência exponencial do fator energético com a temperatura justifica o fato de que pequenas variações de temperatura podem produzir grandes variações no valor da constante de velocidade, mesmo que o resultado no fator de freqüência seja relativamente pequeno. Para que possamos obter finalmente uma equação semelhante a apresentada na equação (3), falta apenas discutir o último aspecto importante chamado fator estérico P. Antes que você, caro aluno, se questione sobre o motivo da letra P para designar o fator estérico, é importante que você saiba que este fator leva em conta um aspecto estatístico, e por isso está relacionado com a probabilidade de que a colisão ocorra de maneira adequada, permitindo que a reação aconteça. Fator estérico Se compararmos os valores obtidos, a partir de considerações teóricas (tal como discutido na secção anterior), para o fator de freqüência de algumas reações químicas com aqueles obtidos experimentalmente a partir da equação de Arrhenius veremos que em alguns casos existe uma considerável discordância, como mostra a tabela 1. Isto sugere que a energia de colisão não é o único critério que deve ser levado em conta no cálculo da constante de velocidade, e que algum outro fator relacionado com a orientação das moléculas durante a colisão deve ser considerado. Observe que na maioria dos casos o fator de freqüência experimental é inferior ao teórico obtido, porém em apenas um caso a relação se inverte, isto é, o valor experimental é superior. Tabela 1: Parâmetros de Arrhenius para reações em fase gasosa. A/(dm 3 mol -1 s -1 ) Experimental Teórico Ea/(kJ mol -1 ) P 2NOCl 2NO +Cl 9,4 x 10 9 5,9 x 10 10 102 0,16 2ClO Cl 2 + O 2 6,3 x 10 7 2,5 x 10 10 0 2,5 x 10-3 H 2 + C 2 H 4 C 2 H 6 1,24 x 10 6 7,4 x 10 11 10 1,7 x 10-6 K + Br 2 KBr + Br 1,0 x 10 12 2,1 x 10 11 0 4, Para resolver este problema nós podemos introduzir um novo conceito denominado secção transversal reativa *, que pode ser determinada a partir da seguinte equação: * = P (23) 97

Cinética Química Onde P é o fator estérico e a secção transversal de colisão, já definida anteriormente. Deste modo, a depender do valor de P, que pode ser maior ou menor do que 1, nós podemos ter o valor de * como sendo um múltiplo ou submúltiplo de. Mas em termos práticos o que significa, por exemplo, dizer que a secção transversal reativa é menor do que a secção transversal de colisão, ou seja, que o fator estérico P é menor do que 1? A resposta para esta pergunta é que nem toda colisão envolvendo as moléculas reagentes resulta em produtos. A figura 3 ilustra este caso onde a secção transversal reativa é menor do que a secção transversal de colisão. Figura 3: Comparativo entre área de secção transversal de colisão e área de secção transversal reativa. Adaptado de: ATKINS, P. W.; Físico-Química, vol. 1 e 2, ed., Editora LTC, São Paulo, 200. Deste modo, a constante de velocidade pode então ser finalmente escrita sob a forma: 9

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão (24) Você pode estar se perguntando agora qual seria o motivo para que algumas reações apresentem o valor de P superior à unidade (P>1). Como exemplo, vamos analisar a seguinte reação gasosa, K + Br2 KBr + Br, cujo valor de P = 4,. Para que esta reação ocorra, a distância entre as espécies reagentes parece ser bem superior do que aquela necessária para provocar apenas uma colisão não-reativa. Isto pode ser explicado conforme o que é conhecido como Mecanismo do Arpão. Para poder entender melhor este mecanismo vamos observar passo a passo o que ocorre durante a reação, conforme esquematizado na figura 4. Figura 4: Representação esquemática para o mecanismo do arpão envolvendo K e Br2. Adaptado de: ATKINS, P. W.; JONES, L. L.; Chemistry Principles, 4ed., Freeman, 200. 99

Cinética Química Quando as espécies reagentes se aproximam (a), a maior eletronegatividade do bromo faz com que seja arrancado um elétron (arpão) do potássio (b). Neste momento, tanto o potássio como a molécula de bromo se tornam íons (c), fazendo com que a atração entre eles se torne mais pronunciada devido à atração de Coulomb. A linha de atuação da força de Coulomb atua como se fosse a linha de um arpão fazendo com que as espécies reagentes colidam entre si (d) permitindo que ocorra finalmente a reação (e). A linha de atuação do arpão é, portanto a responsável pelo aumento considerável da secção transversal reativa, e por conseqüência do valor de P > 1. Com relação a reações que ocorrem em meio líquido, outros processos mais complexos devem ser levados em consideração. Normalmente estas reações são controladas por processos difusivos e por isso a freqüência de colisão envolvendo as espécies reagentes é consideravelmente menor do que nos gases. Por outro lado, esta menor mobilidade das espécies reagentes, em presença das moléculas circunvizinhas de solvente, faz com que o tempo da colisão também seja superior, o que é conhecido como Efeito Gaiola (Cage Effect). Além disso, embora no momento da colisão as moléculas reagentes não tenham energia suficiente para provocar a formação dos produtos, elas podem acumular a energia necessária durante o período em que estão sob efeito do Efeito Gaiola. Esta breve explanação sobre as reações em meio líquido foi feita apenas para que você tenha uma noção sobre reações que ocorrem no estado líquido. No entanto, todos estes fenômenos estão fora do escopo do nosso curso, e por isso não serão discutidos. CONCLUSÃO Agora que você já foi apresentado a todos os fatores que influenciam a velocidade das reações, certamente a partir de agora você terá outra visão sobre os fenômenos envolvidos em uma reação, e como diferentes aspectos influenciam o seu comportamento. Lembre-se que a teoria apresentada nesta aula é útil basicamente para o estudo de reações elementares bimoleculares em fase gasosa, e que por isso apresenta certa limitação a medida que a reação vai se tornando mais complexa. RESUMO A Teoria da Colisão foi um importante marco para o entendimento dos processos reacionais, buscando uma interpretação no âmbito molecular. Anteriormente, Arrhenius havia proposto uma lei empírica para a avaliação da velocidade de uma reação. No entanto, foi somente com a Teoria da colisão que os fatores: energético, estérico e de frequência de colisão vieram à tona com o objetivo de explicar e também de estimar a velocidade das reações químicas. 100

Dinâmica das reações moleculares: Teoria da Colisão PRÓXIMA AULA Na próxima aula, você aprenderá sobre a Teoria do Estado Estacionário, e sua grande contribuição para obtenção de dados termodinâmicos, bem como terá uma valiosa noção sobre dois importantes métodos de Simulação Computacional. REFERÊNCIAS ATKINS, P. W.; Físico-Química, vol. 1 e 2, ed., Editora LTC, São Paulo, 200. CASTELLAN, G.; Fundamentos de físico-química, Editora LTC, São Paulo, 1972. MOORE, W. J.; Físico-química, vol 1, Editora Edgar Blucher, São Paulo, 1976. 101