Teorema Do Ponto Fixo Para Contrações 1

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Transcrição:

Universidade Estadual de Maringá - Departamento de Matemática Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 20 anos c Publicação Eletrônica do KIT http://www.dma.uem.br/kit Teorema Do Ponto Fixo Para Contrações 1 Bernadete Maria Suaki Brandão (DMA-UEM) E-mail:bmsbrandao@uem.br Resumo: Neste trabalho apresentamos o Teorema do Ponto Fixo para Contrações definidas em compactos K R n. Como aplicação desse resultado apresentamos o método de Newton-Raphson. Palavras-chave: Ponto Fixo das Contrações. Método de Newton-Raphson. Sumário 1 Introdução 1 2 O Teorema do Ponto Fixo 2 3 Aplicação: método de Newton-Raphson 3 1 Introdução O Teorema do Ponto Fixo para contrações é um resultado bastante importante da Matemática e é usado na resolução de diversos problemas. Apresentaremos aqui a sua versão no espaço R n e, em seguida, uma aplicação. Optamos por esta versão devido ao fato de que podemos demonstrá-la usando o Princípio do Max/Min para funções reais, que pode ser considerado de fácil aceitação não exigindo, nesse momento, uma demonstração, embora isso seja perfeitamente possível. 1 Publicado em 14-08-2017.

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 2 Teorema 1.1 (Princípio Max/Min). Toda função real contínua f : C R definida em um subconjunto não vazio, fechado e limitado C R n atinge seu máximo e seu mínimo em C. Isto é, existem pontos x 0 e x 1 C tais que f (x 0 ) f (x) f (x 1 ), x C. Antes de apresentarmos o Teorema do Ponto Fixo vamos lembrar algumas definições importantes. Definição 1.1. Seja C R n um conjunto não vazio. Uma aplicação T : C R n é uma contração se existe uma constante k, com 0 k < 1 tal que T(x) T(y) k x y, x, y C R n. Caso seja necessário destacar o valor de k podemos dizer que T é uma k-contração. Definição 1.2. Um ponto fixo de uma aplicação T é um ponto x, que pertence tanto ao domínio quanto ao contradomínio de T, para o qual tem-se T(x ) = x. 2 O Teorema do Ponto Fixo Teorema 2.1 (Teorema do Ponto Fixo para Contrações). Seja C um subconjunto não vazio, fechado e limitado do R n e T : C C uma k-contração. Então, T possui um único ponto fixo em C. Demonstração: Consideremos a função real f : C R dada por f (x) = x T(x). Observe que f é uma função real e que todo zero de f é um ponto fixo de T em C. Uma vez que T é uma k-contração, usando a desigualdade triangular, podemos mostrar que f (x) f (y) (1 + k) x y. Dessa forma, f é Lipschitziana e, portanto, é contínua em C. Como C é um subconjunto fechado e limitado do R n, o princípio do Min/Max garante a existência de x C tal que f (x ) f (x) x C.

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 3 Como T(x ) C temos, em particular, que f (x ) f (T(x )). Além disso, f (T(x)) = T(x) T(T(x)) k x T(x). Logo, Assim, f (T(x)) k f (x), x C. f (x ) f (T(x )) k f (x ). Mas como f (x ) 0 e k < 1, então f (x ) = 0. Ou seja, x é uma raiz de f, sendo também um ponto fixo de T. Para garantir a unicidade desse ponto fixo suponha que x 0 e x 1 sejam pontos fixos de T. Nesse caso, x 0 x 1 = T(x 0 ) T(x 1 ) k x 0 x 1 e, novamente, como k < 1 temos x 0 x 1 = 0 o que significa que x 0 = x 1. 3 Aplicação: método de Newton-Raphson Uma aplicação bastante interessante do Teorema do Ponto Fixo é o problema de determinar raízes para uma equação do tipo g(x) = 0. Sabemos que, embora pareça um problema simples, somente em situações muito específicas, que seriam tipos muito especiais para a função g, é que se pode resolver tal equação de forma exata. Usando o resultado do teorema podemos estabelecer um método geral para encontrar aproximações para os valores procurados. Vamos formalizar o problema. Considere uma função real definida e contínua em um intervalo aberto (a, b) R, g : (a, b) R, tal que se possa garantir que g possui uma única raiz em (a, b). Isto é, existe um único x (a, b) tal que g(x ) = 0. Um método para determinar uma aproximação para x consiste em encontrar uma função auxiliar A, que não se anule em algum intervalo fechado I (a, b), no qual a função f (x) = x A(x) g(x) seja uma contração de I sobre I. De fato, isso resolve o problema, pois sendo f I : I I uma k- contração e I (a, b) um intervalo fechado e limitado, o Teorema do

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 4 Ponto Fixo para Contrações garante que f possui um único ponto fixo em I. Denotemos por x esse ponto fixo. Observe que como f (x ) = x temos que x = x A(x ) g(x ) A(x ) g(x ) = 0. E como A não se anula em I podemos concluir que deve ocorrer g(x ) = 0. Ou seja, esse ponto fixo de f é a solução procurada da equação g(x) = 0. Além disso, considere um ponto arbitrário x 0 I e vamos gerar uma sequência, usando a função f, da seguinte forma: x n = f (x n 1 ), n 1. Toda sequência gerada por f dessa forma será convergente e seu limite será x. Vamos demonstrar esta afirmação mostrando que x n x 0. Usando o fato de que f é uma k-contração temos: Ou seja, x n x = f (x n 1 ) x = f (x n 1 ) f (x ) k x n 1 x = k f (x n 2 ) f (x ) k 2 x n 2 x... k n x 0 x. x n x k n x 0 x. Como 0 k < 1 temos que lim n k n = 0 e daí x n x 0. Consequentemente, podemos usar algum termo de uma sequência gerada como acima para aproximar o valor de x, que é a solução procurada para a equação g(x) = 0. Além disso, podemos escolher o termo da sequência de forma que a aproximação seja satisfatória dentro de nossos propósitos, isto é, estabelecida uma tolerância ε > 0 pode-se determinar o índice n 0 de modo de x n0 x < ε. Para vermos como se faz esta escolha vamos definir no intervalo I uma função auxiliar, análoga à usada na demonstração do teorema do ponto fixo, da seguinte forma: h(x) = x f (x). Observe que, se x I e x é o ponto fixo de f, e lembrando que f é uma k-contração, então: x x x f (x) + f (x) f (x ) h(x) + k x x.

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 5 Logo, para todo x I, Em particular, x x 1 1 k h(x). x n x 1 1 k h(x n). Mas h( f (x)) = f (x) f ( f (x)) k x f (x) = kh(x), segue que: x I. Donde Então, h(x n ) = h( f (x n 1 ) h(x n 1 ) k 2 h(x n 2 )... k n h(x 0 ). x n x kn 1 k h(x 0). Basta então, escolher n 0 de forma que k n 0 1 k h(x 0) < ε para termos que x n0 aproxima adequadamente a solução da equação g(x) = 0. Esse método aqui apresentado é a justificativa para a eficiência de uma conhecida técnica de aproximação de zeros de funções reais, que é o Método de Newton (ou Newton-Raphson), o qual propõe que se use a função auxiliar A(x) = 1 g, que obviamente só pode ser utilizado (x) sob certas condições sobre a função g. Vamos colocar o problema e as condições necessárias para a garantia de convergência do método. Queremos resolver a equação g(x) = 0 quando g : [a, b] R é uma função contínua com um único zero x (a, b). Suponha ainda que as funções g e g sejam contínuas em (a, b) e que g (x) = 0, x (a, b). Se considerarmos a função auxiliar A(x) = 1 g temos que A(x) = (x) 0, x (a, b). Vamos mostrar que, nesse caso, existe um intervalo fechado I (a, b), com x I, tal que a função definida por f (x) = x A(x) g(x) = x f (x) f (x)

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 6 é uma contração de I em I. Ora, f assim definida é contínua e diferenciável em (a, b) e f (x) = g (x) g(x) [g (x)] 2. Sendo então, f uma função contínua em (a, b) com f (x ) = 0. Logo, para qualquer k R, k > 0, existe um δ > 0 tal que f (x) k, x I = [x δ, x + δ] [a, b]. Sendo k < 1, usando o Teorema do Valor Médio para derivadas, podemos garantir que x, y I existe ξ I tal que Daí, temos que f (x) f (y) = f (ξ) x y. f (x) f (y) k x y, x, y I. Ou seja, f é uma k-contração em I. Para garantir que f leva I em I, tomemos x I. Então, x x δ, logo f (x) x = f (x) f (x ) k x x < k x x < x x δ. Portanto, f (x) x < δ f (x) I. Assim, temos que, se A(x) = 1 g, então existe δ > 0 tal que, se (x) I = [x δ, x + δ] a função f (x) = x A(x) g(x) é uma k-contração de I em I. Pela discussão feita anteriormente temos demonstrado o seguinte resultado. Teorema 3.1 (Método de Newton-Raphson). Se a equação g(x) = 0 tem uma única raiz x em um intervalo aberto J no qual g e g são contínuas e g não se anula, então J contém um intervalo fechado I tal que: (i) x I. (ii) a raiz x é o limite de toda sequência gerada por tal que x 0 I. x n+1 = f (x n ), n 0

c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 7 Referências [1] Burden, R. L., Faires, J. D. and Burden, A. M.. Análise Numérica, 3. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2015. [2] Lima, E. L.. Curso de Análise, v.2, 2. ed. Rio de Janeiro, IMPA, 1981. [3] Drager, L. D. and Foote, R. L..The Contraction Mapping Lemma and the Inverse Function Theorem in Advanced Calculus. The Amercican Mathetical Monthly, vol 93, no. 1, 1986, pp. 52-54. [4] Wagner, C. H. Generic Approach to Iterative Methods. Mathematics Magazine, vol. 55, no. 5, 1982, pp. 259-273.