ANÁLISE DE ÁREAS DE RISCO NA ZONA LESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO: O CASO DO BAIRRO JARDIM MARINGÁ.



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Transcrição:

Science in Health jan-abr 2012; 3(1): xx-xxx-xx 5-11 ANÁLISE DE ÁREAS DE RISCO NA ZONA LESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO: O CASO DO BAIRRO JARDIM MARINGÁ. ANALYSIS OF HAZARDOUS AREA IN THE EAST OF SÃO PAULO: THE CASE OF JARDIM MARINGÁ Marcos Timóteo Rodrigues de Sousa 1 Edson do Nascimento 2 Giovani Delli Paoli 2 Thalita Baldrez 2 Enrique Domingos 2 RESUMO A expansão da fronteira urbana, sem critérios técnicos adequados, associados à segregação socioespacial, impulsionou a ocupação desordenada de áreas geomorfologicamente frágeis ao uso urbano. Na cidade de São Paulo existem inúmeras áreas de ocupação em áreas de risco. Nesse contexto abordamos uma dessas áreas, situada na Zona Leste da cidade de São Paulo, no Jardim Maringá, pertencente ao Distrito de Vila Matilde. É uma área de risco geomorfológico em potencial, com ocupações em áreas de drenagem coletora, com risco de alagamentos e inundações, às margens da Avenida Aricanduva, onde foi construída em toda a sua extensão tendo o rio Aricanduva como sua parte central. As encostas encontram-se totalmente ocupadas e esse processo se configura como um vetor da expansão desordenada e irregular da cidade, consequentemente, como áreas de risco potencial. Esta pesquisa busca analisar a ocupação urbana do Jardim Maringá, localizado às margens da bacia do rio Aricanduva. PALAVRAS-CHAVE: Condições habitacionais; Área de risco; Zoneamento de áreas de inundação. ABSTRACT The expansion of the urban frontier, without adequate technical criteria associated with the socio-spatial segregation drove the disorderly occupation of geomorphologically fragile areas to urban use. In Sao Paulo there are numerous areas of occupation in such hazardous areas. In this context we address one of these areas, located in the eastern city of Sao Paulo, Jardim Maringá, belonging to the District of Vila Matilde. It is an area of potential geomorphological risk, with occupations in areas of drainage collection, with the risk of flooding and at the side of Aricanduva Avenue, which was built entirely besides the Aricanduva river as its central part. The slopes are fully occupied and this process is configured as an array of disordered and irregular expansion of the city, therefore, as areas of potential risk. This research seeks to analyze the occupation of Jardim Maringá, located on the banks of the river basin Aricanduva. KEY WORDS: Housing; Risk zone; Floodplain zone. 1 Professor do curso de Engenharia Ambiental Unicid; 2 Alunos do curso de Engenharia Ambiental Unicid. 5

INTRODUÇÃO Segundo Villaça (2001), o espaço intraurbano é estruturado fundamentalmente pelas condições de deslocamento do ser humano, seja quando portador da mercadoria força de trabalho como no deslocamento casa/trabalho seja enquanto consumidor reprodução da força de trabalho, deslocamento casa-compras, casa-lazer e educação. A cidade, como a conhecemos hoje, é resultante do acelerado processo de urbanização que a transformou em metrópole e, nesse processo, manteve intensa relação com a industrialização; porém, a estrutura sobre a qual se desenvolveu essa urbanização era resultante de uma economia rural. A chegada da urbanização ao vale do rio Aricanduva se deu com a implantação das ferrovias em São Paulo, por conta das relações que adensavam os caminhos das terras do bairro do Carrão que, aos poucos, foram se estendendo para Itaquera, que teve sua estação de trem inaugurada em 1875, com o nome de São Miguel. Na década de 1920, o crescimento urbano de São Paulo acelerou a implantação de vias mais modernas, adaptadas ao uso do automóvel. Esse tipo de via aproveitou, em seu trecho inicial, parte de outro antigo caminho, e se desenvolveu em quase sua totalidade por um leito novo, criando novas relações de comunicação e recebendo, inicialmente, o nome de estrada da R.A.E. (Repartição de Águas e Esgotos do Estado de São Paulo), ficando logo conhecida como estrada de Sapopemba. (DELI, 2005). O estudo em questão apontará a vulnerabilidade na Bacia Hidrográfica do Aricanduva, etapa fundamental para a identificação e compreensão da problemática local. A Avenida Aricanduva, construída às margens do rio Aricanduva, situada no centro da bacia hidrográfica do mesmo nome, foi inaugurada e entrou em funcionamento no ano de 1979, a princípio ligando a Marginal Tietê à Avenida Itaquera e, em 1982, foi estendida até a Avenida Afonso Sampaio e Souza, no distrito do Parque do Carmo. Em 1986, em caráter definitivo, foi estendida até o distrito de Iguatemi, como parte do Anel Viário. Essa área sofre regularmente problemas relacionados a um processo de urbanização desordenado da cidade de São Paulo, como ocupação de áreas de risco, adensamento e verticalização das áreas e consequentemente impermeabilização do solo e, com as intensas chuvas, há deslizamento de encostas e alagamentos de ruas, avenidas e margens de rios e córregos. OCUPAÇÃO EM ÁREAS PERIFÉRICAS O Jardim Maringá fica no Bairro Aricanduva na periferia da Zona Leste de São Paulo, local de transição entre a região central e as regiões isoladas da periferia. O conceito de periferia nos remete a entender uma área muito afastada dos grandes centros, expandindo-se a área urbana para espaços antes designados de áreas rurais, e consequentemente aumentando-se os custos sociais pelas distâncias e locomoção (SOUSA, et al. 2010). Também podemos dizer que a noção de periferia refere-se a um lugar distante, afastado de algum ponto central. Todavia, esse entendimento meramente geométrico não representa a verdadeira relação entre o centro e a periferia das cidades. Nesse caso, os afastamentos não são quantificáveis apenas pelas distâncias físicas entre os dois, mas, sim, revelados pelas condições sociais de vida que evidenciam nítida desigualdade entre os moradores dessas regiões da cidade. Para Santos (1988), há um padrão periférico, ou seja, um tipo de segregação social das camadas populares de menor renda que residem em moradias precárias autoconstruídas e precarização de acesso aos melhores equipamentos urbanos da cidade. De acordo com a escola de Chicago e da sociologia norteamericana, Villaça (2001) fala de dois tipos de segregação, a voluntária e a 6

involuntária. A segregação voluntária se produz quando um indivíduo, por sua própria iniciativa, busca viver com outras pessoas de sua classe. A segregação involuntária ocorreria quando um grupo social se vê obrigado, pelas mais variadas forças, a morar ou deixar de morar em uma área ou bairro mais centralizado. Nesse sentido, a segregação urbana brasileira na periferia de baixa renda pode ser considerada como involuntária. Nas últimas décadas, as ocupações humanas instaladas em áreas com grandes declividades têm sido cada vez mais afetadas por movimentos de massa ao longo das encostas. Esses movimentos constituem um fenômeno natural, que pode ser acelerado pelas construções irregulares, e, quando ocorrem em áreas urbanizadas, podem causar mortes e enormes prejuízos materiais. Na tentativa de solucionar ou ao menos amenizar tais problemas, tem sido desenvolvido um número cada vez maior de estudos de susceptibilidade a movimentos de massa em áreas urbanas. Esses estudos têm por objetivo delimitar áreas mais susceptíveis à ocorrência de movimentos a partir da análise de suas causas e mecanismos, os quais estão relacionados ao volume e frequência das precipitações, à estrutura geológica, aos materiais envolvidos, às formas de relevo e às formas de uso da terra. De acordo com Dias E Herrmann (2002), há uma listagem das principais tragédias provocadas por deslizamentos em todo o mundo no período de 1991 a 1995. Em nível nacional, a cidade de São Paulo está entre as mais afetadas por problemas provocados por deslizamentos. Segundo Silva (2010), deslizamento ou movimento de massa é o processo no qual o solo ou o material rochoso da encosta sofre a influência da gravidade, sem a contribuição direta de outros fatores como água, ar ou gelo. Existe um equilíbrio que é controlado pelo teor e estrutura interna das argilas, tendo um plano de ruptu- Figura 1: Mapa da área onde houve deslizamento na Zona Leste de SP. Fonte: Portal R7, 2011. 7

Figura 2: Área antes do deslizamento. ra da força de coesão da massa relacionado à descontinuidade mecânica e/ou hidráulica, onde tem sua localização preferencialmente nos pontos de contato do solo com o saprolito ou até mesmo rocha sã. As erosões também podem ser causadas por fortes chuvas e, na maior parte dos casos, a chuva é o principal agente deflagrador, estando também relacionada às condições que antecedem o evento pluviométrico extremo. Há maior probabilidade de ocorrência de movimentos quando um forte aguaceiro é precedido por dias consecutivos de chuva, que aumentam o grau de saturação do solo. Uma chuva intensa precedida por dias secos também pode provocar Figura 3: Área após deslizamento. movimentos, mas a probabilidade de ocorrência diminui quando comparada à situação anterior (DIAS e HERRMANN, 2002). Os movimentos de massa também estão associados a fatores como estrutura geológica, características dos materiais envolvidos, morfologia do terreno (declividade, tipo de modelado e forma das encostas). Segundo Christofoletti, (1980) em seu sentido amplo a vertente significa Fonte: São Paulo, 2011. Fonte: Google Maps, 2011. Fonte: Portal R7, 2011. Figura 4: Foto da área de deslizamento com retroescavadeira. 8

Fonte: São Paulo, 2011. Figura 5: Em vermelho, a Av. Mendonça Drumond; em azul, o sentido da declividade. superfície inclinada, não horizontal, sem apresentar qualquer conotação genética ou locacional. Para o mesmo autor declividade é a relação entre a diferença de altura entre dois pontos e a distância horizontal entre esses pontos e as formas de uso da terra. ESTUDO DE CASO: BAIRRO JARDIM MARINGÁ O bairro está localizado na Zona Leste de São Paulo, pertence ao distrito da Vila Matilde, e a parte analisada fica entre duas vias: a Rua Fernandes Portalegre e Avenida Mendonça Drumond (Figura 1), local onde, no dia 09 de dezembro de 2010, aconteceu um deslizamento que, segundo o Portal R7, desabrigou 220 pessoas. Segundo relato de moradores, nos dias que antecederam o deslizamento da encosta não houve nenhum tipo de precipitação na área. As figuras 2, 3 e 4 ilustram o local que mantinha diversos imóveis irregulares e construídos em uma área que foi classificada como área de risco pela defesa civil. Por conta desse acidente, 45 imóveis foram interditados e 20 condenados, porém, poucos realmente foram demolidos. A Figura 5 mostra a Avenida Mendonça Drumond, que se encontra exatamente em um fundo de vale. Segundo Fernandes et al., (2001), vale é um corredor ou um tipo de depressão de forma longitudinal que pode ter alguns quilômetros de extensão. O autor conclui que os fundos vales são formas topográficas constituídas por talvegues e duas vertentes com dois sistemas de declives convergentes, ou seja, é expresso pela relação entre as vertentes e os leitos (leito menor, leito maior e terraço). De acordo com as entrevistas realizadas com moradores do local afetado pelo deslizamento, alguns dias antes da encosta desabar sentiram um odor característico de esgoto e acionaram o serviço da SABESP (Companhia de Saneamento Básico de São Paulo), e o funcionário a prestar serviço confirmou que havia esgoto sendo jogado diretamente na encosta. Nessa perspectiva, podemos considerar que a área de risco em questão não sofreu um processo erosivo ocasionado apenas por chuvas torrenciais e nem por 9

Tabela 1: Peneiras utilizadas e valores obtidos. 2011. Peneira Peso retido % % acumulada 4 mm 93,21 52,06% 52,06% 1,4 mm 24,03 13,42% 65,48% 1,0 mm 7,81 4,36% 69,84% 0,500 mm 21,89 12,22% 82,06% 0,250 mm 18,03 10,07% 92,13% 0,125 mm 7,7 4,30% 96,43% 0,063 mm 3,69 2,06% 98,40% < 63 mm 2,64 1,47% 99,96% Gráfico 1: Curva granulométrica do solo da encosta da Rua Fernandes Portalegre (2011). declividade acentuada do terreno, mas a ação do despejo de resíduos e a geração de gases foram as principais causas do impacto. Foi necessário realizar uma análise granulométrica do solo e desse estudo gerou-se uma classificação do tipo de solo existente no local. Seguiu-se a norma NBR 7181, 1984, para a análise granulométrica (Tabela 1) e NBR 6502, 1995, para a classificação do solo (Gráfico 1), onde se encontrou um solo de nomenclatura SW/SM (areia bem graduada com cascalhos finos, areia siltosa, mistura de areia e silte ou limo). Conforme a análise, o solo não é propício para construção de qualquer tipo, com baixa ou nenhuma quantidade de argila e favorável à absorção de água devido a sua porosidade. CONCLUSÃO A pesquisa teve por objetivo compreender a estruturação intraurbana, as áreas de risco e 10

as dinâmicas da natureza na Zona Leste da cidade de São Paulo, com base no entendimento da geomorfologia e urbanização. Notou-se que o processo de (des)estruturação do espaço intraurbano, por meio da morfologia, está aliado à expansão do tecido urbano e proporciona impactos cada vez maiores em áreas periféricas, gerando diferentes espacializações, o que agrava e fortalece ainda mais as desigualdades socioespaciais nas grandes cidades. As medidas tomadas pelo poder público na época do deslizamento foi a demolição de três casas na Rua Fernandes Portalegre e a limpeza do terreno para que os seus funcionários tivessem um melhor acesso às áreas afetadas. Foi prometida a construção de um muro de arrimo no meio da vertente entre as vias, o que não foi feito. Foi pago pela defesa civil às familias que tiveram suas casas condenadas um valor de R$ 300,00 mensais como uma bolsa aluguel. REFERÊNCIAS CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. 2.ed. São Paulo: Hucitec, 1980. DELI, F.R. O povoamento e a circulação no Vale do Aricanduva, da colonização ao início da urbanização: momentos da fragmentação do espaço numa porção da zona leste paulistana. GEOUSP - Espaço e Tempo, n. 18, p. 81-103, 2005. DIAS, F.P.; HERRMANN, M.L.P. Análise da susceptibilidade a deslizamentos no bairro Saco Grande, Florianópolis - SC. Revista Universidade Rural, v. 21, n. 1, p. 91-104, 2002. FERNANDES, N.F.;GUIMARÃES, R.F.;GOMES, R.A.T., et al. Condicionantes geomorfológicos dos deslizamentos nas encostas: avaliação de metodologias e aplicação de modelo de previsão de áreas susceptíveis. Revista Brasileira de Geomorfologia, v. 2, n. 1, p. 51-71, 2001. GOOGLE MAPS. 2011. Disponível em: <http:// maps.google.com.br/maps?hl=pt-br&tab=wl >. Acesso em: 22 de maio de 2011. NBR 6502. Rochas e solos. Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Normas Técnicas, 1995. NBR 7181. Análise granulométrica. Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Normas Técnicas, 1984. PORTAL R7. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://www.r7.com/>. SANTOS, M. Metamorfose do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988. SÃO PAULO. Prefeitura do Estado de São Paulo. São Paulo, 2011. Disponível em: < http://www.capital.sp.gov.br/portalpmsp/homec.jsp >. Acesso em: 02 de Junho de 2011. SILVA, G.C.M. Opções de adaptação às mudanças para a bacia do rio Aricanduva. 2010. [Mestrado]. - Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Departamento de Geografia, São Paulo, 2010. SOUSA, M.T.R.; CAMPOS, G.C.L.; DIAS, M.S.; BARROS, M.A. Espaço intraurbano, periferização e vulnerabilidade sociais nas cidades brasileiras: o caso do município de Rio Claro/ SP. Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos: crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças, espaço de diálogos e práticas. Porto Alegre: ENG 2010. VILLAÇA, F. Espaço intraurbano no Brasil. São Paulo: FAPESP, 2001. 11