Lisboa, 25 Março 2011 Permitam-me que comece a minha brevíssima mensagem a este encontro internacional por agradecer aos organizadores a oportunidade que ofereceram a todos nós de debater as políticas chave para ultrapassar a crise iniciada em 2008 e criar, à saída da crise, mais e melhores condições de dignidade no mundo trabalho. O segundo apontamento que não quero deixar de fazer destina-se a lembrar apesar de pensar que ninguém o desconhece! que as políticas de combate à crise, desencadeada por grandes agentes financeiros globais, e aos seus efeitos económicos e sociais já conheceu duas fases. Na primeira fase, as prioridades políticas concentraram-se em limitar a dimensão da crise financeira, evitar a sua propagação ao sistema económico e limitar as suas consequências sociais. Foi justamente nessa fase que se conheceram algumas propostas visando a regulação supranacional dos bancos e de outros agentes financeiros globais, como foi nesse período que a OIT melhor conseguiu fazer ouvir a sua voz junto das instâncias supranacionais que a crise fez nascer. Nessa primeira fase, as políticas ativas de emprego, as políticas de proteção social e as políticas de regulação dos mercados de trabalho foram recalibradas em muitos países democráticos e desenvolvidos, americanos e europeus, e as estratégias de resposta à crise tinham prioridades muito claras: 1
tudo fazer para salvar tantos empregos viáveis quanto fosse possível; reforçar as políticas ativas de emprego, em particular para os grupos em posição de maior risco e; adotar medidas excecionais de proteção social, também elas prioritariamente destinadas às famílias e aos grupos com maiores vulnerabilidades ou que tinham visto a sua posição no mundo do trabalho degradada pela eclosão da crise financeira. Mas, como bem sabemos, já não estamos a viver nessa primeira fase de resposta à crise. A fase de resposta à crise que estamos a viver tem, na União Europeia, outra lógica e, sobretudo uma outra prioridade, na sequência das posições adoptadas por alguns Estados membros. Na verdade, ainda não vimos frutos das tentativas, que estiveram em curso, de regular o sistema financeiro e de criar uma agência europeia de rating ou mais recentemente os Eurobonds; Optou-se por adotar como prioridade absoluta a redução dos défices gerados na primeira fase de resposta á crise. Lançou-se um processo com vista a criar um governo económico europeu, com dimensão fundamental desde o lançamento da moeda única e até agora não implementada; E forçaram-se respostas casuísticas das crises das dívidas soberanas, parcialmente potenciadas pelas duas opções anteriores. A Grécia e a Irlanda constituem, até agora, as duas ilustrações mais dramáticas e as faces mais visíveis destas opções. 2
Mas não nos iludamos: as consequências destas opções não se resumem àqueles dois países. Pelo contrário, as consequências atingem todos os países europeus, Portugal incluído, como bem sabemos, com os ataques à divida soberana e às dúvidas sobre a capacidade de cumprirmos os nossos compromissos. No caso português, o Governo procurou, na medida das possibilidades que tem e não das que gostava ou era justo que tivesse! -, limitar as consequências das opções a que me referi. Por isso, se é inegável que a substância das políticas públicas é hoje diferente, também em Portugal, do que foi na primeira fase de resposta à crise, orgulho-me de poder afirmar que foi possível manter aberta a via do diálogo social tripartido, da negociação de compromissos entre o Governo, organizações sindicais e empresariais. Se é certo que o diálogo social e o desenvolvimento das relações laborais nunca foram domínios fáceis, em situações como aquela que estamos a viver a sua dificuldade e importância aumenta na proporção em que crescem os escolhos a que estão sujeitos. Por isso mesmo, quero aqui deixar uma palavra de reconhecimento aos sindicalistas e aos representantes empresariais que quiseram e souberam assumir, na passada terça feira, a responsabilidade de contribuir para soluções realizáveis na conjuntura atual e que, estou convencida, contribuirão para minorar as consequências económicas e sociais e a duração da crise e prepararão melhor as nossas empresas e os nossos trabalhadores para o pós-crise. Independentemente das actuais circunstâncias políticas, está nas mãos dos signatários, nas nossas mãos, levar à prática as medidas acordadas. Contou para isso com o emprenho do governo. E entro, assim, no terceiro tema desta brevíssima intervenção. 3
Em meu entender, se queremos que a resposta à crise seja compatível com a agenda do trabalho digno, deveríamos reconhecer que as questões que estruturam essas respostas políticas são a regulação socialmente justa da globalização e uma relação entre as prioridades das políticas públicas que não sacrifique a promoção do emprego e da equidade social a um endeusamento sem limites da disciplina orçamental. Porque os países europeus não estão sozinhos no mundo, nem para o bem, nem para o mal, não podemos que o espaço de manobra de que dispõem as democracias europeias desapareça, sabendo que este é, cada vez mais, um espaço de interdependências, e que estas interdependências são, muitas vezes, assimétricas e inigualitárias. Mas é exactamente nesse espaço e entro no meu quarto e último ponto que temos de criar uma nova articulação virtuosa entre crescimento económico, desenvolvimento social e protecção do meio ambiente. Deixem-me, portanto, ser inteiramente clara também neste ponto: não vale a pena imaginar políticas de emprego, de proteção social ou de regulação dos mercados de trabalho que sejam independentes da competitividade empresarial. Sem competitividade empresarial não há crescimento económico sustentável e, sem este, não há quaisquer possibilidades de reduzir duravelmente o desemprego, de promover a criação de empregos viáveis e de boa qualidade, de termos uma distribuição mais justa da riqueza gerada. Mas não é menos verdade que a relação entre emprego e crescimento económico está longe de ser automática e unívoca, como bem sabemos. 4
Até por isso, me parece fundamental que os poderes públicos, os representantes dos empregadores e os representantes dos trabalhadores construam uma nova e sublinho nova articulação virtuosa entre crescimento económico e trabalho digno. E sublinho que se trata de uma nova articulação porque não vale a pena tentar reconstruir soluções que são incompatíveis com o mundo globalizado em que vivemos. Do que precisamos, é de uma agenda renovada para o diálogo social tripartido, que parta do reconhecimento de que as interdependências entre as organizações que dele participam são hoje maiores e crescentes e não menores do que há uma década atrás. Do que precisamos é de complementar e de desenvolver as políticas públicas com relações laborais que são e devem permanecer o território onde os parceiros sociais e só eles são protagonistas ativos e em plena autonomia. Julgo que, por esse caminho que poderemos construir as políticas indispensáveis à agenda do trabalho digno, do desenvolvimento sustentado e sustentável depois desta crise global. Estou certa de que as discussões e as conclusões desta conferência contribuirão para assim fazermos. Muito obrigado pela vossa atenção. 5