Desnutrição infantil no Brasil: revisão da literatura

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Transcrição:

Desnutrição infantil no Brasil: revisão da literatura FÁBIO BRANCHES XAVIER(UNINGÁ)¹ BRUNO MOREIRA SOARES(G-UNINGÁ) 2 DIOGO CÍRICO(G-UNINGÁ) 2 ISMAELINO MAURO NUNES MAGNO 3 RESUMO Este estudo permite uma maior visão da situação nutricional no país, além de confirmar diferenças regionais. Foi construído através do levantamento de estudos epidemiológico-nutricionais a partir da década de 1970 à 1996, onde observou-se que apesar do Brasil figurar entre os países com graves problemas sócio-econômicos, decresceram muito os casos de desnutrição infantil em todas as regiões do país. Palavras-chave: Desnutrição infantil. Estudos nutricionais. PNSN. INTRODUÇÃO Em pleno século XXI a desnutrição infantil continua sendo um grande problema de saúde pública nos países em desenvolvimento. Recentes estudos mostraram que a desnutrição energético-proteica atinge mais de 1/3 da população mundial menor de 5 anos de idade e está envolvida em mais de 50% dos casos de morte de crianças em todo o mundo (ENGSTROM; ANJOS, 1999). Existe alguma incerteza e confusão quanto aos termos desnutrição protéico-calórica (DPC) e desnutrição energético-protei-ca (DEP). O primeiro termo, muito utilizado nas décadas de 1970 e 1980, foi assim determinado porque pensava-se que o problema da desdesnutrição era deficiência exclusiva de proteínas, então os casos eram 1 Professor Mestre Faculdade Ingá UNINGÁ 2 Acadêmicos do Curso de Nutrição, Faculdade Assis Gurgacz - Cascavel PR 3 Professor Mestre UNIPAR- Cascavel -PR 37

tratados pela dietoterapia com dietas hiperproteicas (TADDEI; SIGU- LEM, 1998). Ao final da década de 1980 até os dias de hoje, observa-se que a maioria dos autores utiliza o termo desnutrição energético-proteica (DEP), pois concluiu-se que a desnutrição é um processo pluricarencial onde o indivíduo carece de energia na forma de calorias, principalmente da fonte preliminar, constituída pelos hidratos de carbono (CARRAZZA; MARCONDES, 1991). Não está se afirmando a inexistência de deficiência de proteínas em um quadro de desnutrição; a mudança conceitual é voltada à terapêutica, que através da dietoterapia moderna busca o equilíbrio entre hidratos de carbono, proteínas e lipídios. Existe consenso também, que dietas ricas em hidratos de carbono e deficientes em proteínas, comprometem o estado nutricional, principalmente quanto ao desenvolvimento do sistema imunológico e a evolução pondero-estatural infantil (ARAÚJO, 1990; STITTES; TERR, 1992). Para determinar as causas da desnutrição infantil, torna-se necessário entender a multifatoriedade que a cerca, considerando-se principalmente algumas necessidades básicas como: alimentação, saneamento, educação e renda (ENGSTROM; ANJOS, 1999; VIEIRA et al. 1998). Didaticamente pode-se atribuir três causas para a desnutrição infantil: as causas imediatas, básicas e adjacentes. As causas imediatas mais significativas ficam por conta do consumo inadequado de alimentos e a intercorrência de algumas doenças, sendo mais comum no grupo infantil às infecções respiratórias agudas (IRA) e a diarréia (MATA, 1988; PELLETIER et al. 1996). A causa básica da desnutrição é a pobreza, gerada pela submissão econômica dos países em desenvolvimento aos desenvolvidos; somada a falta de estruturação político-governamental e corrupção. Esses fatores geram desequilíbrio econômico que é refletido na distribuição per capita de renda, impossibilitando o acesso ao alimento (SOUSA; SILVA, 2003). Uma das causas subjacentes é a falta de educação e estrutura familiar que são fundamentais para compreensão dos elementos para uma boa nutrição, higiene pessoal e de alimentos. Outra causa subjacente é a deficiente cobertura e acesso ao serviço de saúde pública, principalmente os de atenção primária que visam promoção e proteção da saúde (SILVA; STURION, 1998; SILVA et al. 2000). As condições do meio também devem ser levadas em consideração, pois as maiores 38

taxas de desnutridos encontram-se em áreas não saneadas (ALVAREZ et al. 1991). Estudos epidemiológico-nutricionais no Brasil No Brasil encontram-se quatro grandes estudos sobre a situação nutricional da população, sendo os três primeiros realizados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e o último realizado pela Sociedade Bem-Estar Familiar no Brasil (BEM- FAM) com apoio do IBGE. O primeiro estudo, o ENDEF (Estudo Nacional sobre a Despesa Familiar), foi realizado no período de agosto de 1974 a agosto de 1975. O ENDEF teve como objetivo avaliar o consumo alimentar, a estrutura de despesa familiar e o estado nutricional de uma amostra significativa da população brasileira (LEAL; BITTENCOURT, 1997). O segundo foi a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), realizada em 1987/1988, entretanto, esse estudo objetivou, somente, determinar de forma indireta o consumo de alimentos das famílias nas áreas metropolitanas das cidades de Brasília e Goiânia. A POF não englobou em seus objetivos a avaliação nutricional infantil (LEAL; BITTENCOURT, 1997; BATISTA; RISSIN, 2003). A PNSN (Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição) foi realizada no período de junho a setembro de 1989. Mais abrangente, esse estudo teve como objetivo principal avaliar o estado nutricional da população brasileira, principalmente o grupo infantil. Os resultados da PNSN demonstraram que a desnutrição no Brasil inicia-se antes do nascimento, tanto que, o percentual de recém-nascidos com baixo peso atingiu 11%. O estudo também demonstrou que 31% das crianças brasileiras menores de 5 anos apresentavam déficit de peso em relação a idade (desnutrição inespecífica), sendo que destas, 5% nas formas moderadas e graves (OLIVEIRA; TADDEI, 1998). Quanto ao indicador altura para idade (desnutrição crônica), observou-se que as crianças brasileiras apresentavam ao nascer, comprimento médio semelhante e por vezes até superior ao de crianças norte americanas, entretanto no decorrer dos primeiros cinco meses de vida, a velocidade de crescimento das crianças brasileiras era inferior a de crianças norte americanas. Essa situação pode ser justificada pelo desmame, bastante acentuado, pela introdução de alimentos de maneira 39

precoce e a ocorrência de doenças infecciosas (MONTEIRO; CONDE, 2000). Para o segmento populacional entre zero e cinco anos a PNSN detectou que o maior problema é o déficit de altura para idade (desnutrição crônica). As repercussões da desnutrição crônica, nesse período de vida, ficarão evidentes no futuro, onde será observada uma população adulta jovem com estatura inferior aos padrões normais de crescimento, gerando, muitas vezes, alta prevalência de nanicos. Numa comparação entre dois estudos (ENDEF e PNSN), observou-se uma redução considerável dos déficits de peso em relação à idade (desnutrição inespecífica) em todas as regiões do Brasil. As formas moderadas e graves decresceram ainda mais (Quadro 1). Estima-se que nesse período compreendido pelos dois estudos, houve redução de mais de 60% dos casos de desnutrição no Brasil (MONTEIRO et al. 1992; MONTEIRO, 1996). A PNDS (Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde) realizada em 1996 teve como objetivo investigar a situação de saúde da população brasileira levando em consideração aspectos demográficos e sócioeconômicos. Em relação à desnutrição infantil, constatou-se que continua o declínio na proporção dos casos, porém, algumas regiões, mesmo com esse declínio, ainda apresentam proporções elevadas. Se compararmos o período entre 1989 (PNSN) e 1996 (PNDS) o ritmo de queda da desnutrição entendida como retardo estatural moderado ou grave, foi mais acentuado nas regiões norte e nordeste (CARVALHAES; BENICIO, 2002). (Quadro 2) DISCUSSÃO A breve revisão evidenciou que nas últimas três décadas houve no Brasil uma redução nos valores de prevalência de desnutrição infantil. Detectou-se maior número de casos em meio urbano. Esses valores podem ser explicados pelas precárias condições de saneamento e acesso aos serviços de saúde, que não oferecidos pelo poder público de maneira eficaz, influenciam diretamente sobre a elevada prevalência de doenças infecciosas e parasitárias, coadjuvantes no processo da desnutrição. Embora em algumas regiões a desnutrição tenha perdido seu caráter endêmico, ao final da década de 90, ainda existia nas regiões norte e nordeste áreas de risco, onde a principal causa da desnutrição era a pobreza (BATISTA; RISSIN, 2003). 40

REGIÃO Todas as formas Formas moderadas e graves ENDEF PNSN Variação ENDEF PNSN Variação 1974 1989 % 1974 1989 % Nordeste 56.5 46.0-18.7 21.2 10.1-52.3 Sul+Sudeste 38.6 20.6-46.6 8.2 2.4-70.7 Norte+ 49.5 31.3-36.8 15.5 4.0-74.2 Centro-oeste Brasil 46.1 30.7-33.4 13.6 5.1-62.5 Fonte: OLIVEIRA; TADDEI, 1998. Quadro 1. Prevalência de déficit de peso para idade em crianças menores de 5 anos, em dois inquéritos nacionais, Brasil, 1974/75 e 1989. Estrato/Região 1975 (%) 1989 (%) 1996 (%) Variação anual (%) 1975/1989 1989/1996 Urbano Norte 39,0 23,0 16,6-2,9-4,3 Nordeste 40,8 23,8 13,0-3,0-6,5 Centro-Sul 20,5 7,5 4,6-4,5-5,5 Brasil 26,6 12,5 7,7-3,8-5,5 Rural Nordeste 52,5 30,9 25,2-2,9-2,6 Centro-Sul 29,4 12,3 9,9-4,2-2,8 Brasil 40,5 22,7 18,9-3,1-2,4 Fonte: BATISTA; RISSIN, 2003. Quadro 2. Evolução do retardo estatural (-2 desvios padrão) de menores de 5 anos, no Brasil por grandes regiões estratos urbanos e rurais (1975, 1989 e 1996). CONCLUSÃO Os estudos evidenciaram melhoras no quadro nutricional brasileiro, principalmente no norte e nordeste, entretanto, em algumas áreas, os déficits crônicos são preocupantes quando comparados com países desenvolvidos ou até mesmo com a região centro-sul do Brasil (BATISTA; RISSIN, 2003). Os autores enfatizam a importância da 41

realização de estudos epidemiológico-nutricionais, por fornecem subsídios importantes para o conhecimento das diferenças regionais, além de auxiliar na implementação de políticas sociais. REFERÊNCIAS (BEMFAM) Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil. Pesquisa nacional sobre demografia e saúde, 1996. Rio de Janeiro: BEMFAM/ MACRO; 1997. ALVAREZ, M.L. et al. Desnutrición infantil, coeficiente de desarrollo y su relación con el medio ambiente: un estudio piloto. Rev Saúde Públ, 25(4):282-8, São Paulo, 1991. ARAUJO, R. Compêndio de patologia da nutrição. Belém: Universidade Federal do Pará, 1990. BATISTA, F. ; RISSIN, A. A transição nutricional no Brasil: tendências regionais e temporais. Cad. Saúde Pública, 2003, vol.19 supl.1, p.181-191. CARRAZZA, F.R.; MARCONDES, E. Nutrição clínica em pediatria. São Paulo: Sarvier, 1991. CARVALHAES, M. A.; BENICIO, M. H. D Aquino Capacidade materna de cuidar e desnutrição infantil. Revista Saúde Pública, abr. 2002, vol.36, no.2, p.188-197. ENGSTROM, M.E.; ANJOS, L.A. Déficit estatural nas crianças brasileiras: relação com condições sócio-ambientais e estado nutricional materno. Cad de Saúde Publ. Rio de Janeiro, 15(3):559-567, jul-set, 1999. LEAL, M.C.; BITTENCOURT, S.A. Informações nutricionais: o que se tem no país? Cad. Saúde Públ, São Paulo, v.3, n.13, p. 551-55, jul/set. 1997. 42

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