A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS: CONTRIBUIÇÕES DE ATIVIDADES DE INTERPRETAÇÃO FUNCIONAL DE INTERAÇÕES DISCURSIVAS Fabiana Maris Versuti-Stoque Docente da Universidade de São Paulo (USP) Caroline Nogueira da Silva Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid/USP) Lívia Aparecida Alves Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid/USP) Resumo Este estudo teve como objetivo investigar as contribuições da proposição e do desenvolvimento de atividades de interpretação funcional de interações discursivas expressas ao longo da aplicação de sequências didáticas (SD's) de Ecologia para a reflexão de professores de Ciências Naturais acerca do processo da alfabetização cientifica (AC), durante um encontro de formação continuada de professores. A proposta formativa para professores de Ciências, Biologia, Física e Química foi colocada em prática durante um encontro, com duração de oito horas, organizado pelo grupo de pesquisa em Linguagem e Ensino de Ciências (LINCE) da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto. Participaram 27 professores integrantes de uma diretoria de ensino da rede pública de cidades do interior paulista. A temática do encontro foi o processo da ACnas aulas de Ciências Naturais.Este estudo concentrou-se nos resultados obtidos com os professores participantes durante o desenvolvimento das seguintes ações: 1)Atividade de interpretação funcional das interações discursivas registradas durante a aplicação de SD's, por professores da rede pública de ensino em estudos anteriores e; 2) Apresentação oral do roteiro de interpretação funcional elaborado a partir da análise das interações discursivas estabelecidas nas SD's já aplicadas. Os resultados demonstraram que o recurso analítico ajudou os professores a caracterizarem ações educativas que favoreceram e/ou dificultaram o processo da AC, por meio da análise das relações entre as ações educativas dos professores que aplicaram cada uma das SD's e os comportamentos de seus alunos. Dessa forma, o procedimento se configurou como uma estratégia efetiva para estimular a postura de um profissional crítico-reflexivo. Esta proposta tem por fim desenvolver novas aprendizagens profissionais na docência ao ampliar o repertório dos professores em analisar e avaliar ações educativas relacionando-as com o processo da alfabetização científica. Palavras-chave: Formação de professores. Alfabetização científica. Interações discursivas. 00531
2 Introdução Nos últimos anos,os temas relacionados à formação de professores e a reflexão sobre a prática docente tem ganhado destaque no cenário da educação brasileira. Afim de compreender o processo de ensino aprendizagem, torna-se fundamental que os professores tomem consciência de sua ação, sabendo selecionar e organizar conteúdos, garantir o processo de aprendizagem significativa, bem como compreender sua identidade enquanto profissional da educação. Junto a isto, o ensino de ciências torna-se indispensável para ampliação do senso crítico nos alunos refletindo sobre a aplicação dos conceitos no contexto real, algo que só é possível por meio da alfabetização científica. A alfabetização científica não centra-se apenas em abordar termos, conhecimentos ou conceitos básicos, mas também contempla outros eixos importantes como: compreensão das complexas relações existentes entre ciências-tecnologiasociedade-meio ambiente, bem como a compreensão da natureza da ciência e dos fatores éticos e políticos que circundam a sua prática (SASSERON; CARVALHO, 2011). Segundo Chassot (2000), a alfabetização científica é o conjunto de conhecimentos que facilitariam aos homens e mulheres a fazerem uma leitura do mundo onde vivem para assim, entender as necessidades de transformá-lo e contribuir para melhorar a vida no planeta. A fim de possibilitar aos professores o desenvolvimento da capacidade reflexiva em relação a sua prática, foi realizado um encontro com professores de Ciências, Biologia, Química e Física da rede pública de ensino de cidades do interior paulista. Permitir que o professor investigue e analise as interações discursivas decorrentes de sua atuação docente pode ser uma maneira de auxiliar seu processo formativo, ajudando-o a compreender o que tais interações dizem sobre o processo da alfabetização científica (COHEN; MARTINS, 2009). Assim, neste estudo, o objetivo foi investigar as contribuições da proposição e do desenvolvimento de atividades de interpretação funcional de interações discursivas expressas ao longo da aplicação de sequências didáticas (SD's) de Ecologia para a reflexão de professores de Ciências Naturais acerca do processo da alfabetização cientifica (AC) e refletir sobre suas possíveis contribuições. 00532
3 Metodologia A proposta formativa para professores de Ciências, Biologia, Física e Química foi colocada em prática durante um encontro, com duração de oito horas, organizado pelo grupo de pesquisa em Linguagem e Ensino de Ciências (LINCE) da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto i. Participaram 27 professores integrantes de uma diretoria de ensino da rede pública de cidades do interior paulista, no qual a temática foi o processo da ACnas aulas de Ciências Naturais. As seguintes atividades foram desenvolvidas: 1) Discussão sobre a importância da AC como um dos objetivos da Educação Básica; 2) Desenvolvimento e discussão de um trabalho de campo pautado nos pressupostos da AC, sobre a biodiversidade das espécies vegetais de uma área reflorestada; 3) Apresentação de duas SD's sobre ecologia vegetal que almejavam a AC; 4) Proposição e desenvolvimento de uma atividade deinterpretação funcional das interações discursivas registradas durante a aplicação de cada uma das SD's, por professores da rede pública de ensino em estudos anteriores; 5) Apresentação oral do roteiro de interpretação funcional elaborado pelos professores participantes a partir da análise das interações discursivas estabelecidas nas SD's já aplicadas. Este estudo concentrou-se nos resultados obtidos no desenvolvimento das atividades 4 e 5. Vale destacar que na Etapa 4, os professores realizaram uma atividade de análise de interações discursivas registradas durante a aplicação das SD's na rede pública de ensino em estudos anteriores desenvolvidos pelo grupo LINCE (VERSUTI-STOQUE; MOTOKANE, 2012). Os participantes receberam quadros de episódios de ensino (contendo turnos de falas de professores e alunos) que foram gravados e transcritos em um modelo para fazer a análise das práticas discursivas registradas. O objetivo foi discutir se as práticas expressavam indicadores de alfabetização científica. Finalmente, na última parte do encontro, os professores tiveram que socializar as respostas produzidas para as seguintes questões: 1) Observando e analisando os episódios de ensino, você considera que as práticas discursivas dos alunos transcritas expressam indicadores de alfabetização científica? 2) Quais são as principais análises ou comentários sobre as práticas do professor diante das quais foram registradas as práticas discursivas dos alunos? 00533
4 Algumas contribuições da atividade de interpretação funcional de interações discursivas Os professores, de maneira geral, destacaram a SD que expressava indicadores de alfabetização científica, analisando o quanto a prática do professor responsável pela aplicação da SD influenciava na prática discursiva dos alunos. Entre as falas dos professores, destaca-se: Prof.1: O professor faz questionamentos, perguntas, quando o aluno responde equivocadamente, ele erra, ele retorna a pergunta direcionando a resposta correta do aluno. Ele fala presta atenção nisso, olha, vamos levar isso em consideração. O aluno acertando, ele faz uma nova pergunta, seria a continuação do que ele quer que o aluno aprenda. Então ele faz uma nova pergunta, geralmente com um grau de dificuldade maior, para que o aluno responda, se respondeu, continua com uma nova pergunta, se não, ele faz o mesmo direcionamento, ele tenta induzir o aluno a responder corretamente, mediante alguma informação. Já em relação à outra SD apresentada aos professores, encontra-se a figura de uma professora que não domina plenamente os conteúdos, não propicia um ambiente de interação no qual os alunos possam participar ativamente para a construção do conhecimento, além de desconsiderar as argumentações dos alunos, estas estando corretas ou não, o que prejudica a construção do conhecimento. Os professores participantes da dinâmica apontaram diferenças significativas entre tais SDs, reforçando a ideia de que na presente sequência didática não houve indicadores de alfabetização científica. Para Alarcão (1996), [...] os processos de formação implicam o sujeito num processo pessoal, de questionação do saber e da experiência numa atitude de compreensão de si mesmo e do real que o circunda. Esse é o objetivo principal do pensamento e da ação reflexiva proporcionada por encontros de formação como realizado. É por meio da adoção de uma postura investigativa que o professor desenvolve em seus alunos as capacidades de observar, descrever, analisar, confrontar, interpretar e avaliar. A formação, portanto, levou os professores a compreenderem a questão de relação de funcionalidade, onde esta representa a interferência de um sobre o outro (professor-aluno), por meio de indicadores de alfabetização científica. 00534
5 Conclusão O recurso analítico apresentado neste estudo evidenciou para os professores em formação, relações de funcionalidade entre práticas educativas e ações dos alunos, oaspecto mais importante dessa relação não é o repertório final e nem o inicial do aprendiz, mas justamente a relação construída no dia-a-dia com os alunos, partindo do pressuposto que o objetivo maior é a construção do conhecimento e a capacidade de argumentação por parte do aluno, tornando-o reflexivo e crítico, ou seja, não visar apenas o que o aluno não sabe, mas focar no caminho que o levará à apropriação do conhecimento (VERSUTI-STOQUE; MOTOKANE, 2012). Sendo assim, tal encontro viabilizou momentos de reflexão sobre a prática docente. Para Freire (2001), é na formação permanente dos professores, o momento fundamental da reflexão crítica sobre a prática, onde esta se constitui como orientação prioritária para a formação continuada dos professores que buscam a transformação por meio de sua prática educativa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALARCÃO, I. Formação reflexiva de professores: estratégias de supervisão. Porto Editora, Portugal, 1996. CACHAPUZ, A; GIL-PÉREZ, D; CARVALHO, A.M.P; PRAIA, J; VILCHES, A. A Necessária renovação do ensino das Ciências. São Paulo: Cortez, 2005. COHEN, M.C.R.; MARTINS, I. Aproximações entre fluxo da interação verbal e argumentação: Análise de textos autorados por professores de Ciências da escola básica. In: NASCIMENTO S.S.; PLANTIN C. (Orgs.). Argumentação e Ensino de Ciências.Curitiba: Editora CRV, 2009 p. 39-56. CHASSOT, A. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. Ijuí: Editora Unijuí, 2000. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2001. SASSERON, L.H.; CARVALHO, A.M.P. Construindo argumentação na sala de aula: a presença do ciclo argumentativo, os indicadores de alfabetização científica e o padrão de Toulmin. Ciência e Educação, v.17, n.1, p. 97-114, 2011. VERSUTI-STOQUE, F.M.; MOTOKANE, M.T. O uso da argumentação para a construção de indicadores da Alfabetização Científica: Uma proposta para o desenvolvimento de novas aprendizagens profissionais na docência. In: X Jornadas Nacionales V Congreso Internacional de Enseñanza de labiología, 2012, Córdoba. Anais 00535
6 da X Jornadas Nacionales V Congreso Internacional de Enseñanza de labiología, 2012. i Coordenado pelo Prof. Dr. Marcelo Tadeu Motokane 00536