Tópico Especial. Os salários reais em ciclos recessivos no Brasil. TÓPICO ESPECIAL 24 de agosto de José Luciano da Silva Costa

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Transcrição:

Tópico Especial Os salários reais em ciclos recessivos no Brasil José Luciano da Silva Costa O comportamento do mercado de trabalho no ciclo recessivo atual evidencia que o processo de ajuste foi desigual entre a ocupação e os salários. A comparação com outros períodos recessivos da economia brasileira e também frente à experiência internacional demonstra que o ajuste dos salários no ciclo atual teve intensidade baixa. O objetivo desse tópico é discutir a dinâmica do mercado de trabalho durante os períodos de recessão e contrastar com o ciclo atual. O comportamento distinto dos salários entre os setores e os tipos de emprego também serão avaliados no ciclo mais recente. Um aspecto que será avaliado é o impacto do efeito composição sobre os salários médios da economia, ou seja, quanto a mudança do perfil da ocupação influenciou a dinâmica salarial nesse período de queda de ocupação. A recessão atual teve início no segundo trimestre de 2014¹ e nesse período a dinâmica do mercado de trabalho tem uma característica marcante que é a maior elevação da taxa de desemprego em média quando se compara com outros episódios de contração da economia desde 1980. A contrapartida dessa forte deterioração do emprego seria o ajuste dos salários nominais e, principalmente, em termos reais. Avaliando o comportamento dos salários, conclui-se que o ajuste foi pequeno e desigual entre os setores, tanto do ponto de vista do emprego formal e informal quanto da ótica do setor privado e público. A trajetória de deterioração da taxa de desemprego na recessão atual não encontra similaridade em outros episódios de contração da economia. Na tabela abaixo, o comportamento da taxa de desemprego em termos dessazonalizados é analisado durante as nove recessões que ocorreram na economia desde a década de 1980. Há duas medidas que julgamos resumir o ¹Considerando a datação dos ciclos feita pelo CODACE (IBRE-FGV) 1

grau de deterioração do mercado de trabalho, são elas: a diferença entre o patamar médio da taxa de desemprego durante o ciclo de recessão e o desemprego inicial, e a diferença entre o valor máximo da desocupação atingido durante o período de recessão e o desemprego inicial. Na amostra que considera todas as recessões desde 1980, a taxa de desemprego subiu em média 0,6 ponto percentual (p.p.) na comparação entre o valor médio da taxa de desocupação e a taxa de desemprego inicial. Quando se compara a taxa máxima atingida contra a desocupação inicial de cada ciclo, a taxa de desemprego subiu em média 1,6 pontos percentuais. Houve dois períodos recessivos que não tiveram deterioração da taxa de desemprego em nenhuma das duas medidas propostas, e quando se exclui esses dois períodos da amostra, as medidas apresentam deteriorações adicionais de 0,3 e 0,5 p.p., respectivamente. No caso da recessão atual, a piora da desocupação é bem acima do normal nas duas dimensões propostas anteriormente. Houve aumento de 2,7 p.p. do desemprego médio em relação à taxa de desemprego do início do ciclo, o que representa uma piora de 4,5 vezes acima da média de todas as recessões anteriores. No caso da comparação com o desemprego máxima e o valor inicial, a diferença ficou em 6,5 pontos percentuais. Da mesma forma, essa medida é 4,1 vezes maior que o valor médio da amostra desde 1980. Essas medidas demonstram o profundo ajuste sofrido pela ocupação nesse ciclo de contração da atividade. Nesse ambiente de piora do emprego, a expectativa seria que o ajuste dos salários tenderia a ser compatível com a deterioração do emprego. 2

Os salários se ajustam com intensidades diferentes nos diversos ciclos recessivos, mas a característica marcante é a menor intensidade da correção a partir das recessões de 2003. Na avaliação do comportamento dos salários reais será usada a mesma amostra de períodos recessivos desde 1980 até 2017 e duas medidas de avaliação da profundidade de ajuste dos salários reais. A primeira medida será a variação percentual entre o patamar mínimo dos salários no período de recessão em relação aos salários no início do período de recessão. A segunda medida é a variação dos salários reais entre o final e o início do período recessivo. Considerando a amostra de todas as recessões, o patamar mínimo dos salários registrou queda de 8,2% com relação ao valor inicial dos períodos recessivos. A variação registrada entre o valor final dos salários e a patamar inicial dos períodos recessivos foi uma contração de 2,9%. Entretanto, há uma clara mudança de padrão de ajuste a partir das recessões de 2003. As recessões entre 1980 a 2001 são marcadas pelo forte ajuste dos salários em termos reais. As duas medidas nessa amostra até 2001 apresentaram maior deterioração, com recuo de 11,4%, entre o valor mínimo e inicial dos salários reais, e queda de 4,1%, comparação entre o patamar final e inicial dos salários reais no período de contração da economia². Na amostra a partir de 2003, a intensidade dos ajustes é substancialmente menor. No caso da medida dos salários reais entre o patamar mínimo do ciclo e o valor médio durante as recessões, o indicador registrou recuo de 1,9%. Para a comparação entre o salário real do final e do início de recessão, o ajuste seria moderado e seria queda de 0,6%. ² Houve dois episódios de recessão no período até 2001, que não ocorreram queda dos salários reais em uma das medidas. Considerando o cálculo da média dos indicadores sem esses dois períodos, haveria uma deterioração expressiva para queda de 14,0% e 13,3% dos salários reais na comparação entre os patamares mínimos e finais das recessões frente aos valores iniciais das contrações de atividade. 3

Os salários reais no ciclo recessivo atual tiveram comportamento simétrico entre os dois indicadores de ajuste dos salários. Os salários reais registraram queda de 4,1% na comparação entre o valor mínimo atingido em relação ao patamar do início da recessão. Da mesma forma, os salários reais recuaram 1,2% na comparação do valor de junho desse ano frente ao patamar de abril de 2014, que é o início do ciclo de recessão atual. Quando se compara essas duas medidas com a média dos valores de todas as recessões, constata-se que o processo atual de ajuste foi de magnitude inferior ao histórico e relativamente incompleto. Essa é uma das razões, como já discutido no tópico especial de março (O ajuste assimétrico do mercado de trabalho) desse ano, para o ajuste mais intenso da ocupação no ciclo recessivo atual, que observamos no aumento da taxa de desemprego. Uma explicação para essa rigidez dos salários, tanto em termos nominais quanto reais, é o elevado processo de indexação que fica claro no processo sincronizado de alta dos salários nos diferentes setores da economia e tipos de relação de trabalho. Esses resultados também são encontrados no Policy Paper n 23, Manni, Menezes Filho e Komatsu (2017)³, que aponta que a recessão de 2014 parece não ter tido grande efeito sobre os salários que, apesar de uma pequena queda após 2014, se mantiveram estáveis para o período estudado. Outros pontos também citados pelos autores para explicar essa rigidez salarial são a maior formalização do mercado de trabalho, em comparação com o período anterior e também do fato de grande parte dos trabalhadores receberem o salário mínimo, que tem reajuste pela inflação, ou seja, está protegido para quedas reais. A dinâmica de ajuste do mercado de trabalho tem surpreendido com recuperação forte dos salários reais desde dezembro do ano passado. No ciclo de recessão atual, os salários reais tiveram uma trajetória de correção até meados de 2016, quando a queda em termos reais atingiu 4,2% na comparação anual em junho do ano passado. Essa perda dos salários reais se manteve até novembro do ³MANNI, Stefanno Ruiz; MENEZES-FILHO, Naercio Aquino; KOMATSU, Bruno Kawaoka (2017). Crise e Mercado de Trabalho: uma comparação entre recessões. Policy Paper n 23 Centro de Políticas Públicas INSPER. 4

ano passado. A partir de dezembro, ocorreu a reversão da trajetória de queda e, desde então, os ganhos salariais têm sido fortes. No final do segundo trimestre desse ano, os salários reais registraram alta de 2,8% na comparação anual. Entre os setores, os destaques são transportes, comércio e serviços prestados às empresas, como pode ser visto no gráfico abaixo, que mostra a contribuição do crescimento do salário real de cada setor, que foi ponderado pela sua ocupação, para o salário médio da economia. A dinâmica salarial desses setores tem uma mudança de tendência e os salários passaram a subir a partir do final do ano passado. Entre os setores, a reversão da tendência dos salários ligados aos serviços de transportes, que em parte pode ser explicada pela boa safra agrícola que aumentou a demanda por fretes para escoamento da produção. Os salários do comércio tiveram recuperação com a melhora da ocupação do setor, que tem diminuído a contração na margem. No caso dos serviços ligados às empresas, a ocupação do setor tem crescido desde dezembro do ano passado. Os ganhos salariais elevados são reflexo do processo disseminado de indexação da economia. Durante o início do ciclo recessivo atual, o menor poder de barganha salarial dos trabalhadores sem carteira foi observado na redução dos salários em termos reais bem mais pronunciada que a experimentada pelos trabalhadores formais. Entretanto, a situação passou a ser menos desfavorável para essa parcela da ocupação a partir do início desse ano com a recuperação dos salários nominais e, consequentemente, dos salários reais. Os salários reais dos empregados sem carteira atingiram queda de 5,4% em termos anuais em fevereiro de 2016. Entretanto, a partir de janeiro desse ano os salários reais dessa categoria passaram a registar ganhos reais, e terminaram o segundo trimestre com ganhos reais de 2,7% na comparação anual. Os salários dos empregados com carteira tiveram dinâmica mais favorável durante o período atual de contração da atividade, e passaram a exibir ganhos reais já no último trimestre do ano passado. Essa dinâmica se manteve no início desse ano e os salários reais dos trabalhadores com carteira registraram ganho anual de 3,3% em junho. A recuperação mais sincronizada dos salários reais é um sinal do processo difuso de indexação da economia, que dificulta o ajuste do mercado de trabalho pelos salários e, portanto, implica no ajuste maior do emprego. 5

O comportamento dos salários dos empregados do setor privado e público teve grande divergência ao longo do ciclo de recessão, mas recentemente essa diferença se reduziu. As ocupações ligadas ao setor público sofreram pouco durante a recessão atual com pequenos períodos de contração dos salários reais. O maior ajuste dos salários ocorreu no início de 2016, quando houve queda de 1,7% dos rendimentos desse grupo. Entretanto, a dinâmica que se seguiu foi de recuperação dos salários com fortes ganhos reais no início de 2017. Os salários reais dos empregados do setor público registraram alta de 3,1% na comparação entre os primeiros seis meses de 2017 frente ao mesmo período do ano anterior. No segundo trimestre, houve desaceleração dos ganhos reais, mas ainda permaneceram próximos de 2,0% na comparação anual. Quando se compara com a dinâmica dos salários do setor privado, a deterioração dos salários desse grupo é maior, e concentra-se no período entre setembro de 2015 e novembro de 2016, quando os salários atingiram contração de 5,4% em junho de 2016 em termos anuais. No entanto, a partir do final de 2016, os salários já voltam a registrar ganhos reais e seguem uma trajetória de aceleração que termina por convergir em termos de ritmo de crescimento com os salários do setor público. Essa dinâmica reforça os sinais de elevada indexação tanto do setor privado quanto público. Há certamente uma parcela desses ganhos que é resultado da desaceleração da inflação, mas esse período é marcado pelo aumento nominal dos salários dos dois grupos. 6

A mudança de perfil da ocupação teve influência no comportamento dos salários reais médios da economia no período recessivo. A redução do emprego entre os trabalhadores com carteira assinada nas ocupações, que registravam salários médios reais superiores à média da população, teve como efeito intensificar a queda da renda média observada no período recessivo. As maiores quedas de ocupação ocorreram entre os trabalhadores dos setores de administração pública, construção, indústria, comunicação, atividades financeiras e imobiliárias. Esses setores têm como característica comum salários acima da média dos demais setores da economia. Quando se mantém a participação da ocupação desses setores no patamar médio antes do início da recessão, que foi definida como o segundo trimestre de 2014, a dinâmica dos salários reais é menos negativa e atinge queda de 4,8% na comparação anual no segundo trimestre de 2016. A queda nos salários reais médios observados nesse mesmo período foi de 4,0% em termos anuais. O impacto do efeito total da mudança de composição da população ocupada seria em torno de 0,5%, que se refere a diferença entre a contração dos salários reais no período do primeiro trimestre de 2015 até primeiro trimestre de 2017. Nesse período, os salários efetivos e os salários com o efeito composição controlado registraram recuos de 0,8% e 1,3%, respectivamente. A implicação desse exercício é que uma parte do efeito da queda dos salários reais deveu-se ao efeito composição e a sua recuperação no período subsequente torna-se menos intensa se controlada para esse efeito, ou seja, a recuperação da ocupação em setores que possuem salários médios mais altos tenderia a impactar a dinâmica de curto prazo dos rendimentos. A baixa intensidade do ajuste dos salários no ciclo recessivo atual fica clara na comparação com os ajustes da renda real sofridos pelos países da Europa e pelos EUA na crise de 2008. As economias da Zona do Euro registraram, durante a crise 2008, forte contração das suas economias e ajustes severos nos mercados de trabalho. As perdas salariais nesses países foi intensa e o período de ajuste variou entre 6 e 12 trimestres. Durante o processo de correção dos salários, a Irlanda, a Espanha e Portugal sofreram as maiores contrações reais de salários com quedas de 8,2%, 7,0% e 13,6%, respectivamente, na comparação anual quando se compara o patamar mínimo atingido em relação ao início da crise. No caso da Itália, a queda dos salários reais foi mais moderada e ficou em 4,9% na mesma base de comparação. No caso da crise americana, a queda dos salários reais foi menos intensa que a experimentada pelas demais economias da amostra e foi de 2,2% em termos anuais. Uma explicação para a menor contração dos salários reais na economia americana é a flexibilidade do mercado de trabalho, que permite que a ocupação seja corrigida mais intensamente do que nas demais economias. 7

Comparando-se essas trajetórias com a experimentada pelo Brasil, o ajuste dos salários reais foi próximo em intensidade ao observado na Itália, embora a duração tenha sido menor. No momento mais intenso do ajuste do mercado de trabalho, os salários reais atingiram queda de 4,2%, em termos anuais. Portanto, o ajuste dos salários reais no caso do Brasil foi de menor intensidade e na média por um período mais curto de tempo, o que confirma a percepção da dificuldade de correção do mercado de trabalho. Fonte: IBGE, Bloomberg, BRAM No caso da ocupação, a queda experimentada pela economia brasileira é significativa em relação aos países da Europa e os Estados Unidos nos seus respectivos períodos de contração. Da mesma forma, quando se compara o ajuste da ocupação das economias durante o período recessivo observa-se uma forte queda do nível de emprego sofrida pela Espanha e Irlanda, que atingiram retração de 8,6% e 7,2%, respectivamente, no pico da contração da ocupação. No caso de Portugal e Itália, as correções da ocupação são menos intensas, e registram queda anuais de 3,5% e 2,0% nos momentos de maiores quedas da ocupação. A economia americana também passou por um processo de ajuste forte da ocupação e acumulou queda de 4,3% anual da população ocupada. No caso do Brasil, a contração foi moderada frente às experiências internacionais citadas, e no pico da correção do nível de ocupação a queda anual foi de 2,4%. A explicação para esse ajuste mais moderado da ocupação é em parte a precarização do emprego com o aumento do número de trabalhadores informais na economia, que recentemente superou o contingente de empregados com carteira, como pode ser visto no gráfico abaixo. 8

Fonte: IBGE, Bloomberg, BRAM A economia brasileira passou por um forte processo de deterioração da ocupação, mas a intensidade da correção de salários foi pequena tanto em termos históricos quanto em relação à experiência internacional. A comparação da trajetória do desemprego nos episódios recessivos brasileiros evidencia a forte piora da ocupação no ciclo atual. Por outro lado, a queda dos salários reais foi moderada e demonstra a dificuldade de ajuste do mercado de trabalho, que pode ser explicada pelo processo de indexação salarial. Outra explicação para a dinâmica salarial é o efeito composição, que impacta a média salarial. As experiências internacionais também indicam que a correção dos salários reais foi comedida. Portanto, apesar da deterioração da ocupação ser intensa, a dinâmica de ajuste dos salários reais foi incompleta no ciclo atual de recessão. 9

MARCELO CIRNE DE TOLEDO Economista Chefe marcelotoledo@bram.bradesco.com.br ANA PAULA DE ALMEIDA ALVES ana.almeida@bram.bradesco.com.br DANIEL XAVIER FRANCISCO danielxavier@bram.bradesco.com.br DANILO OLIVEIRA IMBIMBO danilo.imbimbo@bram.bradesco.com.br HUGO RIBAS DA COSTA hugo@bram.bradesco.com.br JOSE LUCIANO DA SILVA COSTA lucianocosta@bram.bradesco.com.br MARIANNE KOMORI GEHRINGER marianne.e.komori@bram.bradesco.com.br THIAGO NEVES PEREIRA thiago.pereira@bram.bradesco.com.br Tel.: 3847-9171 economia@bram.bradesco.com.br Material produzido em 24/08/2017 às 10h00 Outras edições estão disponíveis no Site: www.bradescoasset.com.br, As opiniões, estimativas e previsões apresentadas neste relatório constituem o nosso julgamento e estão sujeitas a mudanças sem aviso prévio, assim como as perspectivas para os mercados financeiros, que são baseadas nas condições atuais de mercado. Acreditamos que as informações apresentadas aqui são confiáveis, mas não garantimos a sua exatidão e informamos que podem estar apresentadas de maneira resumida. Este material não tem intenção de ser uma oferta ou solicitação de compra ou venda de qualquer instrumento financeiro. BRAM - Bradesco Asset Management é a empresa responsável pela atividade de administração de recursos de terceiros do Banco Bradesco S.A. BRAM - Bradesco Asset Management - Todos os direitos reservados. 10