Arrecadação e Gasto Público no Brasil: Qual é a Causalidade?

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Transcrição:

Arrecadação e Gasto Público no Brasil: Qual é a Causalidade? Sumário Executivo: Dados da década de 1990 em diante mostram uma grande elevação da carga tributária no Brasil, além de um aumento do gasto público governamental. Como frear esta dinâmica perversa? Esta pergunta pode começar a ser respondida com a análise da causalidade entre despesa e receita do governo. Em outras palavras: um aumento da carga tributária provoca um aumento do gasto público? ou um aumento do gasto público provoca um aumento da carga tributária? O argumento do Depecon-Fiesp/Ciesp é que o governo segue uma política do tipo arrecadar e gastar (tax and spend) e não uma política de gastar e arrecadar (spend and tax). Os resultados dos testes econométricos realizados comprovam nosso argumento. Os exemplos práticos fortalecem ainda mais o argumentam e deixam claro que quanto mais o governo arrecada mais ele gasta. Dito isso, uma forma de frear o gasto público é diminuir a arrecadação governamental. Não podemos continuar negando a importância de um indispensável equilíbrio entre receita e despesa nas finanças públicas do País. Urge promover um ajuste entre as políticas de gastos e de juros. A sociedade brasileira não aceita mais o cruel dueto crescer impostos crescer despesas. 1. Introdução Uma rápida análise dos resultados fiscais brasileiros do início da década de 1990 em diante mostra uma grande elevação da carga tributária do país, assim como um aumento do gasto público governamental (Gráfico 1 e Tabela 01). Isso tem causado preocupações e perguntas em torno da melhor forma de frear esta dinâmica perversa. Neste sentido, um debate importante que pode ser feito está relacionado à causalidade do processo, ou seja, um aumento da carga tributária carrega consigo um aumento do gasto público ou o processo acontece na direção contrária? E esta discussão se torna ainda mais importante em um momento em que se discute uma proposta de reforma tributária no país. 1

Gráfico 1 Carga Tributária Total (% PIB) 36 34 32 30 28 26 24 22 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Fonte: Ipeadata Tabela 1: Receita e Despesa Ano Crescimento Real da Receita Líquida Crescimento Real da Despesa 2000 5,3% 6,3 2001 7,0% 8,3 2002 4,5% 1,8 2003 2,8% 1,3 2004 10,4% 9,4 2005 8,7% 9,9 2006 8,1% 10,8 2007 9,0% 8,5 Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional Nota: Receita e Despesa do Governo Central (Tesouro, Previdência e BC) Para contribuir com esta discussão, a FIESP encomendou uma pesquisa junto a cerca de 1200 empresários paulistas para captar, dentre outros tópicos, a percepção dos mesmos sobre as condições de arrecadação e despesa do governo. Neste sentido, a maioria dos entrevistados (55%) teve a percepção de que uma redução da carga tributária obrigaria o governo a controlar seus gastos. 2. Objetivo e Experiências É justamente a causalidade existente nesta última pergunta o objetivo principal deste trabalho. Nosso argumento é que o governo segue uma política do tipo arrecadar e gastar (tax and spend) e não uma política de gastar e arrecadar (spend and tax). 2

Do ponto de vista prático, podemos citar 2 exemplos de que uma maior arrecadação leva a uma elevação dos gastos públicos: 1) Programação Financeira da União: A Programação Financeira compreende um conjunto de atividades com o objetivo de ajustar o ritmo de execução do orçamento ao fluxo provável de recursos financeiros. Após a aprovação do orçamento, o Poder Executivo estabelece em até trinta dias a programação financeira e o cronograma de desembolso mensal por órgãos, observadas as metas de resultados fiscais dispostas na lei de diretrizes orçamentárias. Periodicamente, e de acordo com a efetiva entrada de receita nos cofres públicos, novos decretos são emitidos de forma a autorizar um maior volume de liberações ordinárias por parte do Tesouro Nacional. Qualquer desvio positivo em relação à meta tende a ser gasto por meio de alteração no decreto de programação, de forma a liberar os recursos financeiros para fazer frente aos gastos já autorizados no Orçamento Geral da União ou a novos gastos viabilizados por meio de créditos adicionais. 2) Gastos com pessoal: Os limites para o gasto com pessoal da União e dos entes subnacionais são definidos pela Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). Tal lei explicita não apenas os limites para o ente, como também sub-limites para os Poderes. As despesas totais com pessoal ativo e inativo da administração direta e indireta, inclusive fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, pagas com receitas correntes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não podem exceder a um percentual da respectiva receita corrente líquida. Dado o crescimento econômico observado nos últimos anos, esperar-se-ia uma queda na relação gasto com pessoal como proporção do PIB, o que viabilizaria uma redução da carga tributária. Entretanto, vários sindicatos de servidores públicos passaram a utilizar os limites legais como justificativa para pressionar por aumentos salariais significativos, de forma que parte do incremento na receita corrente foi convertida em aumento dos gastos com pessoal e encargos. Isso fica claramente demonstrado no Gráfico 2. Como dito, esperava-se uma queda da proporção dos gasto com pessoal em relação ao PIB. Entretanto, os dados mostram que, após 2004, esta proporção está se elevando. 3

Gráfico 2: Gasto com Pessoal (% PIB) 5,00% 4,90% 4,80% 4,70% 4,60% 4,50% 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Portanto, a política de gastos é pró-cíclica, isto é, ela aumenta com o aumento da arrecadação. O rito de crescimento do dispêndio é descrito em detalhes na parte final do artigo. 3. Dados As argumentações e exemplos já seriam suficientes para clarificar nossa idéia de que o aumento da arrecadação governamental tem como conseqüência uma elevação das despesas do setor público. Contudo, daremos um passo adiante e faremos uma análise econométrica com base nas seguintes variáveis: 1) Receita Primária (RECPIB): compreende a receita total líquida de transferências a estados e municípios acumulada 12 meses em relação ao PIB; 2) Despesa Primária Total (DESPIB): compreende a despesa total do governo central acumulada 12 meses em relação ao PIB. As variáveis têm periodicidade mensal e compreendem o período entre Janeiro/1999 e Novembro/2007. O início do período foi escolhido pois marca o estabelecimento de metas de superávit primário para o setor público consolidado. As variáveis acumuladas 12 meses como proporção do PIB eliminam a necessidade de ajuste sazonal dado que tal sazonalidade se dissipa na acumulação das séries. A conversão das séries em relação ao PIB é importante pois o PIB age como uma variável macroeconômica de controle. A idéia é que mudanças autônomas nos gastos, por exemplo, poderiam conduzir a alterações no PIB que indiretamente conduziriam a um possível equilíbrio orçamentário via ajustes na receita. Em segundo lugar, os dados correspondem ao resultado fiscal do Governo Central (Governo Federal, Banco Central, e INSS), e não o setor público consolidado. Em terceiro lugar, os dados são referentes às receitas e despesas primárias. Optamos por esta abordagem em razão de a parcela dos pagamentos referentes aos juros ser embasada em uma decisão exógena de taxa de juros 4

que independe das decisões da autoridade fiscal. Além disso, o superávit primário do governo central não está inexoravelmente associado ao pagamento de juros, como poderia se imaginar. Do ponto de vista contábil, se há um acréscimo no saldo do caixa único da União, há uma redução em percentual idêntico na dívida líquida do setor público porque este saldo é abatido da dívida bruta para efeito deste cálculo. Mas na prática, esse saldo não pode ser utilizado, em sua totalidade, no pagamento do serviço da dívida, uma vez que está vinculado legalmente a outros gastos. De fato, há uma parte da conta única do Tesouro exclusivamente destinada ao pagamento da dívida pública federal, costumeiramente chamada de colchão de liquidez. Desta forma, parte do serviço da dívida é agregada ao principal, isto é, parte significativa dos juros é paga com emissão de novos títulos de dívida. 4. Análise Empírica A análise empírica é baseada na análise econométrica de cointegração. Esta metodologia busca evidenciar uma relação de equilíbrio entre variáveis econômicas ao longo do tempo. A idéia é que, embora as variáveis possam apresentar desvios em suas trajetórias de curto prazo, em virtude de choques que eventualmente acometem a economia, uma vez dissipados os efeitos de tais choques, estas variáveis convergem para um comportamento padrão sincronizado de longo prazo. Este comportamento sincronizado ao longo do tempo é mostrado no Gráfico 1. Nota-se a estreita relação no comportamento temporal da receita e despesa governamentais. Gráfico 1 Receita e Despesa como % do PIB 21 20 19 18 17 16 15 14 13 1999M01 1999M08 2000M03 2000M10 2001M05 2001M12 2002M07 2003M02 2003M09 2004M04 2004M11 2005M06 2006M01 2006M08 2007M03 2007M10 Despesa Primária (% PIB) Receita Primária (% PIB) Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional 5

A equação abaixo mostra esta relação de cointegração. Nota-se que o coeficiente da receita apresenta sinal esperado no vetor de cointegração e estatisticamente igual a 1. Isso significa que as duas variáveis possuem uma forte relação de longo prazo, ainda que haja desvios de trajetória de curto prazo. Esta relação também está explicitada na parte superior da Tabela 2. Despesa + β*receita + Constante = 0 Despesa - 0,96*Receita + 1,45 = 0 Despesa = 0,96*Receita -1,45 Tabela 2: Vetor de Cointegração e Modelo de Correção de Erros Vetor de Cointegração CointEq1 DESPPIB(-1) 1.000 RECPIB(-1) -0.962 (0.085) [-11.244] C 1.452 Modelo de Correção de Erros D(DESPPIB) D(RECPIB) CointEq1-0.075 0.048 (0.023) (0.032) [-3.190] [ 1.491] C 0.023 0.038 (0.008) (0.012) [ 2.682] [ 3.184] Desvio Padrão em ( ) & Estatística t em [ ] Dada esta estreita relação de longo prazo entre receita e despesa, o próximo passo é verificar como se corrigem eventuais erros de percurso no curto prazo. O intuito é verificar qual variável se ajusta (dado um choque no sistema) para garantir o equilíbrio de longo prazo já detectado. Esta parte da metodologia é denominada Modelo de Correção de Erros e os resultados estão na parte inferior da Tabela 2. Nota-se que a despesa primária é a variável de ajuste que garante a relação de equilíbrio de longo prazo com a receita total, isto é, o coeficiente de ajuste da despesa é estatisticamente significante (Teste t = -3.91). Isso significa que, em termos econométricos, a receita é classificada como variável exógena e a despesa é a variável endógena do sistema. 6

Podemos exemplificar o processo da seguinte maneira: Suponha um aumento de 5% na receita governamental. Dado este aumento, a despesa do governo também se eleva gradativamente em 5%, garantindo ao equilíbrio de longo prazo das variáveis. Isso significa que, elevações de receita do governo são necessariamente acompanhadas de elevações nos gastos públicos, ou seja, o comportamento fiscal do governo é do tipo arrecadar e gastar. Se isso é verdade, justifica-se a hipótese de que uma eventual queda da carga tributária faria com que o governo fosse forçado a controlar seus gastos. A evidência empírica detectada acima pode ser observada por intermédio da estatística denominada Decomposição da Variância dos Erros de Previsão. Este cálculo fornece informações sobre a importância relativa de uma perturbação em afetar as variáveis de um sistema. A parte superior da Tabela 3 mostra a decomposição da variância da receita. Como observado, os choques na própria receita são os principais responsáveis pela variabilidade da mesma. A parte inferior da Tabela 3 mostra a decomposição da variância da despesa. Nota-se que 40% da variabilidade da despesa é explicada pela receita. Em outras palavras, a despesa não explica a evolução da receita, que é explicada primordialmente por si própria (97%). Por outro lado, a receita explica cerca de 40% da evolução da despesa, isto é, como mostrado anteriormente, parte significante da variabilidade da despesa é simplesmente em conseqüência de elevações de receita governamental. Tabela 3: Decomposição da Variância Decomposição da Variância da Receita Período Erro Padrão Despesa Receita 1 0.124 0.000 100.000 2 0.173 0.060 99.939 5 0.261 0.603 99.396 10 0.349 2.120 97.879 12 0.376 2.787 97.212 Decomposição da Variância da Despesa Período Erro Padrão Despesa Receita 1 0.091 94.703 5.296 2 0.125 92.122 7.877 5 0.190 82.749 17.250 10 0.261 66.923 33.076 12 0.286 61.542 38.457 Ordenamento de Cholesky: Receita Despesa 7

5. O rito de crescimento das despesas da União 1. O Governo envia um Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) ao Congresso Nacional; 2. Via de regra, o Congresso Nacional estima um excesso de arrecadação em relação à projeção que consta do PLOA; 3. Despesas adicionais são vinculadas a esse excesso de arrecadação; 4. Aprovada a lei orçamentária anual (LOA), o Governo Federal edita decreto de programação financeira, mas limita os gastos com despesas adicionais a sua estimativa de receita; 5. À medida que a receita torna-se efetiva (dito de outra forma, na medida em que a receita verificada aproxima-se da estimada LOA), o decreto de programação é alterado de forma a contemplar: i) aquelas despesas adicionais que foram incluídas durante a tramitação do PLOA no Congresso; ou ii) novas despesas que o Governo Federal considerar prioritárias e que irão substituir parcela das despesas incluídas pelo Congresso, utilizando as fontes de recursos a elas associadas. Os pontos i e ii são demonstrados na Tabela 1, que mostra um crescimento das despesas (R$ 13,9 bilhões) em montante praticamente idêntico ao crescimento das receitas (R$ 13,8 bilhões). Tabela 1: Receitas e Despesas do Governo Central (R$ bilhões) Descrição Decreto 6439 22/4/2008 Decreto 6468 30/5/2008 Variação RECEITA LÍQUIDA TOTAL 565,0 578,8 13,80 DESPESAS 316,0 329,9 13,90 Pessoal e Encargos Sociais 126,9 134,4 7,50 Outras Correntes e de Capital 189,2 195,4 6,20 Contribuição ao FGTS 2,3 2,2 (0,10) Não Discricionárias 70,6 72,4 1,80 Discricionárias 116,3 120,8 4,50 Benefícios da Previdência 200,4 200,1 (0,30) 6. Isso corrobora nossos testes econométricos de que um crescimento de receita leva a mais crescimento de despesa de forma automática. A Tabela 2 fortalece ainda mais nosso argumento, 8

mostrando que as despesas como proporção do PIB crescem à medida que as receitas como proporção do PIB também crescem. Tabela 2: Resultado Fiscal do Governo Central (% PIB) Descrição 2005 2006 2007 RECEITA LÍQUIDA TOTAL 18,84% 19,32% 20,06% DESPESA TOTAL 16,38% 17,22% 17,80% Pessoal e Encargos Sociais 4,30% 4,52% 4,55% Benefícios Previdenciários 6,80% 7,10% 7,24% Custeio e Capital 5,18% 5,50% 5,91% Despesa do FAT 0,55% 0,66% 0,72% Abono e Seguro Desemprego 0,53% 0,63% 0,70% Demais Despesas do FAT 0,03% 0,03% 0,03% Subsídios e Subvenções Econômicas 0,48% 0,41% 0,39% Operações Oficiais de Crédito 0,41% 0,32% 0,30% Despesas com Subvenções aos Fundos Regionais 0,07% 0,09% 0,09% Benefícios Assistenciais (LOAS e RMV) 0,43% 0,50% 0,55% Outras Despesas de Custeio e Capital 3,71% 3,93% 4,24% 6. Conclusão Em suma, este trabalho mostra que a arrecadação crescente do governo leva a um ciclo vicioso de crescimento dos gastos governamentais. Para chegarmos a tal conclusão, fornecemos uma análise contextual do problema assim como uma análise econométrica. Ambos os canais de explicação deixam claro que uma forma de controlar os gastos governamentais seria a contenção do aumento da carga tributária do governo. Este processo passa, necessariamente, por uma reforma tributária ampla que defina um teto para a carga tributária e mecanismos de redução da mesma a médio e longo prazos. 9