Cadernos WGT: Representação

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Transcrição:

Proposta Interacionista para a Prática de Revisão de Texto Rute Rosa Abstract: The goal of this paper is to discuss the role of representations in text revision in order to present an interactionist proposal for text revision practice. It introduces a resource tool that includes the main assumptions of Sociodiscursive Interactionism (ISD), contributions from major Cognitive Psychology s models of writing revision as well as the concept of standard discursive, which has been developed in our previous research. Introdução Esta contribuição visa apresentar uma síntese parcial da Tese de Mestrado em Consultoria e Revisão Linguística (Rosa, 2015) trabalho de investigação a ser desenvolvido no Doutoramento em Linguística do Texto e do Discurso financiado pela FCT desde janeiro de 2016 (PD/BD/113974/2015), sob a orientação de Maria Antónia Coutinho e coorientação de Matilde Gonçalves. Esta proposta foi desenvolvida, tendo em conta a falta de instrumentos de recurso para a prática de revisão de texto como atividade profissional que abordem os aspetos contextuais e pragmáticos dos textos, bem como os aspetos relacionados com a diversidade dos géneros textuais. Neste sentido, apresentamos uma proposta interacionista para a prática de revisão de texto, através da descrição de um instrumento de recurso, no qual procuramos evidenciar, por um lado, os contributos do Interacionismo Sociodiscursivo (Bronckart, [1997] 1999) para a prática de revisão de texto e, por outro, a aplicabilidade da noção de padrão discursivo (Rosa, 2015) nesta mesma prática, assim como na análise e distinção dos géneros textuais. Tendo em conta o tema deste WGT (Workshop em Gramática & Texto), esta contribuição estará focada no papel das representações mobilizadas nas diferentes etapas do processo de revisão de texto. Quadro Teórico e Epistemológico do Interacionismo Sociodiscursivo Tendo como ponto de partida o quadro teórico e epistemológico do Interacionismo Sociodiscursivo, nesta abordagem interacionista do processo de revisão, damos especial atenção à relação entre linguagem e conhecimento, aos instrumentos de análise deste quadro (o modelo da ação de linguagem e o modelo da arquitetura textual), bem como às noções de géneros de texto, tipos de discurso e plano de texto (Bronckart, [1997] 1999; 2001). Além disso, tendo em conta que o facto de alguns géneros textuais serem tendencialmente constituídos por tipos de discurso específicos nos permitir questionar se esta ocorrência não nos possibilita, em parte, a identificação de um género, integramos nesta proposta a noção de padrão discursivo. Partindo do pressuposto de que, em determinados géneros textuais, a ocorrência, a organização dos tipos de discurso tendem a obedecer padrão específico, o padrão discursivo corresponde à organização, articulação e emergência dos tipos de discurso ao nível do plano de texto (Rosa, 2015). Instrumento de Recurso para a Prática de Revisão de Texto Para demonstrar o contributo desta proposta, apresentamos um instrumento de recurso para a prática de revisão de texto (cf. Anexo A). Este instrumento integra os pressupostos do Interacionismo Sociodiscursivo, os elementos convergentes 55

dos modelos descritivos do processo de revisão da escrita (Aleixo, 2006), conhecimentos adquiridos nos seminários que integraram a componente letiva do mestrado e a noção de padrão discursivo. Neste instrumento de recurso, são descritas, na primeira coluna do lado esquerdo, as etapas que integram o processo de revisão, seguindo-se a coluna que enumera os procedimentos do revisor associados a cada etapa de revisão; na terceira coluna, são descritos os conhecimentos e representações mobilizados; a quarta coluna diz respeito aos recursos cognitivos que interagem e asseguram os procedimentos ao longo de todo o processo de revisão de texto: a memória a longo prazo, na qual estão armazenados os conhecimentos e representações prévias e a memória de trabalho, na qual estão armazenados conhecimentos recentes e temporários. A partir deste instrumento, verificamos que, nas diferentes etapas do processo de revisão, são mobilizadas diferentes tipos de representações (cf. Anexo A). Na primeira etapa, definição de tarefa, são mobilizadas as representações que o revisor possui em relação à tarefa de revisão, que, por sua vez, integram as representações que o revisor tem do contexto físico da tarefa de revisão (representação de si mesmo como revisor, representação do destinatário, do lugar e do tempo previsto para a realização da tarefa) e as representações do contexto sócio-subjetivo da tarefa de revisão (lugar social do revisor e da sua atividade, posição social do cliente em relação ao revisor e as finalidades da tarefa de revisão). Nesta primeira etapa, são também mobilizadas as representações do contexto de produção do texto a ser revisto, ou seja, representações do produtor do texto, do lugar e do momento em que foi produzido, bem como do papel social do autor do texto e do lugar social em que foi produzido. Por outro lado, são mobilizadas representações do contexto de receção do texto, nomeadamente do destinatário, da finalidade, do lugar e do momento em que o texto será recebido. Na segunda etapa do processo de revisão, na avaliação do texto, para além dos conhecimentos linguísticos, são mobilizados os conhecimentos que o revisor tem dos modelos de géneros de texto. O conhecimento que o revisor possui de diferentes géneros de texto, assim como as representações do contexto de produção e receção do texto irão permitir-lhe avaliar a adequabilidade do género selecionado. Neste sentido, são também mobilizadas as representações dos contextos de uso do género. Porém, o reconhecimento do género só é possível porque os textos possuem características relativamente estáveis que indiciam a sua identidade genérica. Assim, nesta etapa, são também mobilizadas representações dos parâmetros genéricos 1 dos textos a ser revistos. A partir das representações dos parâmetros genéricos, o revisor possui um determinado horizonte de expetativas 2 em relação ao que pode ou não ocorrer no texto. Deste modo, são mobilizadas as representações das caraterísticas estruturais do género e, mais especificamente, as representações dos tipos de discurso como planos da enunciação selecionados de acordo com o género. Além disso, é mobilizada a representação do plano de texto associado ao género e da organização e emergência dos tipos de discurso no plano, ou seja, a representação do padrão discursivo. Contudo, a regularidade ou irregularidade do padrão discursivo, isto é, o padrão de organização e emergência dos tipos de discurso ao nível do plano de texto, irá depender da maior ou menor estabilidade do género. 1 As noções de parâmetros de género e mecanismos de realização textual e a sua distinção foram propostas e desenvolvidas em Coutinho et al. (2005). 2 A expressão horizonte de expetativas foi difundida por Hans Robert Jauss nas décadas de 70 e 80. 56

Nesta perspetiva, na revisão de um texto de um género mais estabilizado pelo uso e pelas convenções sociais, as representações da sua constituição discursiva tenderão a ser mais estáveis, permitindo que o revisor detete com mais facilidade alguma ocorrência que não seja expetável no género. A terceira etapa do processo de revisão diz respeito à seleção de estratégias. Nesta etapa, são mobilizados conhecimentos linguísticos específicos, bem como representações de problemas e de estratégias adequadas à sua resolução. Na última etapa, na execução, são mobilizados os conhecimentos linguísticos necessários às modificações efetuadas e, posteriormente, o revisor, depois da releitura do texto, efetua dois tipos de comparação: compara a representação do texto inicial com a representação do texto idealizado e com o texto revisto (produto final do processo), assim como compara o exemplar de género (texto revisto) com a representação do modelo de género. Contributo para a Revisão de Texto Para dar conta da aplicabilidade deste instrumento, comparámos oito textos de dois géneros académicos artigo científico e recensão crítica de duas áreas científicas Linguística e Sociologia. Com esta proposta, demonstramos que o revisor não poderá avaliar de forma adequada um texto se tiver como único critério a correção gramatical e ortográfica, ou seja, é fundamental que sejam tidos em conta as características e funções diferenciadas dos géneros. Neste trabalho verificámos que, apesar de serem textos de diferentes áreas científicas, os textos do mesmo género têm uma estrutura semelhante, mas com algumas oscilações na forma de apresentação que se devem às convenções das áreas científicas e das revistas responsáveis pela publicação, ou seja, é também fundamental que o revisor tenha em conta as convenções das áreas científicas e das revistas responsáveis pela publicação dos textos e a unicidade de cada texto. Por outro lado, constatamos que os textos do mesmo género estão associados a parâmetros do contexto de produção e receção de ordem social relativamente estáveis. Neste sentido, são relevantes as representações dos parâmetros do contexto em que foram produzidos os textos, porque é a partir destas representações que o revisor poderá avaliar a adequabilidade do género ao seu contexto de produção e receção. Deste modo, também são relevantes as representações dos contextos de uso dos géneros e das suas caraterísticas estruturais. Contudo, como já referimos, o revisor só reconhece o texto a ser revisto como sendo um exemplar do género, porque este apresenta características estruturais relativamente estáveis. Contudo, o revisor não identifica o género através da ocorrência isolada dos tipos de discurso, nem avalia isoladamente o plano de texto e os tipos de discurso que este envolve, mas avalia o padrão discursivo, ou seja, a forma como os tipos de discurso se organizam, emergem e articulam na globalidade do texto e se é esta é adequada ao género e às suas características estruturais. Neste sentido, são também relevantes as representações dos tipos de discurso, como planos de enunciação selecionados de acordo com o género. Tendo em conta que os géneros artigo científico e recensão crítica estão associados a um plano de texto convencional, espera-se que estes apresentem um padrão discursivo mais estável e, consequentemente, que o revisor reconheça com mais facilidade eventuais irregularidades na emergência dos tipos de discurso. Análise exemplificativa Para demonstrar a aplicabilidade desta noção no âmbito da revisão de texto e o seu contributo na distinção dos géneros textuais, fizemos uma análise do padrão 57

discursivo dos oito textos (quatro de cada género) que integra os seguintes elementos: os segmentos textuais que fazem parte do peritexto e do corpo do texto; a forma como o conteúdo temático se organiza e como é regulado pelo plano de texto; os tipos de discurso que ocorrem nas diferentes partes que integram o texto, assim como o papel que desempenham (principal ou secundário); os lugares de emergência do discurso teórico e do discurso interativo; a modalidade de articulação de cada um dos tipos de discurso (fusão e/ou encaixe). A partir desta análise, constatámos que a emergência, organização e articulação do discurso teórico e do discurso interativo são reguladas por planos de texto distintos. Nos textos do género artigo científico, o discurso interativo emerge, predominantemente, de forma delimitada (encaixe), nos momentos-chave do plano de texto. Quanto aos textos do género recensão crítica, o discurso interativo emerge de forma menos regular, esporádica e não delimitada (fusão), na introdução e no desenvolvimento, como estratégia pontual de orientação e envolvimento do destinatário na descrição efetuada. Por outro lado, o discurso interativo emerge de forma mais marcada e delimitada nos últimos parágrafos dos textos, ou seja, no momento do plano em que o autor apresenta a sua perspetiva e apreciação da obra recenseada. Contudo, em duas recensões críticas, verificamos que o facto de o discurso interativo não emergir de forma marcada no momento final do plano faz com que as perspetivas dos autores e a sua apreciação crítica não tenham a relevância que seria expetável em textos deste género. Isto permite-nos questionar em que medida é que os desvios a esse padrão podem comprometer a função do género e, consequentemente, a comunicabilidade do texto e, por outro lado, discutir se este é um aspeto que deva ser tido em conta na prática de revisão de texto. Considerações finais Na síntese apresentada, procurámos demonstrar que, no processo de revisão, são mobilizadas diferentes tipos de representações, nomeadamente as representações do contexto (físico, social e subjetivo) da tarefa de revisão, as representações do contexto de produção e receção dos textos a serem revistos, bem como as representações de problemas e de estratégias adequadas à sua resolução. Além disso, tendo em conta que o padrão discursivo corresponde à forma como se articulam, organizam e emergem os tipos de discurso ao nível do plano de texto, constatámos que também são relevantes as representações dos modelos de géneros, dos seus contextos de uso e das suas caraterísticas estruturais e, mais especificamente, as representações dos tipos de discurso como planos da enunciação selecionados de acordo com o género. Por outro lado, a partir dos resultados apresentados, consideramos que, apesar de os tipos de discurso não permitirem totalmente a identificação genérica de um texto, a análise da forma como se organizam, articulam e emergem na sua globalidade permite perspetivar alguma identidade discursiva e distinguir os géneros mais estabilizados. No âmbito da revisão de texto, a análise do padrão discursivo permite avaliar se a constituição e organização discursiva dos textos são adequadas ao género e às suas caraterísticas estruturais. Referências Aleixo, C. A. (2006) Processos de revisão. Construir a vez e a voz da escrita. In A. Conceição. A Vez e a Voz da Escrita. Lisboa: DGIDC, pp. 73-96 Bronckart, J.-P. ([1997]1999) Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Raquel Machado. São Paulo: EDUC Bronckart, J.-P. (2001) Langage et representations. In J.-F. Dortier (ed.). Le langage. 58

Nature, histoire et usage. Auxerre: Sciences Humaines Editions, pp. 303-308. Disponível em: <http://fapsesrvnt2.unige.ch/fapse/didlang.ns f/pubpublications/5be8f2c63aeb7fe2412 56CEF0049CBC1/$FILE/Bronckart-2001- Langage-représ.pdf> Coutinho, M. Gonçalves, M. Alves, F. Miranda, Florencia & R. Pinto, Rosalice. (2005) Parâmetros de género e mecanismos de realização textual: aspetos teóricos. Comunicação integrada no Simpósio O interacionismo sociodiscursivo em construção: desafios e posicionamentos, 15.º. In: PLA (Intercâmbio de Pesquisas em Linguística Aplicada). PUC- SP São Paulo / Brasil, maio de 2005 Rosa, R. (2015) Proposta Interacionista para a Prática de Revisão de Texto. Dissertação de Mestrado em Consultoria e Revisão Linguística. Universidade Nova de Lisboa Anexo A 59

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