VALIDAÇÃO DO SCORE DE ALVARADO NO DIAGNÓSTICO DE APENDICITE AGUDA EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO HOSPITAL DE BRAGA



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ARTIGO ORIGINAL Acta Med Port 2011; 24(S2): 583-588 VALIDAÇÃO DO SCORE DE ALVARADO NO DIAGNÓSTICO DE APENDICITE AGUDA EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO HOSPITAL DE BRAGA Jean-Pierre GONÇALVES, Arnaldo CERQUEIRA, Sofia MARTINS R E S U M O Introdução: A apendicite aguda (AA) é a principal causa de cirurgia abdominal urgente em idade pediátrica. O diagnóstico é essencialmente clínico, mas têm sido desenvolvidas metodologias no sentido de evitar laparotomias não terapêuticas (15-30%), como é exemplo o score de Alvarado (SA). SA 5 ou 6 é compatível com AA, havendo indicação para o doente permanecer em observação, se 7 a laparotomia pode estar indicada. Objectivo: Validar o SA para o diagnóstico de AA em crianças admitidas no Hospital de Braga (HB). Métodos: Estudo de validação de método de diagnóstico (SA) para AA, tendo como gold standard o exame histológico. A população estudada consistiu de 192 crianças (4-17 anos) com dor abdominal e submetidos a apendicectomia, no período de Dezembro de 2008 a Julho de 2010. Determinou-se os valores da sensibilidade (S), especificidade (E), valor preditivo positivo (VPP), valor preditivo negativo (VPN), likelihood ratio (LR) e as curvas ROC (receiver operating characteristic) para os pontos de corte (SA=5, 6 e 7). Resultados: Verificou-se que à medida que diminui o ponto de corte aumenta progressivamente as sensibilidades e os VPN e diminui as especificidades e os VPP. Assumindo o ponto de corte o valor de cinco, apenas 18 crianças seriam falsos negativos, ao invés das 67 crianças caso o ponto de corte fosse 7 pontos. A análise das curvas ROC demonstra uma maior área abaixo da curva (area under the ROC curve (AUC)) para o ponto de corte igual ou superior a 5 (AUC=70%). Discussão: Recomendamos utilizar como ponto de corte o valor do SA 5, uma vez que apenas 18 crianças com AA seriam inicialmente classificadas como apendicite improvável, valor este que aumentaria para os 67 doentes para o valor do SA 7. O SA poderá ter a sua aplicabilidade na triagem dos doentes com dor abdominal, contudo todos os métodos de diagnóstico são complementares, devendo a decisão do diagnóstico em última estância resultar do acompanhamento clínico e reavaliação sistemática dos doentes. J.P.G., A.C., S.M.: Serviço de Pediatria. Hospital de Braga. Braga. Portugal S U M M A R Y The Alvarado score validation in diagnosing acute appendicitis in children at Braga Hospital Introduction: Acute appendicitis (AA) is the leading cause of emergency abdominal surgery in children. The diagnosis is essentially clinical, but some methodologies, such as Alvarado score (AS), have been developed in order to avoid non-therapeutic laparotomy (15-30%). AS 5 or 6 is compatible with AA and is an indication for the patient to remain on observations, if AS 7 a laparotomy procedure may be indicated. Objective: To validate the AS for the AA diagnosis of children admitted at Braga Hospital. Methods: A validation study of diagnostic method (AS) using the histological examination as a gold standard. The study population consisted of 192 children (4-17 years) 583 www.actamedicaportuguesa.com

with abdominal pain that underwent appendectomy in the last 20 months (December 2008 to July 2010). It was determined the values of sensitivity (S), specificity (Sp), positive predictive value (PPV), negative predictive value (NPV), likelihood ratio (LR) and the ROC curve for three different cut-off points (SA =5, 6 and 7). Results: We found that as the cut-off point of AS decreases progressively the sensitivity and specificity increases and reduces the VPN and VPP. Assuming a cut-off value of 5, only 18 children would be false negatives, instead of the 67 children if the cut-off point was 7 points. The analysis of ROC curves demonstrated a greater area under the curve for a cut-off equal to or greater than 5 (AUC = 70%). Discussion: We recommend using a cut-off value of 5 points, since only 18 children with AA were initially classified as appendicitis unlikely, this value would increase to 67 patients for the SA value of 7. The AS is a valuable tool in screening children with abdominal pain for the diagnosis of AA. Nonetheless the diagnosis and final decision must be based on clinical and systematic reassessment of patients. INTRODUÇÃO A apendicite aguda (AA) é a principal causa de cirurgia abdominal urgente em idade pediátrica 1, sendo mais comum no sexo masculino entre os 4 e 15 anos de idade 2. O risco de complicações associadas à AA é inversamente proporcional à idade pelo que o diagnóstico precoce, principalmente nos extremos etários, associa-se a uma acentuada diminuição da morbilidade e mortalidade 3. As complicações mais frequentemente associadas ao diagnóstico tardio de AA e mortalidade são a perfuração (30%) e os abcessos intraperitoniais (74%) 4. A mortalidade associada a AA precocemente diagnosticada é inferior a 1%, sendo este valor superior a 5% nos casos em que o diagnóstico é tardio 5. O diagnóstico da AA é essencialmente clínico 6-8, contudo têm sido investigados métodos de diagnóstico baseados na história clínica, exame físico e em exames complementares de diagnóstico 9. A necessidade de métodos de diagnóstico mais precisos resulta da importância de diminuir as complicações associadas ao diagnóstico tardio,a taxa de apendicectomias não terapêuticas (15-30%), os riscos cirúrgicos e encargos económicos desnecessários 3. Diversos estudos no âmbito da predição de AA recorrem a scores, como é exemplo o score de alvarado (SA) 10-13. O SA baseia-se em 3 sintomas, 3 sinais e 2 valores laboratoriais, num total de 10 pontos (quadro I). Um SA igual ou superior a 5 ou 6 pontos é compatível com AA havendo indicação para o doente permanecer em observação, se igual ou superior a 7 pontos a laparotomia pode estar indicada 14. O presente estudo teve como objectivo validar o SA para o diagnóstico de AA em crianças admitidas no Hospital de Braga (HB). POPULAÇÃO E MÉTODOS Estudo retrospectivo de validação de método de diagnóstico (SA) para AA, tendo como gold standard o exame histológico. Efectuado no Serviço de Pediatria do Hospital de Braga no período de Dezembro de 2008 a Julho de 2010 sendo a população elegível definida pelas crianças com idades compreendida entre os 4 e 17 anos observadas no Serviço de Urgência (SU) por dor abdominal e submetidos a apendicectomia. Foram avaliadas 192 crianças e realizada a análise retrospectiva dos processos clínicos e determinados os valores da sensibilidade (S), especificidade (E), valor preditivo positivo (VPP), valor preditivo negativo (VPN) e o likelihood ratio (LR). Para os pontos de corte (SA=5, 6 e 7) foram determinadas as curvas ROC. Excluíram-se os doentes nos quais não existiam informações para uma ou mais variáveis que compõem o SA. Os resultados foram analisados através do programa estatístico SPSS (versão 16.0) recorrendo-se aos testes do Qui-Quadrado, ANOVA e t-student. RESULTADOS Identificadas 192 crianças admitidas no SU por dor abdominal e subsequentemente submetidas a apendicectomia. Foram excluídos do estudo 46 casos por ausência de informação necessária para a determinação do SA. A população em estudo corresponde às 146 crianças admitidas no SU por dor abdominal, submetidas a apendicectomia e com informação para os diferentes parâmetros necessários para o cálculo do SA. Destas crianças 84 (58%) eram do sexo masculino, sendo a média de idade igual a 12,3±3,9 anos. A análise descritiva das crianças excluídas por ausência de informação para um ou mais parâmetros do SA foi idêntica ao grupo dos 146 www.actamedicaportuguesa.com 584

Fig. 1- Curvas ROC (receiver operating characteristic) para os pontos de corte SA 5, 6 e 7 seleccionados. O exame histológico dos apêndices removidos cirurgicamente revelou 123 apendicites agudas. Em termos descritivos 13 casos apresentavam alterações histológicas compatíveis com AA, 100 casos com AA supurada, 6 casos com AA supurada e perfurada, 2 casos com AA supurada e necrosada e 2 casos com AA supurada com peritonite localizada. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na avaliação da média do SA pelos diferentes tipos histológicos de AA (p=0,457). Em 23 crianças cirurgicamente intervencionadas não existia alterações histológicas compatíveis com AA representando portanto apendicectomias não terapêuticas. O diagnóstico de adenite mesentérica foi efectuado em apenas um dos casos. Esta criança apresentava 24h de evolução clínica, 12300/uL leucócicos (7600/uL neutrófilos) e um SA de 10 pontos. Determinou-se a sensibilidade, especificidade, VPP, VPN, LR e as curvas ROC considerando três pontos de corte para o SA (5, 6 e 7 pontos) (quadro II). Verificouse que à medida que diminui o ponto de corte aumenta progressivamente a sensibilidade e o VPN e diminui a especificidade e o VPP respectivos. Assumindo como ponto de corte o valor de 5 pontos, apenas 18 crianças seriam falsos negativos, ao invés das 67 crianças caso o ponto de corte fosse 7 pontos. A análise das curvas ROC demonstrou uma maior área abaixo da curva para o ponto de corte igual ou superior a 5 (AUC=70%) (figura 1). DISCUSSÃO O SA é um instrumento de predição de AA simples, barato, pouco invasivo e com alto valor na triagem de crianças com suspeita de AA. É importante diminuir os falsos negativos que representam a falha no diagnóstico dos doentes com AA, além de reduzir os falsos positivos para minimizar a taxa de laparotomias não terapêuticas. Os estudos de validação do SA em crianças são relativamente escassos 15-18 demonstrando que o score apresenta utilidade como método de triagem para referenciação hospitalar dos doentes com suspeita de AA 19. A utilização do ponto de corte de sete ou mais pontos apresentou uma especificidade de 87% e sensibilidade de 46% para o diagnóstico de AA. Valores de especificidade similares foram determinados em outros estudos 20. Contudo, nesses mesmos estudos valores de sensibilidade superior a 70 % foram apurados. O número elevado de falsos negativos (n=67) associado ao ponto de corte (SA 7), demonstrou que para esta população este ponto de corte é desajustado. Considerando o ponto de corte de seis ou mais pontos observou-se, tal como outros estudos 20, aumento da sensibilidade (71%) e 585 www.actamedicaportuguesa.com

Quadro 1 - Score de Alvarado Sintomas Sinais Exames Migração da dor 1 Anorexia 1 Náusea e/ou vómitos 1 Dor na FID 2 Dor à descompressão 1 Febre (T. axilar 37.5ºc) 1 Leucocitose ( 10000/uL) 2 Neutrofilia ( 7500/uL) 1 Total 10 FID: fossa ilíaca direita diminuição da especificidade (74%). Para o ponto de corte SA 5, observou-se uma sensibilidade de 85% e especificidade de 57%. Para o mesmo ponto de corte outros investigadores observaram a mesma tendência de aumento da sensibilidade e diminuição da especificidade, tendo Bond et al 16 determinado uma sensibilidade de 100% e especificidade de 38%. Na nossa perspectiva recomendamos como ponto de corte o valor do SA 5, uma vez que apenas 18 crianças Quadro 2 Validação do Score de Alvarado segundo diagnóstico de Apendicite Aguda confirmado pelo exame histológico Score de Alvarado Apendicite Aguda Sim Não n n IC 95% S=46% (37-54) E=87% (67-95) 7 56 3 VPP=95% (86-98) < 7 67 20 VPN=23% (15-33) LR=3,5 (1,5-6,2) S=71% (62-78) E=74% (53-87) 6 87 6 VPP=94% (87-97) < 6 36 17 VPN=32% (21-45) LR=2,7 (1,4-5,4) S=85% (78-91) E=57% (37-54) 5 105 10 VPP=91% (85-95) < 5 18 13 VPN=42% (26-59) LR=7,6 (2,9-19,9) S = sensibilidade; E = especificidade; VPP = valor preditivo positivo; VPN = valor preditivo negativo; LR = likelihood ratio. com AA seriam inicialmente classificadas como apendicite improvável, valor este que aumentaria para os 67 doentes para o valor do SA 7. Para SA 5, observamos que 91% dos doentes tinham AA, revelando um alto VPP. Um SA 5 é 7,6 vezes mais provável num indivíduo com AA (LR). Relativamente às curvas ROC observou-se maiorárea abaixo da curva para o SA=5, mostrando que este ponto de corte é o que confere maior acuidade para o diagnóstico de AA. O SA poderá ter a sua aplicabilidade na triagem dos doentes com dor abdominal, contudo todos os métodos de diagnóstico são complementares, devendo a decisão do diagnóstico resultar do acompanhamento clínico e reavaliação sistemática dos doentes pelo médico. Conflito de interesses: Os autores declaram não ter nenhum conflito de interesses relativamente ao presente artigo. Fontes de financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo. REFERÊNCIAS 1. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. Jul 2000;36(1):39-51. 2. HARTMAN GE: Acute appendicitis. In:Behrman N, editor. Textbook of pediatrics. 16th ed. Saunders 2000; 1178-81. 3. Benjamin IS, Patel AG. Managing acute appendicitis. BMJ. Sep 7 2002;325(7363):505-506. 4. Bratton SL, Haberkern CM, Waldhausen JH. Acute appendicitis risks of complications: age and Medicaid insurance. Pediatrics. Jul 2000;106(1 Pt 1):75-78. 5. LIU CD, MCFADDEN DW: Acute abdomen and appendix. In: Greenfield LJ, Mulholland MW, Oldham KT, et al., editors. Surgery: Scientific Principles and Practice. 2nd edition. Philadelphia: Lippincott, Williams & Wilkins. 1997:1246-1261. 6. Andersson RE, Hugander AP, Ghazi SH, et al. Diagnostic value of disease history, clinical presentation, and inflammatory parameters of appendicitis. World J Surg. Feb 1999;23(2):133-140. 7. Franke C, Bohner H, Yang Q, Ohmann C, Roher HD. Ultrasonography for diagnosis of acute appendicitis: results of a prospective multicenter trial. Acute Abdominal Pain Study Group. World J Surg. Feb 1999;23(2):141-146. 8. Oliak D, Sinow R, French S, Udani VM, Stamos MJ. Computed tomography scanning for the diagnosis of perforated appendicitis. Am Surg. Oct 1999;65(10):959-964. 9. Jones PF. Suspected acute appendicitis: trends in management over 30 years. Br J Surg. Dec 2001;88(12):1570-1577. 10. Bhatt M, Joseph L, Ducharme FM, Dougherty G, McGillivray D. Prospective validation of the pediatric appendicitis score in a Canadian pediatric emergency department. Acad Emerg Med. Jul 2009;16(7):591-596. 11. Abdeldaim Y, Mahmood S, Mc Avinchey D. The Alvarado score as a tool for diagnosis of acute appendicitis. Ir Med J. Jan 2007;100(1):342. 12. Khan I, ur Rehman A. Application of alvarado scoring system www.actamedicaportuguesa.com 586

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