INFLUÊNCIA DA LA NIÑA E DO EL NIÑO NA VARIABILIDADE DE PRECIPITAÇÃO EM LONDRINA, PR Luiz Gustavo Batista Ferreira 1, Paulo Henrique Caramori 2, Pablo Ricardo Nitsche 3, Angela Beatriz Ferreira da Costa 4 FERREIRA et al., 2017. Influência da La Niña e do El Niño na variabilidade de precipitação em Londrina, PR: Instituto - Área de Agrometeorologia, Boletim Técnico, 2017, 9p. RESUMO: O presente trabalho teve como objetivo estudar a variabilidade de precipitação em Londrina, PR, causada pelo fenômeno ENOS. Para tanto, foram escolhidos os anos de 1985 e 2011 nos quais se predominou a fase negativa do ENOS ou La Nina (LN) e também os anos de 1998 e 2015, séries que demonstram fase positiva do ENOS ou El Nino (EN) dentre as maiores intensidades da história. Os dados foram obtidos pelo Instituto das Águas do Paraná e pelo Instituto (IAPAR). A intensidade dos eventos foi determinada pelo índice ONI (Oceanic Nino Index). Verificou-se que anos de LN há predominância de chuvas mensais abaixo da média histórica enquanto em anos de EN, constataram-se desvios de precipitação positivos, isto é, chuvas mensais acima da média. Conclui-se que o fenômeno ENOS está diretamente associado com anomalias na precipitação em Londrina. PALAVRAS-CHAVE: Clima. Anomalias. Chuvas INFLUENCE OF LA NIÑA AND EL NIÑO IN PRECIPITATION VARIABILITY IN LONDRINA, PARANA STATE. ABSTRACT: This work studied the variability of precipitation in Londrina, PR, caused by the ENSO phenomenon. For that, the years of 1985 and 2011 were chosen, in which the negative phase of ENOS or La Nina (LN) was predominant, as well as the years of 1998 and 2015, which show a positive phase of ENOS or El Nino (EN) among the Greatest intensities in history. The data were obtained by the Parana State Water Institute and the Parana State Agronomic Institute (IAPAR). The intensity of the events was determined by the index ONI (Oceanic Nino Index). It was verified that NN years there is a predominance of monthly rainfall below the historical average while in years of EN, positive rainfall deviations were observed, that is, above average monthly rainfall. It was concluded that the ENSO phenomenon is directly associated with precipitation anomalies in Londrina. KEY-WORDS: Climate. Anomaly. Rainfall
INTRODUÇÃO O fenômeno ENOS é caracterizado pelo aquecimento ou resfriamento das águas do Pacífico Equatorial. A fase quente é denominada El Niño e a fase fria La Niña. Normalmente em anos de El Niño ocorrem chuvas acima da média na região Sul do Brasil, enquanto que em anos de La Niña há tendência de decréscimo das chuvas e invernos mais frios (MEDONÇA; OLIVEIRA, 2007). O ENOS caracteriza-se por alterações ou anomalias da temperatura da superfície do mar (TSM) na região do Pacífico Equatorial, próximo à costa Oeste da América do Sul (GRIMM; FERRAZ; GOMES, 1998). Na região Sul do Brasil, a fase quente (El Niño) está diretamente associada com o aumento da média de temperaturas e da altura de chuvas, com maiores riscos de enchentes, enquanto nas regiões Norte e Nordeste está associada com a diminuição das médias de chuvas, provocando severas estiagens (MARENGO; OLIVEIRA, 1998; DIAZ et al., 1998). O objetivo do presente trabalho foi estudar a variabilidade de precipitação em decorrência das fases positiva e negativa do ENOS nos anos de 1985, 1998, 2011 e 2015 no município de Londrina, PR. MATERIAL E MÉTODOS Os dados utilizados foram extraídos do Instituto das Águas do Paraná e do Instituto (IAPAR) para a estação meteorológica de Londrina. O índice ONI é utilizado para aferir a intensidade do evento de LN ou EN, classificando de fraco até muito forte, sendo calculado por meio de médias trimestrais móveis (DJF, JFM, etc) de anomalias da temperatura da superfície do mar (TSM) na região do Niño 3.4 (5 o N-5 o S, 120 o -170 o W, sobre o Pacífico Equatorial Tropical) (NOAA, 2017).
Figura 1: Índice ONI para definir a intensidade de EN ou LN. Adaptado de NOAA (2017) Os eventos de EN ou LN, de acordo com o índice ONI podem ser classificados como muito forte, forte, moderado e fraco, de acordo com a Figura 1. Quanto maior a diferença do ONI em relação a 0, maior será a intensidade de LN (diferença negativa) e EM (diferença positiva). O critério para classificar é baseado em um período que ultrapassou o limite crítico da TSM e não no valor médio. Quando a diferença da TSM em relação à média histórica é superior a 0,5 o C por pelo menos cinco trimestres móveis consecutivos caracteriza-se EN, enquanto que sendo inferior a 0,5 o C por pelo menos cinco trimestres móveis consecutivos caracteriza LN. Diferenças inferiores a ± 0,5 C correspondem à condição de neutralidade (N). Foram construídas tabelas de desvio de precipitação e um gráfico, com o auxílio do programa Excel, entre as médias mensais e as médias históricas de cada ano em estudo, estabelecendo as diferenças positivas ou negativas. A diferença é a chuva mensal (mm) menos a média histórica. Os valores positivos ou negativos associados com o índice ONI para mês é um forte indício de predomínio de El Nino ou La Nina. Índices abaixo de 0,5 foram considerados neutralidade ou neutro, de acordo com Noaa (2017).
RESULTADOS E DISCUSSÃO BOLETIM TÉCNICO A variabilidade na precipitação pode ser observada nas tabelas de 1 a 4. Tabela 1. Desvios de precipitação em relação à média histórica, no ano de 1985 (LN) em Londrina, PR. Mês Média histórica (mm) Chuva mensal (mm) Diferença (mm) Índice ONI Jan 216 69-147 - 0,9 Fev 188 98-90 - 0,7 Mar 137 194 57-0,7 Abr 112 258 146-0,7 Mai 112 120 8-0,7 Jun 95 26-69 - 0,6 Jul 76 21-55 - 0,4 Ago 49 2-47 - 0,4 Set 121 33-88 - 0,4 Out 145 80-65 - 0,3 Nov 169 110-59 - 0,2 Dez 207 46-161 - 0,3 Tabela 2. Desvios de precipitação em relação à média histórica, no ano de 1998 (EN) em Londrina, PR. Mês Média histórica (mm) Chuva mensal (mm) Diferença (mm) Índice ONI Jan 216 167-49 2.1 Fev 188 215 27 1.8 Mar 137 400 263 1.4 Abr 112 363 251 1.0 Mai 112 96-16 0,5 Jun 95 39-56 - 0,1 Jul 76 44-32 - 0,7 Ago 49 127 78-1,0 Set 121 298 177-1,2 Out 145 254 109-1,2 Nov 169 32-137 - 1,3 Dez 207 165-42 - 1,4
Tabela 3. Desvios de precipitação em relação à média histórica, no ano de 2011 (LN) em Londrina, PR. Mês Média histórica (mm) Chuva mensal (mm) Diferença (mm) Índice ONI Jan 216 178-38 - 1,3 Fev 188 139-49 - 1,0 Mar 137 140 3-0,7 Abr 112 42-71 - 0,5 Mai 112 3-109 - 0,4 Jun 95 89-7 - 0,3 Jul 76 24-52 - 0,3 Ago 49 23-26 - 0,6 Set 121 5-116 - 0,8 Out 145 281 136-0,9 Nov 169 159-10 - 1,0 Dez 207 59-148 - 1,0 Tabela 4. Desvios de precipitação em relação à média histórica, no ano de 2015 (EN) em Londrina, PR. Mês Média histórica (mm) Chuva mensal (mm) Diferença (mm) Índice ONI Jan 216 201-15 0,6 Fev 188 174-14 0,5 Mar 137 120-17 0,6 Abr 112 65-47 0,7 Mai 112 145 33 0,8 Jun 95 10-85 1,0 Jul 76 346 270 1,2 Ago 49 33-16 1,4 Set 121 202 81 1,7 Out 145 257 112 2,0 Nov 169 516 347 2,2 Dez 207 391 184 2,3 Índice ONI obtido do site http://www.cpc.ncep.noaa.gov/products/analysis_monitoring/ensostuff/ensoyears.shtml (NOAA, 2017). Dados de chuva mensal estão arredondados, de acordo com normas da ABNT. Dados de precipitação histórica e mensal disponibilizados pelo Instituto das Águas do Paraná e Instituto foram obtidos na estação meteorológica localizada no distrito municipal de São Luís, em Londrina, PR. A referida estação foi escolhida por apresentar todos os dados necessários para a realização do estudo desse boletim técnico.
400 LONDRINA 300 mm 200 100 0-100 1985 1998 2011 2015-200 JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ Figura 2: Desvios de precipitação em relação à média histórica nos anos de 1985 (LN), 1998 (EN), 2011 (LN) e 2015 (EN). Em 1985, apesar de ser considerado ano LN de fraca intensidade de acordo com o índice ONI, as médias mensais estiveram abaixo das médias históricas durante 9 meses, sendo que em janeiro e dezembro, as anomalias negativas nos desvios de precipitação em relação a média foram em torno de 150 mm. Nesse ano, apenas em abril as chuvas foram abundantes em Londrina. Em virtude das estiagens prolongadas, foi um dos piores anos agrícolas do estado do Paraná, lembrado até hoje por diversos servidores do IAPAR. É interessante notar que durante todo o ano de 1985, o índice ONI não ultrapassou o valor de um negativo, motivo pelo qual o Noaa considerou ano de LN de fraca intensidade, apesar dos expressivos desvios negativos de precipitação registrados. Isso sugere que a longa persistência do evento, mesmo sendo de fraca intensidade, é suficiente para provocar anomalias na precipitação (GLANDZ, 2001). Já em 1998 durante 6 meses, a precipitação esteve maior em relação a média histórica. Os meses de março e abril registraram desvio de precipitação positiva em torno de 250 mm e no mês de setembro cerca de 180 mm. Esses valores estão de acordo com Noaa (2017) que considerou o EN de 1998 como evento de intensidade muito forte. É
interessante observar no ano de 1998, que o índice ONI decresce gradativamente até se tornar negativo no mês de julho. Mesmo assim, os meses de agosto, setembro e outubro apresentaram desvios de precipitação positivos, o que provavelmente está associada com efeito residual de um EN de intensidade muito forte. O expressivo desvio negativo observado no mês de novembro pode estar associado à ocorrência de veranicos consecutivos. Ferreira (2017) observou que no mês de novembro, a região Oeste do Paraná está mais sujeita a ocorrência de estiagens. Com isso, é evidente que não apenas uma região, mas todo o estado está sujeito a intensos veranicos em novembro. Observa-se na Tabela 1 que, exceto nos meses de março e setembro, todos os meses de 2011 apresentam valores de chuvas mensais inferiores aos da média histórica, o que condiz com o esperado para ano de LN. Em contrapartida, a Tabela 2 demonstra que após o mês de junho, os demais (exceto agosto) apresentam valores de chuva mensal maiores em relação aos da média histórica com altas discrepâncias, sobretudo, nos meses de julho e novembro, meses que em condições de neutralidade apresentam médias mensais similares às médias históricas. Os valores de chuva mensal abaixo das médias históricas no primeiro quadrimestre do ano, provavelmente são explicados porque, nessa época do ano, o evento EN ainda não apresentava a intensidade suficiente para provocar anomalias nas médias mensais. Percebe-se, no entanto, que mesmo com forte intensidade de LN no ano de 2011 e EN em 2015 que as médias do mês de agosto foram inferiores que as médias históricas. Pereira et al. (2008) afirmaram que agosto é o mês com maiores riscos de veranicos durante o ano, o que explica os valores históricos e mensais de chuva determinado para o referido mês. Como mostra a Tabela 1, o índice ONI esteve negativo durante todo o ano de 2011, o que indica atuação considerada da LN. A constância negativa é um fator que também deve ser levado em consideração, pois, geralmente, quanto maior a persistência do evento climático maior é a intensidade do mesmo.
Mendonça e Oliveira (2007) afirmam que a intensidade dos eventos LN/EN tendem a aumentar a intensidade a partir de junho até dezembro. Essa suposição está de acordo com o encontrado nas Tabelas 1 e 2. Na Tabela 1, ano de LN, as maiores discrepâncias negativas se encontram após o mês de julho, de igual forma na Tabela 2, ano de EN, as maiores diferenças positivas entre as chuvas mensais e as médias históricas se dão após o mês de julho, ambas com exceção para o mês de agosto. Verificou-se que 31 dos 48 meses estudados, apresentam desvios de precipitação negativa o que sugere que outro evento do clima colabora com a LN. Um desses eventos é a Oscilação Decadal do Pacífico ODP. Assim como o ENOS, a ODP apresenta duas fases, a quente que tende a causar anomalias positivas na precipitação e a negativa, que tende a diminuir as mesmas, no entanto, sua persistência é de 10 a 40 anos, enquanto o ENOS é de meses ou no máximo anos (MANTUA e HARE, 2002). Para Ávila e Brito (2015) e Ferreira (2017), a fase negativa (fria) da ODP se iniciou no ano 2000, o que sugere que além da influencia da La Nina nesses desvios de precipitação abaixo das médias históricas, também há influencia da fase negativa da ODP, a qual, por ser longa, tem seus efeitos menos perceptíveis. CONCLUSÕES O fenômeno ENOS está intimamente relacionado com a variabilidade de precipitação no município de Londrina, PR. Apesar disso, nem todas as anomalias na precipitação podem ser explicados exclusivamente pelo fenômeno ENOS, pois há outros eventos do clima que também regulam o regime de chuvas.
REFERÊNCIAS CONSULTADAS BOLETIM TÉCNICO ÁVILA, P. L. R.; BRITO, J. I. B. Relação entre a Oscilação Decadal do Pacifico e a variabilidade de precipitação de Campina Grande, PB. Ciência e Natura, Santa Maria, v. 37 Ed. Especial SIC, 2015, p. 159-162, 2015 FERREIRA, L.G.B. Disponibilidade hídrica e produtividade de soja no Oeste do Paraná: Dissertação Mestrado em Agricultura Conservacionista, Instituto Agronômico do Paraná, Londrina, PR, 2017, 77p. DIAZ, A. F. et al. Relationships between precipitation anomalies in Uruguay and Southern Brazil and sea surface temperature in the Pacific and Atlantic Oceans. Journal of Climate, Boston, v.11, p.251-271, 1998. GLANDZ, M. H. Currents of change: impacts of El Niño and La Niña on climate and society. 2. ed. Cambridge: University, 252p., 2001. GRIMM, A.; FERRAZ, S. E. T.; GOMES, J. Precipitation anomalies in Southern Brazil associated with El Niño and La Niña events. Journal of Climate, Boston, v. 11, p. 2863-2880, 1998. MANTUA, N. J.; HARE, S. R. The pacific decadal oscillation. Journal of Oceanography, Tokyo, v.58, n.1, p.35-44, fev. 2002. MARENGO, J. A.; OLIVEIRA, G. S. Impactos do fenômeno La Niña no tempo e clima do Brasil: desenvolvimento e intensificação do La Niña 1998/1999. In: Congresso Brasileiro de Meteorologia, 10., 1998. Brasília, DF. Anais... Brasília: Sociedade Brasileira de Meteorologia, 1998. MENDONÇA, F.; OLIVEIRA, I. M. D. Climatologia: Noções básicas e climas do Brasil. São Paulo: Oficinas de Textos, 206 p., 2007. NATIONAL OCEANIC AND ATMOSPHERIC ADMINISTRATION NOAA: Index ONI: January 1950 to February 2017. Disponível em: http://www.cpc.ncep.noaa.gov/products/analysis_monitoring/ensostuff/ensoyears.shtml Acesso em 18 jul, 2017 PEREIRA, L. M. P. et al. Determinação do início e término da estação chuvosa no estado do Paraná. Revista Geografar. Curitiba, PR, v.3, n.2, p.01-12, jul./dez. 2008