A GESTÃO OPERACIONAL DA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR E A CONTRIBUIÇÃO DO ENFERMEIRO THE OPERATIONAL MANAGEMENT OF HOME CARE AND NURSING CONTRIBUTION

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Transcrição:

A GESTÃO OPERACIONAL DA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR E A CONTRIBUIÇÃO DO ENFERMEIRO THE OPERATIONAL MANAGEMENT OF HOME CARE AND NURSING CONTRIBUTION Antônio Aparecido Txiliski 73 Marcela Lima Cardoso Selow 74 RESUMO Introdução: o processo de envelhecimento populacional exige políticas que atendam à crescente demanda, desta forma, quando o paciente tem a possibilidade de ser tratado em casa, o mesmo adquire maior coniança e segurança. Objetivo:analisar a operacionalização da assistência domiciliar, assim como o papel do enfermeiro na gestão desse processo. Justiicativa: a pesquisa justiica-se pela necessidade de entendimento dessa nova modalidade em constante ascensão no mercado. Considerações inais: o cuidado domiciliar promove a assistência ao indivíduo de maneira humanizada, promovendo, dessa forma, maior conforto e bem-estar. O enfermeiro é visto como proissional indispensável para o bom funcionamento dessa modalidade, sendo o articulador da equipe de Enfermagem e responsável pela continuidade do cuidado. Palavras-chave: Cuidado domiciliar. Enfermagem domiciliar. Assistência domiciliar. SUMMARY Introduction: Population-aging process requires policies that address the growing demand in this way, when the patient has the possibility of being treated at home; it acquires greater conidence and security. Objective: to analyze the operation of home care, as well as the nurse s role in managing this process. Rationale: the re- 73 Aluno do Curso de Pós-Graduação em Gestão em Saúde- Faculdade Dom Bosco 74 Orientadora. Coordenadora dos Cursos de Pós-Graduação - Faculdade Dom Bosco 168 Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-168, jul/dez. 2016.

search is justiied by the need to understand this new modality constantly on the rise in the market. Final thoughts: home care promotes assistance to the individual in a humane manner, thus promoting greater comfort and well-being. he nurse is seen as indispensable professional for the proper functioning of this mode, and the articulator of the nursing team and responsible for continuity of care. Keywords: Household care. Nursing household. Household car. 1 INTRODUÇÃO O Brasil vem passando por uma transição epidemiológica, com um processo de envelhecimento populacional, que exige competências cientíicas e políticas que atendam a essa demanda e visem o envelhecimento ativo e saudável das pessoas, uma vez que as condições crônicas aumentam signiicativamente, e o grau de dependência desses portadores também (ALVAREZ; GONÇALVES, 2012). Quando o paciente tem a possibilidade de ser atendido em seu local de convívio, ele adquire mais segurança e coniança, trazendo assim, maior satisfação ao cliente tratado (FERREIRA; CANAVEZ, 2010). Frente a isso, esta pesquisa justiica-se pela necessidade de entendimento acerca da gestão e funcionamento da assistência domiciliar, sendo esse tipo de assistência uma nova e emergente modalidade de cuidado disponível no mercado. O objetivo deste trabalho é analisar a operacionalização da assistência domiciliar, assim como o papel do enfermeiro na gestão deste processo. 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Trata-se de uma revisão bibliográica, realizada em bases de dados disponíveis na internet. As bases de dados acessadas foram: SciELO Scientiic Electronic Library Online, BDENF Base de Dados de Enfermagem, BVS Biblioteca Virtual em Saúde e Google Acadêmico. Foram utilizados os descritores cadastrados no sistema Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), adotados pela BIREME. Os descritores utilizados foram: Enfermagem domiciliar, assistência domiciliar e serviços de cuidados domiciliares. Os estudos foram selecionados de acordo com os seguintes critérios de inclusão: relevância sobre o tema proposto, idioma português, estudos que permitissem a leitura na íntegra e publicados entre 2007 e 2015. Segundo Hermann et al. (2014), o domicílio é o local privado de cada in- Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016. 169

divíduo, onde a pessoa se sente acolhida e estabelece relações, assim, o cuidado domiciliar é desenvolvido no ambiente do paciente e seus hábitos, crenças e valores devem ser respeitados no momento do cuidado. Os autores referenciados ainda ressaltam que o contato com o paciente no domicílio permite o estabelecimento de vínculos e o desenvolvimento de um cuidado humanizado e integral, porém, diversas ocasiões exigem adaptações dos proissionais, como condições estruturais e de recursos materiais. Sendo assim, a concepção de atenção domiciliar ideal é a de uma prática que visa atender ao indivíduo e à família de forma integral e contextualizada, promovendo uma integração entre os proissionais de saúde para realizar o cuidado de acordo com as necessidades do cliente, promovendo ações de saúde com foco na coletividade e desenvolvendo o potencial resolutivo de cada família (KERBER et al., 2008). Os mesmos autores airmam que o modelo de atenção domiciliar foi trazido como medida alternativa ao modelo hospitalocêntrico, sendo assim uma estratégia que pode ajudar tanto a população carente de atenção à saúde reconhecendo o domicílio como um espaço de cuidado, quanto as instituições públicas de saúde que têm a possibilidade de expandir seus serviços além do ambiente hospitalar. Devido às mudanças estruturais nas famílias atualmente, existe uma escassez de membros que assumam a função de cuidador, levando as famílias que possuem recursos inanceiros a contratar alguém para prestar o cuidado ao seu familiar fragilizado, dessa forma, a questão do cuidador proissional tornou-se uma solução encontrada pelo mercado (ALVAREZ; GONÇALVES, 2012). Como parte do processo da assistência domiciliar, Ferreira e Canavez (2010) ressaltam que a visita domiciliar objetiva avaliar as necessidades do cliente e de seus familiares no ambiente onde vivem, estabelecer um plano assistencial de acordo com as condições do serviço e orientar as pessoas responsáveis pela continuidade do cuidado, enquanto que o atendimento domiciliar compreende as atividades exercidas por proissionais de saúde na residência do cliente na execução procedimentos mais complexos e orientações aos responsáveis. De acordo com Ferreira e Canavez (2010, p. 819): As vantagens da AD: evitar internações e suas consequências; diminuir o tempo de internação. Manter o paciente em seu habitat e no convívio com os seus. Dividir a responsabilidade dos cuidados do paciente com a família. Suprir a diiculdade de locomoção do paciente. Otimizar leitos e recursos hospitalares. Minimizar o estresse e o des- 170 Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016.

gaste familiar. A assistência domiciliária melhora a qualidade de vida do paciente e de seus familiares. Silva et al. (2012) evidenciam que especialmente no setor privado, o cuidado domiciliar tem gerado grande visibilidade e as operadoras que organizam esses serviços dividem o cuidado domiciliar em três modalidades aim de responder às necessidades especíicas dos usuários, sendo as principais: cuidados prolongados no domicílio, atenção provisória no domicílio e intenso uso de tecnologias e de cuidados. Os autores referenciados anteriormente airmam que a modalidade de cuidados prolongados no domicílio é relacionada geralmente, nas situações de agravos crônicos, em que o paciente apresente várias internações ou descompensações. Assim, para esses casos, utilizam-se escores de classiicação a partir da avaliação da capacidade funcional e do histórico de gastos hospitalares e, a partir desses escores, são deinidos os números de visitas pelos proissionais. De acordo com Silva et al. (2012), a modalidade de atenção provisória no domicílio é caracterizada pela prestação de serviços por um curto período de tempo, geralmente, em situações agudas ou de adaptação do usuário e família e, por im, na modalidade de intenso uso de tecnologias e de cuidados há retaguarda assistencial da equipe de Enfermagem durante todo o dia e o enfermeiro atua como coordenador do plano de cuidados. Segundo Cunha e Morais (2007), a assistência domiciliar privada é fundamentada nos princípios da Atenção Gerenciada, sendo esse um modelo de gestão que introduz as regras do mercado nos serviços prestados e que tem como norteadores a lógica da competitividade e a lógica da redução de custos. A Atenção Gerenciada possui um conjunto de princípios que enfocam a padronização de serviços, a regulação entre pacientes e proissionais, a eiciência administrativa nos serviços e a atuação proissional deinida conforme parâmetros da empresa e focados na redução de custos (CUNHA; MORAIS, 2007). Cunha e Morais (2007) airmam que as empresas privadas de assistência domiciliar em saúde oferecem diversos serviços e entre eles estão o internamento domiciliar, o monitoramento de casos, os serviços de urgência e emergência e a assistência em grandes eventos. Os autores citados anteriormente explicam que o internamento domiciliar é caracterizado pela disposição de equipamentos hospitalares e permanência do auxiliar de Enfermagem no domicílio, sob supervisão médica e do enfermeiro. Já o serviço de monitoramento de casos destina-se à assistência de pessoas com doenças crônicas, com histórico de recorrentes internamentos e normalmente realiza-se por intermédio de visitas domiciliares prestadas por proissionais Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016. 171

de Enfermagem. Os serviços de urgência e emergência, por sua vez, são realizados por médicos e proissionais de Enfermagem e podem se destinar ao atendimento de diversos tipos de clientes, e, por im, a assistência em grandes eventos depende dos tipos de contratos estabelecidos pelas empresas demandantes. Ainda que possa haver variações em casos particulares, os protocolos de atendimento são padronizados (CUNHA; MORAIS, 2007). Os mesmos autores airmam que, assim, semanalmente ocorrem no máximo, duas ou três visitas médicas e de Enfermagem para os casos mais graves, uma ou duas visitas médicas e uma de Enfermagem para os casos de média complexidade e, para os casos de baixa complexidade as visitas podem ser semanas ou quinzenais. Os plantões dos auxiliares de Enfermagem podem variar entre 4 e 24 horas, sendo que os plantões de 24 horas são destinados aos casos de alta complexidade, os de 12 horas aos de média complexidade e os de 6 ou 4 horas aos de baixa complexidade (CUNHA; MORAIS, 2007). Dessa forma, Cunha e Morais (2007) constatam que nas empresas de assistência domiciliar privada existem dois grupos de trabalhadores, denominados de quadro ixo e quadro lutuante. O quadro ixo é referente aos trabalhadores que pertencem a um quadro mínimo de proissionais regulares que permanecem na empresa independente da demanda de clientes, e o quadro lutuante é referente ao grupo de proissionais convocados conforme a demanda, prestando serviços como autônomos. Essas empresas de assistência domiciliar devem levar em conta o custo dos processos para a contratação e manutenção de bons proissionais, destacando ainda, que a assistência domiciliar conta com uma alta rotatividade de internação/ alta de pacientes, onde os proissionais podem icar inativos enquanto aguardam serem escalados para um novo cliente (SCHUTZ et al., 2007). Apesar de o ramo das empresas de cuidado domiciliar estar em alta no mercado, alguns pacientes não possuem um suporte social para contratar serviços de cuidados domiciliares particulares, abrindo assim, um espaço para a rede informal de trabalho, desenvolvida por cuidadores leigos ou familiares dos pacientes (PR- ZENYCZKA; LACERDA, 2009). De acordo com as autoras, os cuidadores leigos não possuem conhecimento para a realização de certas atividades, como administração de medicamentos, cuidados com sonda vesical de demora e cistosmia, podendo acarretar prejuízos para a saúde do paciente. Segundo Przenyczka e Lacerda (2009), a Lei do Exercício Proissional impõe limites para a prática dos cuidadores, proíbe a prática para os não habilitados, mas não estipula penas para os que não respeitam os limites da prática e também, não é clara quanto aos limites do ensino do cuidado que o enfermeiro pratica. Frente a isso, tem-se hoje, no Brasil, a assistência domiciliar no sistema público, que conta 172 Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016.

com o Programa Melhor em Casa, lançado pelo Ministério da Saúde em 2011, sendo que a assistência domiciliar pública tem caráter substitutivo ou complementar à intervenção hospitalar e possui um plano assistencial de natureza multidisciplinar, o que requer um dimensionamento de pessoal eiciente para prestar uma assistência de qualidade (VILLAS BOAS; SHIMIZU, 2015). De acordo com Villas Boas e Shimizu (2015), os procedimentos de Enfermagem são os que permitem uma melhor mensuração do tempo por serem mais especíicos e parametrizados que os procedimentos dos demais proissionais, sendo o procedimento de realização de curativos por úlceras por pressão, os que demandam mais tempo dos proissionais. Segundo os autores citados anteriormente, entre os demais proissionais, o isioterapeuta realiza maior número de procedimentos quando comparado ao nutricionista e ao médico, uma vez que esse proissional despende de tempo signiicativo para a avaliação das condições do domicílio. Villas Boas e Shimizu (2015) airmam que o tempo necessário para a primeira consulta de todos os proissionais é superior ao tempo nas demais consultas, devido ao desconhecimento inicial do quadro do paciente. Segundo Kerber et al. (2008), o desenvolvimento das práticas de saúde domiciliar gera qualidade de vida à população e permite o trabalho multidisciplinar e integrado, sendo que esse desenvolvimento pode ser feito pelo sistema de saúde local de cada município, de forma a inserir a atenção domiciliária como parte de suas ações de saúde. Os proissionais que atuam em domicílio precisam ter conhecimento sobre o processo de adoecimento do paciente e destreza para a realização de procedimentos, devendo ainda, demonstrar paciência, empatia e carisma para garantir uma boa comunicação com o paciente e familiares (HERMANN et al., 2014). Algumas dessas diiculdades encontradas em administrar uma empresa de home care, chamam a atenção de Schutz et al. (2007) quanto à necessidade do enfermeiro gestor em aprimorar os conhecimentos de administração e economia, a im de buscar uma maior valorização do cuidado individualizado prestado na assistência domiciliar. Hermann et al. (2014) evidenciam que para desenvolver os atributos essenciais para o cuidado domiciliar, os enfermeiros devem adquirir conhecimentos especíicos na área, através de especializações, atualizações, estudos de caso, artigos e referenciais teóricos, aliados à prática e a troca de experiências entre proissionais. Ferreira e Canavez (2010) airmam que há necessidade de orientar os clientes e familiares que atuarão no cuidado, sendo a ação do enfermeiro associada à participação familiar essencial para a promoção do conforto e bem-estar do paciente. O Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016. 173

enfermeiro assume o papel de educador, sendo responsável pelo ensino dos cuidados que cabem aos cuidadores leigos, podendo ser responsabilizado caso ocorra algum dano ao paciente ou ao próprio cuidador (PRZENYCZKA; LACERDA, 2009). A inserção da Enfermagem no cuidado domiciliar reduz os custos e promove qualidade no atendimento prestado, expressados na criação de vínculo e garantia de continuidade da assistência (SILVA et al., 2012). Schutz et al. (2007) relatam que a Enfermagem deve pensar o quanto custa o seu trabalho para a empresa e o quanto ele vale em preço, uma vez que o negócio da categoria é o cuidado e que tem inúmeras tarefas diárias sob a sua responsabilidade. Os enfermeiros que orientam a equipe de Enfermagem na assistência domiciliar devem estimular a formação de um peril para a realização desse tipo de serviço, que inclui: capacidade de adaptação, criatividade, saber estabelecer limites para o seu trabalho, ser sensível, ter iniciativa para os casos de emergência, saber trabalhar em equipe multiproissional, ter comunicação efetiva e ter noções básicas de administração e gestão de pessoas (SCHUTZ et al., 2007). Segundo Valle e Andrade (2015), o enfermeiro que atua na assistência domiciliar deve ser dotado de determinadas habilidades e atitudes. Os autores elencaram as principais habilidades, sendo elas: de gestão, de planejamento, de comunicação, de avaliação e de incentivação. Valle e Andrade (2015) airmam que a habilidade de gestão engloba o trabalho em equipe multidisciplinar com um objetivo em comum, em que o enfermeiro deve utilizar os princípios da administração participativa, realizando assim, a supervisão do cuidado prestado pela equipe de Enfermagem, reconhecendo seu papel de líder a im de garantir a qualidade da assistência prestada. De acordo com os mesmos autores, a habilidade de planejamento se refere à capacidade do enfermeiro em desenvolver ações e protocolos que visem a proteção e promoção à saúde nos níveis individual e coletivo. A habilidade de comunicação se expressa pela capacidade de transmitir mensagens claras e concisas, além de entender o seu cliente com sensibilidade. A habilidade de avaliação diz respeito à percepção dos resultados obtidos através das ações adotadas durante o processo e, por im, a habilidade de incentivação que é caracterizada pela capacidade de inluenciar, positivamente, os indivíduos para a participação nas ações propostas. Segundo Santos et al. (2011), um dos objetivos da atenção domiciliar é o desenvolvimento da autonomia do paciente e, para que isso se torne possível princípios éticos devem ser seguidos pelos proissionais, sendo eles: beneicência, justiça, não maleicência e autonomia. Os autores referenciados reletem sobre alguns desses princípios éticos, como a beneicência como justiicativa para a internação domi- 174 Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016.

ciliar, em que esse tipo de cuidado promove uma maior qualidade de vida para o cliente e para a família devido ao risco reduzido de contrair infecções. Santos et al. (2011) ressaltam ainda que se deve analisar se a família possui suporte para desenvolver o cuidado que seria feito por um proissional, respeitando-se assim, o princípio da não maleicência. Quanto ao princípio da justiça, os autores airmam que embora as instituições hospitalares visem a rotatividade dos leitos e a redução de custos, o internamento domiciliar traz inúmeros benefícios aos pacientes que aderem a essa modalidade de cuidado, trazendo benefícios, tanto para as instituições hospitalares, quanto para o paciente e, em relação ao princípio da autonomia, o paciente quando tratado em sua casa passa a ocupar uma posição na estrutura familiar e tem a possibilidade de praticar o autocuidado. A dimensão das atitudes está relacionada ao comportamento do enfermeiro nas diversas situações no cotidiano proissional, baseada em valores éticos a serem seguidos e se destacam entre essas atitudes: a liderança, a responsabilidade, a empatia e a iniciativa (VALLE; ANDRADE, 2015). Na atenção domiciliar observa-se um grande uso das tecnologias leves, caracterizado pelo desenvolvimento das relações humanas, o que proporciona uma fonte de educação permanente e se torna o diferencial dessa modalidade de assistência (VILLAS BOAS; SHIMIZU, 2015). Sendo assim, é necessário analisar sob a ótica dos princípios éticos a qualidade da assistência prestada no cuidado domiciliar, de modo que esse tipo de cuidado traga benefícios para todas as partes envolvidas, onde o proissional deve estabelecer vínculo com o paciente e possuir lexibilidade para se adequar as situações cotidianas do domicílio (SANTOS et al., 2011). 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da pesquisa realizada, constata-se que o atendimento no domicílio é uma modalidade de cuidado em constante crescimento no mercado. Essa modalidade permite ao indivíduo manter seu tratamento no seu espaço de convívio e próximo aos seus familiares, tornando a assistência mais individualizada e humanizada. Assim, tanto no setor público quanto no setor privado, existem proissionais capacitados para exercer a prestação dos cuidados, podendo ser de diversas áreas da saúde, de acordo com a necessidade do cliente. No setor privado, as empresas prestadoras de cuidados domiciliares utilizam o princípio da atenção gerenciada, que se foca na padronização de processos e redução de custos. Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-175, jul/dez. 2016. 175

Frente a isso, o enfermeiro é visto como proissional indispensável para que todo o processo ocorra de maneira efetiva, sendo esse o proissional que assume a função de educador, através das orientações constantes aos cuidadores, devendo ser dotado de habilidades e princípios éticos a serem seguidos. Quanto ao seu papel na gestão operacional da assistência domiciliar, o enfermeiro assume a função de gerenciamento da equipe técnica e planejamento de cuidados, além de estabelecer vínculo com o indivíduo e familiares, garantindo dessa forma, a continuidade da assistência. REFERÊNCIAS ALVAREZ, A, M.; GONÇALVES, L.H.T. Enfermagem e o cuidado ao idoso no domicílio. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 65, n.5, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s0034-71672012000500001. Acesso em: 02 dez. 2015. CUNHA, M.A.O.; MORAIS, H.M.M. A assistência domiciliar privada em saúde e suas estratégias (aparentes e ocultas). Revista Ciência & Saúde Coletiva, v. 12, n. 6 2007. Disponível em:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s1413-81232007000600026. Acesso em: 22 dez. 2015. FERREIRA, J.M.; CANAVEZ, M.F. Assistência domiciliar: um estudo relexivo. Revista de Pesquisa: cuidado é fundamenta Online, v.2, n.2, 2010. Disponível em: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/380/pdf_30. Acesso em: 01 dez. 2015. HERMANN, A.P. et al. Especiicidades do cuidado domiciliar apreendidas no processo de formação do proissional enfermeiro. Revista Mineira de Enfermagem, v. 18, n.3, 2014. Disponível em: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/945. Acesso em: 20 dez. 2015. KERBER, N.P. et al. Considerações sobre a atenção domiciliária e suas aproximações com o mundo de trabalho na saúde. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.24, n.3, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0102311x2008000300002&script=s ci_arttext. Acesso em: 01 dez. 2015. PRZENYCZKA, R.A.; LACERDA, M.R. Dilemas éticos no ensino do cuidado domiciliar de Enfermagem. Revista Ciência, Cuidado e Saúde, v. 8, n. 4, 2009. Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/cienccuidsaude/article/view/6564/5399 Acesso em: 22 dez. 2015. SANTOS, L.R.et al. Princípios éticos como norteadores no cuidado domiciliar. Revista Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, n.1, 2011. Disponível em:http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s 141381232011000700017&script=sci_arttext. Acesso em: 20 dez. 2015. SCHUTZ, V.et al. Como administrar cuidados domiciliares Custo e preço na Enfermagem. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem, v. 11, n. 2, 2007. Disponível em:http://www.scielo.br/pdf/ean/v11n2/v11n2a27.pdf. Acesso em: 20 dez. 2015. SILVA, K.L.et al. Serviços de atenção domiciliar na saúde suplementar e a inserção da Enfermagem em Belo Horizonte/MG. Acta Paulista de Enfermagem, v.25, n.3 2012. Disponível em:http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s010321002012000300014&script=sci_arttext. Acesso em: 01 dez. 2015. 176 Revista Dom Acadêmico, Curitiba, v.1, n.1, p.89-183, jul/dez. 2016.

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