A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO CAMPONÊS E A INDÚSTRIA FUMAGEIRA NO CULTIVO DO TABACO: O CASO DO DISTRITO DE GUAMIRIM IRATI

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Transcrição:

139 A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO CAMPONÊS E A INDÚSTRIA FUMAGEIRA NO CULTIVO DO TABACO: O CASO DO DISTRITO DE GUAMIRIM IRATI Introdução RUVINSKI, Anderson Antonio O cultivo do tabaco é uma atividade agrícola desenvolvida principalmente em pequenas propriedades rurais, onde a base para a sua produção é o trabalho familiar, e estes, assim como, a produção de tabaco, se encontram dentro de um sistema produtivo com uma dinâmica bem complexa. Mesmo ocupando uma pequena área dentro da unidade de produção, o cultivo de tabaco ocupa a maior parte do tempo dos agricultores para o manejo e tratos culturais, pois uma grande quantidade de mão de obra, de insumos químicos e de agrotóxicos são necessários durante o ciclo produtivo. O tabaco é uma planta nativa da região central da América (ALMEIDA, 2005, p.32), que ganhou espaço no território brasileiro e hoje é amplamente cultivada em grande parte das pequenas propriedades rurais. Segundo Almeida (2005, p.37). A cultura do tabaco fixou-se na região Sul do país, em regiões de topografia acidentada, concentrando-se em pequenas propriedades rurais: a área média das propriedades dos fumicultores é de 17,9 ha, sendo, normalmente, apenas 2,5 ha utilizados para o cultivo de fumo. Inicialmente o tabaco era cultivado no território brasileiro ao longo do litoral por índios, sobretudo tupi-guaranis que tiveram contato com a planta em suas migrações pela América (DESER, 2003). Desta forma, aborda Pinheiro e Luz (1998) apud Almeida (2005, p.33) onde: Desde o fim do período colonial até o início do século XX, o fumo produzido no litoral do Nordeste, na Bahia e em Pernambuco, passa a ser cultivado em Minas Gerais, Goiás, São Paulo e, principalmente, no Paraná, Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Em 1903, o imigrante português Albino Souza Cruz funda no Rio de Janeiro/RJ sua fábrica de cigarros, posteriormente transferida para Santa Cruz do Sul/RS, onde se consolida junto aos imigrantes europeus instalados em pequenas colônias, de áreas reduzidas situadas nas encostas gaúchas, movidas pelo trabalho familiar. Tendo em vista entender a dinâmica estabelecida em torno da produção de tabaco em pequenas unidades de produção, assim como, as relações entre os camponeses e a indústria do tabaco, se faz necessário compreendermos alguns elementos que possibilitem o entendimento da complexidade estabelecida no processo de produção do tabaco e as relações socioespaciais traçadas. Objetivo A finalidade deste trabalho é compreender a relação entre a produção camponesa e a indústria capitalista, para subsidiar posteriores análises a respeito das condições de trabalho na fumicultura e propor alternativas.

140 Metodologia Este trabalho caracteriza-se em uma análise descritiva, baseando-se na realidade de propriedades rurais de camponeses produtores de tabaco, localizados no interior do município de Irati-PR, no distrito de Guamirim. Trata-se de discutir as relações traçadas entre os camponeses e a indústria fumageira, bem como, a precarização do trabalho oriunda dessa relação no campo. Para a realização do trabalho faremos levantamento bibliográfico, assim como, aquisição de dados em instituições de pesquisas, dando suporte e embasamento teórico/bibliográfico nas discussões abordadas no trabalho. Realizaremos trabalhos de campo, e entrevista aos agricultores para entendermos as relações existentes no processo de produção de tabaco entre os camponeses e a indústria. Resultados Preliminares e Discussões No campo, em meio às atividades camponesas, permeia um processo produtivo que necessita por parte dos camponeses uma grande mão de obra do início ao fim do ciclo produtivo do cultivo, mas que em período de colheita e secagem a mão de obra é dobrada. Na produção do tabaco, tomou-se como base uma unidade de produção com cerca de 12 alqueires de terra, pertencente a uma família camponesa a mais de 50 anos, onde aproximadamente 30 anos é cultivado o tabaco em uma área de 2,0 hectares. Vale resaltar que a cadeia produtiva do tabaco envolve cerca de 2 milhões e 200 mil pessoas, e que, na safra 2013/2014, foram 162.410 famílias produtoras de tabaco somente na região sul do Brasil, que destinaram à produção do tabaco uma área equivalente a 323.700 hectares, (AFUBRA, 2015), e que de forma considerável, interfere na dinâmica da agricultura familiar camponesa. Considerando-se que no Brasil, a se seguir tendência observada nos últimos anos, a fronteira agrícola do fumo em expansão deve continuar a crescer, a destoca de mata nativa e a substituição da cobertura natural por plantas exóticas deve também aumentar, alterando profundamente a paisagem, o clima e mesmo a biodiversidade característica do território onde se instala a cadeia produtiva do fumo (ALMEIDA, 2005, p.72). Desta forma, como observado e relatado pelos agricultores, o cultivo do tabaco esteve presente nas atividades agrícolas da propriedade familiar por um longo período de tempo, cerca de 30 anos. Até hoje é uma atividade bastante desenvolvida, visto que os agricultores se adaptaram ao cultivo do fumo e hoje não utilizam mais de técnicas para alavancar outros cultivos, tendo apenas além do tabaco, cultivos para a subsistência, encontrando dificuldades de deixar de produzir o tabaco, devido a acomodação no sistema em que a produção do tabaco se encontra. I Sobre as etapas produtivas do tabaco. Para a produção do tabaco são necessárias algumas etapas, que vão desde a compra de insumos e germinação da semente até a colheita da folha e venda da produção. Desta forma, o primeiro passo a ser desenvolvido para se cultivar o tabaco é o contrato com a indústria fumageira. Neste contrato constará o que o agricultor deve desenvolver, suas obrigações e responsabilidades no processo produtivo do tabaco. Assim sendo, o contrato é o norteador do processo produtivo, ao mesmo tempo que, é a forma que a indústria encontra de prender o agricultor, com a responsabilidade do compromisso assumido. É no momento da assinatura do contrato que se faz todo o levantamento de insumos necessários para a safra do

141 tabaco, onde um técnico da indústria se responsabiliza em fazer esta previsão de insumos, assim como, uma estimativa de produção. Este técnico que durante o processo produtivo vai prestar assistência técnica ao agricultor, servirá de ponte entre o agricultor e a indústria, sempre, defendendo a postura e os interesses da indústria, orientando o uso de insumos e seguindo as orientações vindas da indústria. Com o contrato assinado, a indústria fornece ao agricultor os insumos, (materiais para o viveiro de mudas, as sementes, os adubos, agrotóxicos, EPIs,) ou seja, tudo o que o agricultor precisa para o cultivo do tabaco, exceto mão de obra e terras, que são de responsabilidade do agricultor. Tais insumos são fornecidos no pré-safra, e são colocados como dívida que o agricultor passa a ter com a indústria, que deve ser quitada no pós-safra, quando ocorre a venda do tabaco. Contudo, o agricultor entra no processo de produção do tabaco, fornecendo a terra para a produção, a mão de obra e, os insumos, visto que estes devem ser quitados ao final da safra, e a indústria somente fornece assistência técnica e garantia de compra do produto a um preço defasado e inferior ao valor real do produto, visto que a indústria processa e agrega valor ao tabaco. Na unidade de produção analisada, o contrato é assinado nos meses de maio ou junho, quando está ocorrendo o final da safra do tabaco, onde a indústria já se garante para que no ano seguinte o agricultor continue cultivando o tabaco. Já em julho e/ou agosto, o viveiro é preparado e iniciado. Em agosto e setembro já com as mudas quase prontas para o transplante ocorre o preparo da terra, com a definição das leras (morros) e adubação. Com isso concluído ocorre o transplante das mudas, cerca de 50 mil mudas. Inicia-se então o manejo e tratos culturais do tabaco na lavoura, sendo utilizado nesta fase até o início da colheita uma grande quantidade de insumos químicos, principalmente adubos e agrotóxicos. Nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março ocorre a colheita e secagem das folhas de tabaco, é nesse período que os agricultores tem a maior sobrecarga de trabalho, pois passam o dia colhendo o fumo na lavoura e levando aos secadores (estufas de secagem) e à noite passam secando o fumo, pois a cada uma hora aproximadamente, é necessário abastecer o secador com lenha, mantendo o fogo no forno ao qual fornece calor e mantém a estufa quente, secando o fumo. Na fumicultura, o trabalho e os meios materiais de produção, em vez de se organizarem pela razão do cálculo aquisitivo capitalista, requisitam longas jornadas que avançam à noite, em pelo menos 3 a 4 meses do ciclo anual da cultura, período em que culminam a colheita, cura e secagem das folhas (LIMA, 2007). No período entre uma colheita e outra os agricultores familiares desenvolvem atividades com cultivos para a subsistência, aqueles destinados ao consumo e não a venda, bem como, com os animais, isto não somente entre as colheitas, mas durante todo o ano. Porém, ainda entre dezembro e março, quando está ocorrendo a fase da colheita os agricultores iniciam a fase de classificação do tabaco, onde é separado por classes para garantir uma melhor venda do produto. Esta fase inicia em dezembro, porém é mais intensa nos meses de março, abril e maio. De forma geral, vemos que o processo de produção do tabaco ocupa grande parte do tempo nas atividades desenvolvidas na propriedade, sendo que, a depender da fase de produção, se exige mão de obra mais intensa, ocorrendo a precarização do trabalho no campo, limitando os agricultores de desenvolver outras atividades, e na maioria das vezes degradando a saúde do agricultor e a terra que é de sua propriedade. II A relações entre a indústria e o camponês.

142 No sistema capitalista de produção ocorrem diversas relações entre a indústria e o trabalhador, e aqui abordando especificamente, as relações entre a indústria fumageira e o camponês, Oliveira (2007, p.36) com base em interpretações de Marx destaca que no sistema de produção capitalista os trabalhadores devem estar no mercado livres dos meios de produção, mas proprietários de sua força de trabalho, para vendê-la ao capitalista; este sim, proprietário dos meios de produção. Porém, no sistema de produção do tabaco a realidade difere um tanto da comumente encontrada no sistema de produção capitalista, pois o trabalhador, sendo aqui o camponês, não detém apenas a força de trabalho, mas também os meios de produção do tabaco. Desta forma, a indústria fumageira extrai uma renda sobre a força de trabalho do camponês dedicada na produção do fumo, sobre a terra que é de propriedade do camponês e é destinada para o cultivo e, sobre os insumos que de fato a indústria não fornece ao camponês, pois o camponês tem o compromisso de quitar a dívida gerada pelo fornecimento de insumos por parte da indústria. Desta forma, o camponês compra os insumos da indústria para quitá-los no pós-safra, além é claro de lucrar sobre o produto final do tabaco, visto que a indústria processa e agrega valor ao tabaco. Observamos assim, que no sistema de produção capitalista fumageiro, onde o camponês entra com a força de trabalho sem receber o salário, fornece os meios de produção, principalmente a terra e não recebe por ela. Compra os insumos e não recebe por isso. Então ocorre um processo de exploração dos camponeses pela indústria, que fornece apenas assistência técnica e uma a garantia de compra da produção, e depois de agregar valor ao produto e vende-lo não divide o dinheiro com o agricultor, que fica sempre no prejuízo. Esta relação entre a indústria fumageira e o camponês é uma relação, nitidamente observada, de exploração, pois como Oliveira (2007, p.36) coloca, a relação social capitalista é uma relação baseada na liberdade e na igualdade, pois somente pessoas livres e iguais podem realizar um contrato, e como analisamos, não existe nenhuma igualdade neste sistema onde se encontra o camponês produtor de tabaco. O contrato que a indústria cria com o camponês proprietário da terra, não abrange sobre a terra, somente abrange o compromisso com a produção do camponês, ainda segundo Oliveira (2007, p.36) o contrato assinado deve ser um contrato de compra e venda da força de trabalho, e mesmo assim, a indústria do tabaco lucra descaradamente, encima, além da força de trabalho, da terra e dos insumos utilizados na produção do tabaco. Considerações Finais É importante observar que no processo produtivo do tabaco são traçados elementos importantes, onde os agricultores familiares camponeses proprietários de uma pequena área de terra não possuem à sua disposição um sistema de mercado, para cultivos alternativos ao tabaco. Desta forma, os agricultores são limitados a cultivar o tabaco, que mesmo trazendo um grande risco a saúde e os demais problemas a cerca de sua produção, principalmente a exploração por parte da indústria, é nesta dinâmica de relações que se insere a família camponesa produtora de tabaco. Referências Bibliográficas AFUBRA. Associação dos Fumicultores do Brasil, Cadeia Produtiva do Tabaco. Disponível em: <http://www.afubra.com.br/index.php/conteudo/show/id/71>. Acessado em 12 de novembro de 2015. ALMEIDA, Guilherme Eidt Gonçalves de. Fumo: servidão moderna e violação dos direitos humanos. Curitiba: Terra de Direitos, 2005. 168p.

143 DESER. Contexto Rural Revista do Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais. Curitiba: Gráfica Popular, a. III, n. 04, dez. 2003. LIMA, R. G. de. Desenvolvimento e relações de trabalho na fumicultura sul-brasileira. Sociologias, Porto Alegre, 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/soc/n18/n18a10.pdf>. Acessado em 13 de novembro de 2015. OLIVEIRA, A. U. Modo de Produção Capitalista, Agricultura e Reforma Agrária. São Paulo: Labur edições, 2007. 184p.