PO 27: Etnomatemática: esboço histórico e sua relação com a educação de jovens e adultos

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Transcrição:

PO 27: Etnomatemática: esboço histórico e sua relação com a educação de jovens e adultos Maria Isabel da Costa Pereira UFRN bel.bellook.isabel@gmail.com Francisco de Assis Bandeira UFRN fabandeira56@gmail.com RESUMO O presente artigo está vinculado à linha de pesquisa: História, Filosofia e Sociologia da Ciência no Ensino de Ciências Naturais e da Matemática (PPGECNM/UFRN) Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática - CCET UFRN/Natal. Este é um programa de Mestrado Educacional, que busca a reflexão a partir da prática profissional convergindo com o seu objeto de estudo na pós-graduação. (SILVA; NORONHA; ARAÚJO, 2012, p. 10). Assim, este trabalho é um recorte da nossa dissertação em andamento que tem como objetivo inter-relacionar a Etnomatemática nas concepções d ambrosianas, aos conhecimentos matemáticos utilizados pelos alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) em suas profissões, para em seguida, dialogá-los com os conhecimentos matemáticos escolares por meio da resolução de problemas. Nosso campo de pesquisa é uma turma de alunos regularmente matriculados na modalidade de Ensino da EJA de uma escola Municipal da cidade do Natal/RN, a saber, a Escola Municipal Professor Ulisses de Góis, situada na Rua Padre Raimundo Brasil, s/n, Bairro de Nova Descoberta, Natal/RN. Escolhemos a Etnomatemática, como fundamentação teórica, por se tratar de um programa que busca entender os conhecimentos matemáticos produzidos e/ou manuseados por um determinado grupo sociocultural específico, além de dialogar com o mundo social mais amplo. Para alcançar esse objetivo, se faz necessário uma coleta de dados, que será realizada por meio de questionários semi-estruturados, a fim de conhecer as características social, cultural e profissional de cada aluno, além de conhecimentos matemáticos pré-estabelecidos para desempenhar sua profissão, assim como motivos que os fizeram desistir de estudar e retornar a sala de aula após um determinado tempo, elucidando todos os motivos de abandono e retorno aos estudos. Para nortear o alcance desse objetivo, iniciaremos nossa pesquisa fazendo uma abordagem de definições referentes à Etnomatemática, fazendo uma contextualização histórica de como surgiu o conceito para tal programa, estando este em constante aprimoramento até os dias atuais. Palavras-chave: Etnomatemática. Educação de Jovens e Adultos. Conhecimentos matemáticos. Introdução Neste trabalho iremos trazer conceitos do programa Etnomatemática, que segundo alguns autores é um campo relativamente novo e que abrange um heterogêneo conjunto de

abordagens. Tomaremos como ponto de partida, tal temática, as concepções de Ubiratan D Ambrósio, que define o programa Etnomatemática, conforme segue: Indivíduos e povos têm, ao longo de suas existências e ao longo da história, criado e desenvolvido instrumentos de reflexão, de observação, instrumentos materiais e intelectuais [que chamo ticas] para explicar, entender, conhecer, aprender para saber e fazer [que chamo matema] como resposta a necessidade de sobrevivência e de transcendência em diferentes ambientes naturais, sociais e culturais [que chamo etnos]. [...] (D AMBROSIO, 2011, p. 60, grifos do autor) Essa concepção de programa Etnomatemática já vinha sendo praticada há muito tempo, desde que a Matemática ainda não era considerada como Ciência, mas sim uma habilidade necessária para a sobrevivência e transcendência do ser humano. Embora não conhecida como Matemática científica, a qual tem sido conceituada como a ciência dos números, das formas e das medidas, das inferências, e suas características apontam para a precisão, rigor, exatidão. (D AMBRÓSIO, 1996, p.113), mesmo assim, existem alguns esboços históricos do surgimento do programa Etnomatemática, mostrando a relação do mesmo com a Matemática, desde o início da humanidade até os dias atuais. De fato, desde o início das civilizações o homem está em decorrente processo de assimilação e acomodação, no qual sempre se busca instrumentos e técnicas que facilitem sua vida. Nesta perspectiva, Ubiratan D Ambrosio vislumbra o programa Etnomatemática dividido em três aspectos: etno como resposta as necessidades de sobrevivência e de transcendência em diferentes ambientes naturais, sociais, culturais e imaginário; a matema que explica, aprende, conhece e lidar com o saber e fazer; e as ticas os indivíduos e povos que tem criado e desenvolvido instrumentos de reflexão, de observação, bem como, instrumentos materiais e intelectuais, a partir de seus próprios modos, estilos, artes e técnicas. Ubiratan D Ambrosio nos traz ainda um exemplo muito interessante de como surge a Etnomatemática, em decorrência de um pensamento matemático de nossos antepassados. Na hora em que esse australopiteco escolheu e lascou um pedaço de pedra, com o objetivo de descarnar um osso, a sua mente matemática se revelou. Para selecionar a pedra, é necessário avaliar suas dimensões, e, para lascá-la o necessário e o suficiente para cumprir os objetivos a que ela se destina, é preciso avaliar e comparar dimensões. Avaliar e 2

comparar dimensões é uma das manifestações mais elementares do pensamento matemático. Um primeiro exemplo de etnomatemática é, portanto, aquela desenvolvida pelo australopiteco. (D AMBROSIO, 2011, p. 33). Com isso mostraremos as relações existentes deste programa com a Matemática escolar e a Matemática de nosso dia-a-dia, em especial a Matemática praticada pelos alunos da EJA de uma escola municipal da cidade do Natal/RN em suas profissões. Ressaltamos que oprograma Etnomatemática atenta para as conexões da Educação Matemática com o mundo social mais amplo, através das diferentes ideias e práticas desenvolvidas por diversas culturas. Mas, para deixarmos mais claro nosso objetivo, se faz necessário mostrarmos um pouco da história da construção do programa Etnomatemática, a partir de alguns pesquisadores envolvidos com esse campo do conhecimento. Esboço histórico do programa Etnomatemática A construção desse conceito não foi simples, nem percorrido somente por uma pessoa. Em 1986, ocorreu a criação do Grupo Internacional de Estudos em Etnomatemática (IGSEm) que tinha como principal objetivo propagar as ideias da Etnomatemática. No primeiro boletim desse grupo, é possível encontrar zona de confluência entre a Matemática e a antropologia cultural (FERREIRA, 2009, p.4) como uma definição para Etnomatemática, baseada ainda nas metáforas de Matemática-no-Contexto-Cultural. Frente a esta definição, outras vêm surgindo ao longo da história em virtude dos diferentes trabalhos calcados no fato de que a Etnomatemática atenta para as conexões da Educação Matemática como mundo social mais amplo, no qual o cidadão está inserido. Conforme as ideias Etnomatemáticas iam se espalhando, diversos pesquisadores tentaram encontrar uma terminologia que as identificasse, antes que a teoria de Ubiratan D Ambrosio ganhasse notoriedade mundial. Argumenta Esquincalha (s/a, p. 6) que de acordo com Sebastiani Ferreira, alguns termos utilizados foram: Zaslawsky (1973) - Sociomatemática D Ambrosio (1982) - Matemática Espontânea Posner (1982) - Matemática Informal Caraher (1982/ Kane (1987) - Matemática Oral Gerdes (1982) - Matemática Oprimida 3

Caraher (1982), Gerdes (1982), Harris (1987) - Matemática Não- Estandardizada Gerdes (1982) - Matemática Escondida ou Congelada Mellin/Olsen (1986) - Matemática Popular SebastianiFerreia (1987) Matemática codificada do saber/fazer SebastianiFerreia (1993) Matemática Materna D Ambrósio (1998) Matemática Antropológica. Atualmente, é difícil encontrar esses termos na literatura das tendências em Educação Matemática. A expressão Etnomatemática acabou por englobá-los, pois todos os termos citados acima representam manifestações de uma cultura ao apropriar-se ou produzir o conhecimento. Como já mencionamos acima, apoiados nas concepções d ambrosianas de Etnomatemática (Imagem 1) iremos pesquisar a Matemática existente no grupo explicitado, ou seja, alunos da EJA, além de enfatizar seu contexto sócio, histórico e cultural. Imagem 1 Ubiratan D Ambrosio Fonte: Arquivo pessoal do autor. Segundo Orey e Rosa (2005) há seis fatos importantes para a consolidação do Programa Etnomatemática. A saber, o primeiro consiste na publicação, em 1973, do livro de Zaslavsky intitulado Africa Counts: Nuber and patterns in Africa Culture. O segundo fato ocorre três anos depois do primeiro com a conferência organizada por D Ambrosio durante o 3º ICME e intitulada Why Teach Matematics? Posteriormente, em 1977, D Ambrosio utiliza pela primeira vez o termo Etnomatemática durante uma palestra no Encontro Anual da Associação Britânica para o Avanço da Ciência. Contudo, tal termo só 4

é consolidado numa outra palestra do mesmo autor proferida em 1984, durante o 5º ICME (Austrália). Em 1985 ocorre o penúltimo fato marcado pela escrita da obra-prima de D Ambrósio, chamada Ethnomathematics and its Place in the History and Pedagogy of Mathematics. Por fim, esses autores destacam a criação do Grupo Internacional de Estudos sobre Etnomatemática (ISGEm), ainda em 1985. Seguindo este escorço histórico temos que, em geral, o termo Etnomatemática está relacionado a conhecimentos matemáticos presentes nas práticas cotidianas de diferentes grupos. Esse conhecimento não é isolado, pois se integra ao cotidiano, possuindo um aspecto abrangente. Na maioria das vezes, seu uso está aliado a soluções de problemas, que é pensada dentro de um conjunto de valores, crenças e saberes que lhe dão significado, não havendo, assim, na resolução desses problemas, uma preocupação disciplinar. (MONTEIRO; POMPEU JR., 2001, p. 46). A Etnomatemática vem surgindo como grande desafio entre aqueles que a estudam, pois requer um maior esforço, por envolver diversas realidades e propor estudar toda parte histórica, bem como, o contexto educacional, cultural e social. É partindo desse princípio que foram realizadas, inicialmente, pesquisas em sociedades marginalizadas e grupos como os indígenas, com a expectativa de que suas práticas reflitam sobre o conhecimento matemático, muitas vezes adquirido sem haver um nível de escolaridade formal. A modalidade de ensino da Educação de Jovens e Adultos - EJA Apoiados nesta perspectiva elucidamos que todos, mesmo que involuntariamente praticam conhecimentos matemáticos para sobreviver. Muitas crianças hoje em dia com 10 ou 11 anos de idade das classes populares nas cidades grandes, estão praticando conhecimentos matemáticos ao desenvolverem uma atividade econômica junto aos seus pais, seja, vendendo doces, pirulitos, picolés etc. na rua; carregando compras nas feiras e mercados públicos; lavando carros em estacionamentos; trabalhando em jardins ou, na pior das hipóteses, pedindo esmolas. (NUNES, CARRAHER; SCHLIEMANN, 2011, p. 65). São com essas reflexões que pretendemos analisar o contexto social, cultural e econômico dealunos da EJA de uma escola municipal da cidade do Natal/RN, assim como a profissão exercida por eles, a fim de evidenciar que conhecimentos matemáticos utilizam em suas profissões e se esses conhecimentos são utilizados em sala de aula, pois, na maioria das vezes os alunos da EJA não conseguem utilizá-los, ou mesmo visualizá-los, 5

em sala de aula. É importante ressaltar que os próprios conteúdos a serem ensinados não podem ser totalmente estranhos àquela cotidianidade. (FREIRE, 2011, p. 21). Assim, estaremos fazendo uma ponte entre a Matemática abordada em sala de aula e os conhecimentos matemáticos manuseados pelos alunos da EJA em suas profissões mediante resolução de problemas. Conclusões O desencadeamento histórico da Etnomatemática é de grande valia para o ensino da Matemática, em especial na modalidade EJA, a qual estamos nos detendo neste trabalho, pois, é uma tendência que traz a tona a importância da produção do conhecimento matemático por grupos diversos enfatizando o contexto histórico, social e cultural, de cada individuo. Referências D AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática: arte ou técnica de explicar e conhecer. São Paulo. 1990..Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus, 1996. 121p.. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade. 4. Ed. 1. Reimp Belo Horizonte: Autêntica, 2011. ESQUINCALHA, Agnaldo da Conceição. ETNOMATEMÁTICA: UM ESTUDO DA EVOLUÇÃO DAS IDÉIAS. Disponível em: http://www.ufrrj.br/leptrans/arquivos/etnomatematica.pdf FERREIRA, E. S. Etnomatemática: Uma proposta metodológica. Rio de Janeiro: Universidade Santa Úrsula, 1997. FREIRE, Paulo. Educação de adultos: algumas reflexões. In: GADOTTI, Moacir. ROMÃO, José E. (Orgs.). Educação de jovens de adulto: teoria, prática e proposta. 12. Ed. São Paulo: Cortez, 2011. 6

MONTEIRO, A.; POMPEU JR, G. A matemática e os temas transversais. São Paulo: Moderna, 2001. NUNES, Terezinha; CARRAHER, David; SCHLIEMANN, Ana Lúcia. Na Vida Dez na Escola Zero. 3 ed. São Paulo: Cortez Editora, 2011. OREY, Daniel Clark; Rosa, Milton. Las Raíces históricas del Programa Etnomatemáticas. In: Revista Latino americana de Investigacionen Matematica Educativa, México, vol8, n. 3, p. 363-377, novembro, 2005. SILVEIRA, Marisa Rosâni Abreu da. A interpretação da matemática na escola no dizer dos alunos: ressonâncias do sentido de dificuldade. 2000. 186f. Dissertação Curso de Mestrado em Educação. Porto Alegre. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 7