A DEFASAGEM NA CORREÇÃO DA TABELA DO IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA 1. Marco Legal Vigente Em 25 de março de 2011 o Governo Federal editou a MP 528 que foi convertida na Lei nº 12.469, de 26 de agosto de 2011, a qual estabeleceu o índice de 4,5% para a correção da Tabela Progressiva do Imposto de Renda Pessoa Física (Tabela do IR) para os anos-base de 2011 a 2014. Esta lei prevê também a correção das deduções com dependentes, educação, da isenção para maiores de 65 anos e limite do desconto simplificado de 20%. A referida lei reproduziu a lógica de correção anual da Tabela do IR, introduzida pela Lei nº 11.482, de 31 de maio de 2007, bem como o mesmo percentual, o qual tem sido insuficiente para repor as perdas inflacionárias. 2. Defasagem na Correção da Tabela do IR desde 1996 Mais um ano se passa e a correção da Tabela do IR em 4,5% se encontra abaixo da inflação oficial medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que foi de 5,84% em 2012. Isso demonstra claramente a defasagem na correção da Tabela do IR que faz com que o contribuinte pague mais imposto do que deveria. Em períodos anteriores a defasagem foi ainda mais grave. A Tabela 1 mostra a evolução dos reajustes nos períodos 1996-2001, 2002-2006 e desde 2007. Percebe-se que entre 1996 e 2001, a Tabela do IR ficou congelada e a inflação acumulada neste período foi de 45,68%. Em 2002, a Tabela do IR foi corrigida em 17,5%. No biênio 2003-2004 não houve reajustes, os quais passaram a ser anuais somente a partir de 2005, quando o reajuste foi de 10%, e em 2006, de 8%, resultando em um reajuste acumulado de 39,59% entre 2002 e 2006. Desde 2007, os reajustes, definidos por lei, têm sido de 4,5% ao ano. 1
Tabela 1 Resíduos na Correção da Tabela do Imposto de Renda pelo IPCA 1996-2012 Em % Períodos IPCA Acumulado Correção na Tabela Resíduo 1996 a 2001 45,68 0,00 45,68 2002 a 2006 28,20 39,59-8,16 2007 4,46 4,50-0,04 2008 5,90 4,50 1,34 2009 4,31 4,50-0,18 2010 5,91 4,50 1,35 2011 6,50 4,50 1,92 2012 5,84 4,50 1,28 Fonte: RFB e IBGE A Tabela 2 mostra que o resíduo da correção da Tabela do IR, em relação ao IPCA, foi de 59,28% desde 1996 até 2012, sendo 45,68% no período 1996-2001 e 9,33% no período 2002-2012. Tabela 2 Resíduos na Correção da Tabela do Imposto de Renda pelo IPCA 1996-2012 Em percentual Períodos IPCA Acumulado Correção na Tabela Resíduo 1996 a 2001 45,68 0,00 45,68 2002 a 2012 98,74 81,78 9,33 Acumulado 1996-2012 189,54 81,78 59,28 Fonte: RFB e IBGE A Tabela 3 mostra a Tabela do IR vigente para o ano de 2013. Ela resulta da correção de 4,5% sobre a Tabela do IR vigente em 2012. Contudo, se a correção fosse de 5,84%, de modo a refletir a inflação acumulada pelo IPCA no ano de 2012, resultaria na Tabela 4. Uma comparação entre as duas tabelas a seguir permite concluir que a segunda apresenta um limite de isenção maior que a primeira, bem como os limites inferiores e superiores de cada faixa de renda tributável. Por fim, a correção da Tabela do IR pela inflação acumulada do ano elevaria também o valor da dedução em cada faixa, da dedução por dependente e o valor da dedução anual individual com educação. 2
Tabela 3 Tabela 4 Tabela Progressiva Mensal do IRPF Tabela Progressiva Mensal corrigida em 5,84% Ano-Calendário 2013 em R$ Ano-Calendário 2012 em R$ De Até Alíquota Dedução De Até Alíquota Dedução 0,00 1.710,78 isento 0,00 0,00 1.732,72 isento 0,00 1.710,79 2.563,91 7,50% 128,31 1.732,73 2.596,78 7,50% 129,95 2.563,92 3.418,59 15,00% 320,61 2.596,79 3.462,43 15,00% 324,72 3.418,60 4.271,59 22,50% 577,00 3.462,44 4.326,37 22,50% 584,40 acima de 4.271,59 27,50% 790,57 acima de 4.326,37 27,50% 800,71 Dedução por Dependente: 171,97 Dedução por Dependente: 174,17 Educação - Dedução anual individual: R$ 3.230,46 Educação - Dedução anual individual: R$ 3.271,88 Fonte: Secretaria da Receita Federal do Brasil Dessa forma, a Tabela do IR, com a correção de 59,28% (IPCA de jan/1996 a dez/2012) seria assim composta: Tabela 5 Tabela Progressiva Mensal corrigida em 59,28% (IPCA jan/96 a dez/12) Ano-Calendário 2012 em R$ De Até Alíquota Dedução 0,00 2.607,59 isento 0,00 2.607,60 3.907,93 7,50% 195,56 3.907,95 5.210,65 15,00% 488,67 5.210,67 6.510,81 22,50% 879,46 acima de 6.510,81 27,50% 1.205,00 Dedução por Dependente: 262,11 Educação - Dedução anual individual: R$ 4.923,90 Fonte: Secretaria da Receita Federal do Brasil 3. As Injustiças com a Correção Defasada da Tabela do IR Estes números mostram claramente que o contribuinte vem perdendo, e muito, com a política adotada para a correção da Tabela do IR aquém da inflação oficial no ano. Há diversos casos de contribuintes cujos rendimentos tributáveis estão muito próximos do limite superior de uma das faixas de renda do IR. Se estes contribuintes obtiverem um reajuste nos seus rendimentos igual à inflação anual, no ano seguinte terão parte destes rendimentos tributados à alíquota da faixa de renda imediatamente superior. Isso ocorre devido à defasagem entre o índice de correção da Tabela do IR e o índice de inflação anual. É o efeito mudança de faixa que ocorre não somente quando o contribuinte aufere ganhos reais, mas também quando os reajustes de rendimento, não sendo reais, são superiores à correção da Tabela do IR. 3
A Tabela 6 mostra na coluna Renda Anual Tributável (líquida) uma simulação de valores de rendimentos anuais tributáveis em 2012, próximos do limite superior de cada uma das faixas de renda tributável, e os mesmos rendimentos reajustados em 5,84% para 2013. As duas colunas seguintes mostram os valores pagos de IR em 2012 e 2013, pelas respectivas tabelas vigentes. A penúltima coluna mostra qual seria o imposto a recolher se a tabela vigente para o ano calendário de 2012 tivesse sido corrigida pela inflação acumulada naquele ano. Finalmente, a última coluna indica o valor do IR pago a mais para estes casos, devido a não correção da Tabela do IR pelo índice de inflação. Tabela 6 Simulação do IRPF a Recolher: Tabelas Vigentes nos Anos-Calendários 2012 e 2013 e Tabela de 2012 Reajustada em 5,84% com vigência em 2013 Em R$ Renda Anual Tributável Imposto a Imposto a Recolher - Recolher - Tabela Vigente Tabela Vigente para o Ano para o Ano Calendário Calendário 2013 2012 (A) Imposto a Recolher - Tabela Reajustada em 5,84% (B) Valores Recolhidos a Maior (A) (B) Valor em 2012 19.644,00 0,00-20.791,21 19,64 0,00 19,64 Valor em 2012 29.436,00 734,30 31.155,06 826,04 777,18 48,86 Valor em 2012 39.252,00 2.206,25 41.544,32 2.423,52 2.335,10 88,42 Valor em 2012 49.044,00 4.409,11 51.908,17 4.787,84 4.666,60 121,24 Valor em 2012 60.000,00 7.421,62 63.504,00 7.976,69 7.855,04 121,65 Fonte: Receita Federal do Brasil Nota: O cálculo dos valores acima não contempla as seguintes deduções: previdência oficial, dependentes, pensão alimentícia e outras deduções (previdência privada, FAPI e parcela isenta de aposentadoria, reserva remunerada, reforma e pensão para declarante com 65 anos ou mais, Carnê-leão: Livro Caixa) usualmente presentes nas declarações de rendimento. 4
Para exemplificar, suponhamos o caso de um contribuinte que no anocalendário de 2012 foi isento, já que seus rendimentos (tributáveis líquidos) somaram R$ 19.644,00. Assim, ele estaria bem próximo do limite superior da faixa de isenção, esta definida em R$ 19.645,32 para aquele ano. Se em 2012 seus rendimentos (tributáveis líquidos) tivessem sido reajustados em 5,84%, ele passaria a receber R$ 20.791,21. Pela tabela vigente no ano-calendário de 2013 (reajustada em 4,5%, conforme a Lei nº 12.469/2011), a parcela que excede o limite de isenção (R$ 261,85 = R$ 20.791,21 R$ 20.529,36) seria tributada à alíquota de 7,5% e o contribuinte pagaria R$ 19,64 de IR. Mas se a Tabela do IR fosse corrigida em 5,84%, a inflação oficial medida pelo IPCA em 2012, ele estaria isento, já que o limite de isenção seria de R$ 20.792,61. Essa simulação mostra que o governo está se valendo do processo inflacionário para aumentar a tributação das pessoas físicas. A correção da Tabela do IR pelo índice integral da inflação evitaria uma distorção comum na política tributária brasileira dos últimos 15 anos: o pagamento de mais imposto de renda, mesmo por aqueles que não tenham auferido ganhos reais. Esta é uma séria ofensa aos princípios da Capacidade Contributiva e da Progressividade, inscritos na Constituição Federal. A conjunção de ambos diz que quem ganha mais deve pagar progressivamente mais. Porém, a não correção integral da tabela faz com que muitos daqueles que não ganharam mais ou mesmo ganharam menos, paguem mais. É, portanto, uma política regressiva, desprovida de um senso maior de justiça fiscal e que, por estas razões, conduz à ampliação das desigualdades distributivas do País. 4. Deduções Ínfimas Além da não correção da Tabela do IR de acordo com o índice de inflação anual, as deduções permitidas por lei são valores que não correspondem à realidade dos gastos necessários (dependentes, custo da educação, por exemplo) que também não vêm sendo atualizados. A seguir estão indicadas as deduções, seus valores atuais e aqueles que deveriam estar em vigor caso houvessem sido corrigidos pela inflação acumulada pelo IPCA de 1996 até 2012. 5
Dependentes O desconto por dependente, por exemplo, de R$ 171,97 por mês (R$ 2.063,58 no ano), deveria estar em R$ 262,11 mensais ou R$ 3.145,33 anuais. O valor atualmente vigente é irrisório, insuficiente para a proteção à família (assistir, criar e educar filhos menores). Educação A dedução das despesas com educação foi sendo limitada ao longo dos últimos anos e hoje podem ser deduzidos apenas os pagamentos do ensino formal, dos cursos de especialização e de outros cursos profissionalizantes. Pela tabela válida para o ano de 2013, será permitido deduzir até R$ 3.230,46 (R$ 269,21 mensais). Apenas para repor a inflação até o final do ano passado, faz-se necessária a correção deste valor para R$ 4.923,90. Saúde A legislação atual do Imposto de Renda restringe a dedução das despesas com saúde. Uma dessas restrições é a não permissão da dedução com medicamentos, exceto aqueles fornecidos pelo próprio estabelecimento hospitalar. A parcela da renda do contribuinte gasta com medicamentos, indispensáveis e vitais, não pode ser tributada porque não há capacidade contributiva, a qual só começa depois de deduzidas as despesas necessárias à sobrevivência. Afinal, medicamentos não são supérfluos, e sim uma necessidade vital do ser humano e deveriam compor a relação de deduções legais, pois de acordo com o Princípio da Capacidade Contributiva, cada pessoa deve ter sua renda tributada somente depois de deduzidas todas as despesas necessárias à sua sobrevivência. Moradia A volta da dedução na base de cálculo do Imposto de Renda das despesas com moradia é uma questão a ser considerada. Note-se que quem recebe deve tributar o rendimento, mas quem paga não pode deduzir. Em alguns casos, trata-se da mesma pessoa que loca seu imóvel para alugar outro. Neste caso, tributa-se o que o contribuinte recebe sem poder deduzir o que ele paga. Até 1998 era permitida a dedução desses desembolsos, tais como locação e juros do financiamento da casa própria. Essas deduções acabaram e, mesmo morando de aluguel ou pagando o empréstimo habitacional, o contribuinte não tem mais qualquer benefício. 6
5. Simulação da Defasagem na Tabela do IRPF A Tabela 7, a seguir, faz uma simulação desta defasagem de 59,28% na Tabela do IR para alguns rendimentos tributáveis previamente selecionados. Ela compara o imposto a recolher pela tabela do IR vigente para o anocalendário de 2013, com o imposto a recolher, caso a tabela contemplasse a defasagem do período 1996-2012, indicando a diferença entre ambos os valores, em termos absolutos e relativos. Para efeitos desta simulação não é possível contemplar as deduções, pois estas se aplicam de forma diferente a cada caso. Tabela 7 Simulação Imposto de Renda Pessoa Física Tabela Vigente e Tabela Corrigida pelo Resíduo Inflacionário 1996-2012 (IPCA) Renda Mensal Tributável Imposto a Recolher Tabela Vigente Tabela Corrigida Maior 1.710,00 - - - 2.000,00 21,69-21,69 2.500,00 59,19-59,19 2.570,00 64,89-64,89 3.000,00 129,39 29,44 99,95 339,50 4.000,00 323,00 111,33 211,67 190,13 5.000,00 584,43 261,33 323,10 123,64 7.500,00 1.271,93 857,50 414,43 48,33 10.000,00 1.959,43 1.545,00 414,43 26,82 12.500,00 2.646,93 2.232,50 414,43 18,56 15.000,00 3.334,43 2.920,00 414,43 14,19 20.000,00 4.709,43 4.295,00 414,43 9,65 25.000,00 6.084,43 5.670,00 414,43 7,31 30.000,00 7.459,43 7.045,00 414,43 5,88 40.000,00 10.209,43 9.795,00 414,43 4,23 50.000,00 12.959,43 12.545,00 414,43 3,30 60.000,00 15.709,43 15.295,00 414,43 2,71 70.000,00 18.459,43 18.045,00 414,43 2,30 100.000,00 26.709,43 26.295,00 414,43 1,58 Fonte: Receita Federal do Brasil (dados da tabela vigente) Valor a Recolher a Diferença em % Nota: O cálculo dos valores acima não contempla as seguintes deduções: previdência oficial, dependentes, pensão alimentícia e outras deduções (previdência privada, FAPI e parcela isenta de aposentadoria, reserva remunerada, reforma e pensão para declarante com 65 anos ou mais, Carnê-leão: Livro Caixa) usualmente presentes nas declarações de rendimento. 7
6. Conclusão O contribuinte está pagando mais Imposto de Renda do que deveria devido à defasagem na correção da Tabela do Imposto de Renda Pessoa Física em relação à inflação oficial. Caso a tabela fosse corrigida pela inflação, todas as faixas de rendimento seriam beneficiadas, em especial as mais baixas, ou seja, a nossa tão penalizada classe média assalariada. Mais grave é o baixo retorno do produto da arrecadação em termos da quantidade e da qualidade dos serviços públicos oferecidos à população. De maneira geral, o brasileiro que dispõe de alguma renda é levado a custear plano de saúde, escola particular, previdência privada, etc., pois a maioria dos serviços públicos deixa muito a desejar. O Sindifisco Nacional defende a correção da Tabela do IR e respectivas parcelas a deduzir, bem como das demais deduções por dependente, pelo índice integral da inflação oficial. A correção da Tabela do IR permitirá atingir um estado de maior justiça fiscal, ampliando a progressividade de nossa tributação e reduzindo as desigualdades sociais. 8