AS TRANSFORMAÇÕES SÓCIOESPACIAIS NO MUNICÍPIO DO EUSÉBIO, CEARÁ: Uma Análise Preliminar

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Transcrição:

AS TRANSFORMAÇÕES SÓCIOESPACIAIS NO MUNICÍPIO DO EUSÉBIO, CEARÁ: Uma Análise Preliminar Antonio Tadeu Pinto Soares Junior tdbtjr@hotmail.com Universidade Federal do Ceará Eustógio Wanderley Correa Dantas edantas@ufc.br Universidade Federal do Ceará Introdução O crescimento da cidade de Fortaleza tornou-se notório, em termos de seu tecido urbano, de verticalização e parcelamento dos seus solos, na década de 1970, quando a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) foi constituída oficialmente. Esta expansão, porém, não foi acompanhada de uma ampliação dos serviços de infra-estrutura, proporcionando um crescimento espontâneo, desordenado e o surgimento de aglomerações de estruturas diversas do centro para o entorno da cidade. Notava-se, e ainda nota-se, uma crescente disparidade na distribuição da população no território cearense, colocando a capital em primazia absoluta (LEFÈBVRE, 1991), pelos avançados processos de expansão urbana trazendo facilidades como serviços, infraestrutura e equipamentos (AMORA, 2005), e da concentração demográfica, e de investimentos advindos do poder público e privado. Segundo Spósito (2008) esta expansão urbana é identificada a partir do par processo/forma no movimento de relação na cidade, consequentemente em Fortaleza, o

centro de atração de nosso Estado, com os outros municípios no que diz respeito à lógica dos espaços que foram ocupados com a dispersão da cidade para o seu entorno, ou seja, o avanço da lógica capitalista, gerando uma reestruturação sócio-espacial e urbana, inerente ao processo de modernização do município na dinâmica metropolitana. Neste sentido, pretende-se fazer uma reflexão do processo de intervenção dos agentes produtores sobre a expansão do espaço metropolitano e como novos lugares ganham destaque nesse processo, ressaltando a mobilidade de capitais e população, com o objetivo de entender a rapidez nas transformações que ocorreu e ocorrem à produção deste espaço, principalmente, para a região do litoral leste do Estado em um município nãolitorâneo, o Eusébio. Este trabalho tem sua abordagem teórico-metodológica apoiada em discussões sobre a produção e reprodução do espaço na Região Metropolitana de Fortaleza, tendo como tema relevante à dinâmica da dispersão do tecido urbano. Tal dinâmica conduz para uma realidade social tensa e contraditória, em toda a extensão territorial da metrópole, onde os conflitos entre ricos e os pobres (as classes sociais) aparecem nas formas de uso da terra urbana, a partir da descentralização e desconcentração espacial das atividades industriais e terciárias. A Região Metropolitana de Fortaleza: um mosaico de características A Região Metropolitana de Fortaleza foi resultado de um período de aceleradas transformações no Ceará, que se intensificou com o processo de industrialização. Isto se dá com a migração de atividades produtivas estratégicas como de equipamentos e de serviços fora dos limites municipais ocasionando o crescimento acentuado da sua malha urbana. Em

meados dos anos 1980, o processo de fragmentação metropolitana, associado a uma descentralização e desconcentração da indústria, resultou na escolha de cidades menores, para receber novos investimentos (SILVA, 2005, p. 111). Figura 1: Evolução da Região Metropolitana de Fortaleza, 1973. Fonte: adaptado de DIÓGENES, 2007. No processo de desconcentração das atividades do capital, outras cidades foram incorporadas à Região Metropolitana de Fortaleza, transformando as relações entre os municípios. Atualmente, ela é formada por treze municípios resultado da reestruturação espacial processada nos últimos anos. Foram mudanças ocorridas ao longo dos anos e são entendidas como inerentes à expansão urbana, que além de histórica é contraditória e resultante de uma realidade social complexa mediante os tipos de intervenções públicas e privadas que modificaram a paisagem urbana em cada período.

Figura 2: Evolução da Região metropolitana de Fortaleza, 1991. Fonte: adaptado de DIÓGENES, 2007. Figura 3: Evolução da Região metropolitana de Fortaleza, 1999. Fonte: adaptado de DIÓGENES, 2007.

A expansão da cidade para a região metropolitana a partir da década de 1980 que visava, sobretudo, atender as necessidades do planejamento urbano tentando controlar o rápido e desordenado processo de urbanização cearense (da capital) e expansão da periferia, caracterizado pelo processo de metropolização corrente em todo Brasil, que para AMORA (1999, p. 32) os grandes aglomerados metropolitanos representam o processo máximo de urbanização do espaço cearense. E SILVA (2005) expressa ainda que Na perspectiva conceitual, os recortes espaciais denominados regiões metropolitanas são aqueles detentores de uma elevada taxa de urbanização, agrupados na forma de lei para a integração e organização do planejamento e execução de funções com interesses comuns metropolitanos, aglomerados urbanos e microrregiões (SILVA, 2005, p. 105). Ressalta-se que na dinâmica dos espaços metropolitanos, as integrações dos componentes da região metropolitana acontecem com a mobilização de um conjunto de diretrizes a fim de desenvolver estes espaços criando uma infra-estrutura que permitisse uma aglomeração dos municípios visando à formação de um entorno (periferia) integrado com o centro (Fortaleza). Isto se dá com as aglomerações de cidades que perpassam por um par industrialização/urbanização que reestrutura o tecido urbano. Temos a nossa frente um duplo processo ou, se se preferir, um processo com dois aspectos: industrialização e urbanização, crescimento e desenvolvimento, produção econômica e vida social. Os dois aspectos deste processo, inseparáveis, têm uma unidade, e, no entanto o processo é conflitante (LEFÈBVRE, 1991: 09).

Ainda segundo LEFÈBVRE (1991: 09) (...) a industrialização não produz apenas empresas (operários e chefes de empresas), mas sim estabelecimentos diversos, centros bancários e financeiros, técnicos e políticos. Do que Fortaleza cresce e se expande, a sua Região Metropolitana se industrializa e ganha novos incrementos. Porém tudo isso é acompanhado do aumento da desigualdade e da segregação, significando o aumento do fosso social entre os ricos e os pobres, ou seja, essa segregação social nega a amplitude e a generalidade na RMF, das relações desiguais de poder entre os proprietários e os proletários, expressas na especulação imobiliária, e na vinculação entre senhores de terrenos citadinos e o governo. Para Cleide Bernal em sua pesquisa intitulada Como Anda Fortaleza (2004, 2005) publicada no Jornal Diário do Nordeste de 24 de Abril de 2006, esse processo de conurbação entre Fortaleza e municípios circunvizinhos da RMF, resultado de uma política de descentralização do município sede de investimentos e políticas públicas transbordando os mesmos para o entorno, e faz com que a separação dentre alguns municípios e a metrópole não exista. O município do Eusébio como os outros municípios da região metropolitana passam a ser considerados como bairros da Capital formando o que já se denomina a Grande Fortaleza, por conta dos fluxos do capital imobiliário, bem como pela atuação do Poder Executivo¹. ¹ Essas são algumas das conclusões da pesquisa Como Anda Fortaleza, estudo realizado em 2004 e 2005 pela professora do curso de Economia da Universidade Federal do Ceará, Cleide Bernal, publicada no Caderno Cidade do Jornal Diário do Nordeste em 24/04/2006.

Segundo Corrêa (1999, p. 24) é imprescindível à atuação do Estado, principalmente nas esferas estadual e municipal, como agente condicionante na regulação do uso dos solos e consumação dos espaços públicos com a implantação de infra-estrutura adequada atendendo aos interesses tanto da população como das empresas ali instaladas, ou seja, é o promotor imobiliário na organização espacial. Ainda Corrêa (2002) afirma que estas alterações no espaço são feitas através de um conjunto de práticas criadas pelo homem como ações para racionalizar e localizar os usos do espaço que impacta nas suas formas e funções e que como conseqüência há uma diferenciação espacial resultado de uma valorização parcial ou total de uma determinada localidade. Como reflexo destas práticas se encontra o município do Eusébio que hoje se encontra num processo de valorização do seu espaço a partir do fenômeno da dispersão metropolitana para novos lugares por uma descentralização das atividades de Fortaleza, onde o Estado torna-se o grande impulsionador de benesses, oferecendo infra-estrutura, incentivos fiscais e dando subsídios aos empresários que tivessem interesse em investir em novos pólos. Diante desta expansão metropolitana e econômica, novos lugares, como o Eusébio, são incorporados à dinâmica produtiva, na tentativa de acompanhar as tendências do mercado mundial numa perspectiva de crescimento.

Eusébio: de distrito a município em transformação MUNICÍPIO DO EUSÉBIO CEARÁ Figura 4: Localização do município do Eusébio. Fonte: adaptado do IPECE, 2007. O município do Eusébio está localizado no litoral leste do Estado do Ceará e a Nordeste de Fortaleza distanciando-se cerca de 20 km. A sua evolução política se deu primeiramente com a categoria de distrito em 20/05/1943 e a município emancipado, desmembrado de Aquiraz desde 19/06/1987 (GIRÃO, 1983, p. 276) e, posteriormente, na década de 1990 foi incorporado à região metropolitana e é resultado das transformações aceleradas e intensas ocorridas no estado do Ceará com o advento do processo de industrialização. Isto se dá com a instalação de equipamentos e serviços fora dos limites municipais ocasionando o crescimento acentuado da sua malha urbana, bem como com a descentralização e desconcentração das atividades do capital. O acesso ao município faz-se através de vias como: a BR-116, a CE-040 e as Estradas do Fio e da Mangabeira.

Figura 5: Vetores de Expansão da Região Metropolitana de Fortaleza Fonte: adaptado de DIÓGENES, 2007. O seu espaço está em constante (re)produção, que é mediada pelo trabalho do homem. Para Santos (2002, p. 172) por meio da produção o homem transforma a primeira natureza em segunda natureza, ele ainda afirma que as novas atividades exigem um lugar no espaço e impõem uma nova arrumação para as coisas, uma disposição diferente para os objetos geográficos, uma organização do espaço diferente. Assim, contribui-se para a valorização e o parcelamento do solo gerando novos fluxos no seu espaço motivado pela transferência de capital, mercadorias, trabalho e moradia. Ele se coloca como receptor de uma população migrante, de renda mais elevada de Fortaleza que tendem a se estabelecer em sítios e loteamentos, com função de primeira e\ou segunda residência, dependendo da função do município seja para moradia, seja para lazer.

Mais recentemente, algumas dessas famílias de melhores condições de renda se instalam a partir da implantação de empreendimentos como os projetos urbanísticos de elevado padrão de vida, os chamados Alphavilles ou condomínios fechados, que oferecem o produto baseado na oferta de uma qualidade de vida a seus compradores. Para Baumam, (2007) a procura por estes tipos de condomínio além de ser para apartar classes é também estratégia de sobrevivência, mediante a insegurança do cotidiano da vida urbana. Uma luta urbana que gera a formação de guetos voluntários e involuntários entre os moradores e o meio habitado. Os moradores com recursos compram casas em áreas separadas por eles escolhidas, também parecidas com guetos (BAUMAN, 2007: 79). Dentre outros empreendimentos principais para dar continuidade a esse crescimento urbano ressalta-se o processo de implantação e de construção de parque tecnológico, no setor de tecnologia da informação, e de seu distrito industrial. De qualquer modo todo o seu território já é considerado como espaço urbano, a partir do intenso processo de parcelamento do solo pela transformação de propriedades rurais em loteamento. A utilização e/ou ocupação de determinado lugar num momento específico aparece no cotidiano das pessoas como forma de realização da produção espacial. Assim, a diferenciação dos usos dos lugares será a manifestação espacial da divisão técnicocientífico-informacional, social, política e cultural num determinado momento histórico, bem como, das forças produtivas materiais da sociedade, suas condições dadas à produção e do desenvolvimento do processo de humanização do homem. Ao produzir o espaço, o homem passa a valorizá-lo e por meio dessa valorização realiza-se um valor de uso, apropriando-se materialmente dos elementos naturais (MORAES, 2007).

A valorização é, portanto, um resultado do trabalho, ao transformar recursos naturais em produtos e ao materializar-se em objetos criados. (MORAES, 2007, p. 23). O espaço, visto como morada, também possui um valor, é tido como mercadoria. A terra, então, passa ter um valor que irá influir no tipo de pessoas e de residências que iram nela habitar. Para ter-se acesso a um pedaço de terra é necessário pagar por ele (através da venda ou do aluguel) pelo fato de que, na sociedade atual, o uso é produto das formas da apropriação (que tem na propriedade privada sua instância jurídica). O preço é expressão de seu valor. O valor de uso é o sustentáculo conceitual do tratamento geográfico dos problemas do uso do solo. Todavia, a teoria do uso do solo urbano deve ser analisada a partir da teoria do valor, fundamentada na unidade entre valor de uso e valor de troca (CARLOS, 2003, p. 47). Ainda Carlos (2001) O processo de reprodução espacial envolve segmentos diferenciados da sociedade, com interesses e desejos conflituosos. Todavia, o processo de reprodução espacial revela que os interesses divergentes podem entrecruzar-se sob a unidade do Estado, que tem inquestionável poder de comando (CARLOS, 2001, p.24). Por outro lado seu espaço é ocupado mediante os fluxos migratórios oriundos do interior do Estado em busca de oportunidades de emprego nas indústrias e empresas de serviços existentes e/ou em implantação no município como alimentos, vestuários, serviços de festas e vigilância. Contraditoriamente, parte dos moradores locais também se desloca diariamente em constante movimento pendular para Fortaleza, por ainda encontrar opções

melhores de trabalhos e de ensino, principalmente o ensino médio. Assim como, no sentido inverso, há os que moram em Fortaleza e trabalham no Eusébio. Logo se constata que a mobilidade é gerada por conta das intervenções do poder público e privado no local tanto é de capital quanto de demanda por trabalho e formação educacional, o que faz com que a relação de dependência do município com a cidade de Fortaleza, capital do Estado ainda seja uma constante mesmo depois de sua emancipação, o município carece de serviços e políticas públicas básicas para atender de forma satisfatória a população local. No processo de diferenciação espacial da região metropolitana ocorre também a negação de particularidades que seriam típicas e que identificariam entre si os habitantes do lugar ocorrendo uma segregação sócio-espacial que segundo Lima (2005) há uma desagregação do modo de vida, bem como das relações sociais entre os citadinos do lugar. Assim, a diferenciação dos usos dos lugares será a manifestação espacial, cultural e política da divisão técnico-científico-informacional e social num determinado momento histórico, bem como, das forças produtivas materiais da sociedade, suas condições dadas à produção e do desenvolvimento do processo social do trabalho. Dessa forma, há uma desigualdade na posse da terra urbana através da apropriação privada que, no Eusébio, depende dos usos desses espaços pela atividade econômica (indústrias e serviços), reforçada pela mediação dos poderes públicos (Estado), em termos de financiamento em infra-estrutura, que valoriza o solo enquanto meio de consumo no mercado imobiliário. Lima (2005) é incisiva a dizer que se faz notório no processo de valorização da terra a emergência de novos usos dos espaços e a presença de diversos atores que darão lógica ao processo, principalmente o interesse do Estado o que causa

impactos de várias ordens no território. Essa segregação social não está localizada em uma área física particular deste município, mas permeia toda a sua dimensão territorial. O território (...) é um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação, e que por conseqüência, revela relações marcadas pelo poder (RAFFESTIN, 1993, apud SOUZA, 2002, p. 96). No caso do núcleo metropolitano, o poder é marcado pela presença do Estado na produção do espaço. Ressalta-se que o território é uma categoria política, produzido por ações políticas e econômicas, isto é, por relações de poder. Ainda segundo Souza (2002) o território existe e é construído e desconstruído nas mais diversas escalas espaços-temporais pelas relações sociais, bem como pelo trabalho do homem que transformam os lugares mediante as suas necessidades e interesses. Portanto o lugar é de reprodução e de práxis social urbana (LEFEBVRE, 1991). O cotidiano dos habitantes do Eusébio desenvolve-se nos espaços vividos e construídos por eles, incluindo os que vieram do interior e dos que trabalham neste, mas moram em Fortaleza. Cada município quando relacionado aos demais mostra as diferenças e semelhanças, determinadas pelas relações sociais, econômicas, de trabalho e renda, pelos movimentos sociais, de moradia e outras necessárias à reprodução social (CARLEIAL e ARAÚJO, 2001). Logo não contempla apenas as áreas com grandes empreendimentos ligados ao processo de industrialização e expansão da metrópole, mas também as áreas freqüentadas pelas populações menos assistidas pelas benesses do desenvolvimento, porém com os mesmos direitos de usar e ocupar um espaço não só pela valorização deste como mercadoria, mas também do espaço de cultura, história e do pensar e agir de um povo, isto é, de sua identidade que pertence a todos (MOURA, 2007, p. 2).

Considerações Preliminares A Região Metropolitana de Fortaleza vê-se ocupada, mais intensamente nos últimos anos, especialmente nos seus entornos, integrados direta ou indiretamente à malha urbana da capital, exigindo ações de planejamento e políticas públicas capazes de atender demandas e projetos futuros conhecendo a realidade no qual ela se movimenta (BERNAL, 2006). Assim, constata-se que a mobilidade é gerada por conta das intervenções do poder público e privado no local tanto é de capital quanto do trabalho, alterando a relações estabelecidas do município do Eusébio com a cidade de Fortaleza, capital do Estado. Nestes últimos anos, tais fragmentações se deram de forma desigual e desordenada sobre o território municipal, onde partes do Eusébio se tornam pólos atrativos de benesses, desenvolvimento e valorização de seu espaço, enquanto o restante do território tem dificuldades em ter uma infra-estrutura básica de cidadania por ainda não serem atrativos na lógica capitalista de apropriação privada de espaços com o incentivo do poder público. Na trama das relações sociais capitalistas, onde as classes se posicionam antagonicamente esta compreensão passa pela análise da sociedade que a engendra, onde capital, trabalho e Estado se articulam para responder aos interesses em conflito.

Bibliografia Consultada CARLOS, A. F. A. A cidade. 7 ed. São Paulo: Contexto, 2003.. Espaço-tempo na metrópole. São Paulo, Contexto, 2001, pp. 11-44. CARLEIAL, A. N., ARAÚJO, A. M. M. O Processo de Metropolização em Fortaleza: Uma Interpretação pela Migração. Scripta Nova/ Revista Electrônica de Geografia e Ciências Sociales. Barcelona, V. V, N.94, P.73-84, 2001. CORRÊA, Roberto Lobato. Espaço: um conceito-chave da geografia. In: CASTRO, Iná Elias de. GOMES, Paulo César da Costa. CORRÊA, Roberto Lobato. Geografia: Conceitos e Temas. 4ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. LIMA. Maria do Céu de. Comunidades Pesqueiras marítimas do Ceará: mariscando resistência. In: SILVA, José Borzacchiello da, CAVALCANTE, Tércia Corrêa, DANTAS, Eustógio Wanderley Correia, SOUZA, Maria Salete de... [et al] (Org). Ceará: um novo olhar geográfico. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2005. LEFEBVRE, Henri. O Direito à Cidade. Tradução de Rubens Eduardo Frias. São Paulo: MORAES, 1991. MORAES, Antonio Carlos Robert. Beira do Mar, Lugar comum? A valorização e a valorização dos espaços litorâneos. In: MORAES, Antonio Carlos Robert: Contribuições para a gestão da zona costeira do Brasil: elementos para uma geografia do litoral brasileiro. São Paulo: Annablume, 2007. MOURA, Marisa Ribeiro; MORAIS, Jáder Onofre de. Processo de valorização da zona costeira do município de Aquiraz, Ceará, Brasil. Anais do VII Encontro Nacional da ANPEGE, Niterói - RJ, 2007. SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova: Da crítica da geografia a uma geografia crítica. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002. SOUZA, Marcelo José Lopes de. O território: sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento. In: CASTRO. Iná Elias de. GOMES, Paulo César da Costa. CORRÊA, Roberto Lobato. Geografia: Conceitos e Temas. 4ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.