EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA E PEDAGOGIA DA AUTONOMIA:



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Transcrição:

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS FACULDADE DE EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA E PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: RELEITURA DE UMA PRÁTICA DIDÁTICA MANOEL CARLOS DINIZ Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Faculdade de Educação da Universidade Católica de Petrópolis, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. PETRÓPOLIS 2004 I

MANOEL CARLOS DINIZ EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA E PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: RELEITURA DE UMA PRÁTICA DIDÁTICA Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Faculdade de Educação da Universidade Católica de Petrópolis, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Orientador: Prof. Dr. VICENTE DE PAULO CARVALHO MADEIRA Petrópolis 2004 II

Todo sucesso que obtive nessa vida devo aos meus pais, pois sempre que tive dúvidas de qual o caminho a seguir, não titubearam em apontá-lo; Em minhas preces, confidenciei a Deus que seria muito triste passar pela vida e não conhecer o amor. Como Deus é magnânimo em suas realizações, proporcionou-me o amor e a mulher-companheira fiel de todas as caminhadas; A eles, ofereço esta conquista. III

Diz o ditado que: quando se está pronto, o Mestre aparece. O meu Mestre é o professor Vicente Madeira, a quem devo a persistência da orientação segura. Por sorte, ainda ganhei o amigo das conversas francas e espirituosas, como só um cearense, ali de pertinho de Paris, sabe sê-lo. A ele, o meu muito obrigado! IV

Diga-me, e eu esquecerei. Mostre-me, e eu lembrarei. Envolva-me, e eu entenderei. Confúcio (557-479 A.C.) V

SUMÁRIO INTRODUÇÃO... 10 CAPÍTULO I O EMPREENDEDORISMO 1.1 O QUE É EMPREENDEDORISMO?... 15 1.2 O CONCEITO DE INOVAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM O EMPREENDEDORISMO... 19 1.3 HISTÓRICO DO ENSINO DO EMPREENDEDORISMO NO BRASIL... 21 1.4 O EMPREENDEDORISMO NA REGIÃO SERRANA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO... 22 1.4.1 O EMPREENDEDORISMO NA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS: O PROEMPI... 1.4.2 O EMPREENDEDORISMO NA FACULDADE ARTHUR SÁ EARP NETO FASE... 25 27 CAPÍTULO II: DA PEDAGOGIA EMPREENDEDORA À PEDAGOGIA DA AUTONOMIA 2.1 CONTEXTUALIZANDO O CENÁRIO... 28 2.2 O EMPREENDEDORISMO COMO ESCAPE AO PROBLEMA DO DESEMPREGO NO SISTEMA 29 CAPITALISTA E A QUESTÃO DA EMPREGABILIDADE... 2.3 A QUESTÃO DA ABORDAGEM DAS COMPETÊNCIAS... 32 2.4 O EMPREENDEDORISMO NA PERSPECTIVA DA PEDAGOGIA DA AUTONOMIA... 36. CAPÍTULO III: A PESQUISA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA SOBRE O EMPREENDEDORISMO 3.1 O EMPREENDEDORISMO EM SALA DE AULA... 43 3.2 A METODOLOGIA... 45 3.3 OS ATORES... 52. CAPÍTULO IV: OS RESULTADOS DA PESQUISA: APRESENTAÇÃO E ANÁLISE... 53 4.1 CATEGORIZAÇÃO... 54 4.2 CURSO DE ADMINISTRAÇÃO 2001.1 UCP... 56 4.3 CURSO DE ADMINISTRAÇÃO 2001.2 UCP... 59 4.4 CURSO DE INFORMÁTICA 2001.1 UCP... 65 42 VI

4.5 CURSO DE ADMINISTRAÇÃO DE SISTEMAS E ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR FASE.. 65 4.6 COMENTÁRIOS E ANÁLISES... 67 CONCLUSÃO... 70 OBRAS CITADAS... 74 OBRAS CONSULTADAS... 76 VII

RESUMO A presente dissertação, tendo como objeto de estudo a relação entre a Educação Empreendedora com a Pedagogia da Autonomia, procurou demonstrar a possibilidade de emprego e utilização de elementos da pedagogia freireana na proposta didática das disciplinas Formação do Empreendedor e Vivências Empresariais, ministradas em instituições de ensino superior da Região Serrana do Rio de Janeiro. Destacaram-se, pela análise de discurso dos depoimentos espontâneos dos alunos das referidas disciplinas, categorias que atestam a influência exercida pela disciplina na sua vivência acadêmica e na sua prática profissional. Apresentou-se a metodologia utilizada, bem como diferenciou-se a proposta da educação empreendedora, aplicada nas instituições UCP e FASE, da proposta preconizada na prática de capacitação e treinamento de formação do empreendedor. Inclui-se a contribuição da Pedagogia da Autonomia para um repensar analítico-crítico em relação à educação empreendedora. Palavras-chaves: Empreendedorismo; Pedagogia da Autonomia; Educação Empreendedora; Empregabilidade; Competências. VIII

ABSTRACT This thesis focuses on the relationship between the Enterpreneur Education and Pedagogy of Autonomy. It aims showing the possibility of using elements of Paulo Freire s pedagogy in some disciplines that involve Enterpreneurship and Business in private universities of a given region of Rio de Janeiro state. Some students that attended the disciplines collaborated with spontaneous declarations which were analyzed in this study. Through this analysis it was possible to identify some categories that testify the influence of these kinds of disciplines in their academic life and professional experience. The methodology was presented and the enterpreneur educational proposal applied in universities as Universidade Católica de Petrópolis and Faculdade Arthur Sá Earp was contrasted with the one used in training and qualifying programs to enterpreneurs. It is included here the contribution of Pedagogy of Autonomy in order to search for a critical and analytical discussion of enterpreneur education. Key-words: Enterpreneurship, Pedagogy of Autonomy, Enterpreneur Education, Employability, Competencies. IX

X

INTRODUÇÃO O mundo atual vem se caracterizando pela velocidade de suas transformações. O processo de mudanças ocorre em todas as esferas da vida moderna, desde a forma de organização da sociedade, passando pela agilidade das mídias e introdução de novas formas de seu uso; o relacionamento entre as pessoas, as formas de socialização das novas gerações e, obviamente, o que é mais fundamental, o modo de produzir conhecimento e riquezas, que tem tido como uma de suas conseqüências a redefinição das relações do trabalho e, logicamente, a questão da empregabilidade que ganhou espaço e centralidade a partir dos anos de 1990 sendo definida como eixo fundamental de um conjunto de políticas supostamente destinadas a diminuir os riscos sociais do grande tormento deste final de século: o desemprego (GENTILI in LOMBARDI et al, 2002:52). Percebe-se portanto, que uma das características mais marcantes do século XX e, deste princípio do século XXI é o desemprego. Frigotto (ibid:70-73) afirma que a ideologia da globalização está produzindo um discurso mistificador de um movimento de reestruturação das forças produtivas, assumindo como pressuposta verdade a questão da empregabilidade, nos termos em que é posta pelos interesses do sistema econômico. O discurso da empregabilidade, por sua vez, ressalta a exigência de indivíduos forjados com XI

novas competências 1 para dar conta de uma nova ordem econômica, onde as empresas precisam desenvolver produtos e serviços inovadores para superar a concorrência acirrada, alargando seus mercados segundo as linhas e a dinâmica da globalização, redesenhando as relações de trabalho e produção. Na expectativa de compreensão e de transformação dessa realidade do desemprego dos indivíduos do contexto deste novo mundo de inovação e desenvolvimento é que se propõe este estudo do empreendedorismo, na qual estão estabelecidos dois núcleos: a) teoricamente, um paralelo entre a formação para o empreendedorismo e a Pedagogia da Autonomia tratando de Paulo Freire; b) empíricamente, uma investigação didático-pedagógica em sala de aula do desenvolvimento de uma disciplina acadêmica que tem como objetivo esta formação. Constata-se, preliminarmente, que o termo empreendedor é utilizado indistintamente tanto para identificar aquele que cria e gera valor a partir da inovação, provocando mudanças em seu ambiente, como para designar aquele que se aproveita de oportunidades temporárias e imediatas para conseguir o seu sustento, garantindo sua produtividade. Partindo do sentido e do significado que é atribuído ao termo, esta pesquisa buscará situar este conceito, no contexto das ciências sociais, tendo como base o que é proposto em Jean Baptiste Say (1803). Tendo como pano de fundo o desenvolvimento da idéia do empreendedorismo, esta pesquisa utiliza o espaço acadêmico universitário como seu locus, onde se implementa a disciplina Formação do Empreendedor: um programa de trinta encontros em que os alunos são preparados para iniciar o exercício de busca da autonomia, planejando uma vida profissional pautada na sua realização como indivíduo, mas sem perder a perspectiva do coletivo, organizando seu negócio de forma a contribuir para o incremento do ambiente no qual estão inseridos. Em sua orientação teórica, esta investigação pretende investigar em que pontos e de que maneira a proposta freiriana de educação autônoma possa ou fornecer os elementos 1 Deluiz assim define competência : Não é um conceito preciso nem é empregado com o mesmo sentido nas várias abordagens. Origina-se das Ciências da Organização e surge num conceito de crise do modelo de organização taylorista e fordista, mundialização da economia, exacerbação da competição nos mercados, exigências de melhoria da qualidade dos produtos e flexibilização dos processo de produção e de trabalho. (DELUIZ, 1996:18) XII

de análise da concepção empreendedoristica da autonomia ou oferecer subsídios para uma revisão do empreendedorismo. Nisto se estaria superando a concepção utilitarista do comportamentalismo pragmático e trazendo os benefícios de uma concepção humanista da educação, da produção e do trabalho. A presente pesquisa procura demonstrar a noção de que o empreendedorismo não surgiu recentemente, mas remonta ao século XVIII, já mencionada e tratada pelo autor francês Jean Baptiste Say (1803), sendo, porém, o autor inglês Schumpeter quem a aproxima (1911) das concepções atuais. [...] O impulso fundamental que põe e mantém em funcionamento a máquina capitalista procede dos novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização industrial criadas pela empresa capitalista. (SCHUMPETER,1982:105) Neste contexto, o entrepreneur é aquele no qual se reconhece capacidade empreendedora, que opera negócios em busca de novas combinações, que demonstra capacidade de previsão e iniciativa. A influência da razão inovadora- um dos mais fortes elementos do movimento do empreendedorismo- como catalisadora do processo produtivo, vem se dando desde o século XVIII. O que passa a ocorrer a partir da metade do século XX até o presente momento, é o aumento da intensidade, amplitude e velocidade em que tais mudanças vinham e estão impactando a sociedade. Houve época em que as inovações descobertas em uma geração só produziriam mudanças nas gerações seguintes, propiciando o tempo necessário a todo tipo de adaptações e exigindo, inclusive, transformações profundas no que tange formação dos indivíduos. No caso da educação, e em particular da educação superior, materializa-se um acentuado processo de mudanças com uma nova compreensão em que se identifica educação como bem de consumo individual ou seja, um produto - e como habilitação ou credencial para o mercado de trabalho. Esta transformação repercute no ensino superior, não por se tratar de um modismo, mas de uma tendência que vem se consolidando e que avança em todas as áreas do conhecimento e em todas as categorias de instituições XIII

universitárias, numa consolidação crescente, caracterizando-se, também, pela complexidade de situações. É neste contexto que se situa a inclusão curricular de uma disciplina com objetivo de dar ao estudante uma visão do empreendedorismo. Esta pesquisa pretende debruçar-se sobre este objeto, numa abordagem didático-pedagógica. Com efeito, o empreendedorismo, como atividade humana, inscreve-se em diferentes cenários desde o mais particular e simples de culturas rurais até ao mais geral - das políticas econômicas, da geração de novas formas de produção, da comercialização até a tributação, do financiamento até à distribuição de renda. Entende-se, pois, que o ensino superior não poderia desconhecer a via aberta pelo empreendedorismo. Entende-se também que a análise crítica do empreendedorismo não signifique uma negação desta realidade histórica. Numa visão de complexidade, o fenômeno do empreendedorismo apresenta-se por diferentes aspectos ou dimensões através dos quais se manifesta, demonstrando possuir uma face social, política, econômica e ideológica, revelando o interesse de diferentes grupos ou classes. Ele implica, por natureza, uma face econômica na qual se colocam em jogo as opções sobre modelos de desenvolvimento, sobre o tipo de sociedade que se quer. O empreendedorismo não aparece como uma fato puro, imune aos determinantes históricos com suas respectivas orientações ideológicas, marcadas pelos interesses das classes industriais, comerciais e de pequenas empresas, nas suas confederações, federações e outras organizações, como se vê nas iniciativas da CNI / FIRJAN, da CNC / SENAC, do SEBRAE e outros. O empreendedorismo possui também uma face cultural, em que se confrontam diferentes racionalidades epistemológicas, resultando em modos diversos de compreender e conceber a Educação para o Empreendedorismo. O empreendedorismo vem sendo apresentado como uma nova postura profissional a ser adotada pelos profissionais do futuro, pelos que querem ter futuro. Aqui está talvez o grande engodo. Entende-se que o indivíduo que se utiliza das características empreendedoras seja capaz de promover, por si só, o desenvolvimento econômico do ambiente em que está inserido. Cria-se o mito de um agente provocador e/ou fomentador de XIV

mudanças. Omitem-se as circunstâncias e condições históricas e objetivas em que se exercita o empreendedorismo. Não sendo uma ciência, a cultura empreendedora a ser academicamente trabalhada em sala de aula, necessita de argumentos teóricos, de referências metodológicas e de indicações técnicas para constituir-se enquanto uma disciplina de cursos de formação superior. Em síntese, toma-se, pois, como objeto desta pesquisa o desenvolvimento didático-pedagógico, em sala de aula, da disciplina que leva o título de Formação do Empreendedor, na Universidade Católica de Petrópolis - UCP e de Vivências Empresariais, na Faculdade Arthur Sá Erp FASE, são duas instituições de ensino superior da região serrana do Estado do Rio de Janeiro, mais especificamente, da cidade de Petrópolis. A questão que se propõe é: quais as repercussões percebidas pelos alunos, em sua vida, pessoal e profissionalmente, a partir da participação na disciplina Formação do Empreendedor? Parte-se de uma colocação sobre o empreendedorismo e o seu ensino no Brasil e na Região Serrana do Rio de Janeiro (capítulo I). Confrontam-se as propostas da pedagogia do empreendedorismo e da pedagogia freiriana da autonomia (capítulo II). Em seguida apresenta-se a pesquisa didático-pedagógica realizada, com a metodologia aplicada (capítulo III). Por fim, delineiam-se os resultados obtidos na coleta de depoimentos dos alunos, através de análise de conteúdo (capítulo IV). XV

CAPÍTULO I O EMPREENDEDORISMO 1.1 O QUE É O EMPREENDEDORISMO Muitas são as definições para o termo empreendedorismo encontradas desde as obras de Cantillon (1755), Jean Baptiste Say (1803) e Joseph A. Schumpeter (1906), até Peter Drucker (1950) nos dias de hoje. A começar com a origem da palavra Entrepreneur (francês) e Entrepreneurship (inglês) que, na língua francesa apresentavam problemas de definição, vários autores passam a usá-la sem parcimônia para significados distintos. Segundo Dolabela (1999:47) Duas correntes principais tendem, no entanto, a conter elementos comuns à maioria delas. São as dos pioneiros do campo: os economistas, que associaram o empreendedor à inovação, e os comportamentalistas, que enfatizam aspectos atitudinais, com a criatividade e a intuição. Na ótica de Schumpeter, segundo Hugon (1980), a essência do capitalismo está centrada na figura do empresário, mais que isto na função do empresário: O elemento motriz da evolução é constituído pelas inovações, fontes de combinações novas das forças produtivas realizadas pelo empresário e que, ao se propagarem, vão provocar desequilíbrios. Estes pelos mecanismos dos ciclos, tendem a novos desequilíbrios em níveis mais elevados e esta prosperidade engendra o lucro, recompensa por seu trabalho de inovação, que recebe o XVI

empresário. Não há, pois, evolução sem inovação, nem inovação sem empresário, nem empresário sem crédito (HUGON, 1980: 417). Nesta perspectiva, pode-se aceitar como empreendedorismo: a arte de inovar pelo conhecimento, agregando valor aos produtos e serviços à disposição da sociedade. Um conceito simples, mas abrangente, onde o empreendedor é aquele que se propõe ao movimento constante de busca pela inovação, aproveitando qualquer oportunidade para, em agregando valor, transformá-la em riqueza. Como se pode ver no gráfico que se segue, o cenário para o desenvolvimento das condições ambientais favoráveis necessita de insumos: aliada à Educação Formal do Indivíduo (a) (conhecimento adquirido no ensino formal), insere-se a Cultura Empreendedora (b) que corresponde à assimilação das características empreendedoras que são estimuladas a partir da perspectiva de aproveitamento das Oportunidades (g). Para tanto, faz-se necessário que Políticas Locais (c) (legalização da empresa, local com infraestrutura mínima para desenvolvimento do negócio) propiciem condições favoráveis ao desenvolvimento de negócios. Dessa forma, cria-se o ambiente favorável ao surgimento da Inovação (f). Esta Inovação necessita ser irrigada com Crédito (d) (linhas de financiamento com juros acessíveis) e Apoio Institucional (e) (incubadoras de empresas, organizações governamentais e privadas de fomentos). O empreendedor, ao aproveitar as Oportunidades (g) criadas pelas condições ambientais favoráveis, inicia um novo Ciclo de Desenvolvimento (h) na sociedade, gerando valor para si e conseqüentemente para os participantes envolvidos no ambiente de negócio (geração de empregos e de novas condições favoráveis ao surgimento de novos empreendedores). Há, portanto, uma retroalimentação no Ciclo de Desenvolvimento (h) e a sustentação do cenário de condições ambientais favoráveis ao empreendedorismo. Faz-se necessário ressaltar que identificam-se dois tipos de empreendedores: (a) aquele que empreende por uma perspectiva de sobrevivência e (b) o empreendedor inovador, aquele que transforma a realidade à sua volta. XVII

No primeiro caso, o empreendedor aproveita oportunidades que surgem em função de suas disponibilidades. Empreende um negócio a partir de suas necessidades esporádicas e temporárias, não produzindo mudanças na sociedade. Seu empreendimento, sua ação, é de curta duração e é visto, pelo mercado, como atividade marginal 2. No segundo caso, o empreendedor inovador, transforma a realidade à sua volta, provocando mudanças no status quo, quebrando paradigmas, desenvolvendo novos negócios ou exercitando novas perspectivas para o mesmo. É este o responsável pelo fomento dos ciclos de desenvolvimento crescentes no mercado. Para se compreender o quão intimamente se relaciona a ação empreendedora com a questão da inovação, encontra-se no pensamento de Schumpeter (1961), a referência teórica básica para esta elaboração, como se vê a seguir. 2 Marginal na concepção da Economia é a atividade secundária. Aqui aplica-se, além de nessa perspectiva, no sentido de à margem do movimento de empreender novos negócios a partir de processos inovadores. XVIII

1.2. O CONCEITO DE INOVAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM O EMPREENDEDORISMO XIX

Cário e Pereira 3 (2003) afirmam que as inovações, para Schumpeter (1982), rompem o quadro de equilíbrio do mercado, possibilitando: o ensejo à expansão econômica, dando lugar ao desenvolvimento, progresso e à evolução. As inovações possibilitam deslocamento da função de produção, com mudança na curva de custos ou pela criação de novas funções de produção através de novas combinações. Afinal, o que são estas novas combinações promovedoras de inovações? Para Schumpeter são: a) novos produtos; b) novos métodos de produção; c) abertura de novos mercados; d) novas fontes de matérias-primas; e e) novas formas de organização industrial. (CÁRIO; PEREIRA, 2003: 2 ) A inovação estaria relacionada à criação de um novo bem ou serviço a ser oferecido ao consumidor, não estando este familizarizado com o mesmo, ou ainda, à agregação de um valor a um bem ou serviço já conhecido. Este movimento de gerar o novo para consumo, quebra a rotina do sistema econômico que mobiliza esforços concentrados para se adaptar e adaptar o mercado a partir da introdução desse elemento desestruturante que é a inovação. Nesta perspectiva, ocorre o processo de destruição criadora, onde o novo compete e supera o antigo. Isto revoluciona a estrutura econômica desde o seu interior, destruindo incessantemente a antiga e criando incessantemente uma nova estrutura. Fundamenta a dinâmica concorrencial capitalista, na medida em que determina superioridade decisiva de custos e de padrão de qualidade, altera a margem de lucro, eleva o nível de produção e abala os alicerces e a própria existência da concorrência. (CARIO; PEREIRA, 2003: 3) 3 Cario e Pereira in Inovação e desenvolvimento capitalista: referências histórica e conceitual de Schumpeter e dos Neo-Schumpeterianos para uma teoria econômica dinâmica. Paper disponível em www.portal.economia.ufpr.br/textos_economia_politica/sipvii/mesa01/caio_pereira.rtf acessado em novembro de 2003. Silvio Antônio Ferraz Cário é Prof. do Departamento de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas e Pesquisador do Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Fernanda Cristina B. Pereira é Mestre em Engenharia de Produção e Profa. do Departamento de Administração da Universidade do Extremo Sul Catarinense - Unesc.. XX

Cário e Pereira (ibid) afirmam que para Schumpeter é o empresário [...] aquele que tem capacidade empreendedora, que opera negócios em busca de novas combinações, que tem capacidade de previsão e iniciativa. Trata-se de uma pessoa desprovida de dados para suas decisões, deve prever e julgar com base na sua experiência e saber que seu sucesso conta com a intuição, com a capacidade de ver as coisas. Como, geralmente, todo indivíduo sente-se relutante em fazer o novo, o empresário tem que possuir força de vontade e ter tempo para conceber e elaborar novas combinações. Da mesma forma, como todo indivíduo depara com reação social contrária quando deseja fazer mudanças, o empresário defronta com resistências econômicas derivadas de grupos contrários às inovações. Apesar destas dificuldades existem motivações para o empresário: há um sonho e o desejo de fundar um reino privado, há o desejo de conquista, há o impulso para lutar e há a alegria de criar, de fazer as coisas, de exercitar a energia e a engenhosidade. (ibid:3-4 ) Além disto, há a corrente neo-schumpeteriana que agrega uma nova perspectiva à inovação, sendo uma série de atos unidos no processo inventivo, fator crucial para explicar os ciclos econômicos e a dinâmica do crescimento econômico. A inovação permite a evolução da firma, modifica a estrutura da indústria e altera sua capacidade competitiva.(ibid:6) É importante ressaltar que a inovação está além de ser a implantação de algo novo, um produto, um serviço, um processo no mercado; pressupõe: um processo social que suporta a novidade técnica sustentada economicamente e segue procedimentos estabelecidos, em que estão presentes processos de busca, rotinas e seleção; desenvolve formas de aprendizado; envolve organização formal que depende de infra-estrutura tecnológica e gastos para pesquisa; e seus avanços decorrem também de relações entre a ciência e a tecnologia. (CÁRIO; PEREIRA, 2003 :7-8) O que difere a visão shumpeteriana da atual perspectiva da inovação é o momento histórico em que se vive e se exige este processo de inovação. Para Schumpeter, a inovação cria o novo e provoca mudanças no sistema econômico, gerando resultados para quem a produz e desenvolvimento para o mercado e à sociedade. XXI

Hoje, a inovação é condição sine qua non para as organizações, deixando de ser uma busca, uma iniciativa individual, tornando-se um exercício coletivo permanente, sob pena de as organizações perderem suas vantagens competitivas na relação de mercado. 1.3. HISTÓRICO DO ENSINO DE EMPREENDEDORISMO NO BRASIL De acordo com Dolabela (1999: 54-55) as primeiras iniciativas para o ensino de empreendedorismo nas IES remonta a 1981, com a criação da disciplina Novos Negócios na Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas. Em 1984, a FGV estende o curso para a graduação. Na época, a USP começa a oferecer a disciplina Criação de Empresas, no curso de graduação em Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade. O Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul cria a disciplina de Ensino de Criação de Empresas. Em 1985, a FEA/USP inaugura a disciplina Criação de Empreendimentos de Base Tecnológica, no Programa de Pós-Graduação em Administração. Com o apoio do Sebrae, em 1992, a FEA oferece o Programa de Formação de Empreendedores voltado a profissionais da comunidade interessados em abrir uma empresa. Neste mesmo período, a Universidade de Santa Catarina cria a Escola de Novos Empreendedores (ENE). Ainda nesta época, é constituído o Cesar Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife, por iniciativa do Departamento de Informática da Universidade Federal de Pernambuco, com suporte da Fundação de Apoio a Ciência do Estado de Pernambuco (Facepe). Em 1993, o programa Softex, do CNPq, desenvolve uma metodologia de ensino para ser oferecida no curso de graduação em Ciência da Computação da Universidade Federal de Brasília. Em 1995, a Escola Federal de Engenharia de Itajubá, em Minas Gerais, cria o Cefei Centro Empresarial de Formação Empreendedora. A partir de 1996, surgem em todo país projetos universitários de empreendedorismo, entre os quais o Instituto Gênesis para a inovação e Ação XXII

Empreendedora, da PUC RJ. Em 1997 registra-se a constituição do Programa Reune Rede de Ensino Universitário de Empreendedorismo, apoiado por um consórcio de instituições formado pelo Sebrae-Minas, Instituto Euvaldo Lodi (IEL), Fumsoft, Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Fundação João Pinheiro. Em 1998, o IEL e Sebrae Nacional lançam o Programa Reune-Brasil, estendendo a filosofia empreendedora a todo país. Registra-se em paralelo, o crescimento do número de incubadoras de empresas nas universidades, saltando de duas para setenta e oito. Em 1998, o Instituto Nacional de Telecomunicações - INATEL - cria o NEMP [INATEL, 2002], com objetivo de agregar valores de cultura empreendedora à sua comunidade acadêmica, desenvolvendo-a nesta área. Em 1999, o Instituto Euvaldo de Lodi cria o Prêmio IEL de Interação Universidade Indústria Programas de Empreendedorismo nas Instituições de Ensino Superior, que tem como vencedora a sua primeira edição a PUC- RJ. 1.4. O EMPREENDEDORISMO NA REGIÃO SERRANA A presença da cultura empreendedora nas instituições de ensino superior na região serrana tem sido fomentada pela implantação do projeto Petrópolis Tecnópolis, criando um cenário extremamente favorável para o fomento de iniciativas como incubadoras de empresas, acordos de cooperação e desenvolvimento de novas tecnologias e processos inovadores. O projeto Petrópolis-Tecnópolis surgiu do interesse da sociedade local em assumir uma nova economia em substituição ao modelo industrial dominante em décadas passadas. Ele inspirou-se no modelo francês Sophia Antipolis 4. O objetivo principal do projeto é viabilizar o desenvolvimento tecnológico não apenas da cidade de Petrópolis, mas de toda a região serrana. 4 Sophia Antipolis situa-se em Nice, Sul da França. É considerada uma das mais bem sucedidas tecnópolis no mundo, concentrando 1.300 empresas onde atuam 20 mil profissionais, incluindo cientistas e engenheiros. Seu modelo, criado na década de 70, ainda é tido como um dos mais arrojados no mundo e alcançou sua maturidade em 20 anos, segundo o senador Pierre Laffitte, idealizador do projeto Sophia, que esteve visitando Petrópolis-Tecnópolis em 2001, Sophia e Petrópolis já são parceiras desde esta data, com intercâmbio cultural e científico. In www.petropolistecnopolis.com.br/principal. acessado em novembro de 2003. XXIII

Com a perspectiva tecnológica, Petrópolis-Tecnópolis atrai para o entorno da cidade novos empreendimentos, incrementando a economia da região. Identifica vocações para áreas determinadas, abraçando projetos em tecnologia de informação, computação, biotecnologia, telecomunicações, os quais são conduzidos por um conselho composto por 16 entidades representantes da sociedade, do segundo setor e do governo, além da FUNPAT 5. O projeto ainda conta com o envolvimento de empresas com a nova postura empreendedora 6, instituições de ensino, agências de fomento, órgãos não governamentais e centros de pesquisa, mobilizados na perspectiva do desenvolvimento da economia inovadora a partir do investimento em novas idéias e no capital intelectual do empreendedor 7. Com a intenção de que empresas, por afinidade, posicionem-se em áreas físicas próximas, para permitirem sinergias, compartilharem dispêndios em logística para redução de custo e viabilização de parcerias de negócios em áreas afins, surgiu o conceito de dividir, geograficamente, o projeto em tecnopólos, solucionando ou equacionando, inclusive, a dificuldade da cidade de Petrópolis em identificar grande espaço físico que comportasse um projeto dessa magnitude. Cinco são os tecnopólos que constituem o projeto, direcionados, cada um deles, a um segmento específico da área tecnológica: Tecnopólo 1, no Quitandinha: computação, softwares, linguagens, suprimentos e provedores da Web; Tecnopólo 2, em Corrêas: telecomunicações; Tecnopólo 3,em Itaipava: biotecnologia; Tecnopólo 4, em Duque de Caxias: metrologia, aproveitando a presença do Inmetro. 8 Tecnopólo 5, no Bingen: hardware e empresas de base econômica. 5 Fundação Parque de Alta Tecnologia 6 Micros, pequenas e médias empresas, principalmente de base tecnológica. 7 Algumas instituições comprometidas com o Projeto Petrópolis-Tecnópolis: Universidade Católica de Petrópolis, Faculdade Arthur Sá Earp Netto, Estácio de Sá, Prefeitura Municipal, Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa), Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), LNCC (Laboratório Nacional de Computação Científica), Funpat (Fundação Parque de Alta Tecnologia), Riosoft, Acirp (Associação Comercial, Industrial e Rural de Petrópolis), Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), Instituto Itaipava e o Governo do Estado, entre outras. 8 Instituto Nacional de Metrologia, localizado em Xerém. XXIV

Neste cenário, as instituições de ensino superior assumem uma missão de grande responsabilidade: formar, dentro da cultura empreendedora, futuros profissionais, com o perfil adequado à proposta do projeto Petrópolis-Tecnópolis. Pierre Laffitte, em visita a Petrópolis, no ano de 2001, afirmou que um dos ingredientes principais para que o projeto Petrópolis-Tecnópolis seja bem-sucedido é transmitir aos alunos a relevância econômica e cultural do projeto e as perspectivas futuras de mercado profissional. 9 Com essa afirmação, reforça-se a importância da inserção da cultura empreendedora nas instituições de ensino principalmente nas faculdades e universidades. Neste contexto, a UCP saiu na frente e implantou a sua primeira Incubadora de Empresas através do PROEMPI - Programa de Empreendedorismo integrada ao espírito do Projeto Petrópolis-Tecnópolis. Os planos de negócios incubados são de base tecnológica, desenvolvidos por alunos e professores da instituição, abraçando iniciativas de outros empreendedores que não sejam da UCP. Ao assumir esta missão de fomento da cultura empreendedora, oferecendo no espaço universitário estrutura física, recursos materiais e suporte administrativo-acadêmico, as instituições locais de ensino superior, engajadas no projeto, são responsáveis pela integração academia-mercado, permitindo que o espaço da pesquisa acadêmica possa resultar em aplicação desta no mercado, gerando futuros negócios e conseqüente desenvolvimento econômico para a sociedade. 9 In Distribuição da População por Anos de Estudo. Fundação CIDE Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro. Em www.petropolistecnopolis.com.br, acessado em novembro de 2003. XXV

1.4.1 O EMPREENDEDORISMO NA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS O PROEMPI Com a intenção de fomentar a cultura empreendedora e permitir que as pesquisas científicas desenvolvidas no espaço da universidade pelos seus pesquisadores 10 assumam uma perspectiva prática, a UCP constituiu o PROEMPI Programa de Empreendedorismo e Incubadora de Empresas. Trata-se de consolidar projetos acadêmicos, permitindo a geração de novos negócios formatados em micro e pequenas empresas que desenvolvem novos produtos, processos ou serviços de base tecnológica. Com a viabilização dessas empresas há uma conseqüente expansão do mercado de trabalho e maior desenvolvimento sócioeconômico da região. Professores também são orientadores de projetos dos alunos empreendedores, apoiados ainda pela Empresa Jr., que elabora os planejamentos estratégicos na fase de préincubação. Além disso, os empreendedores contam com uma estrutura de apoio operacional 11 constituída por recepcionista, sala de reunião, com área de uso compartilhado entre as empresas incubadas, recursos multimídia, participação em eventos, palestras e rodadas de negócios, assessoria empresarial 12. O espaço físico é estruturado numa sala equipada com instalações elétricas e acesso à internet. Podem ainda ter suporte dos laboratórios de informática e biblioteca da universidade. 10 Professores pesquisadores em conjunto com alunos de graduação, envolvidos nos programas de iniciação científica e os de pós-graduação. 11 In www.ucp.br/proempi acessado em novembro de 2003. 12 Suporte oferecidos através das diversas Unidades Universitárias da UCP. XXVI

Abaixo é apresentado o fluxograma de evolução da incubação de um negócio dentro da incubadora UCP. Na perspectiva desse modelo, a incubação se dá em três fases, com o objetivo final de amadurecimento do negócio para ser empreendido fora da incubadora, estruturada como micro, média ou pequena empresa. Fonte: www.ucp.br/proempi. acessado em novembro de 2003. XXVII

1.4.2. O EMPREENDEDORISMO NA FACULDADE ARTHUR SÁ EARP NETO - FASE Especialmente comprometida com as comunidades que a cercam, a FASE implanta em sua grade curricular a disciplina Seminários e Vivências Empresariais, com a finalidade de desenvolver em seus alunos o espírito empreendedor, pois entende que o desenvolvimento destas comunidades, necessita de um profissional que perceba o cenário à sua volta com a perspectiva de identificar oportunidades que gerem tranformações para a sociedade, fazendo da criatividade uma arma poderosa para vencer a adversidade e gerar resultados em suas áreas de atuação. Ao associar a formação empreendedora de seus alunos com o compromisso social, intenciona transformar a instituição em um centro irradiador de desenvolvimento, que se auto-alimenta continuamente com o exercício dos educandos em criar novas idéias, quebrar paradigmas e gerar inovação. XXVIII

CAPÍTULO II DA PEDAGOGIA EMPREENDEDORA À PEDAGOGIA DA AUTONOMIA 2.1 CONTEXTUALIZANDO O CENÁRIO Segundo Manangão (2003) é inegável o fato do impacto das tecnologias de informação mudarem o mundo e a forma como vem se dando o processo de globalização. Neste cenário, as empresas precisam produzir coisas incomuns para fazer frente à concorrência cada vez mais acirrada. Os fatores de sucesso das empresas se transferem da produção em massa para o processo de diferenciação, exigindo profissionais cada vez mais criativos, aptos a desenvolver novos produtos ou a ampliá-los a partir de expectativas e desejos do consumidor. (MANANGÃO, 2003, p.4-10) As organizações exigem, a partir de então, indivíduos que possam desenvolver altos níveis de percepção do mundo para acelerar o processo de construção do capital intelectual ativo intangível responsável pelo movimento que leva ao desenvolvimento não só das organizações, mas da sociedade como um todo. Aprender a transformar-se constantemente é outro novo paradigma do comportamento a ser assumido. Nunca se falou tanto em empreendedorismo. XXIX

A nova organização do século XXI identifica o capital humano como um dos fatores-chave para a conquista de diferencial competitivo. A missão dessa nova organização em um mercado globalizado e altamente competitivo é buscar a geração de diferenciais criar mudanças com valor agregado. O poder das organizações está intimamente relacionado ao valor das informações adquiridas e do conhecimento produzido a partir de então por seus colaboradores. Agilidade, criatividade e eficiência são, portanto, algumas das competências essenciais exigidas ao novo trabalhador para que este possa ser identificado entre os de maior empregabilidade. 2.2. O EMPREENDEDORISMO COMO SAÍDA PARA O PROBLEMA DO DESEMPREGO NO SISTEMA CAPITALISTA E A QUESTÃO DA EMPREGABILIDADE No atual contexto de desenvolvimento das forças produtivas, não se pode deixar de perceber o movimento de milhares de jovens saindo das universidades com seus diplomas na mão para deparar-se com um mercado de trabalho extremamente recessivo e por grande competitividade. Busca-se, então, a alternativa da formação empreendedora para estimular neste público uma atitude diferenciada: em vez de buscar uma vaga no tradicional mercado de trabalho, o demandante empreende um projeto próprio, constrói sua própria empregabilidade, esquivando-se da manipulação do mercado, gerando sua autonomia.. Sabe-se que o Estado e o segundo setor, representado pelas empresas privadas de médio e grande porte, perderam a capacidade de gerar a tal empregabilidade. Neste novo século, o que se percebe é que o fomento da pequena e micro empresas está gerando novas possibilidades de trabalho, de oportunidades - ainda em ritmo lento, mas progressivamente. Sim, porque o emprego formal, como a sociedade conhecia, é hoje muito reduzido. Na produção intelectual contemporãnea é comum ouvirmos expressões como desaparição do trabalho : XXX

O que se passa, então, com o mundo real do trabalho? Da General Motors à Microsoft, da Benetton à Ford, da Toyota ao McDonalds, será que o mundo produtivo e de serviços de fato não mais carece do trabalho vivo? [...] Em verdade, o sistema de metabolismo social do capital necessita cada vez menos do trabalho estável e cada vez mais das diversificadas formas de trabalho parcial ou part-time, terceirizado, [...] (Antunes 13, 2002:p.39-40) Além disso, observa-se que as organizações estão buscando trabalhadores com um novo perfil, dando preferência àqueles aptos a um exercício intelectual, explorando competências até enttão não privilegiadas. Mesmo o trabalho manual cada vez mais é substituído por trabalho dotado de uma dimensão intelectual. a própria forma valor do trabalho se metamorfoseia. Ela assume crescentemente a forma valor do trabalho intelectual-abstrato. A força de trabalho intelectual produzida dentro e fora da produção é absorvida como mercadoria pelo capital que se lhe incorpora para dar novas qualidades ao trabalho morto[...]. A produção material e a produção de serviços necessitam crescentemente de inovações, tornando-se por isso cada vez mais subordinadas a uma produção crescente de conhecimento que se converte em mercadorias e capital. (VICENT, J.M, in ANTUNES, 2002:42) Quando se fala em inovação, verifica-se que ela é exigida em todas as estruturas produtivas da sociedade. As próprias organizações buscam identificar competências empreendedoras em sua força de trabalho para constituir seu capital intelectual. O empreendedorismo se observa como um comportamento emergencial a ser assumido, como perspectiva de empregabilidade, seja para aquele que irá empreender por conta própria ou para o que se habilita a um trabalho formal. Segundo Dolabela (2002), o empreendedorismo é o elemento central no processo de desenvolvimento humano, social e econômico, ou seja, a mola propulsora do processo de constante mudança e inovação das sociedades. O fenômeno empreendedorismo tem a idade da civilização, se assumido como a capacidade humana de usar a criatividade para o indivíduo melhorar a sua condição de vida. 13 ANTUNES, Ricardo in Trabalho e Superfluidade artigo extraído do livro Capitalismo, Trabalho e Educação. São Paulo: Autores Associados, 2002. XXXI

No século XXI o princípio é resgatado e surge como mecanismo de escape para dar conta de questões mal-resolvidas do sistema capitalista como a recessão, o desemprego, a exclusão social, a própria empregabilidade,a qual se reveste de condições impositivas como a exigência de competências e habilidades que divide o mercado entre vencedores e perdedores : os que vivem a empregabilidade e estão dentro do jogo e os que não se sustentam no mercado de trabalho por falta das ditas competências, como afirma Bourdieu: A ideologia da competência convém muito bem para justificar uma oposição que se assemelha um pouco à dos senhores e dos escravos: de um lado, os cidadãos de primeira classe, que possuem capacidades e atividades muito raras e regiamente pagas, que podem escolher o seu empregador, enquanto os outros são escolhidos por seu empregador, no melhor dos casos, que estão em condições de obter altos salários no mercado de trabalho internacional, que são super-ocupados, homens e mulheres [...] e depois, do outro lado, uma massa de pessoas destinadas aos empregos precários ou ao desemprego. (BOURDIEU, 1998:59) Ironicamente, é do empreendedorismo percebido como alternativa para se estimular um novo comportamento do indivíduo em relação ao mercado de trabalho, tornando-se economicamente ativo não mais através da conquista de um emprego, mas da viabilização de seu próprio negócio - que advém também a inovação empreendedora do capital intelectual das empresas, que gera o diferencial competitivo num mercado globalizado. Para o intra-empreendedor ou o empreendedor que trabalha em uma organização como empregado ou colaborador, os comportamentos empreendedores são exigidos num momento crucial onde a empregabilidade está diretamente ligada à capacidade deste profissional em transformar sua condição produtiva em um processo de criatividade, aprendizado, construção de conhecimento e geração de inovação: pensando, agindo e produzindo através da ação de suas competências. XXXII

2.3 A QUESTÃO DAS ABORDAGENS DAS COMPETÊNCIAS Ao abordar-se a questão da competência, faz-se mister ressaltar a perspectiva de Perrenoud, a qual influenciou as mudanças curriculares no Brasil e conseqüentemente a estruturação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). O objetivo agora não é só passar conteúdos, mas preparar todos para a vida moderna ( PERRENOUD, 2002:2 ). Entretanto, quando solicitado a definir competências, faz a seguinte afirmação: Não existe uma definição clara e partilhada das competências. A palavra tem muitos significados, e ninguém pode pretender dar a definição [...] as competências são importantes metas de formação. Elas podem responder a uma demanda social dirigida para a adaptação ao mercado e às mudanças e também podem fornecer os meios para aprender a realidade e não ficar indefeso nas relações sociais.[...] Essa evolução é difícil, pois ela exige importantes transformações dos programas, das didáticas, da avaliação, do funcionamento das classes e dos estabelecimentos de ensino, do oficio de professor e do ofício de aluno. Essas transformações suscitam a resistência passiva ou ativa por parte dos interessados, de todos aqueles a quem a ordem gerencial, a comunidade das práticas ou a preservação das vantagens adquiridas importam muito mais do que a eficácia da formação.( PERRENOUD, 1999:19, 32-33). Observa-se neste texto uma análise cuidadosa sobre as contribuições relacionadas diretamente com a construção do conhecimento e com o crescimento cognitivo e sóciocultural do homem em sua totalidade. A descrição de competências deve partir da análise de situações, da ação, e disso derivar conhecimentos. Os países que querem ir rápido demais se lançam na elaboração de programas sem dedicar tempo à observação das práticas sociais, sem identificar situações com as quais as pessoas são e serão verdadeiramente confrontadas. (PERRENOUD, 2002, p.2). XXXIII

Analisar a ordem profissional e, sucessivamente, toda ordem social, parece também fundada numa ordem conseqüente das competências. Segundo Perrenoud (2002), em geral, a escola se preocupa mais com ingredientes de certas competências e menos em integrá-las nas situações mais complexas. Percebe-se na fala do autor em questão que a educação preocupa-se com os conteúdos das disciplinas, mas não tem a preocupação de ligar essas disciplinas, esses recursos a situações do cotidiano. Em entrevista à revista Nova Escola, Rio de Janeiro, p. 1, setembro de 2002 afirma que [...] A abordagem por competências é uma maneira de levar a sério um problema antigo, o de transferir conhecimentos. Perrenoud (2000) afirma que a transferência e a mobilização são essenciais, fundamentais e não caem do céu. A formação por competências visa a formação do ser como um todo. Saber articular os saberes é que fará a grande diferença entre o aprendizado por conteúdos, ou pela ordem das competências. Nessa ordem, os conhecimentos são considerados válidos quando disponíveis no momento certo e quando são adequados às situações determinadas. Segundo Perrenoud (ibid), competência pode ser considerada a capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiando-se em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles. A definição das competências consiste, nesse sentido, em colocar de forma operacional, e não-genérica, os objetivos do ensino. É inútil exigir esforços sobre-humanos dos professores se o sistema educativo apenas adota a linguagem das competências, sem mudar nada de fundamental. [...] As competências não dão as costas para os saberes, mas não se pode pretender desenvolvê-las sem dedicar o tempo necessário para colocá-las em prática (PERRENOUD, 2002:2) Educar na perspectiva da competência é formar para tornar a trajetória do educando mais efetiva. É importante ressaltar que o aspecto da efetividade está intrinsecamente relacionado com questões práticas e dinâmicas da modernidade, lembrando que A educação precisa educar a modernidade. Esta é a relação dinâmica entre educação e modernidade. Resolver as questões-chaves da educação, para conduzir o processo de modernidade. (DEMO, 1993). Dessa forma, conclui-se que o ato de educar inclui a capacidade de: Saber identificar; avaliar e valorizar suas possibilidades, seus direitos, seus limites e suas necessidades; saber formar e conduzir projetos e desenvolver XXXIV

estratégias; saber analisar situações, relações e campos de força de forma sistêmica; saber cooperar, agir em sinergia, participar de uma atividade coletiva e partilhar liderança; saber construir e estimular organizações e sistemas de ação coletiva do tipo democrático; saber gerenciar e superar conflitos; saber conviver com regras, servir-se delas e elaborá-las; saber construir normas negociadas de convivência que superem as diferenças culturais, entre tantas outras coisas. (PERRENOUD, 2000: 2). Empreendedora. É exatamente esta a pauta de competências estimulada no ambiente da Educação Para desenvolver competências é preciso, antes de tudo, trabalhar por resolução de problemas e por projetos, propor tarefas complexas e desafios que incitem os alunos a mobilizar seus conhecimentos e, em certa medida, completá-los. Isso pressupõe uma pedagogia ativa, cooperativa, aberta para a cidade ou para o bairro seja zona rural ou urbana. ( PERRENOUD, 2002, p. 3). A existência de uma competitividade em cadeia vem gerando o desgaste profissional em todo o processo evolutivo de qualquer área de trabalho. Hoje, coexistem a exigência de afazeres sucessivos, a cobrança permanente de estar no mundo do trabalho e a gestão de competências, como obrigações diárias. É a necessidade de sobrevivência que reforça cada vez mais o vínculo com o emprego. O culto da competência é carismático, é a apologia do poder individual, mediante o qual os produtos da atividade humana aparecem como mágicas. Os indivíduos que se inserem nestas relações enquanto mercadores da própria força de trabalho vivem uma identidade social objetiva e singular. A competência enquanto atributo pessoal se identifica com o ser rentável e o saber competir, a capacidade de pertencer ao mercado por direito. O modelo da empregabilidade para a competência obedece uma lógica orientada para a busca do imediato e a valorização da obtenção individual. A qualificação humana para o trabalho é, portanto, um processo social mais amplo, determinado historicamente. (MACHADO, 1998: 17). Dentro do conceito de qualificação profissional estar em constante evolução, conforme exigência do mercado e o patamar social adquire-se o potencial inerente e de adaptação às mudanças ocorridas no processo de construção e formação para o trabalho. Por essa razão, nos anos 90 o termo competência é utilizado, nas organizações produtivas e nas instituições educacionais, como substituto da noção de qualificação profissional. XXXV

A noção de competência é, de fato, uma noção forte e deve ser recuperada, mas numa perspectiva que rompa com os critérios que a estão orientando na atualidade: o fatalismo da disputa competitiva, [...] Do mundo do trabalho vem o modelo das competências com todas as contradições que ele suscita. Vem também a constatação do que ser competente representa, também, saber transgredir ( MACHADO, 1998, p. 93). Estar inserido no mercado de trabalho, hoje, no qual há cobranças, gera insegurança fragmenta e mercantiliza; cria conflito íntimo, insatisfação pessoal;busca interminável diante das demandas perversas que aí estão. No cenário angustiante de cobranças, percebe-se que, ao longo da história da educação no Brasil, não foi diferente, houve muitas perguntas, mas que ficaram à margem de discussões e permanecem até os dias de hoje sem soluções. No debate sobre a reestruturação produtiva, a relação educação, trabalho e desenvolvimento é então resposta e a teoria do capital humano reeditada. A educação sofre um questionamento bipolar. Por um lado é vista como culpada pelo atraso e pobreza [...] e, pelo outro, como o principal setor da sociedade responsável pela promoção do desenvolvimento econômico, a distribuição de renda e a elevação dos padrões de qualidade de vida. (MACHADO, 1998, p.20) Ainda citando Machado (ibid), o fazer humano, em cada momento histórico, encontra-se subordinado a motivos e interesses sociais que o orientam. A natureza das relações sociais constitui, também, a base do desenvolvimento das capacidades humanas. A relação do sujeito com o mercado de trabalho depende, assim, não apenas de simples atributos e qualidades técnicas e culturais específicas, mas de uma soma de fatores complexos e contraditórios a qual define como tal sujeito insere, nas relações de trabalho, sua subjetividade e sua forma de exercitar sua capacidade de trabalho. Deluiz (1995) ainda acrescenta que o processo de emancipação do indivíduo passa por um envolvimento com questões coletivas e necessita, portanto, de políticas e mecanismos que sustentem essa integração: A formação do indivíduo no âmbito profissional, orientada para um processo de emancipação pessoal e coletivo, supõe, portanto a concepção de que a formação profissional faz parte do todo que constitui a formação cultural ampla, superando-se a dicotomia entre o mundo da educação e o mundo do trabalho. XXXVI