DOENÇAS DA ERVA-MATE NO BRASIL. Albino Grigoletti Júnior', Alvaro Figueredo dos Santos! e Celso Garcia Auer' RESUMO

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Transcrição:

DOENÇAS DA ERVA-MATE NO BRASIL Albino Grigoletti Júnior', Alvaro Figueredo dos Santos! e Celso Garcia Auer' RESUMO A área de cultivo da erva-mate vem aumentando nos últimos anos, ao mesmo tempo que novas técnicas estão sendo adotadas, graças às pesquisas que vêm sendo desenvolvidas. A erva-mate passou de seu ambiente natural para um agroecossistema. As diferenças que existem entre estes dois sistemas evidenciam-se através de vários aspectos, inclusive no comportamento dos microrganismos e seus inimigos naturais. No patossistemanatural ou selvagem, o número de hospedeiros (erva-mate) é pequeno em relação ao patossistema agrícola, existindo barreiras fisicas e homeostase dos microrganismos; podem ocorrer doenças, porém em menor intensidade que no patossistema agricola. O aumento da produtividade, seja pelo aumento do número de plantas por hectare ou pelo aumento do vigor das plantas, produzindo maior massa foliar, poderá favorecer o aparecimento de doenças importantes à cultura. A utilização de sementes de boa procedência, de mudas sadias, de espaçamentos adequados e de adubações equilibradas, dentre outros aspectos, irá prevenir a ocorrência de doenças e gerar colheitas de melhor qualidade. DISEASES OF MATE IN BRAZIL ABSTRACT The cultivated area of mate has increased in the last years, and new technologies have been developed and adopted. Mate has passed from a natural system to a agroecosystem. There are evident differences between these systems, specially in the microorganisms involved in different subsystems (pathosystems). ln natural pathosystems, there are low host frequency, homeostase and physical barriers to microorganisms, keeping diseases in lower intensity than in a crop pathosystem. The increase of productivity of mate by a high density of plants per are a or increasing plant vigor, will produce higher foliar biomass, but also will favor the appearence ofimportant diseases. The utilization of good seeds, healthy seedlings, adequate spacing and fertilization, among another factors, will prevent the occurence of diseases and promote better quality ofthe crop. 1 Pesquisador, Doutor, Embrapa Florestas - Caixa Postal 319. Fone (041) 76G-1313, Fax (041) 766-1276 - CEP 83411-000. Colombo, PR. 359

11 Reunião Técnica do Cone Sul Sobre a Cultura da Erva-Mate l.introduçáo A erva-mate (Ilex paraguariensis St. Hil.) ocupa um importante papel na atividade agrícola dos estados da região sul do Brasil e, mais recentemente, está se expandindo para o estado do Mato Grosso do Sul. A exploração da erva-mate constitui-se numa das poucas alternativas de emprego e renda para os trabalhadores e produtores na estação do inverno (RODIGHERl et al., 1995). A produção anual brasileira de erva-mate, em torno de 210 mil t, com receita de R$ 150 milhões anuais, está concentrada nos estados de Santa Catarina (53,60%), Paraná(23,30%), Rio Grande do Sul (21, 15%) e Mato Grosso do Sul com 1,60% da produção nacional. No período de 1970 a 1992, a produção nacional de mate cresceu 83,59%, passando de 113.460 tem 1970, para 208.298 tem 1992 (Extração... 1973 e 1994). A expansão da área plantada e a mudança do modo de exploração de extrativista para exploração tecnificada vêm provocando alterações significativas no ecossistema erva-mate. Essas modificações favorecem o aparecimento de problemas fitossanitários, como é o caso da broca da erva-mate (Hedypathes betulinus), que causa perdas econômicas significativas em alguns locais, para a cultura da erva-mate. Poucas são as informações disponíveis sobre doenças de erva-mate, tanto na bibliografia nacional como na estrangeira, apesar do desenvolvimento da cultura na última década. O primeiro registro da literatura abordando doenças da erva-mate foi feito por SPEGAZZINI (1908), na Argentina. No Brasil, MAUBLANC (1913) e GRlLLO (1936) fizeram constatações e descreveram alguns fimgos que foram assinalados em plantas de erva-mate. VELLOSO et al. (1949) relatam alguns fungos associados à erva-mate, em levantamentos fitossanitários no estado do Paraná. Uma revisão foi compilada posteriormente por AUER e GRlGOLETTI (1995). Em um levantamento nas principais regiões produtoras do sul do Brasil, GRlGOLETTI et al. (1996) constataram a ocorrência de várias doenças, principalmente em VIveiros. Neste trabalho, foram sistematizadas importantes informações sobre doenças da erva-mate, resultantes das pesquisas feitas pela EMBRAPA e da consulta à literatura existente, procurando correlacionar a ocorrência de doenças, em função do manejo ou do sistema adotado. 360

2. ECOSSISTEMA DA ERVA-MATE A área de distribuição natural da erva-mate abrange aproximadament-e 540.000 krrr', compreendendo territórios do Brasil, da Argentina e do Paraguai, situados entre as latitudes de 21 S e 30 S e longitudes de 48 30' We 56 10' W, com altitudes variáveis entre 500 e 1000m. Só no Brasil estão situados 450.000 km 2 desse total, abrangendo a região centro-norte do Rio Grande do Sul, quase todo o Estado de Santa Catarina, centro-sul e sudoeste do Paraná, sul do Mato Grosso, e reduzidas áreas em Minas Gerais e São Paulo (OLIVEIRA & ROTTA, 1983). Para um melhor entendimento deste estudo, a seguir, são apresentados os conceitos de sistemas naturais e agrícolas e seus subsistemas, definidos por BERGAMIN (1995). Ecossistema pode ser definido como um sistema complexo, incluindo além dos organismos envolvidos, também o complexo de fatores fisicos que formam o que chamamos de ambiente do bioma. Agroecossistema é um ecossistema modificado pelo homem, para atender os seus objetivos na produção de alimentos, fibras, energia, etc. Patossistema é um subsistema dentro de um ecossistema e caracteriza-se pela interação entre patógeno e hospedeiro, ou seja, é um subsistema onde ocorre parasitismo. "Patossistema selvagem" é um subsistema do ecossistema, onde não houve interferência do homem, já o "patossistema agrícola" é um subsistema do agroecossistema onde houve e/ou está havendo ação do homem. Um subsistema do patossistema é o fitopatossistema, onde estão envolvidos os vegetais associados aos patógenos no ambiente. Observando as diferenças que ocorrem entre o ambiente natural e o agrícola (tabela 1) verifica-se que todas as situações do ambiente agrícola conduzem a desequilíbrios provocando distúrbios que podem aumentar a incidência de pragas e doenças em níveis maiores que ocorreriam num ambiente natural. 361

11 Reunião Técnica do Cone Sul Sobre a Cultura da Erva-Mate Tabela 1. Principais diferenças entre o ecossistema natural e o agroecossistema da erva-mate. FATORlSITUAÇAO SITUAÇÃO N DE ÁRVORESIHA ECOSSISTEMA NATURAL 62* AGRÍCOLA ATÉ 5000 IDADE DAS PLANTAS VARIÁVEL HOMOGÊNEA DISPERSÃO HORIZONTAL AO ACASO UNIFORME DISPERSÃO VERTICAL VARIÁVEL UNIFORME MICROCLIMA FLORA FAUNA BIODlVERSIDADE HETEROGÊNEO ABUNDANTE ABUNDANTE GRANDE HOMOGÊNEO REDUZIDA REDUZIDA PEQUENA * Fonte: Oliveira e Rotta (1982) Atualmente, a propagação da erva-mate é por semente, propiciando uma razoável variabilidade genética, não existindo ainda variedades melhoradas ou clones selecionados. Esta situação amplia a base genética e evita surtos epidêmicos. A seleção de clones produtivos poderá provocar uma erosão genética da resistência, proporcionando a homogeneidade que favorece o desenvolvimento e a propagação de patógenos. As adubações visando alta produtiviadade deixam os tecidos e orgãos bastante tenros e altamente suscetíveis às doenças. Além disso, esta prática irá interferir sobre os microrganismos habitantes do solo e da planta. O uso de agroquímicos, que não são permitidos na cultura da erva-mate pode contaminar as folhas com seus resíduos. Estes produtos afetam não só os patógenos como também outros microrganimos, dentre eles os antagonistas responsáveis pejo equilíbrio das populações de patógenos. As podas anuais intensivas de ramos vigorosos e principalmente as podas de rebaixamento provocam ferimentos que são a porta de entrada de fungos causadores de podridões do tronco que evoluem podendo causar a morte da árvore. A freqüência de plantas de erva-mate na floresta é baixa em comparação com plantios, isto faz com que tanto a população de patógenos quanto sua dispersão fiquem reduzidas. Além disso, na mata existem barreiras fisicas entre árvores da mesma espécie, que impedem ou dificultam a disseminação dos patógenos. 362

A exploração da erva-mate, primariamente extrativista em sua totalidade, quando cultivada sofreu uma série de mudanças que além de alterar a fisiologia da planta modifica o comportamento dos macro e microrganismos que estão associados à espécie. No ambiente da floresta a ação de doenças é controlada pelo ecossistema natural, já no ambiente agrícola como o hospedeiro é abundante e homogêneo, a biodiversidade é pequena, os poucos inimigos naturais existentes não conseguem equilibrar a elevada população dos patógenos. 3. DOENÇAS DA ERVA-MA TE NO BRASIL A ocorrência de doenças em regiões ervateiras do Rio Grande do Sul (Venâncio Aires e Erechim), de Santa Catarina (Canoinhas e Chapecó) e do Paraná (São Mateus, Ivaí, Guarapuava e Cascavel) foi registrada por meio de inspeções em viveiros e em plantações. As principais doenças de importância econômica que foram constatadas são: o tombamento de mudas, causado pelos fungos Fusarium sp., Pythium sp. e Rhizoctonia sp.; a pintapreta causada por Cylindrocladium spathulatum; e a antracnose causada por Colletotrichum sp. Além destas, existe um grupo das que são consideradas potencialmente importantes e outro daquelas consideradas secundárias. Doenças como o tombamento de mudas, a pinta preta e a antracnose apresentam um dano potencial, isto é, aquele que pode ocorrer sem que sejam tomadas medidas de controle, que poderá chegar a 100%. O dano real, ou seja, aquele que ocorreu ou que está ocorrendo, poderá ter um efeito direto na produção, na qualidade da muda ou no custo do controle. O efeito indireto do dano vai incidir sobre os produtores, consumidores e meio ambiente. De acordo com estudos recentes realizados em viveiros dos estados do Paraná e do Rio Grande do Sul, os danos reais diretos poderão chegar a 21,8% em função das doenças, podendo acarretar perdas de até R$8.000,00 por viveirista na amostra estudada. Doenças de importância econômica Tombamento de mudas O tombamento é a principal doença das sementeiras, porque as condições dos canteiros são bastante favoráveis ao desenvolvimento de fungos. Os principais fungos associados ao tombamento são: Fusarium sp.; Pythium 363

sp. e Rhizoctonia sp. A alta umidade, a alta densidade de sementes por metro quadrado e o sombreamento são fatores que predispõem as plântulas à doença. Os sintomas são semelhantes aos que ocorrem em outras culturas, tanto na fase de pré como de pós-emergência. Em pré-emergência, as plântulas não emergem, dando a impressão que as sementes têm baixo poder germinativo. Em pós-emergência pode ocorrer um estrangulamento na região do colo, provocando o tombamento ou seca total das plântulas. Estes sintomas ocorrem geralmente em reboleiras, nas margens ou na parte interna dr.s canteiros. A disseminação da doença no canteiro se dá por meio da água de irrigação. Nas mudas repicadas, ocorre por meio de respingos de água e da movimentação das mudas no viveiro. Excetuando-se a presença de inóculo no substrato, o fator mais importante para o estabelecimento e desenvolvimento da doença é o excesso de umidade do solo. Pinta-preta A mancha da folha da erva-mate, também conhecida como pinta-preta, é a principal doença fúngica da cultura, incidindo tanto na sementeira como em mudas transplantadas. Provoca severos prejuízos, tanto no viveiro como no campo. No viveiro, devido às características da doença, os danos poderão ser totais se não for tomado algum tipo de controle. O ataque do fungo Cylindrocladium spathulatum provoca lesões foliares arredondadas, às vezes concêntricas, no interior ou nos bordos do limbo, geralmente em folhas adultas. Estas manchas podem aumentar em tamanho, chegando até 2 em de diâmetro, ou permanecerem pequenas com 1 a 2 mm. Independente do número ou do tamanho das lesões estas poderão provocar a sua queda prematura. A penetração do fungo se dá pelos estômatos, geralmente presentes na face abaxial da folha. Nesta face, verifica-se, em condições de umidade elevada, abundante fiutificação esbranquiçada, sinal característico do patógeno. Uma característica marcante da doença é provocar a ~ queda prematura das folhas basais, deixando as mudas somente com a brotação apicai. No viveiro, a disseminação se realiza por meio dos respingos de água, onde as folhas caídas exercem um papel importante no ciclo secundário da doença. Os substratos e as instalações contaminadas são responsáveis pelas 364

infecções primárias. As infecções secundárias se dão, principalmente, por conídios oriundos de folhas contaminadas. As plantações próximas do viveiro e a produção contínua de mudas, sem os devidos cuidados sanitários, são as principais causas da elevada incidência. O excesso de umidade e de sombreamento também contribuem para o agravamento da doença. ' Antracnose É uma doença que se manifesta principalmente em brotações novas, folhas e ramos jovens. Esta doença ocorre no viveiro, no campo e também em estacas, sob nebulização, durante o processo de propagação vegetativa. O fungo causador da antracnose pertence ao gênero Co/letotrichum sp. Nas sementeiras, ocorre a queima e morte do ápice das plântulas, impedindo o crescimento e provocando alterações na forma das mudas. A morte apical ativa as gemas laterais, estimulando o perfilhamento das mudas. Os principais sintomas nas folhas são manchas necróticas escuras, irregulares, incidindo principalmente nos brotos, causando deformações nas folhas jovens. Em condições de extrema umidade, ocorrem sinais do patógeno, na forma de massas de conídios de coloração amarelo-alaranjada. Pouco se conhece sobre esta doença em erva-mate, e as condições de temperatura, umidade, disseminação e sobrevivência do patógeno ainda não foram estudadas. Doenças potencialmente importantes Podridões de raízes Esta doença se manifesta tanto nas sementeiras como em mudas já transplantadas nas embalagens, podendo ocorrer também em mudas no campo. Nas sementeiras formam-se reboleiras ou ocorrem em plântulas esparsas. Em mudas transplantadas, podem ocorrer em algumas embalagens e, em ambos os casos, está relacionada ao excesso de umidade. Os principais fungos associados são Fusarium sp., Rhizoctonia sp. e Pythium sp. Os principais sintomas da parte aérea são a redução no crescimento das mudas, o amarelecimento, a queima e a seca das folhas, que iniciam a partir da extremidade do limbo. No sistema radicular, observa-se um crescimento reduzido com escurecimento e apodrecimento das raizes. 365

II Reunião Técnica I Congresso Sul-Americano da Erva-Mate do Cone Sul Sobre a Cultura da Erva-Mate Nematóides Em viveiros permanentes os nematóides representam uma ameaça constante, pois sua presença além de causar prejuízos diretos, causando morte de mudas e plântulas, poderá interditar o viveiro. Na parte aérea, os sintomas causados pelos nematóides não são muito característicos, as mudas reduzem o crescimento, amarelecem e as vezes morrem. Nas raízes, a formação de galhas são sintomas típicos de nematóides do gênero Meloidogyne. Cercosporiose É uma doença que ocorre com maior freqüência em plantas estressadas. No viveiro, sua ocorrência é verificada principalmente em mudas que passaram do ponto de plantio. Em folhas adultas, a doença se manifesta em forma de pequenas manchas arredondadas, bem delimitadas, com a parte central acinzentada apresentando pequenas pontuações negras. Posteriormente a parte central necrosada rompe-se, ficando a folha com perfurações em seu limbo. Queda de folhas Em condições de campo, as causas da queda anormal de folhas ainda não estão totalmente esclareci das. A época que mais ocorre esta anomalia é no final do outono. Fatores fisicos como deficiência ou excesso de água por longos períodos e compactação do solo, podem provocar este distúrbio. A presença de manchas foliares causadas por Cylindrocladium spathulatum, também são responsáveis pela queda de folhas em plantios comerciais,(carpanezzi et ai. 1983). Outras Doenças Fumagina É uma doença sem importância econômica que ocorre com freqüência em outras espécies cultivadas, principalmente frutíferas. O sintoma é bastante característico, onde os fungos de vários gêneros, dentre eles Capnodium sp., desenvolvem uma crosta espessa escura sobre folhas e ramos, aproveitando-se das secreções de insetos, principalmente de cochonilhas. O ataque pode ocorrer em parte, ou em toda a planta. O crescimento denso e escuro sobre os órgãos clorofilados pode reduzir a atividade fotossintética das plantas atacadas, e até levá-ias à morte. 366

Fuligem A fuligem, causada por Asterina mate tem alguma semelhança com a fumagina, pois desenvolve-se superficialmente. Ocorre geralmente em-mudas estressadas, seja por excesso de sombreamento, umidade elevada, ou outro fator. Os sintomas principais são manchas escuras, circulares, que podem se justapor e são mais abundantes na face inferior das folhas 4. AGROECOSSISTEMA DA ERVA-MATE X DOENÇAS Existe uma expectativa negativa com relação ao futuro das áreas que estão sendo estabelecidas com erva-mate, pois grandes áreas com monocultivo favorecem o estabelecimento e a especialização de patógenos, que poderão se tornar cada vez mais agressivos. Atualmente não existem doenças limitantes em ervais cultivados. Alguns casos isolados de Queda de folhas, de Roseliniose, de Fumagina e de Asterina, podem ocorrer em situações especiais; entretanto, não caracterizam-se como causadores de perdas significativas. Das doenças que são importantes no viveiro, somente a Pinta Preta poderá se tornar uma doença limitante, principalmente na fase juvenil do erva\. Existe um risco grande quando as condições de cultivo forem bastante alteradas. Situações de alta densidade, áreas contínuas extensas, variabilidade genética estreita, adubações excessivas, uso de agroquímicos, podas severas e contínuas, enfim, o manejo inadequado poderão provocar uma condição de estresse na planta ou proporcionar condições extremamente favoráveis aos patógenos. A alta densidade, além de proporcionar um ambiente mais úmido e sombreado favorece a dispersão do patógeno planta a planta. As grandes áreas contínuas vão dar condições para um aumento exagerado de patógenos com baixa população de inimigos naturais, pois nessas áreas existe poucas barreiras para a expansão dos patógenos. A adoção de práticas com o objetivo de maximizar as produções, por meio do aumento do vigor das plantas e da densidade de plantio, irá criar uma série de condições que favorecem o estabelecimento e o desenvolvimento de doenças. Entretanto, para que essas doenças não inviabilizem o cultivo da erva-mate é necessário usar as tecnologias com moderação. No desenvolvimento do cultivo da erva-mate deve-se estar atento não somente com a produtividade mas também com os aspectos fitossanitários. 367

Dentre esses, as doenças poderão ocupar um importante papel na cultura, caso não se adotem medidas tais como: produção de mudas sadias e rustificadas, de boa procedência; monitoramento das mudas no campo; plantio em épocas adequadas que minimizem o estresse de transplantio; utilizar espaçamento que possibilite uma boa aeração e insolação do erval; evitar adubações pesadas principalmente com relação ao nitrogênio; cuidados especiais na poda, evitando provocar ferimentos ou danos profundos nos ramos; na poda, deixar cerca de 30% de folhas para manter o vigor da planta, não utilizar grandes áreas continuas; utilizar "ilhas" de mata nativa como reservatório de agentes naturais de controle. Esses procedimentos farão com que não haja necessidade da utilização de agrotóxicos, pois eles fortalecerão a planta e criarão um ambiente menos favorável ao patógeno. A adoção dessas medidas irá reduzir os danos causados por doenças e contribuir para a obtenção de um produto de melhor qualidade e com maior aceitação no mercado nacional e internacional. 5. REFERÊNCIAS BffiLIOGRÁFICAS AUER, CG.; GRIGOLETTI JUNIOR, A ;. Doenças da erva-mate. Summa fitopatológica, Jaguariúna, v.21, n.3-4, p. 195-198,1995. BERGAMIN FILHO, A Ecossistemas, Agroecossistemas e Patossistemas. ln: KIMATI, H; AMORIM, L. BERGAMIN FILHO, A; CAMAR- GO, L.E.A; REZENDE, JAM. 3 a ed. Manual de Fitopatologia. Piracicaba: Agronômica Ceres. 1997. VII. p.555-573. CARPANEZZI, AA; CARDOSO, A; VALIO, I.F.M.; GRAÇA, M.E.C; JEDE, E.T.; HIGA, R.CV Queda anormal de folhas de erva-mate (Ilex paraguariensis). In: SEMINÁRIO SOBRE ATUALIDADES EPERS- PECTIVAS FLORESTAIS, Silvicultura da erva-mate, 10, 1983. Anais. Curitiba: URPFCS, 1983. p.141-145. (EMBRAPAlURPFCS, Documentos, 25). EXTRAÇÃO vegetal. Anuário Estatístico do Brasil, Rio de Janeiro, v. 34, p.151, 1973. EXTRAÇÃO vegetal. Anuário Estatístico do Brasil, Rio de Janeiro, v. 54, p. 3-19,1994. GRIGOLETTI JÚNIOR, A; AUER, CG.; MAS CHIO, L.AM.; TAVA- RES, R.F. Levantamento preliminar de fungos associados à cultura da erva-mate (Ilex paraguariensis). In: REUNIÃO TÉCNICA DO 368

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