Nelson Hamerschlak, Dirceu Hamilton Cordeiro Campêlo

Documentos relacionados
ANEMIAS HEMOLÍTICAS ADQUIRIDAS. Prof. Dr. David Cavalcanti Ferreira

Anemia hemolítica autoimune

A N E M I A S H E M O L Í T I C A S

ANEMIAS HEMOLÍTICAS AUTO-IMUNES

Doença dos Eritrócitos

Reação Hiperhemolítica em gestante com doença falciforme. Maria Tereza Taroni Marques de Moraes Patrícia R. S. Cardoso Vanessa Maria Fenelon da Costa

UTILIZAÇÃO DE HEMÁCIAS FENOTIPADAS:

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS (CIPHARMA) IMUNO-HEMATOLOGIA. Doutoranda Débora Faria Silva

ENFERMAGEM. DOENÇAS HEMATOLÓGICAS Parte 1. Profª. Tatiane da Silva Campos

INSTITUIÇÃO: CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS

Anemia x agentes infecciosos ANEMIA HEMOLÍTICA. Manifestações clínicas. Anemia hemolítica imunomediada. Anemia hemolítica imunomediada

Degradação normal dos glóbulos vermelhos Hemoglobina. ferro protoporfirina aminoácidos

Anticorpos. Antígenos. Imunologia SISTEMAS DE GRUPOS SANGUINEOS. Tipos de Anticorpos. Imunohematologia 02/11/2010. Definição:

Uso do Prediderm (prednisolona) associado ao micofenolato de mofetil no tratamento de anemia hemolítica imunomediada canina: relato de caso

Anemias Microcíticas e Hipocrômicas ADC e Talassemias. Profa. Alessandra Barone Prof. Archangelo Fernandes

SECRETARIA DE ESTADO DA SAUDE PROGRAMA DE APRIMORAMENTO PROFISSIONAL KENIA PATRÍCIA DOS SANTOS DO CARMO

Desvendando as Legislações


TESTE DA ANTIGLOBULINA HUMANA NA ROTINA LABORATORIAL

Outras Anemias: Vamos lá? NAC Núcleo de Aprimoramento científico Hemograma: Interpretação clínica e laboratorial do exame. Jéssica Louise Benelli

Ativação de linfócitos B mecanismos efetores da resposta Humoral Estrutura e função de imunoglobulinas

Uma criança com quadro súbito de anemia e trombocitopenia - Qual é o diagnóstico?

18/08/2016. Anemia e Policitemia Prof. Me. Diogo Gaubeur de Camargo

Receptores de Antígeno no Sistema Imune Adaptativo

SERVIÇO O DE HEMOTERAPIA DA ACCG ENF LARISSA PEREIRA E SILVA ENF LUSINERE TAVARES DE LACERDA

Peculiaridades do Hemograma. Melissa Kayser

AUTOANTICORPO INDUZIDO POR USO CRÔNICO DE ALDOMET (METILDOPA) - relato de caso

ANEMIA HEMOLÍTICA AUTO-IMUNE Aspectos moleculares. Dra. Lilian Castilho

Techno TwinStation. Ana Paula Costa Nunes da Cunha Cozac Hemocentro de Ribeirão o Preto

3/15/2013 HIPERSENSIBILIDADE É UMA RESPOSTA IMUNOLÓGICA EXAGERADA A DETERMINADO ANTÍGENO. O OBJETIVO IMUNOLÓGICO É DESTRUIR O ANTÍGENO.

Glomerulonefrite pós infecciosa

Avaliação Hematológica, Interpretação e Importância em Nutrição

Principais Doenças do Sistema Hematológico

Imunidade Humoral. Células efectoras: Linfócitos B. (Imunoglobulinas)

Anestesia em Pacientes com Teste de Coombs Direto Positivo. Relato de Três Casos*

Aulas e discussão dos casos.

DOENÇAS DO SANGUE E ÓRGÃOS HEMATOPOIÉTICOS. ANEMIA Deficiência dos eritrócitos circulantes A medula óssea é responsiva? Há eritropoese?

UNISALESIANO. Profª Tatiani

ORGANIZADOR. Página 1 de 9

CENTRO DE CAPACITAÇÃO EDUCACIONAL CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA LABORATORIAL LÍVIA LIBERAL

PLANO DE ENSINO EMENTA

Classificação das Anemias

TRANSPLANTE DE MEDULA ÓSSEA

Diário Oficial Imprensa Nacional

PESQUISA E IDENTIFICAÇÃO DE ANTICORPOS IRREGULARES

Incidência de aloimunização eritrocitária em pacientes com insuficiência renal: experiência de um hemocentro de Sergipe

REAÇÕES DE HIPERSENSIBILIDADE. Prof. Dr. Helio José Montassier

FREQUÊNCIA DE ANTICORPOS IRREGULARES EM SERVIÇO DE TRANSFUSÃO DE SANGUE EM SALVADOR-BA, NO PERÍODO DE 2009 A 2013

31/10/2013 HEMOGRAMA. Prof. Dr. Carlos Cezar I. S. Ovalle. Introdução. Simplicidade. Baixo custo. Automático ou manual.

Hematologia Geral. Anemias Classificação Morfológica das Anemias NORMOCÍTICAS MICROCÍTICAS E E MACROCÍTICAS NORMOCRÔMICAS HIPOCRÔMICAS SIDEROBLÁSTICA

ROTINA DE AVALIAÇAO DE IMUNODEFICIENCIAS PRIMARIAS NO PSI HRAS. Dr.FABRICIO PRADO MONTEIRO

Fluidoterapia. Vias de Administração. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Enteral Via oral Via intra retal

RESIDÊNCIA MÉDICA SES/MS-DGH 2016 HEMATOLOGIA ÁREA DE ATUAÇÃO HEMATOLOGIA / HEMOTERAPIA PEDIÁTRICA (A1001)

ENFERMAGEM DOENÇAS HEPÁTICAS. Profª. Tatiane da Silva Campos

Sessão televoter anemias. Joana Martins, Manuel Ferreira Gomes António Pedro Machado

Incidência de aloimunização eritrocitária em pacientes poli transfundidos

UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE FARMÁCIA CURSO DE FARMÁCIA RAULY DE BARROS PINTO FILHO

Leucemias Agudas: 2. Anemia: na leucemia há sempre anemia, então esperamos encontrar valores diminuídos de hemoglobina, hematócrito e eritrócitos.

Tópicos de Imunologia Celular e Molecular (Parte 2)

IMUNOGENÉTICA. Sistemas Sangüíneos Eritrocitários

Diagnóstico Laboratorial em Hematologia. Marcos K. Fleury Laboratório de Hemoglobinas Faculdade de Farmácia - UFRJ

Gamapatias monoclonais de significado indeterminado.

Imunoensaios no laboratório clínico

FISIOPATOLOGIA Fatores independentes relacionados à velocidade de polimerização:

Glomerulonefrites Secundárias

Imunodeficiência primária

RESIDÊNCIA MÉDICA 2014 PROVA OBJETIVA

COMISSÃO ORGANIZADORA

PATOLOGIA DO SISTEMA HEMATOPOIÉTICO

PROCEDIMENTO CONCURSAL DE INGRESSO NO IM 2019 PROVA NACIONAL DE SERIAÇÃO JÚRI DE RECURSO HEMATOLOGIA

AULA #3 IMUNOGLOBULINAS E SISTEMA COMPLEMENTO BMI0255

Determinação da frequência de anticorpos irregulares pós-transfusionais* Determination of the frequency irregular antibodies in post transfusion

CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS

Clinical course of autoimmune hemolytic anemia: an observational study

TESTES PRÉ-TRANSFUSIONAIS

USO DO RITUXIMAB NO TRATAMENTO DAS DOENÇAS DAS CRIOAGLUTININAS: RELATO DE CASO

Plaquetopenia. Felippe Schirmer

FORMULÁRIO PADRÃO PARA APRESENTAÇÃO DE PROJETOS

CASO CLÍNICO. Medicina-UFC. Everton Rodrigues

Resposta Imunológica humoral. Alessandra Barone

Reagentes anti-d na detecção dos D fraco e D parcial

ENFERMAGEM SAÚDE DA MULHER. Doenças Sexualmente Transmissíveis Parte 2. Profª. Lívia Bahia

PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE

TÉCNICA TESTE PARA IDENTIFICAÇÃO DE ANTICORPOS IRREGULARES *4

Aplasia de Medula Óssea. Doença esquecida

DIAGNÓSTICOS SOROLÓGICO NAS INFECÇÕES BACTERIANAS. Sífilis

Programa Analítico de Disciplina BIO250 Imunologia

Anticorpos Irregulares Clinicamente Significativos em Doadores de Sangue. Clinically significant irregular antibodies in blood donors

Resposta Imune Humoral Dr. Carlos R Prudencio

As transfusões do plasma devem ser ABO compatíveis com as hemácias do receptor.

PROTOCOLOS DE TRATAMENTO DE DOENÇAS HEMATOLÓGICAS

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA HEPATITE AUTO- IMUNE

Caso Clínico. Nydia Strachman Bacal Centro de Hematologia de São Paulo Hospital Israelita Albert Einstein

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DAS HEPATITES VIRAIS. Profa. Ms.: Themis Rocha

ELETROFORESE DE PROTEÍNAS

Incidência de aloimunização eritrocitária em pacientes com doença falciforme: experiência de um centro em São Paulo

Diagnóstico Diferencial das Síndromes Glomerulares. Dra. Roberta M. Lima Sobral

Faculdade da Alta Paulista

ENFERMAGEM IMUNIZAÇÃO. Calendário Vacinal Parte 26. Profª. Tatiane da Silva Campos

Transcrição:

ANEMIAS HEMOLÍTICAS AUTO-IMUNES (AHAI) Nelson Hamerschlak, Dirceu Hamilton Cordeiro Campêlo INTRODUÇÃO A hemólise imune é a diminuição da sobrevida das hemácias, mediada direta ou indiretamente por anticorpos, os quais podem ser auto-anticorpos ou aloanticorpos. CLASSIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICA CLÍNICA DA ANEMIA HEMOLÍTICA IMUNE A classificação baseada nas distintas categorias clínicas é a mais comumente utilizada (Quadro 1). Quadro - Classificação baseada nas categorias clínicas AHAI a quente Primária (idiopática) Secundária (linfomas, LLC, LES etc.) Anemia hemolítica a frio ou Síndrome da aglutinina fria Idiopática Secundária o Doenças não-malignas (infecção, pneumonia por micoplasma, mononucleose infecciosa e outras infecções virais) o Doenças malignas (principalmente doenças linfoproliferativas) Hemoglobinúria paroxística a frio (HPF) Primária Secundária (sífilis, infecções virais etc.) Anemia hemolítica tipo mista (combinação de AHAI a quente e a frio) Anemia hemolítica atípica AHAI com teste direto da antiglobina negativo AHAI a quente causada por auto-anticorpos IgM ou IgA Anemia hemolítica induzida por drogas Anemia hemolítica imune induzida por aloanticorpos AHAI = anemia hemolítica auto-imune; LLC = leucemia linfóide crônica; LES = lúpus eritematoso sistêmico; HPF = hemoglobinúria paroxística a frio. A maioria dos casos de anemia hemolítica auto-imune (AHAI) é mediada por auto-anticorpos quentes, na qual a temperatura ótima de reatividade é 37 o C e, usualmente, a classe da imunoglobulina é IgG; por outro lado, a síndrome da aglutinina fria é geralmente causada por uma IgM cuja reatividade máxima ocorre a 4 o C. A diferenciação entre a AHAI a quente e a frio é essencial, pois o prognóstico e as estratégias terapêuticas são distintos. A AHAI referida como idiopática não é associada a nenhuma doença de base; entretanto, a

secundária é geralmente associada à infecção, que desaparece após a resolução do quadro infeccioso. ANEMIAS HEMOLÍTICAS AUTO-IMUNES (AHAI) A QUENTE A incidência é de 1:80.000 indivíduos e representa cerca de 70,3% de todos os casos de AHAI. Ocorre principalmente entre 60 a 70 anos, com discreta predominância no sexo feminino. As manifestações clínicas são variáveis; usualmente, têm início insidioso, febre, dor abdominal e lombar, manifestações de anemia com dispnéia, palpitações, mal-estar geral e hemoglobinúria. Achados clínicos são palidez cutâneo-mucosa, ictérica, hepatopesplenomegalia, linfoadenomegalia e tromboembolismo venoso, sendo responsável por 3 a 10% dos óbitos em pacientes com AHAI. ACHADOS LABORATORIAIS São eles: anemia leve a grave, alterações morfológicas das hemácias (anisocitose, poiquilocitose, policromasia, esferocitose e, raramente, autoaglutinação); reticulocitose, porém alguns pacientes apresentam reticulocitopenia. A maioria dos pacientes evolui com leucocitose, hiperplasia da série eritroíde da medula óssea. A urina pode conter pigmentos de bilirrubina ou hemoglobina. Trombocitopenia associada à AHAI caracteriza a síndrome de Evans. PROGNÓSTICO É imprevisível que haja um prognóstico; nos casos de AHAI secundária, ele depende da evolução da doença de base. TRATAMENTO Corticosteróides; Esplenectomia; Drogas imunosupressoras (exemplo: azatioprina, ciclofosfamida, etc) Anticorpo monoclonal anti CD20 (Rituximab) etc SÍNDROME DA AGLUTININA FRIA OU ANEMIA HEMOLÍTICA A FRIO A incidência é relativamente incomum; havendo um pico de incidência entre 50 a 60 anos em ambos os sexos. Sintomas de anemia crônica (fadiga, dispnéia aos esforços e fraqueza), urina escura, acrocianose de orelhas, dedos das mãos e dos pés, icterícia, hepatoesplenomegalia e linfadenomegalia. As

manifestações clínicas variam entre os pacientes; provavelmente, são dependentes da amplitude térmica do anticorpo frio. ACHADOS LABORATORIAIS A primeira observação que muitas vezes sugere o diagnóstico é autoaglutinação à baixas temperaturas, da amostra de sangue anticoagulado do paciente, anemia leve a moderada, alterações morfológicas (anisocitose, esferocitose, poiquilocitose e policromasia), reticulocitose, aumento bilirrubinas e hemoglobinúria. EVOLUÇÃO DA DOENÇA E PROGNÓSTICO O curso da doença é monótono; o paciente pode sobreviver muitos anos sem complicações, e o prognóstico é significantemente melhor que AHAI a quente. TRATAMENTO Raramente são necessárias drogas imunossupressoras ou transfusão de sangue. HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA A FRIO (HPF) É uma anemia hemolítica caracterizada por uma hemolisina bifásica. A destruição dos eritrócitos é causada por um auto-anticorpo frio, conhecido como auto-hemolisina bifásica, que se liga aos eritrócitos do paciente em baixas temperaturas e fixa complemento. A maioria dos casos foi descrita em crianças após infecções virais, como sarampo, caxumba, varicela, mononucleose infecciosa, infecção do trato respiratório superior, e, em adultos, secundária a sífilis. A HPF pode ser classificada em três categorias: sifilítica crônica; crônica não-sifilítica e transitória aguda. Atualmente, a HPF é rara; quase todos os casos são tipo aguda e transitória. Não há particularidade racial. SINAIS E SINTOMAS A manifestação típica é a anemia, que aparece entre 1 a 2 semanas após a infecção do trato respiratório superior, febre recorrente, urina escura, dor abdominal, icterícia.

ACHADOS LABORATORIAIS Anemia frequentemente grave e rapidamente progressiva; Reticulocitose (reticulocitopenia em alguns) morfológica anormal de hemácias (esferocitose, anisocitose, poiquilocitose, auto-aglutinação e policromasia); Eritrofagocitose por neutrófilos; Hemoglobinúria; Hiperplasia eritróide; Leucocitose; Contagem de plaquetas normal ou elevada. ACHADOS IMUNO-HEMATOLÓGICOS O anticorpo de Donath-Landsteiner (DL) característico da HPF é IgG com especificidade de anti-p, que demonstra baixo título (< 32), amplitude térmica (< 20 o C) e hemólise bifásica. Embora a especificidade do anticorpo de DL seja quase sempre anti-p, hemácias P- (p.ex., P k, ou P k) são extremamente raras e não estão disponíveis na rotina imuno-hematológica. O anticorpo DL não interfere na rotina pré-transfusional e nos testes de compatibilidade, porque o auto-anticorpo raramente causa aglutinação das hemácias acima de 20 o C. O teste direto da antiglobulina é positivo e pesquisa anticorpos irregulares negativos. O teste de Donath-Landsteiner é essencial para avaliar hemólise bifásica, o qual pode ser realizado pelo método direto, usando sangue total, ou pelo método indireto, usando o soro. A amostra do paciente deve ser mantida a 37 o C após a coleta. Ambas as técnicas requerem incubação das amostras a banho frio (0 o C) e, a seguir, incubação a 37 o C. A causa mais comum da negatividade do teste de DL nos casos suspeitos (quadro clínico clássico e achados laboratoriais inconsistentes) é a falha na identificação desse anticorpo transitório, que desaparece rapidamente do plasma durante a recuperação da fase aguda. Os títulos do anticorpo rapidamente caem após o episodio inicial. TRATAMENTO Transfusão de sangue; Drogas imunossupressoras etc.; O prognóstico é excelente, porém há descrição de recaídas.

ANEMIA HEMOLÍTICA MISTA Tem achados sorológicos característicos de AHAI e aglutinina fria com altos títulos e amplitude térmica, bem como especificidade anticorpo anti-i e teste direto antiglobulina fortemente positivo com anti-igg e C3. É mais frequente na idade avançada, com predomínio no sexo feminino, associada ao linfoma e lúpus eritematoso sistêmico (LES). ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE ATÍPICA COM TESTE DIRETO DA ANTIGLOBULINA NEGATIVO A incidência exata do TDA negativo em pacientes com AHAI é desconhecida. Algumas vezes, a pequena quantidade de IgG ligada à hemácia pode não ser detectável ou o auto-anticorpo é IgM ou IgA. ANEMIA HEMOLÍTICA INDUZIDA POR DROGAS A anemia hemolítica causada por drogas é muito rara, porém é mais frequente com alfa-metil-dopa. A hemólise ocorre devido à destruição imune das hemácias que estão recobertas com anticorpo, anticorpo e complemento ou apenas complemento. Há quatros mecanismos clássicos responsáveis pela hemólise induzida por medicamentos: a formação de complexos imunes; adsorção dos medicamentos; modificação da membrana e formação de autoanticorpos. No primeiro mecanismo, denominado formação de complexo imune (testemunha inocente), a droga combina-se às proteínas plasmáticas, formando imunógenos. As imunoglobulinas, IgM e IgG, reconhecem determinantes no medicamento. Se o paciente ingerir a droga, pode ocorrer formação de um complexo medicamento/antimedicamento com ativação da cascata do complemento; as hemácias envolvidas nesse processo atuam como testemunhas inocentes, porém podem ser lisadas. O paciente, frequentemente, apresenta hemólise intravascular aguda; entretanto, com a suspensão da medicação, há rápida recuperação. O TDA pode ser negativo, mesmo que o anticorpo seja IgG, pois o complexo medicamento/antimedicamento pode eluirse da hemácia. Na adsorção de medicamento (penicilina), ele liga-se firmemente às proteínas, inclusive às proteínas da membrana eritrocitária, e não há ativação do complemento; portanto, a destruição celular é predominantemente extravascular. A anemia tem evolução mais branda, sem risco de vida para o paciente. No terceiro mecanismo, ocorre uma modificação da membrana pela adsorção não-imunológica; acredita-se que as cefalosporinas, em especial a cefalotina, atuam sob esse mecanismo. Elas são capazes de modificar as hemácias de tal forma que proteínas plasmáticas, IgG, IgM, IgA, e complemento podem ligar-se à membrana. Cerca de 3% dos pacientes medicados com cefalotina podem apresentar TDA positivo. O último mecanismo proposto é a formação de auto-anticorpos. O alfa-metildopa induz a produção de um auto-anticorpo que reconhece os antígenos eritrocitários. Cerca de 10 a 20% dos pacientes que são medicados com alfa-metildopa apresentam TDA positivo; entretanto, apenas 0,5% a 1% evoluem com anemia

hemolítica imune com repercussão clínica. Medicamentos como L-dopa, ácido mefenâmico, diclofenaco também causam o aparecimento de auto-anticorpos. Os achados laboratoriais da anemia hemolítica induzida por alfa-metildopa são semelhantes aos da anemia hemolítica auto-imune idiopática com TDA e eluato positivo. Informações sobre o uso de medicamentos é importante para formular a hipótese de a droga ser o agente causal. O tratamento de escolha é a suspensão da droga; contudo, o TDA permanecerá positivo durante meses. O prognóstico é excelente. ANEMIA HEMOLÍTICA IMUNE INDUZIDA POR ALOANTICORPOS A presença de aloanticorpos em pacientes cronicamente transfundidos e após a gestação é uma complicação bem conhecida; em contraste, o risco de auto-imunização associada à aloimunização é muito pouco estudada. Em estudos com pacientes politransfundidos, tais como anemia falciforme e talassemia, tem sido descrita a associação entre aloimunização e autoimunização. Uma das teorias que explica o mecanismo pelo qual a AHAI pode ocorrer concomitantemente ou logo após a transfusão de sangue é o fato de o aloanticorpo se ligar às hemácias transfundidas, alterando a conformação dos epítopos antigênicos, o que leva a produção de auto-anticorpos. O termo hemólise bystander é usualmente utilizado quando a AHAI ocorre após a exposição à aloantígenos. O quadro clínico florido de hemólise precede o teste direto de antiglobulina (teste de Coombs) na grande maioria. Há relatos na literatura de resolução espontânea do quadro hemolítico em um curto período (semanas), e outros com evolução fatal. Geralmente, apresenta boa resposta a corticoterapia. BIBLIOGRAFIA 1. Ayun B, Padmanabhan S, Paley C, Chandrasekaran V. Clinical significance of RBC alloantibodies and autoantibodies in sickle cell patients who received transfusions. Transfusion 2002; 42:37-2. Branch DR, Petz LD. Detecting alloantibodies in patients with autoantibodies. Transfusion 1999; 39:6-3. Eder AF. Review acute Donath-Landsteiner hemolytic anemia. Immunohematology 2005; 21(3):132. 4. Feinstein DI. Inhibitors of blood coagulation. In: Hoffman R, Benz EJ, Shattil SJ et al. Hematology: basic principles and practice. Philadelphia: Churchill Livingstone, 2000; p.1963-5. Harmennig D. Modern blood banking and transfusion practices. 4.ed. Baltimore: Williams & Wilkins, 2006. 6. Petz LD, Garraty G. Acquired immune hemolytic anemias. Nova York: Churchill Livingstone,1980. 7. Petz LD, Garraty G. Bystander immune hemolysis Immune hemolytic anemias. 2.ed. Filadélfia: Churchill Livingstone, 2004; p.358-8. Pirofsky B. Autoimmunization and the autoimmune hemolytic anemias. Baltimore: Williams & Wilkins,1969.

9. Schreiber AD, Herskovitz BS, Goldwein M. Low titer cold hemagglutinin disease: mechanism of hemolysis and response to corticosteróides. N Engl J Med 1977; 296:1490-10. Schubothe H. The cold hemagglutinin disease. Semin Hematol 1966; - 11. Shelt SS, Karande SC, Nadkarni VB, Lahiri K, Jain MK, Shah MD. Autoimmune hemolytic anemia- mixed type. Indian Pediatr 1991; 28:303-12. Sokol RJ, Booker DJ, Stamps R. Paroxysmal cold hemoglobinuria and the elusive Donath- Landsteiner antibody. Immunohematology 1998; - 13. Young PP, Uzieblo A, Trulock A et al. Autoantibody formation following alloimmunization: are blood transfusions a risk factor for autoimmune hemolytic anemia? Transfusion 2004; 44:67-