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Transcrição:

BuscaLegis.ccj.ufsc.br O Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal Marcelo Augusto Paiva Pereira Como citar este artigo: PEREIRA, Marcelo Augusto Paiva. O Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal. Disponível em http://www.iuspedia.com.br 09 maio. 2008. 1. INTRODUÇÃO O Tratado de Roma criou o Tribunal Penal Internacional (TPI) [1], competente para o julgamento dos acusados por crimes internacionais: acolheu a pena de morte, a de prisão perpétua e a entrega de nacionais. Os Estados devem aceitá-lo integralmente ou não, porque não admite a aceitação com reservas [2]. O Tribunal Penal Internacional tem 18 Juizes, funcionários internacionais que não se sujeitam às instruções dos países de origem, e se distribuem em três Tribunais [3]: a) de 1.ª Instância; b) de Apelação; c) de Questões Preliminares. Também criou, o Tratado de Roma, a imprescritibilidade de alguns crimes internacionais [4], que dependem da aprovação de 2/3 da Assembléia dos Estados-membros[5]. São [6]:

a) de genocídio (art. 6.º); b) contra a humanidade (art. 7.º); c) de guerra (art. 8.º); d) de agressão (art. 9.º). A Constituição Federal dispõe, no art. 4.º, II, a prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais; e, no art. 5, estabelece a imprescritibilidade dos crimes de racismo (XLII) e dos cometidos contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (XLIV); fixa as penas proibidas (XLVII); proíbe a extradição do brasileiro nato (LI) e a do estrangeiro por crime político ou de opinião (LII); e assegura outros direitos e garantias previstos nela própria ou nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte ( 2 ). Antes de ser ratificado, o Tratado de Roma aparentava colidir com essas normas constitucionais, ensejando dúvida sobre a conveniência de ratificá-lo ou não pelo Brasil. Para resolver essa suposta colisão de interesses juridicamente tutelados por ordenamentos distintos, convém abordar, mesmo superficialmente, algumas regras de Direito Internacional Público e sobre a extradição, prescrição, prisão perpétua e pena de morte. 2. DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO 2.1. HISTÓRICO Historicamente, precedeu ao Direito Internacional o Direito Romano [7], o qual possuía três espécies de direito: a) jus civile: normas postas somente aos cidadãos romanos;

b) jus gentium: normas postas entre peregrinos e entre estes e os cidadãos romanos; c) jus fetiale: normas postas entre os Estados. Foi Jeremias Bentham [8] quem lançou a expressão "Direito Internacional", no livro "An Introduction to the Principles of Moral and Legislation", em 1789. Mas, como o Direito Privado também possui a porção internacional, diferenciaram um do outro com a inclusão da expressão "público": resultou no Direito Internacional Público. 2.2. DESTINATÁRIOS Substituindo o antigo jus fetiale dos romanos, o Direito Internacional Público rege os direitos e deveres internacionais dos Estados, do indivíduo e de certos organismos interestatais: estes são os destinatários, informados pela corrente heteropersonalista [9], ainda que o Estatuto da Corte Internacional de Justiça, no art. 34, somente admita o Estado como destinatário, acolhendo expressamente a corrente estatal [10]. As normas dos direitos e deveres são de obrigatória observância e procedem do assenso tácito (costume) e expresso (tratados) dos Estados. Assim, num campo de atuação abrangente, as normas do Direito Internacional Público sujeitam as pessoas jurídicas e naturais, na medida do alcance da norma e da responsabilidade dos sujeitos. 2.3. JUSTIFICAÇÃO O Direito Internacional é justificado pela Teoria Objetivista do Direito Natural moderno, que define três regras básicas: a) a obrigação de cumprir os compromissos pactuados;

b) o dever de reparar os danos injustamente causados; c) o respeito às normas estabelecidas pela autoridade que visem o bem comum. Na primeira delas está a regra do pacta sunt servanda dos contratos a qual está sempre presente, mesmo implicitamente, em todos os Tratados e Convenções firmados entre os Estados. 2.4. FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO Conforme o art. 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, são: a) convenções internacionais; b) o costume internacional; c) os princípios gerais de direito. São meios auxiliares: a) decisões judiciárias; b) doutrina dos publicistas. Os Tratados ou Convenções são, também, fonte do Direito Internacional Público. É, entretanto, o costume internacional a fonte primeira e principal, sendo este a origem da maior parte das normas jurídicas internacionais e dos Tratados celebrados entre os Estados. Os princípios gerais de direito abrangem os de âmbito interno e internacional, na medida que são reconhecidos pelos Estados nos próprios ordenamentos jurídicos; são, porém, normas subsidiárias, pois não se confundem com o Direito Natural, visto deste decorrerem.

2.5. TRATADOS INTERNACIONAIS Em duas são as espécies de tratados: a) tratados-contratos: pactuado entre um número limitado de Estados, visam regular relações do interesse somente daqueles contratantes. Ex.: Mercosul. b) tratados-normativos: formulam preceitos de ordem geral para orientar relações entre tantos Estados quanto anuírem, firmando princípios e gerando direitos e deveres aos anuentes. Ex.: Declaração Universal dos Direitos do Homem (ONU, 1945). Ambos obedecem a condições de validade, a saber: a) capacidade das partes; b) habilitação dos agentes signatários; c) consentimento mútuo; d) objeto lícito e possível; e) ratificação. Os tratados somente obrigam os Estados anuentes, os quais poderão invocar a implícita cláusula rebus sic stantibus quando deixarem de existir as condições que os motivaram, com a consequente perda de vigência deles em relação ao Estado que não mais os quis. 2.6. DIREITO INTERNACIONAL X DIREITO INTERNO A primazia do Direito Internacional sobre o Interno é reconhecida pela jurisprudência internacional [11], como fêz a Corte Permanente de Justiça Internacional no parecer

consultivo de 21.02.1925 (sobre troca de populações gregas e turcas) e ao conhecer o caso dos interesses alemães na Alta Silésia Polonesa, aos 25.05.1926. Através do Secretário Geral, a ONU também reconheceu aquela primazia, em documento firmado aos 05.11.1948, acentuando: "Os tratados validamente concluídos pelo Estado e regras geralmente reconhecidas de direito internacional formam parte da lei interna do Estado" e "não podem ser unilateralmente revogadas puramente por ação nacional." As Constituições dos Estados Unidos, no art. 6, II; da França, no art. 55; e da Itália, no art. 10, postulam nessa orientação. No Brasil, a Constituição Federal alude ao Direito Internacional na forma do disposto no art. 5, 4, que trata do Tribunal Penal Internacional (introduzido pela Emenda à Constituição n 45, de 8 de dezembro de 2004), e admite a competência do Superior Tribunal de Justiça para julgar, em recurso especial, qualquer decisão que contrariar tratado ou negar-lhe vigência (CF, 105, III, "a"). Conforme nosso ordenamento jurídico e doutrina, os tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional e ratificados pelo Presidente da República ingressam em regra, no ordenamento jurídico como lei ordinária federal, invalidando automaticamente qualquer norma interna que se lhe oponha. Logo, ingressam como regra infraconstitucional e se submetem aos mandamentos constitucionais; mas, como tem origem internacional, também se sujeitam às regras de obediência firmadas (pacta sunt servanda). Quando, porém, o tratado internacional versar matéria de direitos humanos, terá status de emenda à constituição quando for aprovado, em dois turnos, pelo voto de três quintos dos membros de cada casa legislativa do Congresso Nacional, conforme a CF, 5, 3 (introduzido pela Emenda à Constituição n 45, de 8 de dezembro de 2004).

O tratado internacional de direitos humanos terá aplicação legislativa no ordenamento jurídico pátrio quando suas normas forem ao encontro das garantias constitucionais. Estas prevalecerão quando as do tratatado internacional restringirem direitos [12]. Em ambas as hipóteses prevalece o princípio pro homine. O cumprimento dos tratados internacionais sujeita-se a dois critérios: a) os de origem constitucional: conforme deflui da nossa Constituição Federal, os tratados internacionais acolhidos ingressam no ordenamento jurídico como lei ordinária federal; b) os de origem internacional: os Estados anuentes obrigam-se a cumprir o pacto assumido, não podendo ignorá-lo em face da legislação interna de mesmo grau de hierarquia. No Brasil os tratados internacionais acolhidos no nosso ordenamento prevalecem sobre a legislação ordinária federal, revogando automática e imediatamente as normas que colidirem com as disposições daqueles, mas não prevalecem sobre normas constitucionais, tanto as do Poder Constituinte Originário quanto as do Derivado, bem como não imperam sobre as leis complementares. Salvo se, ao versarem sobre direitos humanos e preencherem os requisitos da CF, 5, 3, terão status de emenda à constituição. 3. EXTRADIÇÃO Extradição é o encaminhamento de um indivíduo por um a outro Estado[13]. Em dois são os requisitos: a) especialidade: o indivíduo não pode ser julgado ou condenado por um delito diverso daquele que motivou a extradição; b) identidade (ou dupla incriminação): somente se no Estado requerido também for considerado crime o fato cometido pelo indivíduo, será este extraditado.

São exceções à extradição: a) nacionalidade do extraditando: a.1) se for do Estado requerido, não será extraditado; a.2) se for de outro Estado, será extraditado mas, por cortesia internacional, o Estado requerido deverá comunicar ao Estado de origem do extraditando a solicitação de extradição; a.3) se for do Estado requerente, será extraditado. b) condição particular do extraditando: ocorre esta situação quando a pena de morte ou de prisão perpétua é a cominada no País em que cometeu o crime e o extraditando encontra-se refugiado num País em que essas penas não são acolhidas pela legislação; será ele extraditado, mas com o compromisso do outro Estado não lhe aplicar tais penalidades. c) gravidade das infrações: a extradição somente deverá ser admitida quando as infrações forem de certa importância; para identificar a importância delas, dois critérios foram criados: o primeiro, admite rol taxativo de infrações no tratado de extradição; enquanto o segundo admite crimes apenados com penas não inferiores a 1 ano. Com a extradição, o Estado requerente será competente para julgar e condenar o indivíduo, comprometendo-se a aplicar a lei penal do Estado requerido, se mais benigna ao agente. 3.1. EXTRADIÇÃO NO BRASIL O art. 5.º, LI e LII, da Constituição Federal, trata dos casos de extradição, respectivamente, de brasileiro naturalizado e de estrangeiro residente no Brasil: em qualquer hipótese, o texto constitucional proíbe expressamente a extradição de brasileiro nato. Conforme estabelece os citados textos constitucionais, a regra é a não extradição de brasileiros natos e naturalizados e de estrangeiros residentes no território nacional, salvo nas hipóteses expressas naqueles dispositivos. São:

a) do brasileiro naturalizado: se, antes da naturalização, cometeu qualquer crime comum; ou, a qualquer tempo, comprovar-se o envolvimento com o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins (na forma da lei); b) do estrangeiro: será extraditado por crime diverso do crime político ou de opinião, na forma da Lei n.º 6.815/80, arts. 76 e 77. Quanto ao brasileiro nato, a este se aplica as regras do art. 7.º, II, "b", c.c. 2.º, do Código Penal, pelo qual ser-lhe-á aplicada a lei penal pátria quando ocorreu no estrangeiro o crime por ele cometido. O crime político a que alude o texto constitucional em benefício do estrangeiro residente no Brasil, deve ser analisado pelo STF à luz da cláusula belga (ou do atentado), prevista no art. 77 da Lei n.º 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro). 4. IMPRESCRITIBILIDADE A imprescritibilidade é situação oposta à prescrição. Será mais adequado conceituar esta para entender os efeitos daquela: prescrição é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício[14]. A prescrição é regulada pelo Código Penal nos arts. 107, IV; 109; e 110, fixando prazos para o exercício do jus puniendi pelo Estado antes e depois de transitar em julgado a sentença, como também extinguindo a punibilidade do agente quando aquela se opera sem a atuação estatal (persecutio criminis). É um instituto jurídico que confere ao Estado prazo certo para perseguir o agente, beneficiando-o com a extinção da punibilidade quando não se operar a atuação estatal. Historicamente a imprescritibilidade era tida como uma injustiça praticada contra o agente, pois o colocava aos caprichos do ofendido, que podia processá-lo quando bem quisesse.

Para diminuir esse efeito, criou-se a prescrição, pondo termo à persecutio criminis até então infinita. A imprescritibilidade retira a paz pública e a segurança jurídica pugnadas pelo Direito e permite ao Estado perseguir ad perpetuam o agente delituoso, sem que este possa ter extinta a punibilidade pelo decurso do tempo sem a atuação estatal: aquele nunca se livrará da persecutio criminis, submetendo-se à discricionariedade do ofendido quanto à oportunidade e conveniência para processá-lo, quando a providência mais adequada seria fixar um prazo certo para essa finalidade. No ordenamento jurídico pátrio, dois são os crimes imprescritíveis: a) de racismo (CF, 5.º, XLII); b) contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (CF, 5.º, XLIV). A estes se aplicam os efeitos da imprescritibilidade. São cláusulas pétreas, não podendo ser removidas nem modificadas, ingressando no ordenamento jurídico como desvios da evolução histórica dos próprios direitos humanos. 5. PRISÃO PERPÉTUA A prisão perpétua é proibida nos limites das atribuições legislativas e competência jurisdicional nacionais: não se pode criar leis nem condenar o réu nessa espécie de pena, para não agravá-lo mais do que o entendimento do legislador pátrio quanto à dosagem máxima da pena. Há, também, a influência da hipótese do erro judiciário, que pode ser revisto em favor do condenado, livrando-o do cumprimento de sua própria execução. Mas, em relação aos crimes internacionais, objetos da competência jurisdicional do Tribunal Penal Internacional criado pelo Tratado de Roma a prisão perpétua não colide [15] com a determinação constitucional em vista da competência: somente aquele tribunal

pode aplicar esta pena e, ainda, somente aos crimes internacionais (art. 5, 1, do Estatuto de Roma do Tibunal Penal Internacional). A pena de prisão perpétua não se estende à outros, diversos dos crimes internacionais, nem à competência jurisdicional externa à do Tribunal Penal Internacional: somente este e naqueles crimes pode aplicar aquela pena. 6. PENA DE MORTE No art. 5º, XLVII, a Constituição Federal prevê a pena de morte como exceção, somente no caso de guerra declarada, nos termos do disposto no art. 84, XIX, "a". Apesar de ser extremamente gravosa e causa impeditiva da revisão criminal, é acolhida expressamente pelo Decreto-lei nº 1001, de 21 de outubro de 1969 (Código Penal Militar), nos crimes de traição previstos nos arts. 355 ao 362. Significa que o ordenamento jurídico pátrio não proíbe a pena de morte, mas a limita aos excepcionalíssimos casos de crimes militares em tempo de guerra cometidos para favorecer o inimigo. 7. CONCLUSÃO Assinado pelo Brasil, o Tratado de Roma cria o Tribunal Penal Internacional, órgão jurisdicional competente para processar e julgar os agentes de crimes internacionais: tem competência limitada e não representa nem se confunde com a pessoa jurídica de nenhum Estado; ao contrário, é uma instituição de direito público vinculada à ONU, mas não tem o status jurídico ou político de Estado (não emite selos nem moedas, por exemplo). Os pedidos de encaminhamento de nacionais ou estrangeiros para lá serem processados e julgados não se configuram, tecnicamente, como casos de extradição[16] porque estes

exigem a relação entre Estados. São definidos como entrega de pessoas, porque o Tribunal Penal Internacional não é Estado, mas apenas um órgão jurisdicional internacional. Quanto aos crimes imprescritíveis e aos apenados com prisão perpétua, somente devem ser acolhidos os internacionais, para não extrapolar os limites de competência jurisdicional do Tribunal Penal Internacional: este é competente para processar e julgar os agentes daqueles crimes, sendo absolutamente incompetente para conhecer de outros casos. Dever-se-á apenar com prisão perpétua e tratar como imprescritíveis somente os crimes internacionais para não apagar, do universo jurídico atual, as normas constitucionais interna corporis de cada País e o instituto da prescrição que garantem, ao ofendido e ao acusado, o direito de processar e de não ser processado valendo-se de um determinado período de tempo. Quanto à pena de morte, não há impedimento para o acolhimento, em vista do nosso ordenamento jurídico havê-la prevista expressamente na Constituição Federal em casos tão excepcionais quanto são os crimes internacionais, objeto da competência exclusiva do Tribunal Penal Internacional. Finalmente, não há colisão entre o Tratado de Roma e a Constituição Federal, relativa aos casos de encaminhamento de nacionais e estrangeiros para serem processados e julgados pelo Tribunal Penal Internacional, nem em relação aos crimes imprescritíveis, à extradição, à prisão perpétua e à pena de morte. E, por fim, adquiriu o mesmo status de emenda à constituição após a promulgação da EC 45/04. 1. Diz Enrique Ricardo Lewandowski: "O Tratado de Roma, que prevê a criação do Tribunal Penal Internacional vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), foi aprovado em 17 de julho de 1998 por uma maioria de 120 votos a favor, 7 em contrário (da

China, Estados Unidos, Filipinas, Índia, Israel, Sri Lanka e Turquia) e 21 abstenções. No dia 11 de abril de 2002, o Tratado alcançou 66 ratificações, ultrapassando o número de adesões exigido para sua entrada em vigor. O Brasil assinou o pacto em 12 de fevereiro de 2000, ratificando-o em 12 de junho de 2002, depois de aprovado pelo Congresso Nacional, tornando-se o 69 Estado a reconhecer a jurisdição do TPI.". LEWANDOWSKI, Enrique R. O Tribunal Penal Internacional: de uma cultura de impunidade para uma cultura de responsabilidade. Disponível em, Acesso em: 29.03.2008. 2. MAGALHÃES, José Carlos de. Palestra sobre o Tratado de Roma e o Tribunal Penal Internacional. 07.08.2001. Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Não Publicada. 3. Idem. 4. Ibidem. 5. Ibidem. 6.. Tribunal Penal Internacional: roteiro de palestra na Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. 2001. Não publicado. 7. Assim dizem José Fabio Rodrigues Maciel e Renan Aguiar: "Só os cives, os cidadãos romanos, gozavam do direito dos romanos, do ius civile. Os estrangeiros, os peregrini, estavam submetidos apenas ao ius gentium, o direito comum a todos os homens.". MACIEL, José Fabio R.; AGUIAR, Renan. História do Direito, 1. ed. 2. tiragem. São Paulo: Editora Saraiva, 2007, pág. 66. 8. Consta do verbete Bentham (Jeremy): "jurisconsulto e filósofo inglês (Londres 1748 id. 1832). Fundou sua moral sobre uma "aritmética" dos prazeres e das dores. Segundo ele, todo governo deve propor-se a quatro fins: ocupar-se da subsistência, favorecer a abundância, procurar a segurança e tender à igualdade. Ocupou-se da legislação, para cuja

transformação contribuiu, e teve influência decisiva no desenvolvimento do ensino. Devem-se as obras: Introduction to the Principles of Morals and Legislations (Introdução aos princípios de moral e legislação) (1789), Defence of Usury (proibição da usura) (1797) etc. A filosofia de Bentham, que procura conceituar a maior utilidade para o maior número de indivíduos é conhecida como utilitarismo e foi a base ideológica do radicalismo político inglês.". HOUAISS, A. (Ed.). Grande Enciclopédia Delta Larousse, volume 2. Rio de Janeiro: Editora Delta S.A., 1971, pág. 855. 9. Diz Luiz Ivani Amorim de Araújo: "Dentro dessa direção, o Direito Internacional Público pode ser definido como "o conjunto de regras ou princípios destinados a reger os direitos e deveres internacionais tanto dos Estados e de certos organismos interestatais, quanto dos indivíduos.".". ARAÚJO, Luiz Ivani A. Curso de Direito Internacional Público, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998, pág. 4. 10. Diz Luiz Ivani Amorim de Araújo: "É a orientação que encontrou ressonância no art. 34 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, in verbis: "Só os Estados poderão ser partes em questões perante a Corte".", ob. cit., págs. 2/3. 11. Como diz Luis Ivani de Amorim Araújo: "Outro não é o preceituado no art. 27 da Convenção sobre Direito dos Tratados, in verbis: "Uma parte não pode invocar as disposições do seu direito interno como justificativa para o inadimplemento de um tratado".", ob. cit., pág. 37. 12. Assim diz Luiz Flávio Gomes: "De outro lado, quando o DIDH conflita com a CF brasileira, restringindo o alcance de algum direito ou garantia, vale a CF.". GOMES, Luiz Flávio. Conflito entre a Constituição brasileira e os tratados de direitos humanos. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1734, 31 mar. 2008. Disponível em:. Acesso em: 31 mar.2008. 13. Dizem Ricardo Cunha Chimenti, Fernando Capez, Márcio Fernando Elias Rosa e Marisa F. Santos: "Extradição: é o ato pelo qual um Estado entrega um indivíduo, acusado

de um delito, ou já condenado como criminoso, à justiça de outro, que o reclama (a extradição depende de requerimento de outro país) e que é competente para julgá-lo e punilo. (...)". CHIMENTI, Ricardo C.; CAPEZ, Fernando; ELIAS ROSA, Márcio F.; SANTOS, Marisa F. Curso de Direito Constitucional, 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2005, pág. 154; 14. JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Editora Saraiva, 20. ed. 1997, 1.º volume, pág. 711. 15. Ao contrário do que entende Pedro Lenza, que diz: "Nesse sentido, em respeito à soberania nacional (art. 1, I), há sérias dúvidas sobre a aplicação, por exemplo, do art. 77, 1, "b" do estatuto, que prevê a prisão perpétua, em contraposição ao art. 5, XLVII, "b", da CF/88. (...)". LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Editora Saraiva, 12. ed., 2008, pág. 620. 16. Dizem Ricardo Cunha Chimenti, Fernando Capez, Márcio F. Elias Rosa e Marisa F. Santos: "Há que observar, contudo, que o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional TPI, promulgado pelo Decreto n. 4.388, de 25 de setembro de 2002 (DOU de 26-9-2002), ao tratar da Cooperação Internacional e Auxílio Judiciário, em seu art. 102 faz distinções entre entrega e extradição, nos seguintes termos: "Termos Usados Para os fins do presente Estatuto: a) Por entrega entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado ao Tribunal nos termos do presente Estatuto; b) Por extradição entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado a outro Estado conforme previsto em um tratado, em uma convenção ou no direito interno", ob. cit., pág. 154 BIBLIOGRAFIA ARAÚJO, Luiz Ivani A. Curso de Direito Internacional Público. 9. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998. 364 p.

CHIMENTI, Ricardo C.; CAPEZ, Fernando; ELIAS ROSA, Márcio F.; SANTOS, Marisa F. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2005. 582 p. ESTATUTO de Roma do Tribunal Penal Internacional. Disponível em. Acesso em: 30.mar.2008. GOMES, Luiz Flávio. Conflito entre a Constituição brasileira e os tratados de direitos humanos. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1734, 31 mar. 2008. Disponível em:. Acesso em: 31.mar.2008. GRANDE Enciclopédia Delta Larousse, volume 2. Rio de Janeiro: Editora Delta S.A., 1971. 15 v. JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: parte geral. 1 volume. 20. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1997. 744 p. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Editora Saraiva, 12. ed. 2008. 811 p. LEWANDOWSKI, Enrique R. O Tribunal Penal Internacional: de uma cultura de impunidade para uma cultura de responsabilidade. 11 p. Disponível em. Acesso em: 29.mar.2008. MACIEL, José Fabio R.; AGUIAR, Renan. História do Direito, 1. ed. 2ª tiragem. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. 167 p. MAGALHÃES, José Carlos de. Tribunal Penal Internacional: roteiro de palestra na Escola Superior do Ministério Público, 2001. Não publicado..palestra sobre o Tratado de Roma e o Tribunal Penal Internacional. 07.08.2001. Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Não Publicada.

Disponível em: http://www.wiki-iuspedia.com.br/article.php?story=20080509093736745. Acesso em: 09 junho 2008.