Lina Martins de Carvalho (1) Palavras chave: Processo de urbanização; Áreas Verdes; Vazios Urbanos.

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Transcrição:

Áreas verdes e vazios urbanos como proposta sustentável de urbanização em área de bacia-endorréica: o caso do bairro Cidade Universitária em Maceió (AL) Lina Martins de Carvalho (1) (1) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Mestrado em Dinâmicas do Espaço Habitado, UFAL, Brasil. E-mail: lina@ctec.ufal.br Resumo: Este trabalho baseia-se no conflito entre a tendência de crescimento urbano e a peculiaridade ambiental bacia-endorréica de uma região periférica da cidade de Maceió (AL). O objetivo geral é propor diretrizes sustentáveis para o andamento do processo de urbanização do bairro da Cidade Universitária, através de propostas condizentes sobre suas áreas verdes e de proposições satisfatórias de utilização de seus vazios urbanos. O trabalho foi realizado através de pesquisa bibliográfica, de visitas a campo e de levantamento de dados, onde as informações coletadas auxiliaram na elaboração dos resultados apresentados. Pôde-se concluir que a tendência do bairro é de se adensar cada vez mais, principalmente através de parcelamentos voltados a uma população de baixo poder aquisitivo. Deve-se exigir um posicionamento mais eficaz das Políticas Urbanas através de um maior controle demográfico, incentivando a baixa taxa de ocupação do solo, optando por edificações verticais. Como contribuição sócio-ambiental teríamos: as áreas verdes, proporcionando uma maior área permeável, qualificando o abastecimento de água da cidade, além de proporcionar áreas de lazer; e os vazios urbanos, possibilitando a implantação de Habitações de Interesse Social, ou ainda podendo ser utilizados como áreas verdes. Palavras chave: Processo de urbanização; Áreas Verdes; Vazios Urbanos. Abstract: This article is based on the conflict between the trend of urban growth and the environmental peculiarity endorheic basin of a peripheral region in the city of Maceió (AL). The general objective is to propose sustainable guidelines for the urbanization process of the Cidade Universitária, through consistent proposals related to its green areas and satisfactory proposals for the use of the urban empty spaces. This project was conducted through literature search, field visits and data survey, where the information collected helped with the formulation of the results presented. It was able to conclude that the tendency for the neighborhood is to become even more dense, mainly through allotment of land destined for a low income population. There must be a demand for a more efficient action by the Urban Policies through a better demographic control, providing incentives for the low occupancy rate of the land, opting for vertical buildings. The social and environmental contribution would be related to the green areas and the urban empty spaces. The green areas would provide more permeable area, enhancing the water supply, and leisure areas. The urban empty spaces would be used for the implantation of housing with social interest or green areas. Key-words: Process of Urbanization; Green Areas; Urban Empty Spaces. 1

1. INTRODUÇÃO O processo de urbanização da cidade de Maceió constituiu-se, até a década de 1950, sobre suas planícies: litorânea e lagunar. Nos últimos cinquenta anos, observa-se uma forte tendência de expansão urbana sobre o tabuleiro da cidade, principalmente no sentido norte, ao longo do eixo de ligação entre centro e periferia, através de importantes vias que estruturam a cidade, avenidas Menino Marcelo e Fernandes Lima. Esse processo de suburbanização, além de incentivar a segregação sócio-territorial (exclui a população de baixa renda dos centros e redireciona-a para o arrabalde), provoca o crescimento horizontal desnecessário da cidade, à medida que impulsiona o surgimento especulativo de vazios urbanos intersticiais. Esta visível ineficácia do planejamento urbano da cidade de Maceió se traduz pela implantação de habitações populares numa periferia carente em infra-estrutura, sem haver um cuidado maior com as condições naturais do local, gerando a degradação de regiões ambientalmente frágeis. A peculiaridade ambiental da periferia norte da cidade configura-se por abranger uma área responsável pela drenagem urbana e recarga dos aquíferos subterrâneos, uma bacia-endorréica. Trata-se de depressões filtrantes que abrangem quase todo o bairro da Cidade Universitária, permitindo a percolação natural das águas pluviais e recarga os aquíferos que alimentam os mais importantes mananciais de abastecimento de água (FERREIRA NETO et al, 2004). Apesar da singularidade ambiental da Cidade Universitária, observa-se o incentivo à ocupação desta área periférica, tendo em vista que as legislações urbanas estimulam a ocupação do bairro qualificando-o como Zona de Expansão Urbana (Plano Diretor de Maceió de 2005). Baseado neste conflito entre a peculiaridade ambiental e a tendência de crescimento urbano, pretende-se analisar a contribuição sócio-ambiental das áreas verdes e vazios urbanos em seu processo de urbanização. O trabalho está voltado ao estudo das características físicas e ambientais das áreas verdes e vazios urbanos da Cidade Universitária, com o objetivo geral de propor diretrizes sustentáveis para orientar o andamento de seu processo de urbanização, através de propostas condizentes sobre suas áreas verdes e de proposições satisfatórias de usos e ocupações de seus vazios urbanos. Nesse sentido, observa-se a importância de se analisar as áreas verdes por serem obrigatoriamente permeáveis, ou seja, contribuem diretamente com a percolação natural das águas pluviais. A importância da análise do fenômeno dos vazios urbanos consiste em sua relevância no desenvolvimento da urbanização na cidade de Maceió, já que, à medida que o município cresce horizontalmente, seus vazios continuam desocupados e subutilizados, atribuindo à cidade um caráter disperso. Este trabalho serve de subsídio para propostas de desenho urbano direcionadas às áreas de baciaendorreica (CARVALHO, 2008). Desta forma, o trabalho foi realizado a partir de pesquisa bibliográfica, de visitas a campo e de levantamento de dados, onde as informações coletadas foram sistematizadas e utilizadas para a elaboração dos resultados apresentados. 2. O BAIRO DA CIDADE UNIVERSITÁRIA Cidade Universitária é um bairro periférico localizado no extremo eixo norte de crescimento urbano, fazendo limite com o município de Rio Largo e com a área rural do município de Maceió. O bairro possui área total de 20,20km², altitude média de 80m e um relevo suavemente ondulado constituído por uma rica hidrografia. Trata-se de um local de recarga de aquíferos pelo fato de abranger uma baciaendorréica e por localizar-se entre dois importantes mananciais que juntos abastecem uma significativa porção da cidade, os riachos Pratagy, Catolé e Aviação. As ondulações do relevo direcionam os caminhos a serem percorridos pelas águas pluviais, que irão se encontrar no fundo da bacia-endorréica (área destacada de amarela na figura 1), ponto mais propício para a percolação e a recarga dos aquíferos. 2

Área Rural do Município de Maceió Município de Rio Largo BAIRRO CIDADE UNIVERSITÁRIA FIGURA 1 Cidade Universitária com setas indicando o caminho das águas pluviais. Fonte: Adaptado da Base Cartográfica de Maceió (2000). A descontinuidade do ciclo natural da bacia-endorréica, provocada pela impermeabilização do solo, prejudicou a percolação natural das águas pluviais, dando surgimento a vários alagamentos nas vias principais do bairro. A implantação do Sistema de Macro-drenagem do tabuleiro de Maceió tinha o objetivo de amenizar estes alagamentos através de lagoas artificiais de retenção (FERREIRA NETO et al, 2004). Pode-se dizer que este sistema é ineficiente e conflitante no sentido de fazer o papel inverso da bacia-endorréica. Enquanto esta tende a infiltrar naturalmente as águas pluviais no solo, o Sistema de Macro-drenagem redireciona-as para rios em outros pontos da cidade, dificultando a recarga dos aquíferos, de modo a resolver somente o problema da drenagem urbana, já que problematiza, ainda mais, a questão do abastecimento de água da cidade. Além disso, é uma obra impactante, de alto valor, sem contar com os projetos de extensão e criação de novas lagoas incentivadas pelos programas governamentais. Por se tratar de um bairro localizado próximo à área rural do município, observa-se uma nítida divisão entre a área urbana de uso rural (sentido norte) e a área urbanizada (sentido sul). A primeira equivale a 39% de todo o bairro, abrangendo atividades agrícolas como o cultivo da cana-de-açúcar, com sítios ou chácaras. Na segunda, com 61% do bairro e objeto de estudo do trabalho, observa-se uma configuração urbana mais consolidada, através de parcelamentos, edificações e equipamentos urbanos. (Figura 2). De acordo com os relatórios do grupo de pesquisa Morfologia dos Espaços Públicos (MEP/UFAL), o processo de ocupação nesta área urbanizada iniciou-se na década de 1950 através de chácaras e sítios. A construção da Universidade Federal de Alagoas e do Hospital Universitário na década de 1960 impulsionaram a ocupação do restante do bairro a partir de conjuntos populares, com casas de um a dois pavimentos, de pequenos recuos ou mesmo edificações conjugadas. 3

área urbana de uso rural área urbanizada FIGURA 2 Área Urbana de Uso Rural / Área Urbanizada. Fonte: Google Earth (2008). Na década de 1980 a ocupação se intensifica preenchendo áreas mais internas e com edificações multifamiliares, como o caso do conjunto Tabuleiro dos Martins, além de estabelecimentos comerciais implantados nas bordas das duas vias estruturais do bairro, BR 104 e a avenida Menino Marcelo. Baseado em dados do IBGE (2000), observa-se que o bairro é predominantemente habitado por população de baixa renda com rendimento mensal entre um e três salários mínimos, atraída pelos vários loteamentos e conjuntos populares. Em relação à infra-estrutura urbana observa-se uma grave carência em relação ao abastecimento de água, esgotamento sanitário e pavimentação. Menos de 80% dos domicílios está ligado à rede geral de água, nenhum destes domicílios se encontra ligado à rede geral de esgoto e somente as principais vias estão pavimentadas. Apesar disso, há um agudo crescimento urbano neste bairro, tendo em vista que a legislação urbana e o próprio interesse imobiliário estimulam sua ocupação, implantado, atualmente, vários conjuntos destinados à população de alta e média renda que atraem novos equipamentos e serviços, como é o caso do novo shopping center da cidade. No entanto, observa-se que esse crescimento urbano, caso não seja planejado, pode prejudicar o ciclo natural da bacia-endorréica, tendo em vista a falta de infra-estrutura e a impermeabilização descontrolada do solo. Este fato prejudica diretamente a qualidade do abastecimento de água da cidade por conta da inevitável contaminação dos aquíferos e dificuldades de sua recarga. 3. ÁREAS VERDES Em Cidade Universitária, as áreas verdes seguem a descrição de Demattê (apud Harder, 2002). Trata-se de espaços públicos, com equipamentos urbanos e de lazer, onde exercem uma significativa função ambiental. Surgem pontual e heterogeneamente, ocupando dispersas quadras de formato quadrado ou retangular, localizando-se no centro ou nas bordas dos parcelamentos. Para a análise dos resultados do trabalho, foram consideradas somente as áreas verdes que se encontram nos parcelamentos cadastrados pela prefeitura, Superintendência Municipal de Controle do Convívio Urbano (SMCCU). Segundo Lima et al (apud Russo, 2005), as áreas verdes são espaços livres de construção, de modo que a vegetação deve ocupar o mínimo de 70% da área, devem ser planejadas e equipadas, atendendo as necessidades de seus usuários, com o tipo de arborização e lazer específicos e satisfatórios. Porém, as áreas verdes da Cidade Universitária geralmente se configuram como espaços livres, sem estrutura de lazer e pouca arborização. 4

Até o ano de 1989, a Legislação Urbana (Códigos de Edificações, Posturas e Urbanismo de 1985) exigia uma área mínima de 3,5% de áreas verdes nos parcelamentos a serem implantados. No caso da Cidade Universitária alguns parcelamentos visivelmente ultrapassam este valor, como o caso do conjunto Eustáquio Gomes de Melo, mas a maioria configura-se como espaços livres. De acordo com as análises do mapa e das visitas a campo, observaram-se quatro situações diferentes de áreas verdes: (a) áreas verdes de fato implantadas, com equipamentos, arborização e áreas de lazer para a população como meio de recreação; (b) áreas verdes não implantadas, com aspecto de espaços livres, pouca vegetação e utilizada pela população para diferentes fins; (c) áreas verdes utilizadas para equipamentos e instituições; e enfim, (d) áreas verdes invadidas. As áreas verdes com aspecto de espaços livres são as mais comuns no bairro, utilizadas pela população como atalhos para circulação, pontos de encontro ou mesmo na implantação temporária de parques infantis. Segundo os próprios moradores, estes espaços merecem uma maior atenção por parte do poder público, através da implantação de parques, quadras de esportes além de mais arborização. É o caso das áreas verdes do conjunto Eustáquio Gomes de Melo e do loteamento Denisson Menezes. Segundo Sanchotene (1994), o grande problema das áreas verdes é sua ocupação indevida, clandestinamente, por sub-habitações ou por atividades comerciais, associações de bairros, entre outras (Figura 3). Nestas áreas verdes que vem sendo invadidas, seja por pessoas de baixa ou até de média renda, devem ser aplicados os instrumentos já encontrados no Estatuto da Cidade de Maceió (Lei Federal 10.257/2000). Trata-se da Regularização Fundiária ou do Termo de Ajuste de Conduta entre prefeitura e invasor. FIGURA 3 Área Verde invadida no conjunto Conjunto Eustáquio Gomes de Melo. Fonte: Lina Carvalho (2009). Em 1996, a Sociedade Brasileira de Arborização Urbana (SBAU) propôs o índice mínimo de 15m²/habitante de áreas verdes por cada cidade brasileira, que deverão ser destinadas a recreação e outras atividades direcionadas a população (MACEDO et al, apud HARDER, 2002). Se compararmos a área total das áreas verdes dos parcelamentos cadastrados pela prefeitura no bairro, 338.361m² (ou seja, 2,71% da área urbanizada), com sua população, 52.269hab, percebe-se que a distribuição de área verde por habitante é insatisfatória, 6,47m²/hab, valor bem a baixo do recomendado pela SBAU. No entanto, essa distribuição de áreas verdes por habitante varia a depender da densidade dos diferentes parcelamentos, pôde-se concluir que os parcelamentos de baixa densidade, que são aqueles ainda não totalmente consolidados, possuíam satisfatória distribuição de áreas verdes; e os de maior densidade, aqueles já consolidados, possuíam áreas verdes insatisfatórias. Para que a análise dessa distribuição seja eficaz, deve-se apontar diretrizes somente àqueles parcelamentos já consolidados. 5

4. VAZIOS URBANOS Os chamados vazios urbanos são justamente os espaços vazios que aguardam futuras valorizações. Mesmo inseridos no espaço urbano, não acompanham o ciclo dinâmico de funcionalidade urbana. São fruto do interesse econômico do mercado imobiliário comportando-se como um tipo de mercadoria, cujo produto final se valoriza ou se desvaloriza com o passar do tempo, a depender das circunstâncias que estão inseridos no espaço urbano. É evidente que inseridos num processo de urbanização descontrolado, como o caso de Maceió, os vazios urbanos são considerados obstáculos, uma vez que não interagem com as atividades citadinas, acumulando um significativo espaço, às vezes privilegiado com infra-estrutura e equipamentos. Identificando os problemas que os geram e as potencialidades de sua utilização, os vazios urbanos podem se tornar as verdadeiras soluções no que diz respeito ao desenvolvimento qualitativo das cidades, através de políticas públicas voltadas a seu planejamento e utilização. Para os excluídos, um lugar onde viver; para os setores médios, possibilidades de áreas de lazer, equipamentos e recreação (...). (CLICHEVSKY, 2002). Sobre os vazios urbanos da Cidade Universitária, observou-se que sua caracterização assemelhase ao conceito utilizado por Ebner (1999), são lotes desocupados e não edificados, parcelados ou não, terrenos à espera de futuras instalações localizados em áreas que possuem o mínimo de infra-estrutura já instalada. Encontram-se de forma heterogênea ao longo do bairro, concentrando-se dentro ou próximo aos parcelamentos implantados. Por localizarem-se numa periferia, estes vazios estão distribuídos em diferentes tipologias: lotes pequenos (até 125m²), padrão (de 125 a 500m²), grande (de 500 a 1.000m²) e glebas (mais de 1.000m²). Tamanho dos vazios TABELA 1 Tabela Síntese Vazios Urbanos. Tipologia dos vazios Quant. Área (m²) Bairro Vazios Pequeno 125m² 230 52.305,00 0,25 0,89 Padrão 125 e 500m² 1.161 296.572,00 1,46 4,96 Grande 500 e 1000m² 75 54.349,00 0,26 0,91 Gleba > 1000m² 432 5.568.721,00 27,58 93,24 Fonte: Carvalho, 2006 e Base Cartográfica PMM, 2000. Juntos, equivalem a 29,58% da área total do bairro, e a 47,90% de sua área urbanizada (dados sistematizados da base cartográfica do ano de 2000). Dentre estes vazios os que mais se destacam são as glebas, ocupando 93,24% de todos os vazios e consequentemente 27,58% da área total do bairro (Figura 4). Estas glebas se caracterizam como grandes espaços vazios e abandonados em meio ao bairro, localizando-se geralmente vizinhas aos parcelamentos consolidados. A população as utiliza para diversos fins: campos de pelada (Figura 5); atalhos para circulação entre áreas ocupadas; pontos de prosa pelos moradores vizinhos mais antigos com mesas e banquinhos; acúmulo de material ou lixo a céu aberto, principalmente nos vazios urbanos invadidos; ou até mesmo para uso rural com o plantio de determinadas culturas. 6

FIGURA 4 Vazios Urbanos. Fonte: Adaptado da Base Cartográfica de Maceió (2000). FIGURA 5 Vazio urbano utilizado como campo de pelada. Fonte: Lina Carvalho (2006). Aquelas glebas próximas aos densos loteamentos e que margeiam as vias principais do bairro se destacam por serem constantemente invadidas por uma população desprovida de moradia, sem teto, e de baixíssimo poder aquisitivo. São grupos politicamente organizados que pressionam a prefeitura na criação políticas voltadas à baixa renda. Juntam-se a procura de terrenos desocupados a fim de montar barracos de lona e papelão, compondo formas subumanas de moradia, em locais totalmente insalubres e desprovidos de infra-estrutura. É o caso da gleba localizada entre o conjunto Eustáquio Gomes de Melo e o loteamento Jardim da Saúde. Com área de 223.680m², foi ocupada por aproximadamente 115 famílias, o maior assentamento irregular encontrado no bairro, que se fixaram no local acerca de dez anos (Figura 6). Atualmente, essas famílias foram removidas para um conjunto construído num bairro vizinho proporcionado pelo município. Percebe-se a potencialidade de implantação de Habitações de Interesse Social nesta gleba em particular. Entretanto, a peculiaridade ambiental do bairro exige um cuidado maior no que se refere ao tipo de ocupação que poderá ser empregado nesses vazios. 7

FIGURA 6 Invasão de vazio urbano. Fonte: Lina Carvalho (2009). 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A singularidade ambiental do bairro aliada à sua tendência de expansão urbana são fatores que devem servir de subsídio para a orientação de políticas urbanas voltadas ao planejamento e gestão da cidade de Maceió sobre a necessidade de se estipular diretrizes sustentáveis de uso e ocupação do solo. Isso será possível através de um maior controle demográfico, incentivando a baixa taxa de ocupação do solo, optando por edificações verticais, a fim de possibilitar maior área permeável, o que facilitará a percolação natural das águas pluviais. Em relação às áreas verdes, percebeu-se que sua melhor disposição depende de fatores como relevo, bacia-endorréica, percurso das águas pluviais e também distribuição da ocupação no bairro. É recomendado que as áreas verdes se distribuam ao longo do parcelamento de forma estreita e alongada, percorrendo o sentido do caminho das águas pluviais de forma paralela, e se possível, havendo uma continuidade entre as áreas verdes dos diferentes parcelamentos (Figura 7). FIGURA 7 Continuidade entre áreas verdes. Fonte: Adaptado da Base Cartográfica de Maceió (2000). Russo (2005) afirma ainda que as áreas de maior densidade demográfica são as que mais necessitam de áreas verdes, diferentemente daquelas mais dispersas onde, naturalmente, é encontrada uma maior área vegetada. Neste sentido, o ponto mais central do bairro merece atenção, por abranger os parcelamentos mais densos, os conjuntos Deputada Lucila Toledo e Santa Helena e o loteamento Denisson Menezes. O próprio perfil periférico do bairro e sua fragilidade ambiental remetem à não utilização de todos os seus vazios para fins construtivos. Observa-se que o único perfil construtivo a ser implantado nestes vazios deve ser o de habitações populares destinadas à população de baixa renda, principalmente a 8

gleba localizada entre o loteamento Jardim da Saúde e o conjunto Eustáquio Gomes de Melo. Além disso, os vazios urbanos de menores dimensões podem atrair os invasores das áreas verdes, fazendo com que estas exerçam sua função urbana. É aconselhável que os demais vazios urbanos se constituam como áreas permeáveis, facilitando a percolação natural das águas pluviais, permanecendo-se vazios ou tornando-se áreas verdes a depender das necessidades de cada local, seja pela existência de alagamentos, ou para proporcionar área de lazer para os parcelamentos mais adensados e carentes de áreas verdes, como o caso do loteamento Denisson Menezes. O papel social das áreas verdes seria a implantação de áreas de lazer e o seu papel ambiental seria evitar os corriqueiros alagamentos de modo a contribuir com a percolação natural das águas pluviais, beneficiando diretamente o abastecimento de água de uma significativa parte da cidade. O papel social dos vazios urbanos seria a implantação de Habitações de Interesse Social, principalmente naqueles que vêm sendo invadidos pelos sem-teto. Já o papel ambiental destes vazios seria sua utilização como áreas verdes, proporcionando um maior controle da drenagem em locais estratégicos. Essa harmonia estabelecida entre os meios social e ambiental é fundamental para um planejamento urbano sustentável. Esse equilíbrio passa a ser essencial num país onde a desigualdade cresce a cada dia, acompanhada do crescimento acelerado e sem planejamento das grandes cidades atuais. Os cidadãos necessitam mais do que a infra-estrutura básica pode oferecer como água, esgoto, luz, etc. Eles necessitam de equilíbrio, lazer e também tranquilidade. Estas qualidades podem ser encontradas em espaços ainda vazios, tranquilos, com bastante verde, situados dentro das cidades, justamente com o objetivo de fugir dos transtornos e dificuldades que a própria cidade pode causar em seus moradores. REFERÊNCIAS CARVALHO, Lina Martins de. O processo de urbanização no bairro da Cidade Universitária em Maceió (AL): a contribuição sócio-ambiental das áreas verdes e vazios urbanos. Trabalho Final de Graduação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas. Orientadora: Profª. Drª. Verônica Robalinho Cavalcanti. Maceió-AL, 2008. CLICHEVSKY, Nora. Tierra vacante em ciudades latinoamericana. Cambridge, Massachussets: Lincoln Institute of Land Policy, 2002. EBNER, Íris. A Cidade e seus Vazios. Campo Grande-MS: Editora UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), 1999. FARIA, Geraldo. Produção dos espaços públicos na cidade de Maceió na segunda metade do século XX Estudo Morfológico dos Projetos de Parcelamento Urbano de maceió, aprovados entre 1945 e 2000. Grupo de Estudos Morfologia dos Espaços Públicos (MEP/UFAL), Maceió-AL. FERREIRA NETO, J. V.; SANTOS, R. J. Q. dos; LIMA, R. C. de A. Os Recursos Hídricos da Área do Tabuleiro do Martins Maceió/AL. In: ARAÚJO, Lindemberg Medeiros de. (Org.). Geografia: espaço, tempo e planejamento. Maceió-AL: Edufal, 2004. HARDER, Isabel Cristina Fialho. Inventário quali-quantitativo da arborização e infra-estrutura das praças da cidade de Vinhedo (SP). Dissertação (Mestrado na Escola Superior Agricultura Luiz de Queiroz ) Universidade de São Paulo, Piracicaba-SP, 2002. RUSSO, Renato Anselmo. Aplicação do indicador de proximidade de áreas verdes urbanas na cidade de Jaboticabal SP. Dissertação (Mestrado em Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana.) Universidade Federal de São Carlos, São Carlos-SP, 2005. SANCHOTENE, M. C. Desenvolvimento e perspectivas da arborização urbana no Brasil. In: Congresso Brasileiro de arborização urbana, 2.; Encontro Nacional sobre arborização urbana, 5., São Luís, 1994. Anais. São Luís: Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, 1994. p. 15-26. 9