UMA VISÃO SISTÊMICA SOBRE A SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO. por Roberto de Souza presidente do CTE Centro de Tecnologia de Edificações



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UMA VISÃO SISTÊMICA SOBRE A SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO por Roberto de Souza presidente do CTE Centro de Tecnologia de Edificações Nos últimos cinco anos, a sustentabilidade vem ganhando força significativa no setor da construção brasileira. São inúmeros os empreendimentos de diferentes tipologias que vêm sendo objeto de práticas sustentáveis e certificação ambiental, em diferentes regiões do País. As perspectivas de crescimento do setor da construção e do mercado imobiliário são muito promissoras para os próximos anos. No artigo abaixo, sob a forma de uma entrevista, faço uma revisão conceitual da sustentabilidade aplicada à construção, considerando suas dimensões econômicas, ambientais e sociais, assim como uma retrospectiva das principais ações que as empresas do setor vêm conduzindo no campo da construção sustentável e da certificação de empreendimentos. São apontados também as tendências e os caminhos futuros da construção sustentável no Brasil. A sustentabilidade há muito deixou de ser modismo, e hoje desponta como tendência no mundo para um novo modelo de desenvolvimento econômico, para uma economia verde, inclusiva e responsável. O setor da construção civil já reconhece esta tendência? Realmente a sustentabilidade vem assumindo importância estratégica para os governos e empresas de vários setores da economia mundial. A crise de 2008, de início, fez refluir o movimento pela sustentabilidade nos países desenvolvidos. Em um segundo momento, no entanto, ficou claro que a crise ocorreu devido à fragilidade de um dos tripés da sustentabilidade, o econômico, por conta de um sistema financeiro internacional inconsistente e insustentável. A retomada da economia mundial com todos os seus avanços e recuos, a partir de então, vem sendo pautada pela discussão de novos modelos econômicos, com forte ênfase ambiental, social e responsável, fortalecendo os aspectos econômicos e financeiros. Em vários países, o setor da construção civil já reconhece esta tendência, assumindo práticas sustentáveis especialmente em empreendimentos, projetos, materiais e obras e parcialmente incorporando a sustentabilidade nas empresas como um todo. Na construção civil brasileira, podemos ver esta tendência também ser reconhecida pelo crescimento acentuado de empreendimentos sustentáveis nos últimos cinco anos em vários segmentos: arenas esportivas, hospitais, shoppings e edifícios comerciais e industriais. Como poderiam ser avaliadas as dimensões sociais, ambientais e econômicas no setor da construção civil? A dimensão econômica está relacionada aos resultados financeiros das empresas e dos empreendimentos. Ou seja, ao crescimento do faturamento e lucro das empresas, ao volume de vendas dos empreendimentos imobiliários, assim como à rentabilidade e taxa interna de retorno do capital investido. O atendimento aos prazos e o descolamento dos custos de obras em relação ao planejado e orçado, são também aspectos da dimensão econômica, pois estão diretamente ligados à rentabilidade dos empreendimentos e das empresas. A qualidade do produto final é também uma dimensão econômica, pois está associada à satisfação do cliente,

um dos principais stakeholders da empresa, e à redução de desperdícios e custos de manutenção do empreendimento pós-entrega. Um outro aspecto da dimensão econômica é o impacto dos empreendimentos e do consumo de materiais locais nas economias regionais, fortalecendo as empresas regionais e o emprego e renda. A dimensão ambiental está relacionada aos resultados de redução dos impactos ambientais gerados pelas empresas e seus empreendimentos. Por exemplo, à eficiência energética, à redução do consumo de água, ao uso de materiais reciclados, à qualidade do ambiente interno, à minimização dos impactos ambientais durante a execução das obras, à geração de resíduos no canteiro e à gestão do lixo na fase de uso do empreendimento. As ações preventivas tomadas na fase de concepção do produto, desenvolvimento do projeto, especificação dos materiais e execução das obras, contribuem de forma significativa para o desempenho ambiental ao longo da vida útil do empreendimento. A dimensão social está relacionada aos resultados sociais gerados pelas empresas, empreendimentos e obras. Podemos incluir nesta dimensão: o comportamento ético, os projetos de responsabilidade social, a gestão de pessoas e as ações de voluntariado das empresas. Estão também nesta dimensão as práticas de segurança e saúde ocupacional nos canteiros e as ações sociais e culturais nas obras, como programas de alfabetização, capacitação e treinamento, inclusão digital e implantação de bibliotecas em obras. O setor da construção mostra-se hoje vigoroso, diante dos indícios de um novo ciclo de expansão e das boas perspectivas de desenvolvimento do País para esta nova década. Quais as oportunidades que o setor tem para inserir a sustentabilidade em sua agenda nos próximos anos? Todos os indicadores apontam para um cenário de crescimento acelerado da construção civil no País. Os indicadores de desenvolvimento econômico são animadores, o mercado imobiliário está em franca expansão, o programa Minha Casa Minha Vida permitiu a entrada de novos segmentos sociais no mercado e teremos ainda a Copa 2014 e as Olimpíadas 2016 com muitos investimentos em infraestrutura e mobilidade urbana. A primeira questão é o que fazer para este crescimento ser sustentável? A cadeia produtiva está preparada para atender esta demanda? É necessário, de antemão, um plano estratégico setorial para garantir que não faltarão recursos de investimento e financiamento, materiais e equipamentos, e profissionais qualificados, como projetistas, engenheiros de obras, equipes de produção. As empresas e o governo deverão também estar preparados em termos de planejamento e gestão para aprovar, projetar e construir dentro dos prazos e custos definidos, com garantia da qualidade e desempenho ambiental. A segunda questão diz respeito às diretrizes ambientais para o desenvolvimento, projeto e construção dos vários empreendimentos resultantes deste crescimento, que, como já falamos,

envolvem economia de energia e água, utilização de materiais reciclados, gestão de resíduos e garantia da qualidade do ambiente interno. Neste aspecto, temos hoje várias iniciativas em curso no mercado, que podem ser fortalecidas. A certificação ambiental dos empreendimentos pelo modelo americano do LEED, do Green Building Council, por exemplo, vem crescendo de forma significativa no País. Hoje ocupamos a quarta posição no ranking de empreendimentos registrados para certificação (590 empreendimentos), abaixo dos EUA, Emirados Árabes e China. O modelo de certificação ambiental (AQUA) também começa a ocupar espaço no País. Hoje temos em torno de 72 empreendimentos em processo de certificação. A Caixa Econômica Federal lançou também o Selo Casa Azul com 54 diretrizes para a construção sustentável dos empreendimentos. O Programa Procel criou e vem gradativamente difundindo no setor a Etiquetagem Energética de Edificações Comercias e Habitacionais. A FIFA tem um conjunto de diretrizes de sustentabilidade para a construção dos estádios, assim como o Comitê Olímpico Brasileiro tem tais diretrizes para as arenas e demais equipamentos para as Olimpíadas. Na questão social, há um grande espaço para o setor investir na capacitação e o treinamento de seus profissionais nos diversos níveis, promovendo o desenvolvimento profissional de arquitetos, engenheiros e tecnólogos e a inclusão cultural e social dos operários das obras visando gerar aumento de emprego e renda. Quais os principais equívocos sobre o conceito de Sustentabilidade? O principal equívoco é considerar a sustentabilidade como um modismo passageiro, ou como um mero elemento de marketing, sem considerar os conceitos envolvidos em suas três dimensões: econômica, ambiental e social. Sendo a sustentabilidade e a construção sustentável temas e conceitos ainda novos, que implicam novos paradigmas, é natural que existam várias abordagens, linhas de atuação, pesquisas ou projetos em desenvolvimento. No entanto, em algumas vezes, as análises surgem simplificadas e abordam apenas partes dos conceitos de sustentabilidade, sendo que os resultados são apresentados como se tratassem de um todo, como se todas as dimensões e aspectos tivessem sido considerados, o que não é real. No caso da construção sustentável, é importante que seja dada atenção às questões econômicas, socioambientais e a todas as abordagens que envolvem os impactos, o desempenho e as tecnologias sustentáveis de um empreendimento ou de uma empresa, e não apenas a uma abordagem parcial de um ou outro aspecto ambiental da sustentabilidade, pois isto não garante que um empreendimento ou empresa seja realmente sustentável, mas só responde a um aspecto da grande gama de soluções a serem implantadas.

Quais as práticas sustentáveis que o setor da construção no Brasil tem incorporado e devem incorporar no futuro para o desenvolvimento sustentável de seus empreendimentos, projetos e obras? As principais práticas sustentáveis que estão sendo adotadas nos empreendimentos no Brasil podem divididas nas seguintes categorias e fases do empreendimento: Estudos preliminares e concepção do produto: análise dos impactos econômicos e socioambientais; localização próxima aos transportes públicos; densidade e conectividade urbana. Inserção do empreendimento no meio ambiente e na malha urbana: proteção e maximização de áreas verdes; acessibilidade nos empreendimentos; gestão da permeabilidade e escoamento das águas pluviais. Uso e conservação de água: aproveitamento de águas pluviais e águas cinzas; redução do uso de água potável para irrigação; medição individualizada de consumo, especificação de componentes hidráulicos economizadores. Gestão do uso de energia: luminárias de alto rendimento e lâmpadas eficientes; sistemas de automação; elevadores inteligentes; estudos dos sistemas prediais para melhor desempenho energético; equipamentos e motores elétricos de alto desempenho, especificação de componentes de coberturas, fachadas e vidros de alto desempenho térmico, aumentando a eficiência energética das edificações. Seleção de materiais e resíduos: redução do desperdício de materiais; sistemas construtivos industrializados, previsão de áreas nos empreendimentos para depósitos de recicláveis, visando a coleta seletiva do lixo; seleção de materiais regionais e com conteúdo reciclado e de madeiras com manejo sustentável. Qualidade do ambiente construído: desenvolvimento de projetos e especificação de matérias visando o conforto térmico, acústico e lumínico; aproveitamento da ventilação e iluminação natural. Práticas ambientais nos canteiros de obras: gestão da geração de resíduos e coleta seletiva nos canteiros de obras; desmobilização do canteiro com reaproveitamento dos materiais; minimização dos impactos ambientais e interferências no entorno: manutenção e limpeza de ruas e calçadas, arranjo físico do canteiro, proteção de bocas de lobo, execução de lava rodas e lava bicas; proteção de taludes e do solo contra erosão. Práticas sociais nos canteiros de obras: saúde, segurança e condições de trabalho; educação e desenvolvimento profissional; ações sociais voltadas à comunidade; alfabetização; áreas de vivência e desenvolvimento cultural para os trabalhadores; inclusão digital. Como pensar em soluções sustentáveis, sem afetar os orçamentos e a lucratividade das construtoras e incorporadoras?

Quando questionamos o investimento adicional de um empreendimento sustentável em relação ao convencional, estamos, na verdade, questionando se vale a pena desenvolver um produto com melhor desempenho em relação à média. Qualquer produto acima da média já se diferencia no mercado e possui maior atratividade para os clientes; somado a isso, existe um movimento gigantesco que está levando investidores, organizações e consumidores a valorizar os produtos sustentáveis e as ações de empresas ambiental e socialmente responsáveis. O edifício sustentável é um produto com maior valor agregado e percebido, ou seja, o edifício sustentável é um produto melhor em vários aspectos, desde o baixo consumo de água e energia até o alto nível de conforto para seus usuários, além, é claro, dos benefícios da imagem do produto e dos empreendedores. Deve-se inicialmente destacar que muitos itens agregam custos insignificantes ou não requerem custo adicional algum ao empreendimento, como, por exemplo: destinação de áreas e infraestrutura para coleta seletiva, adoção de áreas verdes nativas e de baixo consumo, iluminação apenas aonde é necessária, uso de tintas sem cheiro (VOC), reaproveitamento de materiais de demolição, adoção de materiais regionais e com conteúdo reciclado, etc. Em função da experiência do CTE nos trabalhos desenvolvidos para vários empreendimentos, pode-se dizer que há um aumento no custo de construção entre 1% e 6%. No entanto, não há como se definir um valor de investimento médio adicional, pois sempre dependerá de o quê será incorporado ao projeto (padrão do produto) e o nível de sustentabilidade desejado pelos empreendedores. Diversas pesquisas americanas sobre o nível de investimento adicional e os retornos na locação e venda de edifícios comerciais e residenciais certificados pelo LEED têm comprovado que a certificação é interessante do ponto de vista do negócio, ou seja, o valor agregado é superior aos investimentos. Outras pesquisas demonstram que um edifício certificado Green Building, por exemplo, pode reduzir em até 30% o consumo de energia, 35% as emissões de carbono, 30% a 50% o consumo de água e de 50% a 90% o descarte de resíduos. Assim, a melhor forma de se desenvolver um empreendimento sustentável é começar o projeto com o máximo de soluções técnicas focadas em sustentabilidade e com um orçamento detalhado; depois disso, decidir o quê cabe e o quê não cabe para o produto. Não se esquecendo dos retornos esperados na redução do consumo de energia e água, aumento de conforto, benefícios na imagem das empresas e do produto, maior tempo para a edificação ficar obsoleta em relação às demais e a consequente manutenção do nível de rentabilidade de áreas locadas, entre outros. De certa forma, não há volta para o assunto, ou seja, uma edificação que não for construída com os conceitos de sustentabilidade nascerá obsoleta e perderá seu valor no mercado imobiliário. Quem define o preço é o mercado, e o mercado está ficando mais consciente e exigente, o espaço para edificações insustentáveis e fora do novo padrão que se estabelece começa a diminuir. Esta tendência de inclusão das práticas sustentáveis já está sendo incorporada ou pensada também com relação ao desenvolvimento urbano?

Esta abordagem faz todo o sentido e é uma tendência de futuro, pois os ganhos significativos de sustentabilidade ocorrem quando se tem edificações sustentáveis em um espaço urbano também sustentável. Um espaço urbano que pense de forma sustentável a infraestrutura urbana energia, drenagem, água, esgoto, sistema viário, áreas verdes, etc. assim como a mobilidade urbana. Um espaço urbano que promova a diversidade de tipologias e usos de edificações, que respeite a escala humana e promova a inclusão social. A sustentabilidade no desenvolvimento urbano, assim como os retrofits de bairros sustentáveis, vem ganhando espaço em vários países do mundo que já incorporaram a sustentabilidade em edificações, em especial alguns países europeus, como a França, Alemanha, Inglaterra, EUA, China e Emirados Árabes. Os países europeus, e em especial a França, via seu sistema de certificação ambiental HQE, está trabalhando em projetos de bairros sustentáveis. O USGBC apresentou no mês de junho de 2011 a norma LEED-ND, focada na certificação ambiental de bairros sustentáveis. Alguns empreendimentos piloto dentro e fora dos EUA estão aplicando esta metodologia em projetos de intervenção urbana e, no Brasil, a norma já começou a ser implementada em alguns empreendimentos. O Parque das Cidades, empreendimento lançado em São Paulo pela OR Empreendimentos Imobiliários segue esta normativa do LEED-ND. Temos ainda o projeto Porto Maravilha, um retrofit urbano no Rio de Janeiro de 5 milhões de metros quadrados que está sendo concebido a partir da adoção de um Compromisso do Empreendimento com a Sustentabilidade. Temos ainda aqui em São Paulo, o exemplo do loteamento Genesis da Takaoka, em Santana do Parnaíba/SP da Riviera de São Lourenço, desenvolvidos a partir de premissas sustentáveis, e que obtiveram a certificação ISO 14.000. Destaca-se também o empreendimento Pedra Branca, em Santa Catarina, que segue um conjunto de premissas sustentáveis. Os ganhos de sustentabilidade acontecem apenas via certificação dos empreendimentos? Como ampliar a visão da sustentabilidade para os negócios das empresas da cadeia produtiva da construção? A sustentabilidade na construção brasileira realmente está acontecendo via certificação de uma ampla gama de empreendimentos pelo modelo americano do LEED - Green Building e pelo modelo francês do AQUA. Como estes modelos definem diretrizes sustentáveis a serem adotadas no empreendimento, temos alcançado muitos ganhos em diversas áreas, em especial na concepção de projetos, desenvolvimento de novas tecnologias, materiais sustentáveis e procedimentos de execução de obras, com práticas sustentáveis nos canteiros. Porém ainda estamos longe de incorporar, na estratégia e na gestão das empresas da cadeia produtiva da construção, todo o potencial que a sustentabilidade nos permite. Quando tratamos do Green Building ou do AQUA nos referimos essencialmente à dimensão ambiental da sustentabilidade, deixando de lado as dimensões econômicas e sociais.

Além disso, a empresa incorporadora e construtora, em geral, aplica as diretrizes do LEED ou do AQUA, somente ao empreendimento em processo de certificação, quando tem dezenas de empreendimentos em andamento. Como aplicar, então, os conceitos da sustentabilidade ao DNA das empresas da cadeia produtiva da construção? Em primeiro lugar, abrindo espaço para incluir os aspectos de responsabilidade socioambiental na estratégia das empresas, em seus valores e em sua gestão. Algumas ações concretas podem sinalizar aos stakeholders da organização o compromisso com o desenvolvimento sustentável. Por exemplo, a adesão da empresa ao Pacto Global, a adoção dos indicadores ETHOS para medir o estágio da empresa em relação ao compromisso socioambiental, assim como podem ser desenvolvidas ações corporativas para reduzir as emissões de CO2 e o aquecimento global, e implementadas ações de responsabilidade social empresarial. Em segundo lugar, as empresas podem incorporar as diretrizes ambientais, sociais e econômicas tripé da sustentabilidade aos seus processos de gestão. Por exemplo, uma incorporadora e construtora pode definir contornos sustentáveis para os processos de escolha de terreno, concepção de produto, desenvolvimento de projeto, suprimentos, execução de obras, manual de uso/operação e assistência técnica pós-entrega. Para tal, os processos podem ser redesenhados, incluindo diretrizes socioambientais e check lists para verificar se as diretrizes estão sendo efetivamente aplicadas. Ou seja, podemos rodar nos processos empresariais um ciclo especial de PDCA, que incorpore a sustentabilidade no dia a dia da incorporadora e construtora. O mesmo raciocínio vale para as empresas de projeto. Nas empresas fabricantes de materiais, a inclusão do DNA da sustentabilidade é também plenamente possível. No aspecto da produção, é necessário inovar nos produtos e redesenhar os processos de fabricação de materiais, incorporando as metodologias de Design Sustentável e Análise do Ciclo de Vida do Produto. Enfim, a questão da sustentabilidade é um desafio complexo para as empresas da cadeia produtiva, mas pode ser enfrentada de forma evolutiva, definindo-se planos de ação e prazos factíveis, que irão consolidar a cultura do desenvolvimento sustentável na organização. Na verdade, trata-se de estabelecer um programa estratégico, pois a tendência é a de evoluirmos cada vez mais rápido para uma sociedade e uma economia em que os valores da sustentabilidade sejam adotados por consumidores, contratantes, investidores e governos. Pensar globalmente e agir localmente, esta é uma boa dica para as empresas que têm compromisso com as futuras gerações. Quais seriam os passos concretos para implantar de forma objetiva a sustentabilidade nos processos de gestão das empresas de construção? A incorporação dos conceitos de sustentabilidade nas organizações consiste em um dos grandes desafios para a diferenciação entre as empresas do setor da construção visando seu desenvolvimento sustentável.

A ampliação da visão puramente econômica com a inclusão das dimensões ambientais e sociais na estratégia empresarial, aliada a ferramentas para a gestão e controle das operações de forma transparente e ética, são, certamente, objetivos a serem alcançados pelas organizações preocupadas com sua atuação no médio e longo prazo. Mas como de forma prática dar os passos rumo à gestão da sustentabilidade nas empresas de incorporação e construção? Inicialmente, conhecendo as principais iniciativas, normas e referências em sustentabilidade do mundo e do Brasil e selecionando as adequadas à realidade do setor da construção, tanto nos aspectos corporativos quanto nos aspectos aplicáveis a empreendimentos, projetos, materiais e obras. Em segundo lugar, definindo o posicionamento atual da empresa em relação às práticas de sustentabilidade reconhecidas internacionalmente, criando um plano de ação visando implantar projetos de responsabilidade social e ambiental, mapeando as partes interessadas no negócio da empresa (stakeholders) e promovendo o diálogo e engajamento da organização com seus diferentes públicos. Este segundo passo deve ser complementado com a criação de um programa de alinhamento, sensibilização e educação dos colaboradores para promover a cultura da sustentabilidade. Definir uma política de sustentabilidade e incorporá-la na missão, visão e valores da empresa, encerra este segundo passo e alinham a estratégia, a gestão e a cultura empresarial. O terceiro passo rumo à gestão da sustentabilidade é o desdobramento dos aspectos socioambientais para os processos de seleção do terreno, concepção do produto, desenvolvimento do projeto e lançamento do empreendimento. Neste momento, além de definir critérios de sustentabilidade para aquisição do terreno, é importante definir de forma clara o que é um empreendimento sustentável e quais diretrizes de sustentabilidade serão adotadas na prática. Tais diretrizes envolvem a dimensão ambiental energia, água, resíduos, materiais reciclados, áreas verdes, áreas contaminadas e a dimensão da responsabilidade social no desenvolvimento do empreendimento. Todas estas diretrizes devem ser desdobradas para os projetos e especificação de materiais e equipamentos, e chegar também à campanha de lançamento e marketing do empreendimento. O quarto passo é o da gestão do processo de suprimentos com foco na sustentabilidade, o que envolve a definição de critérios ambientais e sociais para seleção, contratação e avaliação de fornecedores de projeto, materiais e serviços de execução de obras e outros serviços contratados pela incorporadora e construtora. Trata-se, neste momento, de expandir as práticas de sustentabilidade para a cadeia de fornecedores. O quinto passo é a gestão da sustentabilidade dos canteiros de obras. É fundamental definir o que é uma obra sustentável, definir as diretrizes ambientais para a implantação e operação do canteiro água, energia, resíduos, poluição, recursos naturais, preservação de fauna e flora, solo e subsolo e as diretrizes sociais na gestão e execução da obra relacionamento com a comunidade local, relações de trabalho, direitos humanos, educação e desenvolvimento dos trabalhadores, inclusão social, inclusão digital, ambiente de trabalho, saúde e segurança do trabalho e educação ambiental dos colaboradores de obra.

O sexto passo está focado na gestão da sustentabilidade na entrega do empreendimento e na fase de uso, operação e assistência técnica. Neste momento são definidas as diretrizes sustentáveis para a operação, uso e assistência técnica do empreendimento, assim como um programa de educação ambiental para os usuários e operadores do condomínio. Tais diretrizes são consolidadas no manual de operação, uso e manutenção do edifício, destacando as tecnologias sustentáveis implantadas. O sétimo passo rumo à gestão da sustentabilidade é o monitoramento, controle e comunicação da sustentabilidade. Para tal, é necessária a criação de indicadores para monitoramento e controle do desempenho econômico, ambiental e social da empresa e seus empreendimentos. Este monitoramento do desempenho vai permitir a elaboração de relatórios de sustentabilidade da empresa com base em referências, como os Indicadores do Instituto ETHOS e do GRI - Global Reporting Initiative. Com os relatórios consolidados, é possível definir formas de comunicação da sustentabilidade empresarial tanto para o público interno quanto para as partes interessadas no negócio da incorporadora e construtora, divulgando as vantagens competitivas da empresa no que se refere à sustentabilidade. Como pensar na sustentabilidade de maneira macro considerando também os setores fora da construção? Do ponto de vista macro, a sustentabilidade deve evoluir para a criação de uma economia verde, inclusiva e responsável, onde a consciência dos consumidores deve se ampliar consideravelmente, tornando a sustentabilidade um critério de escolha de produtos e serviços. De outro lado as empresas vão passar a definir suas estratégias e sua gestão a partir de diretrizes e critérios socioambientais, a redesenhar seus processos a partir da ecoeficiência e da responsabilidade social e desenvolver produtos e serviços sustentáveis de forma a atender este novo mercado. Como o CTE tem se posicionado no mercado da construção civil em relação à sustentabilidade? È possível pensar em uma linha do tempo em relação à atuação do CTE na área de construção sustentável? O CTE é uma empresa líder de consultoria no mercado da construção civil e há 22 anos fornece soluções para o setor da construção. Desde 2000, trabalha com gestão ambiental, mas, nos últimos cinco anos, o CTE tem atuado fortemente no desenvolvimento de consultorias técnicas nas fases de projeto e construção de empreendimentos sustentáveis, o que significa haver uma demanda crescente e significativa do mercado por este segmento. Este trabalho consiste basicamente no fornecimento de nosso know-how técnico, por meio de uma equipe multidisciplinar de especialistas em várias áreas, como: eficiência energética, arquitetura bioclimática, uso racional de água, materiais sustentáveis, conforto no ambiente construído, processos e tecnologias construtivas sustentáveis, gestão de resíduos, responsabilidade social, dentre outras. Hoje, no Brasil, a maior demanda pela construção sustentável é de clientes empresariais que procuram edifícios de escritórios sustentáveis. Estas empresas formam um segmento de

corporações que adotam a sustentabilidade como valor estratégico e de gestão e querem ter suas instalações em edifícios certificados ambientalmente. Essa demanda paulatinamente vem se ampliando para clientes de casas, apartamentos, loteamentos, hotéis e resorts. Atualmente o CTE, como empresa de consultoria, está atuando simultaneamente em mais de 180 empreendimentos sustentáveis no País, que apresentam variadas tipologias: prédios comerciais, residenciais e industriais, edificações do varejo, laboratórios de análises, hospitais, estádios, shoppings centers, residências particulares, projetos de interiores de escritórios comerciais e grandes resorts turísticos. Temos atuado também no campo da sustentabilidade de materiais e equipamentos prestando consultoria aos fabricantes para elencar os diferenciais sustentáveis de seus produtos e comunicá-los ao mercado e aos consumidores. No campo da gestão da sustentabilidade em empresas de incorporação e construção, o CTE desenvolveu um programa de consultoria empresarial para as empresas do setor, que insere a sustentabilidade na estratégia e no negócio da empresa, assim como as orienta no redesenho de todos os seus processos gerenciais e operacionais, com foco na sustentabilidade, culminando com a preparação de relatórios de sustentabilidade da empresa. Percebemos nestes anos que, embora os aspectos ambientais na construção estejam sendo discutidos há algum tempo no Brasil, este processo vinha acontecendo de forma mais pontual, envolvendo questões de conforto ambiental, economia de água e gestão de resíduos. Foi a partir do ano de 2006 que realmente esta reflexão assumiu uma natureza sistêmica, gerando o que podemos chamar de movimento da construção sustentável. Este movimento foi alavancado pelo processo de certificação de empreendimentos, com base no modelo americano de Green Building, gerando o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e de uma cultura de sustentabilidade nas empresas da cadeia produtiva da construção.