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Revisão de Literatura Clínica e Cirurgia de Pequenos Animais Revista INVESTIGAÇÃO medicina veterinária DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO CONSERVADOR DA DISPLASIA COXOFEMORAL EM CÃES DIAGNOSIS AND TREATMENT CONSERVATIVE IN THE HIP DYSPLASIA IN DOGS: LITERATURE REVIEW Bruna Bressianini Lima 1, Fernanda Gosuen Gonçalves Dias 2, Lucas de Freitas Pereira 2, Maria Eduarda Bastos Andrade da Conceição 1, Thiago André Salvitti de Sá Rocha 1, Cristiane dos Santos Honsho 2, Luis Gustavo Gosuen Gonçalves Dias 1 1. UESP-Univ Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP, Jaboticabal, São Paulo, Brasil. E-mail: felipefariaspcb@yahoo.com.br 2. Pós-graduação em Ciência Animal, Hospital Veterinário, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, São Paulo, Brasil. RESUMO O presente trabalho tem como objetivo discorrer sobre a displasia coxofemoral em cães, envolvendo principalmente meios diagnósticos e diferentes opções terapêuticas, enfatizando as medidas conservativas. A displasia coxofemoral é uma afecção ortopédica de etiologia multifatorial, que comumente acomete os cães de raças grandes e gigantes e de crescimento rápido. Caracteriza-se pelo desenvolvimento anormal da articulação coxofemoral, causando doença articular degenerativa secundária irreversível. Os sinais clínicos comumente observados nos animais acometidos são claudicação e relutância a exercícios intensos. O diagnóstico deve ser baseado agregando informações como o histórico do paciente, sinais clínicos e exame radiográfico da pelve. O tratamento instituído pode ser conservador ou cirúrgico e a escolha varia de acordo com idade, grau de dor, achados clínicos e radiográficos. O tratamento clínico inclui perda de peso, exercício controlados, medicações anti-inflamatórias e analgésicas, acupuntura, e ainda terapia com ondas de choque e células tronco mesenquimais; contudo, os mesmos agem de forma paliativa para alívio da dor, sendo muitas vezes necessário evolução para tratamento cirúrgico. Palavras-chave: cão; claudicação; pelve; ortopedia veterinária 78 ABSTRACT This paper aims to discuss the hip dysplasia in dogs, mainly involving diagnostic methods and different treatment options, emphasizing conservative measures. Hip dysplasia is an orthopedic disease of multifactorial etiology that commonly affects dogs of large and giant breeds and rapid growth. It is characterized by abnormal development of the hip joint, causing irreversible secondary degenerative joint disease. Clinical signs commonly observed in affected animals are lameness and reluctance to intense exercise. The diagnosis should be based on adding information such as patient history, clinical signs and radiographic examination of the pelvis. The treatment can be conservative or surgical and the choice varies according to age, level of pain and findings clinical and radiographic. Medical treatment includes losing weight, controlled exercise, anti-inflammatory and analgesic medications, acupuncture, and even therapy with shock waves and mesenchymal stem cells, however, they act in the palliative treatment of pain relief, and often is necessary surgical treatment Keywords: dog; lameness; hip; veterinary orthopedic

INTRODUÇÃO A displasia coxofemoral é uma afecção ortopédica comumente observada na espécie canina (ROCHA et al. 2013), principalmente nos animais de porte grande e com crescimento rápido. Cães pequenos apresentam menor risco de desenvolvimento da doença, porém não podem ser excluídos dessa condição (MINTO et al. 2012). Caracteriza-se pelo desenvolvimento anormal uni ou bilateral da articulação coxofemoral (ROCHA et al. 2013), demonstrando diferentes graus de sub-luxação e alteração articular degenerativa (MINTO et al. 2012), o que favorece a frouxidão de tecidos moles e instabilidade local (ROCHA et al. 2013). Os principais fatores associados à etiologia e a gravidade da doença são hereditariedade, nutrição, influência hormonal e meio ambiente (GUO et al. 2011; BARTOLOME et al. 2015; SANCHEZ- MOLANO et al. 2015). Há relatos da ocorrência da doença tanto em machos quanto em fêmeas de qualquer idade (MINTO et al. 2012). Os sinais clínicos dependem do grau de evolução da doença e quando percebidos pelo proprietário já podem estar em estágio avançado. Os mais comumente demonstrados são dor, claudicação unilateral ou bilateral progressiva e crônica, marcha rígida, atrofia muscular e relutância durante a realização de exercícios constantes (ROCHA et al. 2013; SOUZA et al. 2015). O diagnóstico deve ser baseado na resenha, histórico completo, sinais clínicos, exame ortopédico e radiográfico (BETTINI et al. 2007). A escolha de tratamento conservador ou cirúrgico depende da idade do paciente, gravidade da displasia e presença ou não de afecções concomitantes, no entanto, o intuito de ambas é diminuir a dor, melhorar a função do membro afetado e garantir qualidade de vida ao paciente (SANTANA et al. 2010). Investigação, 14(1):78-82, 2015 Diante da ocorrência comum da displasia coxofemoral em cães, o objetivo do presente trabalho foi discorrer sobre esta afecção nesta espécie, enfatizando alguns aspectos envolvidos, principalmente o diagnóstico e protocolos terapêuticos conservadores. DESENVOLVIMENTO A articulação coxofemoral é composta pela cabeça e colo femoral e acetábulo. Tal configuração anatômica confere estabilidade e congruência, concomitantemente permitindo grande amplitude de movimentos como lateralidade e rotação dos membros pélvicos (VEZZONI, 2007). Nesse sentido, a displasia coxofemoral ocorre por falha no desenvolvimento da articulação, caracterizado por vários graus de frouxidão de tecidos moles ao redor, má formação da cabeça femoral e acetábulo, os quais podem contribuir para subluxação em idade precoce (BETTINI et al. 2007), principalmente nos animais de grande porte e com crescimento rápido (MINTO et al. 2012; ROCHA et al. 2013). Esta afecção ortopédica ocorre por problemas entre o desenvolvimento muscular e esquelético, que podem levar a instabilidade e subluxação das mesmas à medida que os filhotes crescem (VEZZONI, 2007; BARROS et al. 2008). Devido à pressão que é submetida, a cartilagem é a que mais sofre modificações, onde, no início da doença se encontra áspera e com presença de fissuras, e no decorrer da afecção seu estado fisiológico transparente esbranquiçado se torna amarelo acinzentado e algumas vezes pode ser vermelho-amarronzado, uma vez que pode ocorrer extensa lesão e consequentemente exposição do osso subcondral. Microfraturas provocadas no 79 osso subcondral, devido à distribuição anormal das forças, se consolidam e alteram a elasticidade óssea. O estresse contínuo sobre a cartilagem intensifica sua degeneração e promove a exposição do osso (SANTANA et al. 2010). O processo seguinte é caracterizado pela formação de osteófitos, espessamento de cápsula articular e hipertrofia das vilosidades da membrana sinovial. Ocorre também morte de condrócitos superficiais, alterações na matriz de proteoglicanos e na cadeia de colágeno (SANTANA et al. 2010). Os fatores intrínsecos e extrínsecos envolvidos incluem estrutura e conformação corpórea, alteração no desenvolvimento ósseomuscular, crescimento rápido, nutrição deficiente ou excessiva (proteínas, cálcio e fósforo), distrofia do músculo pectíneo, atrofia muscular pélvica, excesso de exercícios em cães jovens, distúrbios hormonais e fatores ambientais como tipo de piso, presença de escadas, entre outros (BETTINI et al. 2007). Há descrições na literatura da ocorrência da doença tanto em machos quanto em fêmeas de qualquer idade (MINTO et al. 2012). Diante do caráter genético desta doença, aconselha-se que os animais acometidos sejam selecionados por triagem rigorosa e retirados da reprodução por meio de esterilização, principalmente nos centros criadouros (BETTINI et al. 2007). A displasia coxofemoral é uma síndrome comumente encontrada na espécie canina; por outro lado, Barros et al. (2008) relatou que a importância ainda é questionável em gatos. Raças caninas com alto índice de massa corporal como as de grande porte e gigantes têm alto predomínio para a displasia coxofemoral (SANTANA et al. 2010; MINTO et al. 2012) tais como border collie, sheepdog (BETTINI et al. 2007), pastor alemão, labrador, rottweiler, pointer, fila brasileiro e são bernardo, em geral afetando as duas articulações coxofemorais. Ocorre em

ambos os sexos com a mesma frequência e não há relatos de predisposição em relação à idade (BARROS et al. 2008). Os sinais clínicos demonstrados por animais jovens acometidos são diversos e incluem claudicação unilateral com aparecimento repentino e redução da atividade locomotora associada à dor, dorso arqueado e peso corporal deslocado para os membros torácicos. Nesses animais é observada intolerância ao exercício e musculatura fracamente desenvolvida. Nos mais senis, a claudicação normalmente é bilateral, podendo ser classificada em leve a grave; tais sinais são decorrentes das alterações articulares degenerativas crônicas. Também pode ser observada hipertrofia da musculatura dos membros torácicos em virtude do alívio de peso da região pélvica (HULSEN & JOHNSON, 2002). Para o diagnóstico desta afecção deve-se agregar uma série de dados e informações como o histórico do animal, sinais clínicos observados durante o exame físico e exame radiográfico da pelve obtido na incidência ventrodorsal (TUDURY et al. 2004; BETTINI et al. 2007; SANTANA et al. 2010), porém deve-se considerar que nem sempre os sinais clínicos são compatíveis com os achados radiográficos (BARROS et al. 2008). Na anamnese, o proprietário deve ser questionado sobre o tipo de ambiente que o animal permanece, se apresenta dificuldade ou não de se levantar, intolerância ao exercício, claudicação, crepitação ao movimento, dor, hipertrofia da musculatura torácica e atrofia da musculatura pélvica (OHLERTH et al. 2001). A maioria dos animais é assintomática ou demonstram sinais leves (ANDERSON, 2011). Dentre os achados esperados em animais jovens durante o exame físico ortopédico está a claudicação, dor aguda, intolerância a exercícios e atrofia dos músculos da região pélvica (MANLEY et al. 2007). Grande diversidade de alterações pode ser encontrada nas articulações, desta forma, a doença pode ser ponderada de discreta até severa, havendo diferenças clínicas entre os pacientes dos diversos graus, principalmente relacionadas à marcha, de acordo com o nível de dor (SOUZA et al. 2015). Em casos crônico, devido osteoartrite, encontra-se dor durante a extensão da articulação coxofemoral, alterações na marcha, dificuldade para subir ou descer escadas. Crepitação, sensibilidade e amplitude de movimentação restrita da articulação também podem ser observadas durante o teste ortopédico de Ortolani (GINJA et al. 2009). Para realização deste exame, o paciente sob contenção física ou química, deve ser posicionado em decúbito lateral com o membro a ser avaliado para cima. Devese aplicar uma força no fêmur no sentido ventrodorsal fazendo com que a cabeça do fêmur saia parcialmente ou totalmente do acetábulo. Ato contínuo realiza-se abdução do fêmur voltando à cabeça femoral para a fossa acetabular, que ao sair da borda do acetábulo, produz som de estalo que pode ser ouvido ou sentido pelas mãos do examinador, caracterizando o sinal de Ortolani positivo (TUDURY et al. 2003). Para o diagnóstico definitivo são necessárias radiografias na incidência ventrodorsal obtidas com o paciente bem posicionado, de maneira que possam ser visibilizados cabeça e colo femorais, além do bordo acetabular (BETTINI et al. 2007); para isso, os membros posteriores devem ficar estendidos e os fêmures paralelos entre si e em relação à coluna vertebral. Os membros pélvicos devem ser rotacionados internamente, permitindo que as patelas se centralizem nos côndilos femorais e a pelve fique em simetria. Existem alguns escores de avaliação radiográfica como da Fédération Cynologique Internationale (FCI) usada na Europa e OFA (Orthopedic Foundation for Animals), usada principalmente nos Estados Unidos (FLUCKIGER, 2007). A 80 primeira avalia nove parâmetros e cria escore entre zero a 106, onde zero é uma articulação normal e 106, displasia coxofemoral severa. Os parâmetros avaliados são ângulo de Norberg, subluxação, borda acetabular cranial, borda acetabular caudal, borda acetabular dorsal, rima acetabular cranial, fossa acetabular (arrasamento) e conformação da cabeça e colo femoral (LEWIS et al. 2010; SANCHEZ-MOLANO et al. 2015). O ângulo de Norberg, o mais utilizado em cães, é avaliado a partir da linha traçada entre o centro das duas cabeças femorais e outra linha entre esse ponto e a borda acetabular, devendo ser 105º, quando menor confirma subluxação. Entretanto há conformação pélvica distinta para cada raça, logo, os valores do ângulo de Norberg que distinguiria animais normais de displásicos deveriam ser específicos para cada raça. A variação do ângulo de Norberg é classificada em distintos graus, de acordo com os achados radiográficos; neste contexto, grau A (articulações coxofemorais normais: congruência entre cabeça femoral e acetábulo), grau B (articulações próximas da normalidade: incongruência leve entre cabeça femoral e acetábulo, com ângulo de aproximadamente 105 ), grau C (presença de displasia coxofemoral leve: a cabeça femoral e o acetábulo são incongruentes; o ângulo acetabular é de aproximadamente 100 ), grau D (displasia coxofemoral moderada: incongruência entre a cabeça femoral e o acetábulo evidente, podendo observar subluxação) e grau E (displasia coxofemoral grave: alterações articulares evidentes de displasia, com sinais de luxação ou subluxação) (BETTINI et al. 2007). Segunda a OFA, outra forma de diagnosticar subluxação é por meio da cobertura acetabular, ou seja, percentual da cabeça do fêmur coberto pelo acetábulo. Assim, quanto maior a porcentagem, melhor a congruência da articulação, desta forma, se a cobertura for menor que 50%, caracteriza-se subluxação (MCLAUGHLIN & TOMLINSON, 1996).

Outras formas de avaliação da articulação incluem ultrassonografia, principalmente para detecção de produção exacerbada de fluido sinovial (GINJA et al. 2009). Ressonância magnética apesar de usada com menor frequência, revela detalhes não visibilizados na radiografia comum (ROCHA et al. 2008). Contudo sabe-se que as características fenotípicas muitas vezes não estão evidentes, principalmente em animais jovens, desta forma o controle da displasia coxofemoral em cães não tem sido tão efetivo nas últimas décadas, havendo pequena evolução com esses métodos diagnósticos (JANUTTA et al. 2008; HOU et al. 2010), de tal forma que tem sido determinado genoma de cães que apresentem a doença em diversos graus, afetando diferentes genes (BARTOLOMÉ et al. 2015; SANCHEZ-MOLANO et al. 2015). Inúmeros problemas ortopédicos e neurológicos em cães provocam sinais clínicos parecidos, portanto a claudicação deve ser diferenciada de panosteíte, osteocondrite, osteocondrose, separação fiseal, osteodistrofia hipertrófica, fraturas, neoplasias ósseas, doença do disco intervertebral, mielopatia degenerativa, síndrome da cauda equina, poliartrite e lesão completa do ligamento cruzado cranial (KIRKBY & LEWIS, 2012). A escolha do tratamento correto para um cão com displasia coxofemoral depende de inúmeros fatores como idade, tamanho e atividade do paciente, ambiente doméstico, grau de displasia e de osteoartrite, qualidade e profundidade do acetábulo, formato da cabeça femoral, presença ou não de afecções concomitantes, além dos custos do tratamento médico e cirúrgico e preferências do Médico Veterinário (HULSE & JOHNSON, 2002). Quando a doença já se encontra em estágio avançado, os benefícios do tratamento clínico são temporários, evoluindo na maioria das vezes, para a terapia cirúrgica (FERRIGNO et al. 2007). No entanto, o tratamento conservador é indicado principalmente para os casos de displasia coxofemoral leves, mostrando-se menos eficaz no retardo a evolução da doença articular degenerativa em animais jovens quando comparado às técnicas cirúrgicas (ANDERSON, 2011; KIRKBY & LEWIS, 2012). Controle de peso é um dos fatores mais importantes para impedir a evolução de osteoartrite (KIRKBY & LEWIS, 2012). O paciente deve ser acompanhado semanalmente, determinando-se ingestão calórica diária necessária (HULSE & JOHNSON, 2002). Outras técnicas podem ser incluídas ao plano de exercícios em pacientes com grave perda muscular e fraqueza, como por exemplo, a eletroestimulação neuromuscular na recuperação da força. A utilização de exercícios ativos e passivos visa à recuperação da amplitude de movimentos, metabolismo e difusão de nutrientes na cartilagem. A melhora na amplitude de movimentos em cães portadores de displasia coxofemoral ainda pode ocorrer apenas com o alongamento passivo (KIRKBY & LEWIS, 2012). Acupuntura também é indicada nos pacientes acometidos, é considerada eficaz no alívio da dor, melhorando a mobilidade da articulação e marcha do paciente e fortalecendo os músculos que envolvem a articulação afetada (JAEGER et al. 2007). O uso de anti-inflamatórios não esteroidais e analgésicos são importante no alívio da dor, contudo não podem ser utilizados prolongadamente, de forma que podem promover úlceras gástricas, sendo necessário o uso de protetores gástricos concomitantes ao anti-inflamatório (BARROS et al. 2008). Diacereina é inibidor de citocina pró-inflamatórias, além de estimular componentes cartilaginosos, havendo ação antiosteoartrósica, analgésica e anti-inflamatória (FIGER & RICCI JUNIOR, 2012). 81 Além da dieta convencional, o uso de nutraceuticos tem sido amplamente difundido na medicina veterinária com função imunomoduladora para prevenção de diversas doenças, incluindo osteoartose, aumentando a qualidade de vida e longevidade do animal (BORGES, 2013). Dentre os nutraceuticos, condroitina e glucosamina possuem efeito anti-inflamatório benéfico e condroprotetor, por ser importante constituinte da cartilagem hialina (SANTANA et al. 2010). O primeiro inibe ação de enzimas que degradam cartilagem, já a glucosamina estimula produção de colágeno e proteoglicanos pelos condrócitos, havendo efeito codroprotetor sinérgico pelas duas moléculas (BEYNEN, 2003). Contudo o efeito desses compostos é tardio, sendo necessário 6 a 8 semanas para observar melhora no quadro clínico do animal (Henrotin et al., 2005). Terapia com onda de choque utiliza ondas sonoras de alta energia através da pele para aumentar as citocinas e fatores de crescimento no organismo, demonstrando boa resposta no tratamento clínico de osteoartrite (MUELLER et al. 2007). Outro tratamento menos utilizado clinicamente, mas que tem mostrado bons resultados em estudos experimentais inclui a utilização de células tronco mesenquimal autógena, por meio da retirada e cultivo de células adiposas (BLACK et al. 2007). Em contrapartida, o tratamento cirúrgico deve ser instituído quando a terapia conservativa não estiver mais surtindo efeito ou o paciente se encontrar incapacitado por período extenso (MUELLER et al. 2007). Devido à alta incidência da displasia coxofemoral e sua consequente influência no desempenho locomotor dos cães acometidos, o interesse pela busca de novas alternativas terapêuticas é incessante, visto proporcionar minimização da

82 Investigação, 14(1):78-82, 2015 sintomatologia, com consequente melhora na qualidade de vida do paciente. Além disso, é de suma importância que o médico veterinário avalie cada paciente para estabelecer o melhor protocolo terapêutico individual diante de cada condição, sendo a terapêutica clínica paliativa e, em muitos casos, é necessário evolução para cirurgia. REFERÊNCIAS Anderson A. 2011. Treatment of hip dysplasia. Journal of Small Animal Practice. 52(1):182-189. Barros G.S. et al. 2008. Frequência da displasia coxofemoral em cães da raça Pastor Alemão. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia. 60(6): 1557-1559. Bartolome N. et al. 2015. A Genetic Predictive Model for Canine Hip Dysplasia: Integration of Genome Wide Association Study (GWAS) and Candidate Gene Approaches. 10(4): 1-13. Bettini C.M. et al. 2007. Incidência de displasia coxofemoral em cães da raça Border Collie. Arquivo de Ciências Veterinárias e Zoológicas Unipar. 10(1): 21-25. Beynen AC. 2003. 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