Costallat, D. R. et al., 2002 33 ESTUDO DE UM MÉTODO NÃO CONVENCIONAL DE EXTRAÇÃO DE ÓLEO DE SOJA E AVALIAÇÃO DA SUA QUALIDADE DANIELLE RIBEIRO COSTALLAT 1 VANESSA DIAS DO NASCIMENTO 2 WILSON PEREIRA DE ANDRADE 3 ANA LÚCIA DA ROCHA NOBRE 4 LEILA MARTINS DA COSTA QUINTEIRO 5 ABSTRACT: COSTALLAT, D. R.; NASCIMENTO, V. D. do; ANDRADE, W. P. de; NOBRE, A. L. da R.; QUINTEIRO, L. M. da C. Study of a non convetional method of the soybean oil extraction and its quality evaluation. Revista Universidade Rural, Série Ciência Exatas e da Terra, v. 21, n. 2, 2002, p. 33-37. The soybean oil quality conservation is mainly very dammaged, to its linolenic acid concentration a relatively high polyunsaturated fatty acid. Those acids easily react with the oxygen, forming hydroperoxides and others compounds producing rancid product smell. For obtaining, on laboratorial schedule, soybean oils with high quality, a nonconventional extraction method was studied. The results indicated that it is a fast, practical method and low cost alternative for obtaining oils and/or fats from foods. KEY WORDS: Soybean oil ; Lipid extraction; Fatty; Oil and waxes analysis, Peroxides. 1 INTRODUÇÃO Óleos e gorduras, constituem os principais componentes insolúveis em água, destacando-se por suas propriedades de serem fontes de energia e de proporcionarem sabor e textura agradáveis aos alimentos (NAWAR, 1986). Seja como um grupo de alimentos ou como parte integrante dos mesmos, a matéria graxa, de um modo geral, está sujeita à reações degradativas. Mas, em contraste com as proteínas e os carboidratos, óleos e gorduras possuem poucos sítios reativos na molécula. Isto faz com que a ocorrência de reações, a que estão sujeitos, seja menos variada que a de componentes solúveis em água, podendo, entretanto, tornar-se de grande extensão provocando Bolsista, em 2001,de Iniciação Científica/PIBIC/CNPq/ UFRuralRJ, Discente do Curso de Eng. de Alimentos; 2 Bolsista de Iniciação Científica/PIBIC/CNPq/UFRuralRJ, Discente do Curso de Química; 3 Técnico do Instituto de Tecnologia da UFRuralRJ; 4 Professora do Instituto de Ciências Exatas da UFRuralRJ; 5 Professora do Instituto de Ciências Exatas da UFRuralRJ. alterações de suas diversas propriedades como qualidade sensorial (sabor, aroma, textura e cor), valor nutricional e funcionalidade,podendo apresentar até mesmo toxidez (ARAÚJO, 1995). Tais alterações podem ter sua origem durante a produção, o processamento, a preservação, o armazenamento e o preparo do alimento e apesar de geralmente ter seu início na fração lipídica do alimento, eventualmente outros componentes são afetados, como proteínas, vitaminas e pigmentos. São vários os fatores que podem ocasionar a degradação: oxidação, hidrólise, polimerização, pirólise e absorção de sabores e odores estranhos. Dentre estes fatores, a oxidação é a principal causa de deterioração de vários alimentos e componentes lipídicos biologicamente importantes. Em tais alterações, têm-se um aumento da concentração de peróxidos (ranço oxidativo) e/ou ácidos graxos livres (ranço oxidativo), os quais vêm freqüentemente acompanhadas por uma mudança indesejável do flavor (NAWAR, 1986). A velocidade de reação de oxidação depende do grau de insaturação na
34 Estudo de um método não convencional de extração... molécula do ácido graxo. Assim, quanto maior o grau de insaturação do óleo e, ou, da gordura, maior será a suscetibilidade à oxidação (ARAÚJO, 1995). De acordo com este mesmo autor, a maior ou menor capacidade que a matéria graxa possui de resistir ao ranço, é denominada de estabilidade. O óleo de soja, por exemplo, apesar ser um dos óleos vegetais comestíveis mais importantes, em termos de nutrição, produção e consumo, é também um dos mais instáveis. Sua baixa estabilidade se deve a maiores quantidades de ácido linolênico em sua composição, podendo ser aumentada através do uso de sementes de boa qualidade e de boas práticas de extração, refino, estocagem, transporte e consumo. A estabilidade de um alimento geralmente é determinada acompanhando-se o surgimento da rancidez e esta pode ser monitorada por várias medidas, sendo a da quantidade de peróxidos, de ácidos graxos livres e de dienos conjugados as principais (ARAÚJO, 1995 e NAWAR, 1986). Tais medidas, que ajudam a avaliar o estado de conservação do alimento e também sua estabilidade quanto à degradação, são feitas na matéria graxa extraída de sua matriz. Para a extração dos lipídeos dos alimentos em geral, o método mais comum é o que utiliza um sistema de Soxhlet, dentre outros (JAMES, 1996). QUINTEIRO (1991) verificou que a maioria dos métodos existentes, entretanto, são trabalhosos e demorados e o mais grave: devido ao uso de calor, o material extraído, freqüentemente, já se apresenta com os artefatos primários da oxidação os hidroperóxidos. Este mesmo autor desenvolveu um método de extração de óleo de soja em escala laboratorial, o qual consiste da percolação de solvente através de uma coluna cromatográfica de vidro preenchida com soja moída. Ao produzir facilmente um óleo bruto com baixos teores de peróxidos e pouca acidez, o autor recomendou que a técnica fosse estudada mais exaustivamente em relação à influência da polaridade do solvente extrator sobre a composição química do material extraído e algumas de suas principais e também determinar os diversos tempos e velocidades de percolação do solvente, o que compreende o objetivo deste trabalho. Para melhor avaliação e comparação, esse estudo foi conduzido paralelamente ao uso oficial do extrator de Soxhlet. MATERIAL E MÉTODOS 1. Obtenção da amostra A soja em grão foi adquirida de um supermercado do comércio da cidade de Seropédica RJ devidamente embaladas em sacos plásticos em quantidade de 500g, sempre pertencendo ao mesmo lote. 2. Preparo da amostra o conteúdo dos vários pacotes foram misturados, homogeneizados e, em seguida, foram secos em estufa por duas horas a 60 C e após, moídos e peneirados. 3. Extração do óleo de soja na coluna 3.1. Montagem do sistema extrator: as vidrarias (coluna e kitazato) que compreendem o extrator foram montadas e acopladas a uma trompa de vácuo de acordo com o esquema proposto por QUINTEIRO (1991). 3.2. Otimização da vazão do solvente extrator: após coluna preenchida com 50g de soja previamente moída e peneirada, percolou-se uma mistura 1:1 de éter de petróleo e éter etílico, a uma determinada vazão. Três vazões foram estudadas: 10, 20 e 30 gotas/15 segundos. As extrações foram feitas em triplicata. Do material obtido eliminou-se o solvente através de um rotavapor a 60 C e pressão reduzida. 3.3. Estudo da influência dos diferentes tipos de solventes na extração: com uma vazão constante de 30 gotas/15 segundos, determinada no item anterior, a percolação foi realizada com três diferentes solventes e em triplicata: Hexano (I); Éter etílico + éter de petróleo 1:1 (II); Éter etílico + éter de petróleo 1:3 (III). 4. Extração do óleo de soja no extrator Univ. Fed. Rural do Rio de Janeiro Revista Universidade Rural, Série Ciências Exatas e da Terra Vol. 21, n.2, p. 33-37, 2002
Costallat, D. R. et al., 2002 35 de Sohxlet: estudou-se da influência dos diferentes tipos de solventes na extração em Sohxlet com os mesmos solventes usados no experimento anterior (item 3.3), de acordo com o método oficial (IAL, 1985), também em triplicata. 5. Determinações analíticas (IAL, 1985) 5.1. Acidez Titulável: por ser o principal produto da hidrólise dos triglicerídeos, o teor de ácido graxo livre é um parâmetro muito usado para determinar o estado do óleo ou gordura quanto a rancidez hidrolítica. 5.2. Índice de Peróxidos: é o mais usado para monitorar a rancidez autoxidativa. Baseia-se na determinação da quantidade de peróxidos, os produtos primários da autoxidação, expressa em miliequivalentes de O 2 kg -1 de amostra. 5.3. Composição em Ácidos Graxos por Cromatografia Gasosa: um dos parâmetros de identidade de óleos e gorduras. RESULTADOS E DISCUSSÃO 1. Rendimento da extração em coluna de acordo com a vazão: as extrações, nas diferentes vazões, apresentaram rendimentos médios que variaram de 16,70 a 17,45 % (m/m) sem diferença significativa entre si. Estes valores foram considerados bons, pois a soja possui 20% (m/m) de óleo, em média (QUINTEIRO, 1991), de modo que optou-se por uma maior velocidade de extração (30 gotas/15 segundos), o que tornou o método mais rápido. 2. Rendimento da extração em coluna de acordo com o tipo de solvente: Na extração com a coluna, verificou-se que as médias dos rendimentos obtidos para os diferentes solventes variaram de 17,02 a 17, 84% (m/m) sem diferença significativa entre si. Esse resultado já era esperado, uma vez que a diferença de polaridade dos solventes não era grande o suficiente para o arraste de quantidades, significativamente diferentes, de lipídeos polares, como lecitinas, além dos neutros. Na extração com o Soxhlet, verificou-se que o uso do calor fez aumentar o rendimento de um modo geral: de 19 a 20 % (m/m). Esse aumento pode ser devido também à falta de circulação de água no aparelho extrator, pela interrupção de água no laboratório, propiciando um maior contato entre a amostra e o solvente. 3. Composição em ácidos graxos (% relativa): A composição em ácidos graxos de cada óleo obtido se apresentou de acordo com a característica para óleos de soja (QUINTEIRO, 1991). Uma excelente correlação entre as composições dos óleos obtidos com o método otimizado de coluna à frio e o convencional, com extrator de Soxhlet, foi encontrada podendo ser observada no gráfico representado na Figura 1. 4. Qualidade dos óleos obtidos por ambos os métodos: Os parâmetros que caracterizam a qualidade dos óleos foram estabelecidos pela ANVISA (1999). Na Tabela 1 pode-se observar os valores obtidos. Tais valores indicam que todos os óleos de soja obtidos, com exceção do óleo SI (extraído em Soxhlet/Hexano), se apresentaram com os valores dentro dos parâmetros legais considerados normais para óleos brutos (não refinados) que são: Índice de Peróxido (I.P.) de no máximo 20 meq de O 2 /kg e Acidez Titulável (A.T.) no máximo 2,0 % (m/m), expresso em ácido oléico. O alto valor obtido no I.P. para o óleo SI foi provavelmente devido ao uso de calor excessivo, pois o ponto de ebulição do hexano é igual a 60 C. Isto fez com que tanto no momento da extração quanto na hora da eliminação do solvente o produto ficasse exposto ao calor por mais tempo do que o devido. Este fato não se repetiu nas outras extrações, pois em SII e SIII as misturas de solventes tinham pontos de ebulição mais baixos e no caso de CI, CII e CIII os óleos foram obtidos a temperatura ambiente, de modo que a presença de peróxidos não foi detectada pelo método ou realmente tais produtos não foram desenvolvidos. Estes resultados paralelos à tendência observada de os óleos obtidos
36 Estudo de um método não convencional de extração... apresentarem baixa acidez revelam que as sementes usadas para a extração eram de boa qualidade e que os métodos de extração não ofereceram meios propícios para a hidrólise ocorrer efetivamente. COLUNA (% ácidos graxos) 60 50 40 30 20 10 0 Y = 0,1066 + 0,9923 X R = 0,99977 0 10 20 30 40 50 60 SOXHLET (% ácidos graxos) Figura 1. Correlação entre as composições em ácidos graxos dos óleos obtidos pelos dois métodos. Tabela 1. Índices de peróxidos e Acidez dos óleos de soja obtidos por Soxhlet (S) e por Coluna (C). SI SII SIII CI CII CIII A.T. 0,67 0,49 0,48 0,74 0,64 0,63 oficial, tornando-se uma opção para extração de matérias graxas de alimentos, para fins de estudo de sua composição e qualidade de conservação, lembrando que é um método que extrai com um mínimo de oxidação e hidrólise. 3. Solventes mais difíceis de evaporar são os menos indicados devido ao calor excessivo necessário para sua eliminação. 4. O monitoramento da qualidade de um alimento gorduroso é feito pela determinação do estado de conservação de sua matéria graxa. Tal constituinte deve ser extraído de sua matriz sem sofrer oxidação e hidrólise. Métodos convencionais, como o de Soxhlet, não oferecem essa opção, pois ou geram, no momento da extração, amostras oxidadas, ou são muito trabalhosos. O método pela coluna aqui estudado, não é trabalhoso, é rápido, de baixo custo e, o mais importante, produz amostras com níveis de oxidação não detectáveis pelas técnicas analíticas usadas. AGRADECIMENTOS E AUXÍLIO FINANCEIRO PIBIC/CNPq/UFRRJ. I. P. 68,7 <l.d. <l.d. <l.d. <l.d. <l.d. l.d.= limite de detecção; I - Hexano; II - Éter etílico:éter de petróleo (1:1); III = Éter etílico: Éter de petróleo (1:3). CONCLUSÕES 1. O método não convencional, em coluna, resultou em um bom rendimento, independente do solvente usado, devendose levar em consideração, na hora da escolha do solvente, o seu menor custo e a sua disponibilidade. 2. Com o método não convencional, independente do solvente, obteve-se óleos com composições, em ácidos graxos, semelhantes aos obtidos pelo método LITERATURA CITADA ARAÚJO, J.M.A., Química de Alimentos- Teoria e Prática, Imprensa da UFV, 1995, 335p. ANVISA Órgão Nacional da Vigilância Sanitária - www.anvisa.gov.br., resolução n 482 de 23/08/1999. IAL, INSTITUTO ADOLFO LUTZ, Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz, São Paulo, secretaria de Saúde Pública, 1985, 371p. JAMES, C.S., Analytical Chemistry of Foods, Chapman & Hall, London, UK, 1996, 178p. Univ. Fed. Rural do Rio de Janeiro Revista Universidade Rural, Série Ciências Exatas e da Terra Vol. 21, n.2, p. 33-37, 2002
Costallat, D. R. et al., 2002 37 NAWAR, W. N., Lipidos, In Fennema, O. R. Pquímica de los alimentos, Editorial Acribia S.A., Cap. 4, p:157-274, 1986. QUINTEIRO, L.M.da C., Estudo da estabilidade oxidativa de óleos de soja. Seropédica, RJ, 1991. 110p. Dissertação (Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos) Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2. ARAÚJO, J.M.A., Química de Alimentos-Teoria e Prática, Imprensa da UFV, 1995, 335p.