Responsabilidade Social das Empresas Turístico-Recreativas



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Transcrição:

Responsabilidade Social das Empresas Turístico-Recreativas Área: 1.5 Gestão Social Sub-área: 1.5.1 Cidadania Corporativa / Responsabilidade Social Rinaldo Zaina Junior Faculdade SENAC de Turismo e Hotelaria de Campos do Jordão jrzaina@uol.com.br Fabiana Supino Faculdade SENAC de Turismo e Hotelaria de Campos do Jordão supino@directnet.com.br ABSTRACT The social responsibility concepts are relatively recent in our society and have been in constant debate. The present research indicates how this subject matter has been understood and under which aspects it has been articulated within the tourist-recreation sector. The main goal is to detect as the entrepreneurs and managers realize the social responsibility of tourism, which are their motivation and which dynamic they excite in their attitudes on the market. It is a first attempt to study the universe of social performance of these companies in the metropolitan region of São Paulo, Campinas and Vale do Paraíba. Questions related to know where and whom their social actions benefit, which are the activities they develop, which are the resources applied, if really employees involvement exists and if they make use of tax incentive. The result discloses philanthropic and attendance profile with no planning aiming continuity or commitment with social inclusion in the present tourism management. It underestimates the inherent transforming power of the tourist space in the local community quality of life through the leisure sold to the tourists, neglecting this natural vocation in its main ability for the social investment. Key-words: management; social responsibility,, tourist-recreation

RESUMO Os conceitos que envolvem a responsabilidade social são relativamente recentes em nossa sociedade e têm estado em constante debate, o presente artigo desenvolvido serve para indicar como essa temática vem sendo compreendida e sob quais aspectos vem sendo pautada no setor turístico-recreativo. A meta principal é detectar como os empresários e gerentes percebem a responsabilidade social do turismo, quais são suas motivações e que dinâmicas suscitam em suas atitudes no mercado. É uma primeira tentativa de estudar o universo de atuação social dessas empresas na região metropolitana de São Paulo, de Campinas e Vale do Paraíba. Procurou-se responder a diversas questões como, por exemplo, saber onde e quem as ações sociais dessas empresas beneficiam, quais são as atividades que desenvolvem, que recursos utilizam, se existe o envolvimento dos próprios funcionários e se fazem uso de incentivos fiscais para realiza-las. O resultado revela um perfil filantrópico e assistencialista, sem qualquer planejamento visando a continuidade ou compromisso com a inclusão social no modelo de gestão vigente no turismo, subestimando o poder transformador inerente do espaço turístico na qualidade de vida da comunidade receptora pelo lazer que vende ao turista, negligenciando sua natural vocação na sua principal competência para o investimento social. Palavras-chave: gestão; responsabilidade social ; turismo recreativo 1. INTRODUÇÃO Mais de metade das empresas do Brasil realizam algum trabalho social, em um investimento que chegou a R$ 4,7 bilhões em 2000. As informações são da pesquisa Ação Social das Empresas, do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Os números finais mostram que cerca de 465 mil empresas brasileiras ou seja, 59% do total desenvolvem iniciativas de caráter social. A pesquisa do IPEA, não discriminou as empresas de turismo, lazer e recreação. Lacuna esta que não pretendemos preencher, mas apenas apontar as tendências e comportamentos deste segmento. A pesquisa lança um primeiro olhar à lacuna, antes inexplorada, às ações sociais do setor turístico-recreativo privado. Seus resultados conferem visibilidade ao papel social exercido pelo setor, que poderá rever instrumentos e mecanismos que estimulem e fortaleçam a gestão dessas ações sociais, além de obter o reconhecimento público pelo seu esforço no combate à exclusão social, bem como, dispor de informações para melhorar o resultado e a eficiência de suas ações. Ao identificar o que os empreendimentos de turismo e recreação fazem no atendimento de seus empregados e de comunidades carentes, a pesquisa procurou traçar um perfil da ação social do setor turístico-recreativo. A diferenciação qualitativa das ações sociais focou as doações, atividades ou projetos de caráter filantrópico ou de investimento social, executadas pelas empresas na área do lazer, educação e assistência social. Apontar localmente essa realidade é o que se espera desse trabalho. Definir as motivações e o tipo de gestão das ações de responsabilidade social realizadas pelo setor turístico-recreativo, disponibiliza informações que ilustram o comportamento do empresariado na área social. O

estudo realizado é pontual, não permitindo comparações ou generalizações. Especificamente, refere-se a empresas paulistas de apelo turístico-recreativo. 2. GESTÃO SOCIAL, UMA DEMANDA PREMENTE O estudo utilizou o método de pesquisa exploratória, qualitativo, com instrumentos de coleta de dados estruturados, disfarçados e não-disfarçados, com perguntas fechadas, abertas e semi-abertas e de múltipla escolha. A pesquisa foi feita por entrevistas pessoais ao quadro gerencial das empresas, direcionada preferencialmente aos gerentes de marketing. O período de realização da pesquisa foi de janeiro a abril de 2002. A técnica de amostragem não-probabilística por julgamento do universo de parques de entretenimento, na região metropolitana de São Paulo, de Campinas e Vale do Paraíba, selecionou seis empresas, sendo cinco de médio porte, considerando-se unidades de administração autônomas e independentes de rede ou grupo, e uma de pequeno porte. A subdivisão se deu por número de funcionários: pequenas (menos de 50), médias (de 51 a 499), grandes (mais de 500). Na delimitação do universo amostral utilizou-se o Estudo Econômico-Financeiro dos Meios de Hospedagem e Parques Temáticos no Brasil realizado pela EMBRATUR, em 1998. No item 2 da Parte II, o texto Características dos Parques Temáticos no Brasil (EMBRATUR, 1996, p.160) diz: Os parques temáticos ou de diversão fixos se utilizam de temas diferenciados na ambientação física de suas atrações e têm como um de seus objetivos mercadológicos o estímulo da atividade turística. Esta definição se aplica aos parques de entretenimento com temas específicos, tais como o Beto Carrero World e a Turma da Mônica (sic), os aquáticos, como o Beach Park e o Wet n Wild, e os parques de diversão, dos quais o maior é o Playcenter. Considerou-se atividades realizadas para atender os empregados das empresas ou comunidades em geral, de caráter não obrigatório, em áreas como lazer, educação e assistência social. As atividades executadas por obrigação legal, como o cumprimento de normas ambientais, contribuições compulsórias a entidades de classe e sindicatos foram excluídos, a exceção das mencionadas pelo empresariado, caso ele as considerasse como ações de responsabilidade social. Embora apenas a metade (50%) saiba efetivamente do que se trata responsabilidade social, tende a defini-la como filantropia: oferecer lazer a comunidades carentes, sinal de que, intuitivamente o empresariado percebe uma das funções básicas da responsabilidade social: o desenvolvimento social da comunidade. O conceito de sustentabilidade apresentado pelas empresas não faz referência a comunidade, apesar de 50% relacionar preservação ambiental com turismo sustentável e apresentar programas específicos de Educação Ambiental direcionados e vendidos ao turista, apenas 16% os inclui nas ações sociais. Os conceitos sociais definidos pelos entrevistados têm como referência o papel do Estado regulador e fiscalizador, relegando a contribuição privada ao pagamento de impostos e cumprimento da legislação. 100% não faz associação entre turismo social e responsabilidade social. A grande maioria (83%) define o turismo social como gratuidade.

A mesma percentagem não sabe como o turismo pode contribuir no investimento social, porque, segundo eles, não têm conhecimento exato dos instrumentos necessários a sua implantação, tão pouco realizam as ações de filantropia por responsabilidade social. A geração de empregos (100%) e a oferta de recreação (50%) são considerados como itens da responsabilidade social da empresa junto a comunidade e por estes motivos 28% considera-se parceiro da comunidade. Quando a origem da iniciativa social parte da empresa, em 50% dos casos avaliados, as ações têm patrocínio de fornecedores e 100% contam com o auxílio das prefeituras no transporte do público beneficiado, por solicitação deste. 100% das ações sociais são direcionadas ao público externo e 67% não seleciona o perfil da demanda beneficiada. Estes mesmos profissionais abordados percebem valores de cidadania em âmbito pessoal, mas só 16% amplia este conceito para a cidadania corporativa. 100% desconhece se há prática do voluntariado entre os funcionários. Vale notar que 83% considera os resultados de uma única ação social anual como contribuição suficiente, e não tem projetos sociais específicos, apenas atende às solicitações de entidades de assistência social, sem, no entanto, estabelecer relações de parceria. Na amostra selecionada, apenas 33% das empresas conta com um profissional de turismo no seu quadro gerencial. 100% crê que as exigências para as ações sociais trazem custos adicionais que são fatores limitantes para uma realização mais freqüente. A maioria (83%) dos pesquisados não percebe que uma mudança no paradigma sócio-econômico, na direção da responsabilidade social, pode trazer inclusive oportunidades econômicas. Existe uma marcada predisposição das empresas pesquisadas (67%) em não divulgar suas ações sociais. O motivo é evitar maior demanda de entidades e pessoas nas ações sociais. As ações de doação filantrópica que não envolvem o uso do equipamento da empresa ganham tratamento de marketing institucional e vinculam a marca às entidades de assistência reconhecidas em datas comemorativas na mídia. Das empresas pesquisadas, 83% não conhece a opinião da comunidade sobre a atitude social da empresa, mas 50% observa que as campanhas filantrópicas veiculadas na mídia têm forte apelo junto ao turista-consumidor, apesar de não detectar nenhum incremento no fluxo turístico decorrente da ação social. As empresas concebem que a responsabilidade social é de ordem pública. Por isso, são muito críticas quanto à ineficiência do Estado em certas áreas. Com relação ao seu próprio trabalho, a maioria acredita que tem realmente um papel a cumprir na sociedade, mas sempre atuando em caráter complementar ao Estado. A análise, apenas qualitativa, identificou que o tipo de atividade social realizada pelo setor concentra-se no lazer. As atividades de educação, eminentemente ambiental, são comercializadas como produtos e as ações de assistência social restringem-se a contribuições financeiras. Endossando a pesquisa do IPEA, as crianças são o público-alvo prioritário das empresas, que desconhecem e/ou não utilizam as deduções fiscais permitidas por lei, apesar de todas participarem de algum tipo de ação social de forma habitual.

A participação das empresas privadas na solução de assuntos de caráter público é um dos aspectos mais discutidos do marketing na atualidade, tanto por sua dimensão quanto pelas demandas sociais que afetam suas atividades. Embora exista uma corrente de pensamento que defina a responsabilidade das empresas privadas na área pública como delimitada pelo livre mercado e ao sistema legal - as empresas e os gerentes não são responsáveis por julgamentos morais; podem fazer conscientemente tudo que o sistema permitir - há outra linha crescente cujos argumentos ampliam seu papel para uma consciência social além da esfera permitida pelo sistema, através de uma perspectiva ética e moral de sustentabilidade dos próprios empreendimentos, ou seja, preocupar-se com a formação de uma potencial demanda num futuro onde o Estado provavelmente exigirá posturas social e ambientalmente engajadas do setor privado. Adotar posturas éticas e compromissos sociais com a comunidade pode ser um diferencial competitivo e um indicador de rentabilidade e sustentabilidade a longo prazo, contudo este fato parece estar distante do pensamento estratégico da indústria turístico-recreativa. A idéia de que os turistas e visitantes possam valorizar atitudes empresariais nesse sentido e a optar por empreendimentos identificados como éticos, "cidadãos" ou "solidários" ainda é rudimentar para o quadro gerencial do setor. Entretanto o assunto marca uma presença pontual, ainda que discreta, no planejamento da indústria do turismo e recreação, já que há tempos empresários e empresas praticam ações na área social, doando recursos a entidades filantrópicas ou disponibilizando o ingresso em seus espaços, equipamentos e instalações beneficentemente a grupos carentes. O inédito para este setor é a transformação de uma concepção fundamentada na caridade e no altruísmo para um esforço de planejamento integrado entre filantropia e estratégia como já ocorre em outros setores da economia. Porém, tal integração ainda é subestimada ou mesmo desconsiderada nos planejamentos dos empreendimentos entrevistados. No Brasil, o movimento de valorização da responsabilidade social empresarial ganhou forte impulso na década de 1990, através da ação de entidades não governamentais, institutos de pesquisa e empresas sensibilizadas para a questão, como o trabalho realizado pelo IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas - na promoção do Balanço Social das empresas socialmente responsáveis. A maioria das empresas entrevistadas surgiu neste mesmo período. A obtenção de certificados de padrão de qualidade e de adequação ambiental, como as normas ISO, por centenas de empresas brasileiras, o prêmio ECO - de Empresa e Comunidade - criado pela Câmara Americana de Comércio de São Paulo, com os objetivos de reconhecer, divulgar e ecoar as iniciativas de responsabilidade social no setor privado e mais recentemente as normas SA 8000 e AA1000, no entanto tais certificações não foram sequer mencionadas por nenhuma das empresas entrevistadas, exceto uma filiada à Fundação ABRINQ como Empresa Amiga da Criança. A relação da ação social das empresas pesquisadas com o marketing estratégico ainda é alvo de preconceitos e equívocos. Os empreendimentos que praticam ações voltadas para a comunidade evitam relacioná-las com a comunicação da empresa, pois temem que as ações de

caridade empresarial possam soar incompatíveis com uma perspectiva estratégica na sociedade. O desgaste do termo filantropia, associado a empresas que obtém vantagens comerciais e/ou fiscais em nome de uma causa pública, agrega um valor depreciativo a ação social, transmutando o benefício efetivo para o público alvo em exploração da condição humana desprivilegiada. A ação social nas empresas turístico-recreativas, quando ocorre, é sempre muito discreta e em grande parte sem vínculo com sua atividade vocacional; as empresas preferem se colocar como patrocinadoras ou eventuais colaboradoras em ações beneficentes a instituições especializadas do terceiro setor. Tal incômodo registra-se também na modalidade social do turismo recreativo, onde as empresas privadas do setor, que realizam alguma ação social, preferem considerar-se coadjuvantes do Estado, no papel resumido de estabelecer políticas de preço relativamente baixo para propiciar o acesso ao lazer e turismo a um maior número de pessoas de todas as classes sócio-econômicas, que segundo esta visão é uma maneira de fomentar o turismo social, sem discriminação de uso e compatível com as margens de lucro praticadas no mercado. Contudo, algumas ações sociais propostas por representantes significativos deste segmento segregam o público beneficiado ao uso discriminado de uma data reservada, geralmente ociosa ou improdutiva. Análises de Pinto (apud Werneck) sobre lazer e mercado destacam a importância de estabelecer relações éticas, pautadas no respeito a empregados, comunidades e clientes, de maneira democrática nos processos de tomada de decisão. Este discurso é integrado pela responsabilidade social, através da atitude coerente entre discurso e ação. A incoerência entre o discurso e a atitude prática denuncia o uso da máscara da responsabilidade social pela imagem corporativa e institucional. O comportamento empresarial adotado é aquele legal, instituído e fiscalizado pelo Estado, sendo que as outras propostas exógenas à missão da empresa são consideradas de caráter voluntário e independente, sem vínculos permanentes ou critérios de avaliações por qualquer público e por conseqüência, sem risco ou comprometimento. A medida em que a empresa comunica aos clientes, funcionários e fornecedores a adoção de princípios éticos em suas atitudes e investe em ações para a comunidade, estabelece uma imagem que precisa corresponder à realidade. Portanto, as atitudes sociais não podem ser consideradas como medidas cosméticas para a empresa, mas devem estar alicerçadas na missão e vocação do empreendimento. Caso contrário, se a cultura da empresa não respeita ou prioriza tais atitudes sociais pode vir a ser questionada por algum comportamento não consoante à imagem criada, e sofrer efeitos negativos tanto interna quanto externamente. A consciência deste risco parece bem evidente no posicionamento atual do trade pesquisado. Alguns empreendimentos, por exemplo, ao oferecer ingressos gratuitos para os familiares de seus funcionários, valoriza este ato como benefício trabalhista, uma negociação sindical, transformando o benefício social em uma obrigação contratual que, para a empresa, foge do conceito de responsabilidade social. Algumas iniciativas que relacionam esforços de marketing com ações sociais já podem ser observadas em algumas empresas do trade, como promoções destinando parte do valor do ingresso a instituições carentes ou de assistência social. Contudo esse tipo de atuação é tímida e conceitualmente pouco explorada. É importante ressaltar que não há formas padrão de intervenção privada no social, e estas podem ou não envolver o espaço, as instalações e a imagem da empresa de forma direta. Os esforços podem ir da simples doação de recursos a uma entidade

à atuação direta em projetos voltados para a comunidade - estes mais raros. O setor especificamente pesquisado acredita ainda que as questões ambientais e trabalhistas, regulamentadas pelo cumprimento das leis, envolvem a atuação responsável em toda a cadeia produtiva, caracterizando-as como responsabilidade social. É interessante observar que a autopercepção dos empreendimentos junto às respectivas comunidades se dá em primeiro plano na sua capacidade de gerar empregos diretos, mesmo que grande parte do quadro de funcionários seja contratado temporariamente para as funções operacionais, relegando os cargos gerenciais dos quadros fixos aos profissionais importados. Muitas empresas de lazer turístico instaladas em locais privilegiados, em municípios que concederam condições especiais de isenção de impostos e outros benefícios fiscais, a título de gerar empregos diretos para a comunidade local e trazer receita através da promessa do turismo e seu efeito multiplicador, são empreendimentos transacionais, que exploram o potencial da região sem dar retornos expressivos não apenas para o país, mas sobretudo para a classe trabalhadora e para a população local, e acabam concentrando involutariamente, ainda mais a renda e distribuindo impiedosamente a pobreza, a violência e a miséria. A população é excluída assim, das possibilidades de usufruto da riqueza que, socialmente ajudou a produzir. Embora tais investimentos possam minimizar o desemprego estrutural e possibilitar a arrecadação de impostos para o município e a geração de renda, é importante repensar para onde são canalizados os frutos desses e de outros substanciais investimentos no setor turístico, bem como o público que tais empreendimentos privilegia. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS O termo investimento social desencadeia uma série de compromissos e responsabilidades vinculados a vocação da empresa que exige um cuidado e planejamento maior do que em uma ação filantrópica. O investimento social traz para a empresa a responsabilidade de realizar, ou ser o agente transformador da qualidade de vida da comunidade, enquanto que a filantropia permite apenas que a empresa financie esta transformação, o que é legítimo para as ações onde a empresa não tem competência, e que relegue a outras organizações especializadas esta função empresas do terceiro setor. A despeito dos méritos da filantropia, o sentimento humanitário não é suficiente para o combate da pobreza e da exclusão social. São necessários, simultaneamente, um maior compromisso e atuação mais agressiva e mais bem estruturada. Dentro da sua competência, as empresas podem transformar as ações sociais em oportunidades, mas os meios e os fins devem servir antes ao objetivo social. Significa beneficiar, direta ou indiretamente, através de sua vocação a sociedade. Neste princípio baseia-se o marketing em variadas modalidades para viabilizar campanhas e promoções de cunho social. Porém uma análise mais profunda revela que subverteram-se os propósitos legítimos, cambiando os fins pelos meios, ou seja, o benefício social é oportunidade apenas quando se traduz em ingressos ou agrega valor à imagem institucional da empresa, e quando isso não é possível, não recebe o devido planejamento e investimento, e como conseqüência, limitando o desenvolvimento de ações melhor direcionadas a inclusão social.

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