ARTIGO ORIGINAL. Solange Alves Vinhas 4 INTRODUÇÃO

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Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL PRATA, P.B. et al. Aspectos epidemiológicos da hanseníase em localidades do Estado de Sergipe, Brasil, Período de 1994-1998' Aspectos epidemiológicos da hanseníase em localidades do Estado de Sergipe, Brasil, Período de 1994-1998 1 Epidemiological characteristics of leprosy in localities of Northeastern Brazil, during the period 1994-1998 Plácia Barreto Prata 2 Anna Klara Bohland 3 Solange Alves Vinhas 4 RESUMO Apesar do Estado de Sergipe ser uma região endêmica de hanseníase, poucos estudos são realizados no nível local, principalmente nos municípios do interior do Estado. O presente trabalho mostra um estudo epidemiológico nos municípios de Aracaju e Itabaiana em pacientes inscritos no Programa de Controle e Eliminação da Hanseníase entre 1994 e 1998. Durante este período foram inscritos 624 pacientes residentes em Aracaju e 525 no município de Itabaiana. A incidênciataxa de detecção da doença foi elevada nas duas localidades, sendo considerada hiperendêmica em Itabaiana. Encontrou-se 58,6% de casos do sexo feminino; 54,4% tinham entre 20 e 50 anos de idade e 65,2% possuíam as formas tuberculóide ou virchowiana. O elevado incidênciacoeficiente de detecção anual e o alto percentual de formas polares sugere a necessidade de intensificação das medidas de controle preconizadas. Decritores: Hanseníase. Epidemiologia. 1 Trabalho derivado da monografia de conclusão do Curso de Graduação em Ciências Biológicas - modalidade medica. Universidade Tiradentes (UNIT), 1998. 2 Acadêmica do Curso de Especialização em Patologia Clinica - Universidade Federal Fluminense - Niterói, RJ. 3 Docentes do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - Universidade Tiradentes - Aracaju, SE. 4 Endereço para correspondência: Rua Lagarto 1191, apto 303, CEP 49010-390. Aracaju, SE. INTRODUÇÃO A hanseníase é uma doença infecciosa de evolução crônica que atinge principalmente as camadas de baixo nível sócio-econômico'. Está distribuída principalmente nas regiões tropicais e subtropicais', caracterizadas como quentes e úmidas, e relaciona-se às más condições higiênico-sanitárias, condições precárias de moradia, baixa escolaridade e à movimentos migratórios que facilitam a difusão da endemia 10,14. É considerada um problema de Saúde Pública a ser enfrentado pelo mundo'', presente principalmente nas regiões subdesenvolvidas. O Brasil apresentou o segundo lugar em prevalência, concentrando 12,8% dos casos mundiais, sendo superado apenas pela Índia". Esta situação é preocupante, exigindo esforços para o controle da doença. Apenas o Estado do Rio Grande Sul apresenta baixos índices de prevalência, e nas demais regiões brasileiras a situação é de alta ou média endemicidades 5. A prevalência para o Brasil foi de 6,2/10.000 habitantes, em 1996 15. Estudos de séries históricas mostraram elevada prevalência da doença no país nas últimas duas décadas''. Em 1991, o Ministério da Saúde implementou o Programa de Controle e Eliminação da Hanseníase (PCEH), cujo objetivo era reduzir os coeficientes de prevalência para níveis inferiores a um paciente em cada dez mil habitantes. O PCEH adota medidas técnicas para o diagnóstico e tratamento precoce, visando diminuir o período de contágio e o risco de seqüelas. É realizado em regime ambulatorial, nas unidades da rede de serviço de saúde; também desenvolve programas de educação em saúde e vigilância epidemiológica, através da busca ativa em comunicantes 4. Após a adoção do programa, houve uma diminuição da prevalência no Brasil na ordem de Hansen. Int., 25(1): 49-53, 2000 49

Hansenologia Internationalis 60,0%, devido às altas por cura 2. Porém, o incremento na identificação de casos levou à um aumento da incidência (também denominada taxa de detecção), na presente década 4,9,12. A cobertura do PCEH foi estimada, em 1995, no Estado de Sergipe em 70,0%, abaixo da média nacional (86,0%) 8. Segundo o Ministério da Saúde os níveis de detecção são classificados em: baixos (menor que 0,2), médios (0,2 a 0,9), altos (1,0 a 1,9), muito altos (2,0 a 3,9) e situação hiperendêmica (maior que 4,0) 6. No Brasil, o número de casos novos (por 10 mil habitantes), em 1996, foi de 2,5, considerado muito alto 3. Alguns trabalhos revelaram desigualdades regionais na distribuição da doença, sendo que o coeficiente de incidência variou entre 0,9 e 8,0 (por 10 mil habitantes) nas regiões Sul e Norte, respectivamente, em 1996 3. A região Nordeste, que é a terceira região com os maiores coeficientes do país, apresentou taxa de 2,7 por 10 mil habitantes, sendo que no Estado de Sergipe os valores foram ainda maiores (3,0 por 10 mil habitantes) 6. Diversos estudos abordam as diferenças macrorregionais na distribuição desta patologia 8,9, entretanto, poucos são os estudos no nível local 1,14, principalmente nos municípios do interior do país 1. O objetivo deste trabalho é descrever os casos novos de hanseníase, de residentes nos municípios de Aracaju e Itabaiana, durante o período de 1994 a 1998, considerando alguns aspectos epidemiológicos. MATERIAL E MÉTODOS Foi realizado um levantamento dos prontuários de pacientes hansênicos inscritos no PCEH. As informações foram coletadas dos inscritos durante o período de 1994 a 1998 (sendo que em 1998 os dados referem-se apenas ao primeiro semestre). Os municípios escolhidos foram Aracaju (capital do Estado de Sergipe, com 428.194 habitantes, em 1996 7 ) e Itabaiana (município do interior, com 72.052 habitantes, em 1996 6, cuja distância da capital é de 60 Km13). O critério de escolha baseou-se no fato destes municípios apresentarem o maior número de casos novos, segundo dados obtidos junto à Secretaria de Estado da Saúde 11. Cabe lembrar que os dados foram coletados nos dois maiores serviços especializados, a Policlínica Dr. Aristóteles de A. Silva, no município de Aracaju, e na Unidade da Fundação Nacional de Saúde, no município de Itabaiana, o que implica dizer que os resultados apresentados neste trabalho tratam-se dos valores mínimos, podendo haver casos detectados no período que não tenham sido encaminhados à estes serviços. As variáveis do estudo foram: casos registrados no ano, sexo, idade, forma clínica da doença e município de residência. Também coletou-se dados sobre os resultados dos exames baciloscópicos e histopatológicos, porém na análise, foram descartados por se tratarem de informações incompletas ou por não fazerem parte da rotina de coleta de um dos serviços estudados, embora haja recomendações para a coleta da baciloscopia na ocasião do diagnóstico, bem como da realização da histopatologia para a determinação da evolução das formas clínicas da doença 4. As variáveis foram analisadas segundo freqüência relativa e absoluta, e segundo os coeficientes de incidência geral e específico por idade. Os dados sobre população foram obtidos dos Censos de 1980 e 1991 e da Contagem Populacional de 1996, realizadas pela Fundação IBGE 7,13, a partir dos quais foram efetuadas projeções populacionais pela técnica de interpolação de Langrange, para os anos do estudo. RESULTADOS E DISCUSSÃO No período de 1994 a 1998, foram registrados no PCEH 923 casos em Aracaju e 581 em Itabaiana. Destes, 624 eram residentes em Aracaju e 525 em Itabaiana. Em 44 casos não foi possível coletar a informação sobre o município de residência e os restantes (311) eram provenientes de outros 53 dos demais municípios do Estado de Sergipe. O município de Aracaju apresentou maior número de casos de hanseníase, entretanto em Itabaiana observou-se maior incidência (taxa de detecção por 10 mil habitantes). Em Aracaju este índice variou entre 3,1, em 1994, e 1,3, em 1998; enquanto que em Itabaiana variou entre 8,4, em 1994, e 4,4, em 1998 (Gráfico 1). Estes coeficientes foram considerados elevados, se comparados aos da região Nordeste' e do Brasil Segundo a classificação do Ministério da Saúde, a taxa de detecção da patologia no município de Aracaju pode ser considerada muito alta, e, em Itabaiana a situação é hiperendêmica 6. Com relação ao sexo, dos casos residentes em Aracaju, 50,7% eram do sexo feminino e 49,3% masculinos. Em Itabaiana também houve predominância de casos do sexo feminino (68,0%) em relação aos do masculino (32,0%). De acordo com a literatura, a hanseníase é mais freqüente no sexo masculino, devido às condições de vida mais ativa, estando assim, mais expostos à doença 1. Entretanto, em Aracaju e principalmente em Itabaiana, observou-se maior freqüência no sexo feminino. Tal fato pode ser devido ao hábito da mulher freqüentar mais o consultório médico, enquanto que os homens procuram assistência médica apenas quando apresentam formas mais graves e/ou já possuam algum grau de incapacidade. 50

'RATA, P.B. et al. Aspectos epidemiológicos da hanseníase em localidades do Estado de Sergipe, Brasil, Período de 1994-1998' No Estado de Sergipe, em 1996, a presença da doença entre as mulheres (60,4%), também foi maior que entre os indivíduos do sexo masculino (39,6%), situação diversa à do país no mesmo ano (54,7% entre os homens e os 45,3% restantes entre mulheres) 3. Considerando a faixa etária, 16,8% dos casos registrados em Aracaju, tinham menos de 20 anos, 52,4% entre 20 e 50 anos e 30,7% mais de 50 anos, enquanto que em Itabaiana 11,8% dos casos tinham idade inferior a 20 anos, 56,6% entre 20 e 50 anos e 31,6% mais de 50 anos de idade. Esses dados são próximos aos obtidos por Asseis et al. 1, em Londrina, no Paraná. O Brasil apresentou uma elevada ocorrência desta patologia em menores de quinze anos (9,0%), principalmente nas regiões Norte (14,0%) e Nordeste (11,0%) 8, enquanto que na região Sul os menores de quinze anos corresponderam a 0,5% dos casos 3. Em Aracaju e Itabaiana, estes percentuais foram 7,7% e 4,6%, respectivamente. Na análise detecção anual segundo faixa etária (Tabela 1), os municípios apresentaram taxas elevadas praticamente em todas as classes, principalmente no município de Itabaiana. A presença da doença em menores de 20 anos sugere que estes municípios são áreas de alta endemicidade, pois quanto maior a exposição, menor a idade com que as pessoas se infectam 8,5 A forma clínica predominante em ambos os municípios foi a hanseníase tuberculóide, que somada à forma virchowiana, representaram 60,5% (Aracaju) e 70,9% (Itabaiana) dos casos, fato ocorrido em todos os anos do estudo. Estas formas são definidas como polares 4,10, decorrentes da longa evolução da doença. (Gráfico 2). Este resultado sugere que o diagnóstico da hanseníase, nestes municípios, foi tardio, pois já houve evolução da patologia. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o presente estudo foi possível descrever a situação da hanseníase nos municípios de Aracaju e Itabaiana no período de 1994 a 1998. A metodologia de coleta de dados permitiu o estudo das variáveis: sexo, idade, forma clínica e município de residência. No entanto, outras informações deixaram de ser discutidas (como a baciloscopia e o diagnóstico histopatológico), uma vez que, apesar dos municípios seguirem o PCEH, cada serviço segue uma rotina própria, de acordo com as condições locais. Constatou-se que o município de Aracaju possui uma incidência taxa de detecção classificada como muito alta, e em Itabaiana a situação é de hiperendemicidade. Aliado à este fato, a maior freqüência de formas clinicas polares sugere que as medidas de controle da doença deveriam ser intensificadas. Tabela 1. Taxa de detecção de hanseníase (por 10.000 habitantes) segundo faixa etária* nos municípios de Aracaju e Itabaiana, no período de 1994 a 1998** IDADE ARACAJU TABAIANA 1994 1995 1996 1997 1998 1994 1995 1996 1997 1998 0 1-10 0,3 0,1 0,1 0,2 0,2-2,5 1,8 1,2-10 1-20 2,8 1,1 3,3 1,8 0,7 2,5 6,1 10,7 7,6 4,0 20 1-30 3,2 2,9 5,3 4,5 1,3 8,7 28,6 14,4 14,1 4,3 30 i-40 2,5 2,6 3,3 3,0 1,1 6,6 37,8 19,0 22,8 6,1 40 1-50 4,3 2,9 6,2 5,3 2,4 17,9 71,5 43,5 33,5 13,4 50 i-60 7,3 8,8 6,3 7,4 2,7 25,3 52,0 48,4 49,8 4,6 60 1-70 6,8 3,4 11,4 10,6 2,6 19,0 59,5 43,7 46,3 7,0 70 1-80 80 e mais TOTAL 13,5-3,1 15,7 16,5 2,7 18,0 8,2 4,2 * Excluídososcasoscomidadeignorada. * * Dados referentes a 1998 são parciais. 3,6 5,4 3,3 2,4 2,7 1,2 44,3 52,8 8,4 55,8 25,8 25,4 17,2 12,1 50,6 41,6 74,2 17,0 5,8-4,4 Hansen. Int., 25(1): 49-53, 2000 51

Hansenologia Internationalis Gráfico 1. IncidênciaTaxa de detecção da hanseníase por 10.000 habitantes em Aracaju e Itabaiana, no período de 1994 a 1998 * Gráfico 2. Distribuição do número de casos de hanseníase segundo formas clínicas, nos municípios de Aracaju e Itabaiana, no período de 1994 a 1998 * SUMMARY Although leprosy is endemic in the state of Sergipe (Brazil) there are few the reports on the disease in this State, specially in the interior communities. This research reports an epidemiological study in patients registered in the Leprosy Control Program (1994-1998), in the cities of Aracaju and Itabaiana. During this period, 624 patients were registered in Aracaju and 525 in Itabaiana. The incidence was high in both cities. It was found that 58.6% of the patients were female; 54.4% were between 20 and 50 years old and 65.2% had tuberculoid or virchowian leprosy. The high incidence of leprosy and the predominance of polar forms, suggest that is necessary to intensify the control program. Uniterms: Leprosy. Epidemiology. AGRADECIMENTOS À Eliane Nascimento, gerente do Programa de Controle da Hanseníase no Estado de Sergipe, que possibilitou o acesso aos dados estudados. 52

PRATA, P.B. et al. Aspectos epidemiológicos da hanseníase em localidades do Estado de Sergipe, Brasil, Período de 1994-1998' REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS 8. MERCHÁN-HAMANN, E. Diagnóstico macrorregional da situação das endemias das regiões Norte e Nordeste. 1. ASSEIS, E. A., TORNERO, N., MAGALHÃES, L. B., JESUS, v. 4, n. 3, p. 43-114,1997. PRISCINOTTI, T., BARTH, Y.L., CASAGRANDE, N.A. Alguns aspectos sobre a hanseníase na região de Londrina 9. NOGUEIRA, W., MARZLIAK, M.L.C. Perspectivas da - PR, 1968-1978.-1. Características gerais. Hansen. Int., v. eliminação da hanseníase no Estado de São Paulo e no 6, n., 1, p. 55-62, 1981. Brasil. Medicina, Ribeirão Preto, 30 :364-370, 1997. 2. BRASIL MINISTÉRIO DA SAÚDE. CENTRO NACIONAL DE EPIDEMIOLOGIA. FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Boletim Epidemiológico, v. 4, n. 2, p. 2, 1998, 3. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Taxa de detecção de hanseníase. Brasil, 1996 Ion line]. 1999. Disponível em: <URL: http://www.saude.gov.br> [1999 Mai 15]. 4. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. CENTRO NACIONAL DE DERMATOLOGIA SANITÁRIA. Guia de controle da hanseníase. 2. ed. Brasília. 1994. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. CENTRO NACIONAL DE EPIDEMIOLOGIA. COORDENAÇÃO NACIONAL DE DERMATOLOGIA SANITÁRIA. Avaliação epidemiológica e operacional do programa nacional de controle e eliminação da hanseníase: 1995. Brasilia. 1996. 6. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Qualificação dos Indicadores do IDB-97. Taxa de Incidênciadetecção de hanseníase. [on line] 1999. Disponível em: <URL: http:llwww.saude.gov.br> [1999 Mai 15]. 7. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - FUNDAÇÃO IBGE. Contagem da População. 1996. CD ROOM. Rio de Janeiro. 1997. 10. SAMPAIO, S.A.P., CASTRO, R.M., RIVITTI, S.C. Hanseníase, tuberculose cutânea e outras micobactérias. In: Dermatologia básica. 3.ed. Rio de janeiro. Artes Médicas. 1989. 287 : 309. 11. SERGIPE. SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE. Prevalência e Incidência da hanseníase por municípios de residência, 1995. [on line] Sergipe, 1998. 12. SERGIPE. SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE. Programa de Controle e Eliminação da Hanseníase. Situação epidemiológica e operacional do programa de controle e eliminação da hanseníase. Sergipe,1995. 13. SERGIPE. SECRETARIA DO ESTADO DE PLANEJAMENTO E DA CIÉNCIA E TECNOLOGIA. Anuário estatístico de Sergipe. 1996. v : 18. Aracaju. 1996. 14. VARELA, J., CONDE, P, FERNANDEZ, C., MARTINEZ- MOLE,M. Estudio de la morbidad por lepra en el area de salud de Guayos. Rev. Cubana Med. 26:137-187, 1987. 15. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Progress towards leprosy elimination Wkly Epidemiol Rec [serial on line] v. 73, n. 21, p. 153-160, 1998. Avaliable from: <URL: http://www.who.int//wer> [1999 Jul 081. Hansen. Int., 25(1): 49-53, 2000 53